emanuel dimas de melo pimenta

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Transcrição:

C A O S 1 9 9 5

também conferência em conferência realizada na Universidade Técnica de Lisboa Faculdade de Arquitectura - ESBAL Colóquio Ambiente e Qualidade de Vida Maio 16,. Lisboa, Portugal Caos Emanuel Dimas de Melo Pimenta título: autor: Emanuel Dimas de Melo Pimenta ano: Arquiitectura, estética editor: ASA Art and Technology UK Limited Emanuel Dimas de Melo Pimenta ASA Art and Technology www.asa-art.com www.emanuelpimenta.net Todos os direitos reservados. Nenhum texto, fragmento de texto, imagem ou parte desta publicação poderá ser utilizada com objectivos comerciais ou em relação a qualquer uso comercial, mesmo indirectamente, por qualqueis meios, electrónicos ou mecânicos, incluindo fotocópia, qualquer tipo de impressão, gravação ou outra forma de armazenamento de informação, sem autorização prévia por escrito do editor. No caso do uso ser permitido, o nome do auto deverá ser sempre incluído.

A palavra cultura lança a sua remota raiz etimológica na palavra Indo Europeia *kwol que indicava a ideia de cercar, andar em torno de. Algo parecido com o acto da caça. E é esse o sentido que resgatamos em nosso mundo superpopuloso e em supercomunicação. Cercar uma possível significação das coisas. A história dessa palavra tem tudo a ver com o que nós somos: arquitectos. E mais ainda, tem tudo a ver com o conceito de ambiente, tantas vezes tragicamente reduzido a aspectos exclusivamente biológicos. De cerca à presa, que era o sentido da palavra pré-histórica milhares de anos atrás, o significado foi transformado em se movimentar constantemente dentro de um espaço definido. Depois, como é natural, passou a significar o conhecimento que uma pessoa tem daquele espaço, assim se produziu o termo *quoltus e o sentido de culto tão frequentemente aplicado à religião. Devido ao facto de normalmente as pessoas exercerem actividades especializadas dentro de espaços especializados, o sentido dessa palavra se transformou em fazer algo com grande frequência.

Assim, cultura e conhecimento foram se tornando coisas muito semelhantes. Mas hoje, para o nosso planeta interactivo, o sentido de cultura enquanto conhecimento estático de alguma coisa deixa de ser válido. Passamos a caçar continuamente o sentido das coisas que se nos apresentam enquanto contínua metamorfose. É no mínimo curioso lembrar que o sentido de cultura antes considerado como algo quase sagrado, imutável começou a mudar durante a Primeira Guerra Mundial com a propaganda Alemã que inventou a Kultur nacional em contraste com a cultura dos outros países que era, obviamente para eles, mais pobre e que deveria ser eliminada em benefício de uma limpeza étnica. Assim, teve início junto com os primórdios da telecomunicação e da aviação uma espécie de racismo intelectual, intensificando o sentido de culturas melhores e culturas piores; culturas primitivas e culturas avançadas. Dessa forma, uma determinada cultura passou a poder mudar com o tempo uma ideia quase inexistente até então. Quer dizer: pela primeira vez, os meios de telecomunicação separaram as ideias de cultura e território antes muitas vezes consideradas como uma mesma coisa tornando-as descontínuas, independentes e misturando tudo.

Para o universo urbano contemporâneo, cultura não mais é característica exclusiva de um dado espaço territorial. A cidade contemporânea se transformou em um organismo transcultural. Por essa via, as empresas foram adoptando a forma de poderosas entidades transnacionais, caracterizando agregados humanos que põe em causa, para o futuro, o valor das nossas ideias relacionadas ao voto e ao conceito tradicional de democracia. Quando, no início do século XX, a aviação atingiu um certo grau de intensificação, a ideia de território até então um conceito bidimensional transformou-se em um conceito tridimensional. Se Hitler tivesse percebido isso, certamente a Segunda Grande Guerra não teria acontecido. Ele teria primeiro procurado conquistar os céus e hoje teríamos uma realidade muito diferente e, com certeza, terrível. No final da última Grande Guerra, quando felizmente já não havia mais tempo, Hitler teria se questionado: «Por que nunca ousei acreditar na conquista do espaço? Tínhamos foguetes desde 1939!». Com Hiroxima e Nagasaki o espaço territorial não é mais uma figura bidimensional impressa sobre a superfície do planeta. Até mesmo a imagem da destruição passou a ser vertical, na figura dos imensos cogumelos atómicos. 5

As fronteiras territoriais passam a ser projectadas para cima, etéreas. Décadas depois, com a introdução do mundo virtual integral que quer dizer comunicação interactiva em tempo real a noção de espaço sideral passou a fazer parte de nosso quotidiano. O espaço sideral foi literalmente transferido para dentro das nossas casas, através de micro-computadores e da computação gráfica. O lançamento de uma nave espacial tripulada já não causa mais surpresa, não porque tenham ocorrido muitos lançamentos desse tipo, mas porque milhares de pessoas passaram a estar virtualmente no espaço através dos seus computadores pessoais. A História, enquanto tecnologia praticamente normalizada no século XVIII, tende ao desaparecimento e à obsolescência através de uma over-dose informacional. Tudo torna-se transdisciplinar. Assim, a ideia de cultura resgata a sua origem primeira. E passamos, novamente, a cercar as nossas ideias e as nossas crenças que são sempre de natureza imprecisa.

Não há precisão possível na meteorologia, como não há precisão possível no acaso. E, da mesma forma que ninguém comete erros gramaticais nas sociedades não alfabetizadas, esses mesmos erros se tornam menos importantes em nossas sociedades pós-alfabetizadas. Isto é: o nosso domínio de linguagem não mais privilegia a precisão exemplar do código verbal e da visão. Possuímos os computadores e os manuais de navegação realizando novas linguagens, transnacionais, transculturais, transdisciplinares e trans-sensoriais. O ser humano à distância tomou o lugar do ser humano próximo, através de tele-sistemas de comunicação. Assim, pela primeira vez, a amizade entre pessoas não mais se restringe à proximidade física. Podemos conhecer pessoas e ideias localizadas simultaneamente milhares de quilómetros de distância umas das outras. A identificação de uma cultura sempre acontece pela diferença, pelo conflito. Identificar uma determinada cultura é perceber o continente de diferenças que desenha uma assimetria em relação a outras. Foi isso o que aconteceu com Marco Polo, com Alexandra David-Neel ou com Daisetz Suzuki em termos

espaciais, tratando de questões acerca de uma mesmo princípio de tempo. Foi isso o que aconteceu com Plínio, com Vasari ou com Burckhardt em termos de diferenças temporais. Mas, essa divisão entre cultura geográfica e temporal também conheceu profundas metamorfoses em nosso novo planeta. Simplesmente não há mais a geografia plana e bidimensional dos mapas de Mercator, utilizados com poucas alterações durante cinco séculos! A noção de tempos culturais é simultânea num mundo povoado por redes de comunicação que fundem numa só realidade os horrores da antiga Jugoslávia e de Ruanda ao vertiginoso e enebriante luxo dos desfiles de moda e das corridas de Fórmula Um; a beleza exuberante da floresta Amazónica ou as ilhas perdidas no Pacífico até à densidade de cidades como Nova York ou Tóquio tudo misturado enquanto ambiente urbano. Algo a que poderíamos chamar transcultura. E aqui, por paradoxal que possa parecer, tomamos cultura nos seus dois sentidos vulgares: conhecimento especializado e conhecimento étnico, como sendo uma só significação. A separação artificial desses conceitos foi produto da forte intensificação do uso da visão. Assim, emerge a cultura enquanto tecnologia e tecnologia na sua raiz grega technos ou habilidades. Tais habilidades estão para a cultura como o estilema está para o estilo; isto é: são formadores do design de uma determinada

cultura, no seu sentido étnico. Em arquitectura simplesmente não mais se fala em pós-modernidade ou em qualquer outro tipo de formalismo. Um projecto de arquitectura é um acto de cultura em todas as suas instâncias. Uma obra de arte, no sentido mais profundo da expressão. Cultura enquanto cerca a uma presa, cerca a uma ideia, a uma significação, a uma ordem não verbal, ou ao Logos como diria Heráclito. Mas cultura também enquanto conhecimento e habituação de um espaço. De um novo espaço, virtual. Um espaço que elude o seu próprio conhecimento, através de contínuas e imediatas transformações. Assim, junto com as palavras telepresença, interactividade, ciberespaço e desprogramação vai se confeccionando um novo artefacto, talvez o mais radical de sempre, uma nova humanidade chamada teleantropos. Mas essa nova humanidade, submersa nessa cultura de complexidade, não acontece linearmente. Acontece enquanto mudança de fase. Catastroficamente, no sentido atribuído por René Thom. 9

Poucos se percebem que o plasma que circula pelos bancos de sangue nos hospitais é, hoje, uma simples mercadoria transaccionada internacionalmente. O mesmo acontece com órgãos para transplante, ou com nossos próprios alimentos. Repentinamente, o nosso teleantropos revela que a cultura não será mais que uma estratégia orgânica, replicando o mesmo fenómeno em nossa ideosfera. Uma estratégia que desenha a matéria prima da arquitectura: a ideia de território. A ideia de um território andróide resgatando a maravilha da criação de Frankenstein. Nos próximos dez anos, os países com crescimento demográfico explosivo serão o Afeganistão, a Arábia Saudita, a Líbia, o Oman, a Etiópia, a Nigéria, a Síria, o Irão, o Yemen, o Congo, o Quénia, o Malawi, a Somália e a Mauritânia. Nesse mesmo período, os países que terão sua população diminuída ou congelada serão a Hungria, a Itália, a Áustria, a Dinamarca, a Alemanha, a Grécia, o Luxemburgo, a Bélgica, a Irlanda, a Espanha, a Inglaterra, a Finlândia, o Japão, Portugal, Suécia e Suíça. Mas, esse aparente desenho de uma nítida divisão entre dois mundos separados é assistida e participada em directo, em tempo real, por milhões de pessoas espalhadas por todo o planeta. 10

Uma realidade que não apenas está circulando pelas ruas das nossas cidades, mas que está virtualmente dentro das nossas casas. Junto com essa informação demográfica, circula diariamente pelo planeta em transacções comerciais mais de um trilião de dólares. Um dinheiro que simplesmente não existe no plano físico. Uma simples abstracção. Os aeroportos vão se transformando, rapidamente, em gigantescos centros comerciais. A iconologia do futuro imediato não será a imagem limpa e uniforme de Solaris de Tarkovsky, mas sim uma bricolagem intensa e semelhante de uma certa forma a Blade Runner de Ridley Scott. Uma lógica da complexidade para o paradoxo de uma ideia de tempo padrão e uniformizada distribuída por todo o planeta também pela primeira vez na História. A palavra ética surge do grego ethos que significa usos e costumes de uma mesma gente. O nosso planeta superpopuloso e supercomunicativo projecta, pela primeira vez, um ethos global. Assim, aquilo que antes se entendia como ética, nação e cultura deixa de ter sentido. 11

Os territórios do conhecimento já não conhecem departamentos. Caos é um princípio segundo o qual há uma ordem indecidível no acaso. Heráclito afirmava que a sabedoria consistia numa simples coisa: conhecer o pensamento, que ordena tudo em toda a parte. Alguns anos antes de morrer, Buckminster Fuller defendia que «todo mundo nasce inventor. Quando crianças, vamos inventando jogos até que os crescidos venham nos convencer que aquilo que inventávamos era fútil, que deveríamos nos conformar com as coisas aparentemente provadas no passado, quase sempre invenções gastas. Mas, a inventividade continua latente em todos nós. Os inventores devem canalizar a inata capacidade humana de pensar em termos cósmicos. Como inventor, você pode fazer questões cósmicas, tais como: A humanidade é mesmo necessária no universo? Terá ela, então, uma função universal? E se a humanidade for essencial, o que precisa de ser inventado para melhorar o seu funcionamento?». A natureza não-linear pode tanto desestabilizar um sistema como estabilizá-lo. Num sistema linear, a perturbação é uma condição essencial. Num sistema não linear, uma perturbação pode ser dissipada. Esse é o sentido da criatividade. O espelho de nossa cultura: o avesso do avesso do avesso. 12