A QUESTÃO DA INDENIZABILIDADE DOS TERRENOS MARGINAIS DE RIOS FEDERAIS NAS DESAPROPRIAÇÕES AGRÁRIAS: Desapropriações feitas no Estado de Goiás.



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Transcrição:

A QUESTÃO DA INDENIZABILIDADE DOS TERRENOS MARGINAIS DE RIOS FEDERAIS NAS DESAPROPRIAÇÕES AGRÁRIAS: Desapropriações feitas no Estado de Goiás. Roberto Élito dos Reis GUIMARÃES; Cleuler Barbosa das NEVES Programa de Mestrado em Direito Agrário UFG - Robertoelito@gmail.com Palavras-chave: desapropriação agrária; terrenos marginais; rios federais; indenizabilidade. 1 INTRODUÇÃO O marco jurídico fundamental da propriedade moderna foi a Revolução Francesa e a elaboração das Constituições nacionais. O Estado moderno foi teoricamente construído para garantir a igualdade, a liberdade e a propriedade. 1 Assim, o direito de propriedade era garantido em sua plenitude pelos primeiros diplomas constitucionais. No entanto, com o passar dos tempos esse direito intransponível deixou de ser visto como um direito absoluto e ilimitado; voltado apenas ao atendimento dos interesses do titular da propriedade, para tornarse um direito condicionado ao cumprimento de uma função social. No Brasil, a situação também não foi diferente. Ou seja, a função social da terra passou a ser um atributo inerente à propriedade, sem o qual, o titular de domínio poderá vir a colhido pela desapropriação para fins de reforma agrária. Assim, o art. 184 da vigente Constituição preceitua que compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo a sua função social, mediante prévia e justa indenização em títulos da dívida agrária, resgatáveis no prazo de até vinte anos. Ocorre que muitos desses imóveis agrários são banhados por rios ou outras correntes d água. E, nos termos da legislação regente, muitos desses recursos hídricos e os terrenos que os margeiam são de domínio da União. Saber exatamente quais são estes rios/terrenos e sua evolução dominial, à luz do direito intertemporal, é de fundamental importância para a autarquia agrária se manifestar juridicamente quanto à indenização, dessas áreas. Com efeito, o desafio da pesquisa consiste justamente em analisar 1 MARÉS, Carlos Frederico. A função social da terra. Porto Alegre-RS. Sérgio Antônio Fabris Editor. 2003. p. 18

esses aspectos, sob a ótica do ordenamento jurídico brasileiro. 2 MATERIAL E MÉTODOS A pesquisa está sendo desenvolvida sob uma abordagem qualitativa, recorrendo-se às fontes legais, doutrinárias e jurisprudenciais referentes ao objeto do estudo, Tendo como marco principal o ordenamento constitucional pátrio pretérito e vigente, passando também pelas normas infraconstitucionais correspondentes. Iniciou-se a pesquisa pela evolução legislativa do direito de propriedade e da desapropriação para fins de reforma agrária no Brasil e, em continuação ao estudo proposto, está fazendo-se uma imersão no regime legal dos cursos d'água e de seus terrenos marginais, com ênfase na natureza jurídica de tais bens, na possibilidade jurídica de aquisição desses terrenos por particulares e a que título; na legitimidade do registro imobiliário privado sobre os terrenos marginais e, por fim a (des)obrigação do Incra, ao desapropriar um imóvel agrário, indenizar essa faixa marginal eventualmente existente e qual a destinação a ser dada a essa área. No campo das instituições públicas afetas ao objeto de estudo está sendo feito um levantamento de dados e informações perante a Gerência Regional do Patrimônio da União em Goiás 2 referente aos rios federais que banham esse Estado e seus respectivos terrenos marginais. Outro levantamento está sendo feito junto às Superintendências Regionais do Incra no Estado (SR-04 e SR-28/DFE) no sentido de se identificar os imóveis desapropriados, cujas áreas incidiram em terrenos marginais de rios federais e se houve indenização dessa faixa marginal. 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO No atual estágio em que se encontra a pesquisa ainda é cedo para se falar em resultados, mas já é possível dizer que na origem, a dominialidade pública dos cursos d água recaia somente sobre os rios navegáveis 3, 4, no entanto, evoluiu- 2 As Gerências Regionais são unidades estaduais da Secretaria do Patrimônio da União SPU, cuja missão institucional, dentre outras, é a gestão dos terrenos marginais ao longo dos rios federais. 3 Ordenações Filipinas, Livro II, Título XXVI, n.º 8: E as estradas e ruas públicas, antigamente usadas, e os rios navegáveis, e os de que se fazem os navegáveis, se são caudais, que corram todo o tempo. E posto que o uso das estradas e ruas públicas, e os rios seja igualmente comum a toda a gente, e ainda a todos os animais, sempre a propriedade delas fica no patrimônio real. 4 Decreto-Lei 2.281/1940, Art. 6º - É navegável, para efeitos de classificação, o curso d'água no qual

se ao longo dos tempos e, atualmente, essa dominialidade pública abrange todos os rios e demais correntes d água. Da mesma forma, somente ao longo das margens dos rios navegáveis é que existia a figura dos terrenos reservados 5, posteriormente denominados de terrenos marginais. Com o Regime Republicano e a promulgação da Constituição de 1891, acirrou-se a discussão doutrinária e jurisprudencial quanto à dominialidade dos terrenos reservados dos rios navegáveis, face ao propalado silêncio dos artigos 64 e 65 da mencionada Carta Política sobre essa matéria. Essas discussões acabaram influenciando o arcabouço legislativo vindouro, notadamente o Decreto n.º 21.235, de 2 de abril de 1932 que transferiu tais terrenos para os Estados. 6 Continuando, tal matéria foi tratada no Código de Águas de 1934, na Constituição de 1934 e suas sucessoras e no Decreto-lei nº 9.760 de 1946. Registra-se que essa legislação sempre se referiram aos terrenos reservados/marginais, como aqueles localizados ao longo dos rios navegáveis. No entanto, a Constituição da República de 1988 inovou nesse aspecto ao aduzir na parte final do inciso III, artigo 20, que pertenciam à União os terrenos marginais dos lagos, rios e de quaisquer correntes de água em terrenos de seu domínio, ou que banhassem mais de um Estado, servissem de limites com outros países, ou se estendessem ou proviessem de território estrangeiro. Ou seja, não fez menção expressa ao termo rios navegáveis. Com isso e, além disso, evidencia-se que a novel Constituição teria ampliado o rol de bens da União em detrimento dos bens dos Estados-Membros e dos particulares, visto que não ressalvou a propriedade anterior desses terrenos 'pleníssimo flumine', isto é, coberto todo o álveo, seja possível a navegação por embarcações de qualquer natureza, inclusive jangadas, num trecho não inferior à sua largura, para os mesmos efeitos, é navegável o lago ou a lagoa que, em águas médias, permita a navegação, em iguais condições, num trecho qualquer de sua superfície. 5 Lei n.º 1.507/1867, Art. 39. Fica reservada para a servidão publica nas margens dos rios navegaveis e de que se fazem os navegaveis, fóra do alcance das marés, salvas as concessões legitimas feitas até a data da publicação da presente lei, a zona de sete braças contadas do ponto médio das enchentes ordinarias para o interior, e o Governo autorisado para concedêl-a em lotes razoaveis na fórma das disposições sobre os terrenos de marinha. (redação original) 6 Decreto n.º 21.235/1932, Art. 1º Fica assegurado aos Estados o domínio dos terrenos marginais e acrescidos naturalmente dos rios navegáveis que correm em seus territórios, bem como o das ilhas formadas nesses rios, e o das lagoas navegáveis, em todas as zonas não alcançadas pela influência das marés. Parágrafo único. Igual domínio será exercido sobre os terrenos marginais e acrescidos dos rios que, embora não navegaveis, mas caudais e sempre corredios, contribuam com suas águas para tornar outros navegaveis, estendendo-se esse domínio ás respectivas ilhas. [...] Art. 3º Não se aplica o disposto no art. 1º às margens dos rios que limitam o Brasil com países estrangeiros.

marginais, mediante o uso da expressão São bens da União, salvo se por algum título não forem do domínio estadual municipal ou particular.... Alexandre de Moraes acentua que o Poder Constituinte que estabelece a Constituição de um Estado caracteriza-se por ser inicial, ilimitado, autônomo e incondicionado: inicial, pois, a sua obra a Constituição é a base da ordem jurídica; seria ilimitado e autônomo, porquanto não estaria de modo algum limitado pelo direito positivo antecessor e, por último, seria incondicionado, porque não estaria sujeito a qualquer forma prefixada para manifestar a sua vontade. 7 Com efeito, a nova ordem jurídica constitucional parece ter repercutido diretamente no direito de propriedade incidente nesses terrenos, influenciando, destarte, na questão da indenizabilidade dessa faixa marginal nos casos de desapropriações levadas a efeito pelo Incra. Na busca de uma resposta a essa intricada questão vislumbrou-se a necessidade de enveredar-se pela evolução histórica do direito de propriedade e da desapropriação por interesse social para fins de reforma agrária no Brasil; bem assim, no domínio público dos cursos d água e no instituto dos terrenos marginais, para que, à luz do direito intertemporal, da validade e eficácia das normas jurídicas, e dos princípios constitucionais, possa chegar-se a uma interpretação que melhor atenda aos interesses em jogo. No que se refere aos rios federais que banham o Estado de Goiás já é possível dizer, com base nos dados obtidos junto à Gerência Regional do Patrimônio da União que referido Estado é banhado por... rios federais distribuídos em... municípios perfazendo uma extensão de... km de curso d água e... km de terrenos marginais. No entanto, nenhum desses terrenos encontram-se delimitados. Quanto às desapropriações levada a efeito pelo Incra ao longo desses cursos d água, foi concluído apenas o levantamento dos dados atinentes às desapropriações sob jurisdição da Superintendência Regional-SR/04. Pelos dados apurados, existem 23 projetos de assentamento cujas áreas limitam com referias correntes de água, perfazendo uma extensão de... km de terrenos marginais. Faltam, assim levantar as informações dos imóveis desapropriados sob a jurisdição da Superintendência Regional do Incra do DF e Entorno-SR/28. 7 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 4. ed. São Paulo: Atlas. 2004. p. 89.

4 CONCLUSÃO Do que foi exposto, já se pode afirmar que existem no Estado de Goiás várias áreas desapropriadas pelo Incra incidentes em terrenos marginais de rios federais, sem que aludidos terrenos tivessem sido excluídos da indenização. Quanto aos demais aspectos da pesquisa, acredita-se que, ao final, seja possível responder, utilizando-se da interpretação sistemática do ordenamento jurídico: a) se os terrenos reservados, instituídos sobre terras devolutas do Império, teriam, a partir de sua instituição pela Lei n.º 1.507/1867, deixado de serem considerados terras devolutas, passando-se à condição de bem patrimonial da Coroa Imperial; b) se a Constituição de 1891, ao transferir para os Estados algumas terras devolutas (art. 64) teria transferido também os terrenos reservados; c) na eventualidade dos estudos sinalizarem que a Constituição de 1891 não transferira tais terrenos, se o Decreto n.º 21.235/1932 poderia fazê-lo; d) os terrenos reservados, passando para o domínio estadual, teriam vindo gravados com a inalienabilidade, como os eram quando de domínio do Império; e) se há direito adquirido sobre a propriedade dos terrenos marginais dos rios navegáveis e não navegáveis, transferidos para a União (art. 20,III, CF/1988); f) eficácia do registro imobiliário sobre os terrenos marginais, de domínio da União. 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Constituição Federal de 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www. planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>. Acesso em: 06 jul. 2008. Decreto n.º 21.235, de 2 de abril de 1932. Disponível em: <http://www6.sen ado.gov.br/legislacao/listapublicacoes.action?id=32163>. Acesso em 22 ago. 2008. Decreto-Lei nº 2.281 de 6 de maio de 1940. Disponível em:< http://www6.senado.gov.br/legislacao/listanormas.action?numero=2281&tipo_norma=del& data=19400605&link=s>. Acesso em: 20 jan. 2011. Lei n.º 1.507, de 26 de setembro de 1867. Disponível em: <http://www6. senado.gov.br/legislacao/listapublicacoes.action?id=74360>. Acesso em: 20 ago.2008. MARÉS, Carlos Frederico. A função social da terra. Porto Alegre-RS. Sérgio Antônio Fabris Editor. 2003. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 4. ed. São Paulo: Atlas. 2004. p. 89. PORTUGAL. Ordenações Filipinas (Livro II, Título XXVI, n.º 8). Disponível em: <http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l2p441.htm>. Acesso em: 20 de ago. 2008.