NOÇÕES MATEMÁTICAS PRESENTES NO TRABALHO DE COSTUREIRAS EM PARINTINS: POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS PARA A CONTEXTUALIZAÇÃO DO ENSINO DA MATEMÁTICA Rosângela dos Santos Lima, UEA, flordelimas@hotmail.com Lucélida de Fátima Maia da Costa, UEA, celiamaia5@hotmail.com Adriana dos Santos Gomes, UEA, nanagomes22@hotmail.com Bruno Lopes dos Reis, UEA, brunolopesdosreis@gmail.com RESUMO A pesquisa toma por base os pressupostos da Etnomatemática e combina a observação participativa com entrevistas para alcançar o objetivo de analisar as noções matemáticas presentes no processo de confecção de roupas. Tal processo está repleto de noções matemáticas e constitui um espaço para a contextualização de conceitos matemáticos ensinados na escola. Isso é o que vem mostrando a pesquisa etnográfica desenvolvida no Centro de Costura Dona Cota, na cidade de Parintins no interior do estado do Amazonas. Palavras-chaves: Contextualização, Etnomatemática, Confecção e roupas. ABSTRACT The research is based on the presuppositions of Ethnomatematics, and it combines participant observation with interviews to reach the objective of analyzing the mathematical notions present in the process of making clothes. This process is full of mathematical ideas, and it's a space for the context of mathematical concepts taught in school. It s what has shown ethnographic research developed at the Dona Cota Sewing Center, in the city of Parintins in the state of Amazonas. Keywords: Background, Ethnomathematics, Clothing. 1 Introdução No curso de licenciatura em matemática o estudante tem a oportunidade de observar a prática docente, aprender com ela e perceber pontos onde esta pode ser melhorada. Neste sentido, o interesse pela temática desta pesquisa, deu-se pela necessidade de contextualização do ensino de matemática percebida no estágio supervisionado. Na cidade de Parintins, devido ao festival folclórico dos Bois Bumbás, é muito comum a profissão de costureira, pois durante seis meses do ano, é grande a confecção de roupas para este festival. Ao observar a prática das costureiras percebeu-se a presença de noções matemáticas relacionáveis ao currículo escolar como as formas geométricas e cálculos aritméticos.
Sendo assim, surgiu o interesse em desenvolver uma pesquisa cujo objetivo é analisar as noções matemáticas presentes no processo de confecção de roupas que constituem possibilidades para a contextualização do ensino da matemática, pois se acredita que é possível construir uma ponte entre o ensino da matemática formal e o meio sociocultural dos estudantes. A etnomatemática e a etnografia constituem a base do delineamento metodológico da pesquisa, a qual é do tipo qualitativa e tem como principais técnicas de coleta de dados a observação participativa e a entrevista semiestruturada. Aqui são apresentados parte do referencial, os procedimentos metodológicos e discutem-se os resultados encontrados até o momento. 2 Referencial Teórico A matemática está presente em várias atividades dos seres humanos e, no contexto escolar do ensino fundamental e médio, não pode apresentar-se de forma pronta e acabada como se não fosse um produto da cultura humana. Nesse sentido, os PCN+ mostram que: A matemática deve ser compreendida como uma parcela do conhecimento humano essencial para a formação de todos os jovens, que contribui para a construção de uma visão de mundo, para ler e interpretar a realidade e para desenvolver capacidades que deles serão exigidas ao longo da vida social e profissional. (2002, p. 111). O professor ao ensinar a matemática em sala de aula precisa relacioná-la com práticas do cotidiano, pois o conhecimento matemático é utilizado em diversas situações como instrumento para desenvolver capacidades que são exigidas no decorrer da vida dos sujeitos. Ademais se pode notar que: A construção e a utilização de conhecimento matemático não são feitas apenas por matemáticos, cientistas ou engenheiros, mas, de formas diferenciadas, por todos os grupos socioculturais, que desenvolvem e utilizam habilidades para contar, localizar, medir, desenhar, representar, jogar e explicar, em função de suas necessidades e interesses (BRASIL, 1998, p. 32) O conhecimento matemático não é próprio apenas dos matemáticos, cientistas ou engenheiros, mas também dos grupos sócios culturais, como as costureiras que para efetivarem o trabalho de confecção de um molde modelo
usam uma boa dose de criatividade, intuição e instrumental matemático para fazer ressaltar os atrativos de seus clientes. (BIEMBENGUT e HEIN, 2002, p. 17). Nesse processo de modelação estão presentes saberes matemáticos culturais de forma implícita, pois, a costureira ao cortar uma peça de roupa, criar um modelo, pratica sua visão espacial e resolve problemas de geometria. (DRUCK, 2004, p. 01). Esses saberes matemáticos, mesmo que de forma implícita, constituem-se conhecimentos de um determinado grupo que surgem através da prática do dia a dia. Esses conhecimentos podem ser entendidos como a Etnomatemática das costureiras, pois para D Ambrósio: Etnomatemática é a matemática praticada por grupos culturais como comunidades urbanas e rurais, grupos de trabalhadores, classes profissionais, crianças de uma certa faixa etária, sociedades indígenas, e tantos outros grupos que se identificam por objetivos e tradições comuns aos grupos ( 2005, p. 09). As noções matemáticas mobilizadas pelas costureiras podem constituir um espaço para a contextualização da matemática ensinada na escola, pois na visão de D Ambrósio a proposta pedagógica da Etnomatemática é fazer da matemática algo vivo, lidando com situações reais no tempo [agora] e no espaço [aqui]. (2005, p. 46). Permite colocar os conceitos matemáticos num contexto conhecido por muitos alunos, torná-los reais e significativos de serem aprendidos. 3 Procedimentos Metodológicos O local escolhido para o desenvolvimento da pesquisa foi o Centro de Costura Dona Cota, um lugar criado pela Prefeitura de Parintins-AM destinado a oferecer cursos de corte e costura para pessoas de ambos os sexos que desejem aprender a profissão. O cunho etnográfico dado a pesquisa levou a pesquisadora a conviver com um grupo de cinco costureiras para aprender a costurar e observar as relações que se estabelecem entre as costureiras e seus alunos. Para a observação participativa e para os aportes etnográficos da pesquisa está seguindo-se o direcionamento de Ghedin e Franco (2008) e Ludke e André (1986). As entrevistas realizadas com as costureiras foram do tipo semiestruturada indicadas por Lakatos e Marconi (2001),
pois dão maior liberdade ao entrevistador e lhe permite reelaborar seus questionamentos a partir das respostas que vai obtendo. As informações obtidas no trabalho de campo estão sendo confrontadas com a base teórica para identificar, além das noções matemáticas, as situações presentes no processo de confecção de roupas que constituem possibilidades para a contextualização do ensino de conceitos matemáticos ensinados na escola. A análise dos dados ocorre num movimento cíclico, característico das pesquisas etnográficas, o qual vai da coleta de informações em campo, parte para a seleção, faz a codificação e finaliza com a interpretação e explicação do fenômeno estudado, sempre confrontando as informações obtidas com a base teórica que sustenta a pesquisa (GÓMEZ, 1996). 4 Resultados Preliminares As primeiras observações já mostraram que o processo de confecção de roupas é rico em noções matemáticas relacionáveis aos conteúdos matemáticos do currículo escolar, tanto do ensino fundamental como do ensino médio. Percebeu-se que o simples fato de prognosticar a quantidade de tecido necessário para determinada peça de roupa é um movimento cognitivo que envolve a capacidade de fazer estimativas matemáticas, capacidade que exige do sujeito a articulação entre atenção, percepção, memória e conhecimento matemático referente às operações aritméticas básicas, além do conceito de regra de três simples e até composta. A habilidade das costureiras para fazer estimativas da quantidade de tecido para determinado modelo de roupa depende da sua capacidade de colocar as coisas em relação, o que para Piaget (1978) é a base estruturante do pensamento matemático. Nesse processo, as costureiras relacionam o modelo da roupa e as dimensões da cliente (altura e circunferência) para poder fazer estimativa da quantidade de tecido necessário. O desenho dos moldes é, em sua maioria, permeado de noções geométricas como a planificação da superfície do tronco de um cone reto que se apresenta no molde de uma saia godê, que são aquelas que abrem em grandes rodas na barra. São cortadas em forma circular diminuindo assim o número de costuras. (Modelagem Plana Feminina, p. 30, 2010). Para iniciar o corte a costureira dobra o tecido unindo a largura à altura. Ao finalizar o corte, percebe-se que o tecido cortado
forma um semicírculo vazado no centro de acordo com o tamanho da cintura da cliente. Situações como esta são representativas da riqueza de oportunidades de contextualização para o ensino de matemática que pode ser utilizada nas escolas de Parintins-AM ou em qualquer outro lugar onde se efetive o processo de confecção de roupas. Figura1: Forma geométrica vista numa saia godê Ao aproveitar os conhecimentos de grupos socioculturais na educação matemática escolar mostram-se as diversas formas de se fazer matemática e abrese possibilidade para contextualizar e enriquecer o conhecimento matemático, uma vez que este se apresenta no cotidiano das pessoas. De acordo com os PCN+: Aprender Matemática de uma forma contextualizada, integrada e relacionada a outros conhecimentos traz em si o desenvolvimento de competências e habilidades que são essencialmente formadoras, à medida que instrumentalizam e estruturam o pensamento [...] (2002, p. 111). Sendo assim, ao finalizar a pesquisa espera-se contribuir, por meio da identificação das noções matemáticas presentes no processo de confecção de roupas e da verificação da relação com os conceitos matemáticos, para a melhoria do ensino da matemática ao demonstrar possibilidades encontradas no meio sociocultural para o ensino da matemática na escola, pois de acordo com D`Ambrósio (2005, p. 44) o essencial da etnomatemática é incorporar a matemática do momento cultural, contextualizada, na educação matemática. 5 Considerações Finais Quando um aluno vai para a sala de aula, leva consigo conhecimentos prévios, pois, dependendo do meio em que este está inserido em função de suas necessidades saberá contar, medir, localizar e desenhar. Assim é de grande importância o professor levar ter em conta estes conhecimentos para que o ensino
da matemática aconteça de uma forma que desperte o interesse do aluno para aprendê-la, tornando-se importante fazer a contextualização destes conhecimentos. Muitas pessoas praticam matemática sem saberem a ligação com os conteúdos formais, isso mostra que a aprendizagem matemática ocorre no meio cultural. Então, é possível que o docente de matemática se utilize dos contextos onde essa aprendizagem ocorre para tornar sua prática mais contextualizada, mais significativa e prazerosa. Referências BIEMBENGUT, M. S. e HEIN, N. Modelagem matemática no ensino. São Paulo: Ed. Contexto, 2 ed, 2002. BRASIL. S. E. F. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática/ Secretaria de Educação Fundamental. - Brasília: MEC/SEF, 1998. BRASIL. S.E.M.T. PCN + Ensino Médio: orientações educacionais complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais. Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias. Brasília: MEC, SEMTEC, 2002. D`AMBRÓSIO, U. Etnomatemática- elo entre as tradições e a modernidade. Belo Horizonte: Ed. Autêntica, 2ª ed. 1 reimp. 2005. DRUCK, S. Coleção Explorando o ensino: Matemática Ensino Médio. Vol. 3. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2004. GHEDIN, E.; FRANCO, M. A. S. Questões de método na construção da pesquisa em educação. São Paulo: Cortez, 2008. GÓMEZ, R. G. Metodología de la Investigación Cualitativa. Málaga: Aljibe, 1996. LAKATOS, E. M. e MARCONI, M. A. Metodologia do trabalho científico: procedimentos básicos, pesquisa bibliográfica, projeto e relatório, publicações e trabalhos científicos. São Paulo: Ed. Atlas, 6ª ed, 2001. LUDKE, M. ANDRÉ, Marli E. A. D. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. PIAGET, J.O Nascimento da inteligência na criança. Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1978. SENAC.DN. Modelagem plana feminina. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2010.