7 LEANDRO RAATZ BOTTURA EFEITOS DA DISFUNÇÃO DA ARTICULAÇÃO TEMPOROMANDIBULAR SOBRE O SISTEMA NERVOSO CENTRAL Monografia apresentada à Fundação para o Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico da Odontologia da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo, para obter o título de Especialista. Área de Concentração: Cirurgia e Traumatologia Buco Maxilo Facial Orientador: Almir Alves Feitosa, CD BMF Prof. Coordenador: Dr. Marcos Vianna Gayotto São Paulo 2008 NESTE SITE SERÁ DISPONIBILIZADO PARTES DO TRABALHO ACIMA NOMINADO. Acesso à integra deverá ser solicitado ao autor. Almir Feitosa - Coordenador do site P.O.A. ODONTOLOGIA HOSPITALAR
8 PROPOSIÇÃO A proposição deste estudo é revisar a literatura referente aos efeitos da disfunção da articulação temporomandibular (DTM) sobre o sistema nervoso central, os possíveis danos às estruturas neurais, e sua correlação com o estresse e a ansiedade cada vez mais presente em nosso dia a dia. INTRODUÇÃO Durante a última década muito se discutiu a respeito da importância etiológica de fatores centrais, como estresse mental; e de fatores periféricos, como distúrbios oclusais, na etiopatogenia da disfunção da articulação temporomandibular (DTM). No entanto, em alguns casos clínicos, pesquisas epidemiológicas não foram capazes de demonstrar nenhuma associação entre fatores oclusais e DTM (MAGNUSSON et al., 2005). Atualmente a DTM é considerada a condição mais freqüente de dor orofacial crônica, e a prevalência da dor orofacial relacionada à DTM é estimada em 12%, enquanto a prevalência dos sinais da DTM está acima dos 60% na população adulta, com uma forte representação feminina de 3:1 (MANFREDINI et al., 2003a). O componente psíquico tem ganhado muita força na base da atual etiopatogênese da DTM. Isso porque tem sido demonstrado que ele é capaz de enfraquecer a tolerância fisiológica do sistema estomatognático, fazendo com que uma atividade normal do sistema tenha um efeito patológico ao organismo daquele indivíduo (MANFREDINI et al., 2003b). Assim como os fatores psíquicos, a própria patologia da DTM é capaz de reduzir essa tolerância fisiológica à dor miogênica através de uma hiper-sensibilização central, se
9 tornando um fator predisponente de outros tipos de dor crônica e da perpetuação da própria doença (SARLANI et al., 2004). Alguns autores desenvolveram propostas de novos modelos de construção da etiologia da doença. Dentre estes, Stholer (2006) incluiu fatores de risco e fatores predisponentes para tentar melhorar a relação entre os modelos atuais e as respostas clínicas ao tratamento proposto. Estudos mostram que é grande o sofrimento dos pacientes com disfunção crônica da articulação temporomandibular, e que sua ansiedade e descontentamento com relação à incerteza do prognóstico acabam por piorar seu quadro psicológico e conseqüentemente o grau da doença (WOLF, 2006). Por isso, é de vital importância a evolução no entendimento dessa doença, melhorando a efetividade da terapêutica e da prevenção para que seja possível melhorar também a qualidade de vida dos pacientes (STHOLER, 2006), uma vez que o ritmo alucinante do dia a dia nas grandes cidades parece só aumentar (OKESON, 2000). DISCUSSÃO Ao longo dos anos pudemos observar trabalhos com resultados bastante controversos com relação às causas da disfunção da articulação temporomandibular, em especial com relação à dor miofascial. Atualmente, o papel dos fatores centrais na etiologia da DTM tem ganhado destaque, uma vez que diversos trabalhos não foram capazes de relacionar alterações oclusais com a disfunção da articulação temporomandibular (MAGNUSSON et al., 2005 e STHOLER, 2006). Le Bell et al. (2002) demonstrou que interferências artificiais não são capazes de causar bruxismo em pacientes sem história prévia de DTM, e Magnusson et al. (2005) encontrou a mesma prevalência de bruxismo em pacientes com e sem interferência oclusal,
10 concluindo que a ocorrência da disfunção em pacientes sem problemas periféricos reforça a idéia de que esses fatores agem como modificadores dentro da característica multifatorial da disfunção da articulação temporomandibular. A fisiologia da dor muscular crônica foi bem estudada por Mense (1985, 1991, 1993 e 1998), e é caracterizada por algumas peculiaridades como a dor referida, a dor projetada e os pontos gatilho; que causam sensação àlgica à distância do local afetado, fazendo com que a dor miofascial na região orofacial seja de difícil diagnóstico. Segundo o autor, esses fenômenos se devem a presença de interconexões entre os neurônios que inervam o músculo afetado, neurônios dos músculos vizinhos e neurônios sensitivos da pele. Essas interconexões deixam o sistema nociceptivo da região não afetada excitado, e sua despolarização acontece ao menor estímulo. Por esse e outros motivos, a dor muscular tem uma tendência a se tornar crônica rapidamente quando não apresenta períodos de alívio (OKESON, 2000). Estudos mais recentes como o de Suzuki et al. (2007), foram capazes de comprovar a presença de uma hiper-excitabilidade central nos pacientes com DTM crônica. Já Sarlani et al. (2002 e 2004) mostrou que os pacientes com disfunção da articulação temporomandibular apresentam maior sensibilidade a estímulos dolorosos do que os indivíduos sadios, concluindo que o grupo doente tem maior propensão a apresentar outros tipos de dor crônica associadas à dor na região orofacial, principalmente na região cervical. A hiper-excitabilidade central faz com que o limiar de despolarização do sistema nociceptivo fique diminuído, predispondo o indivíduo a emitir estímulo doloroso. A presença de grande inervação e a constante atividade, faz com que a região orofacial seja bastante afetada por processos álgicos em indivíduos cuja hiper-excitabilidade está presente (OKESON, 2000). A hiper-excitabilidade do sistema nervoso central pode ser considerada uma conseqüência da dor muscular crônica e predispor o indivíduo a apresentar outros tipos de
11 mialgia associadas, e isso acontece através das interconexões sinápticas (MENSE, 1991). Outra situação é que fatores periféricos subclínicos como microtraumas, pequenas inflamações e patologia periféricas microscópicas também podem gerar uma facilitação da geração de impulsos por excitação central sem a presença do fator local aparente (SARLANI et al., 2004). Diversos trabalhos demonstraram que fatores psicológicos patológicos como ansiedade, neurose e estresse também são capazes de desenvolver hiper-excitabilidade central (SARLANI et al., 2002 e 2004; MANFREDINI et al., 2003a e 2003b; FERRANDO et al., 2004 e PALLEGAMA et al., 2005), e isso diminui o limiar de tolerância fisiológica do indivíduo fazendo com que um estímulo que normalmente seria fisiológico tenha um efeito patológico naquele paciente (MANFREDINI et al., 2003a). Stholer (2006) apurou que os pacientes com dor orofacial crônica apresentam uma pobre resposta aos tratamentos propostos durante o atendimento feito por profissionais em um nível primário. Isso faz com que a falta de perspectiva com o tratamento desenvolva fatores psicológicos deletérios ao quadro clínico desse paciente (SARLANI et al., 2002 e 2004; MANFREDINI et al., 2003a e 2003b; FERRANDO et al., 2004 e PALLEGAMA et al., 2005), levando a uma tendência de perpetuação da doença e causando uma piora significativa na qualidade de vida dos indivíduos afetados (STHOLER, 2006). Uma significante evolução na avaliação psicométrica dos pacientes ocorreu a partir da criação de instrumentos mais eficazes como o Minnessota Multiphasic Personality Inventory (MMPI), e tornou possível demonstrar que a DTM está mais relacionada a fatores psicológicos do que a fatores articulares e oclusais (MICHELOTTI et al., 1998). Existe uma forte tendência no aumento dos problemas psíquicos relacionados ao ritmo de vida frenético das grandes cidades que acabam estimulando a liberação de substâncias endógenas de ação sistêmica desencadeadoras de estresse fisiológico manifestado por
12 irritabilidade, ansiedade, bruxismo, briquismo, contratura muscular e hiper-estimulação do sistema nervoso central, promovendo o quadro clínico de dor crônica que pode assumir característica de referida e/ou projetada e/ou sensibilização central (OKESON, 2000; SARLANI et al., 2002 e 2004 e MANFREDINI et al., 2003a e 2003b). Rizzatti et al. (2003) demonstrou que antidepressivos tricíclicos em baixas doses contribuem para diminuir os efeitos dos fatores centrais no desenvolvimento e perpetuação da DTM, podendo ser associados ao tratamento direcionado à eliminação do fator etiológico basal da disfunção buscando uma melhora na qualidade de vida dos pacientes. Na última década tivemos uma evolução considerável no entendimento da etiopatogênese da disfunção da articulação temporomandibular. Isso nos dá possibilidade de criar parâmetros mais adequados para que os tratamentos propostos possam trazer resultados mais satisfatórios, e principalmente que as ações preventivas possam ser mais efetivas contra os problemas futuros (STHOLER, 2006). CONCLUSÃO 1- É imprescindível se conhecer a fundo a etiopatogênese da disfunção da articulação temporomandibular para que o tratamento e a prevenção possam ser mais efetivos para cada paciente. 2- A hiper-excitabilidade do sistema nervoso central é um fator predisponente no desenvolvimento e perpetuação da disfunção da articulação temporomandibular e age através da diminuição da tolerância fisiológica do sistema estomatognático. 3- A dor muscular crônica na região orofacial é capaz de desencadear uma hiperexcitabilidade no sistema nervoso central, o que provoca uma tendência em se associar a outros tipos de dores musculares, principalmente as cervicais.
13 4- A DTM é capaz de desencadear fatores psicológicos patológicos deletérios, manifestados através do estresse e da ansiedade, que predispõem o indivíduo a desenvolver e perpetuar a disfunção da articulação temporomandibular através da excitação central. 5- Fatores etiopatológicos centrais são preponderantes na etiopatogênese multifatorial da disfunção da articulação temporomandibular (MICHELOTTI, 1998; LE BELL, 2002; SARLANI, 2002 e 2004; MANFREDINI, 2003; MAGNUSSON, 2005 e STHOLER, 2006).