IV QUANTIFICAÇÃO DE HIDROCARBONETOS NAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS DA REGIÃO CENTRAL DE GOIÂNIA-GO

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Transcrição:

IV-234 - QUANTIFICAÇÃO DE HIDROCARBONETOS NAS ÁGUAS SUBTERRÂNEAS DA REGIÃO CENTRAL DE GOIÂNIA-GO Ana Taíssa de Resende Falcão (1) Acadêmica de Engenharia Ambiental e Sanitária do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás, campus Goiânia. Francislainy Teles Almeida Acadêmica de Engenharia Ambiental e Sanitária do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás, campus Goiânia. Roberta Ferreira de Oliveira Acadêmica de Engenharia Ambiental e Sanitária do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás, campus Goiânia. Rosana Gonçalves Barros Agrônoma e Mestre e Doutora em Agronomia pela Universidade Federal de Goiás. Professora do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás, campus Goiânia. Viníciu Fagundes Bárbara Engenheiro Ambiental pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Mestre em Engenharia do Meio Ambiente e Doutor em Ciências Ambientais pela Universidade Federal de Goiás. Professor do curso de Engenharia Ambiental e Sanitária do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás, campus Goiânia. Perito Ambiental do Ministério Público de Goiás. Endereço (1) : Rua 75, nº 46 - centro - Goiânia - GO - CEP: 74055-110 - Brasil. Tel: (62) 3227-2861 - e-mail: viniciu.fagundes@gmail.com. RESUMO Os vazamentos em postos de combustíveis são responsáveis pelo surgimento de grande número de áreas contaminadas no mundo. Os compostos monoaromáticos benzeno, tolueno, etilbenzeno e xilenos são os componentes que mais causam preocupações em áreas contaminadas por hidrocarbonetos, pois apresentam maior mobilidade hídrica e são os mais tóxicos presentes nos combustíveis. Devido a todos os riscos ambientais associados às formas de exposição a esses compostos e à grande chance de atingirem o lençol freático, o objetivo do estudo foi quantificar esses quatro elementos químicos nas águas subterrâneas de cinco postos localizados no centro de Goiânia, região onde há muitos estabelecimentos antigos que comercializam combustíveis e cuja concentração de pessoas é elevada. As amostras, coletadas em poços de monitoramento ao final do período chuvoso de 2016, foram analisadas pelo método EPA 8260C. Os resultados obtidos indicaram que as concentrações dos parâmetros químicos avaliados se mostraram abaixo dos limites máximos estabelecidos pela Resolução 420\2009 do Conselho Nacional do Meio Ambiente, o que pode ser explicado pela ausência de vazamentos nos sistemas de armazenamento subterrâneos de combustíveis dos estabelecimentos pesquisados, por processos de remediação bem executados no passado ou pela existência de contaminações em fase inicial, ou seja, que ainda não atingiram as coleções hídricas subsuperficiais. Futuros procedimentos investigatórios envolvendo os solos dos postos estudados deverão ser desenvolvidos para que se verifique a possível existência de contaminação na modalidade sorvida. PALAVRAS-CHAVE: Áreas Contaminadas, Passivos Ambientais, Monitoramento. INTRODUÇÃO Áreas contaminadas, também chamadas de passivos ambientais, são terrenos que contém substâncias químicas oriundas de atividades antrópicas capazes de causar danos significativos aos seres vivos em geral e de comprometer recursos naturais abióticos. Em grande parte das cidades, são encontrados passivos ambientais originados por lixões, despejos clandestinos de substâncias tóxicas, indústrias em funcionamento e desativadas, minerações e edificações onde são manuseados elementos químicos potencialmente tóxicos. Uma área é considerada contaminada quando em seus limites são introduzidas de forma planejada, acidental ou até mesmo 1

natural, substâncias com potencial de contaminação dos recursos abióticos, principalmente do solo, sedimentos e águas superficiais e subterrâneas, acima dos limites permitidos. Nesse sentido, segundo Sánchez (2001), desde que a poluição começou a adquirir maiores proporções, suas consequências foram refletidas no meio natural como um todo, afetando principalmente áreas urbanas, zonas industriais e regiões de agricultura intensa. Porém, apesar de nem todos os passivos ambientais representarem perigo iminente, muitos casos denotam sérios riscos ao meio ambiente e à saúde do ser humano (SCHIANETZ, 1999). Segundo Rocca (2006), passivos ambientais são consequência do desenvolvimento tecnológico e industrial, concepção que fica clara nos desastres que já ocorreram em todo mundo. Nesse sentido, um dos eventos mais graves no cenário internacional foi o caso do Love Canal, na cidade de Niagara, no estado de Nova York, onde mais de 22 toneladas de lixo tóxico depositado no solo de forma inadequada trouxeram transtornos irremediáveis aos moradores da região. A situação se tornou amplamente conhecida em 1978 e, a partir de então, vários estudos passaram a ser realizados. Em 2004, a área foi declarada como descontaminada pela Agência de Proteção Ambiental de Nova Iorque, contudo, ainda é monitorada periodicamente (GOMES, 2012). Outro fato relevante foi o ocorrido em 1979 em Lekkerkerk, Holanda, onde residências foram edificadas sobre uma área contaminada. À época, a remediação ambiental dos terrenos foi feita de forma a não deixar traços de material tóxico e, a partir de então, o país ficou reconhecido como referencial na elaboração de práticas acerca de remediação do solo (OLIVEIRA, 2008). No Brasil, especificamente em São Paulo, durante seu período de atividades industriais, uma empresa de Cubatão lançou inadequadamente no solo cerca de doze mil toneladas de material tóxico, causando uma contaminação ambiental de grandes proporções e a morte de dois trabalhadores (SILVA, 2007). Na Bahia, em 1993, após sua desativação, uma mineração deixou um passivo com 490 mil toneladas de resíduos contaminados com metais pesados, principalmente por cádmio e chumbo, afetando solo, sedimentos e a fauna do estuário do rio Subaé, além de diversas doenças desencadeadas na população local (CETEM, 2012). O número de áreas contaminadas no mundo tem crescido aceleradamente nos últimos anos, sendo as indústrias responsáveis por grande parcela dos passivos ambientais existentes. Nesse sentido, a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) começou a tratar da questão no ano de 1993, por intermédio de cooperação técnica firmada com o Governo Alemão (GÜNTHER, 2006), parceria que culminou com a elaboração do Manual de Gerenciamento de Áreas Contaminadas, documento técnico adotado nacionalmente. Contudo, apesar dessa e de outras iniciativas de gestão de passivos ambientais, o problema de contaminação do meio natural no Brasil ainda não recebe a devida atenção por parte do poder público. Os diferentes tipos de contaminantes advindos das atividades antrópicas, uma vez introduzidos no meio natural e dependendo de suas características físico-químicas, normalmente são transportados por águas superficiais e subterrâneas e até mesmo pelas correntes atmosféricas, podendo resultar na alteração da qualidade ambiental e, em alguns casos, no comprometimento da vida. Substâncias conservativas como os metais pesados se destacam nesse contexto, pois se acumulam nos tecidos de organismos expostos (CALIJURI e CUNHA, 2013), podendo inclusive desencadear alterações genéticas nos organismos expostos. De maneira não menos importante, o grupo dos hidrocarbonetos também ocupa lugar de destaque entre as substâncias químicas de interesse ambiental, pois além de ser constituído de elementos de elevado potencial carcinogênico, como o benzeno, tolueno, etilbenzeno e xilenos (BTEX), está presente no cotidiano das pessoas, principalmente na forma de combustíveis. Segundo CETESB (2015), somente no ano de 2015, São Paulo registrou 5.148 áreas contaminadas no Estado, sendo que a maior parte delas está associada a postos de combustíveis (74%). A principal causa para uma porcentagem tão elevada de degradações ambientais associadas a postos são os vazamentos que podem ocorrer em vários processos realizados de forma tecnicamente incorreta nesses estabelecimentos ou devido a instalações e equipamentos integrantes do sistema de armazenamento subterrâneo de combustíveis nãoestanques. A contaminação do solo e das águas subterrâneas em postos pode ocorrer tanto por derrames superficiais nas bombas e bocais de abastecimento dos reservatórios, quanto por vazamentos subterrâneos nos tanques e nas tubulações de sucção e retorno de produto. Apenas mais recentemente, devido às exigências estabelecidas pela resolução 273/2000 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), os tanques de armazenamento 2

obsoletos/antigos vêm sendo substituídos por outros equipamentos mais seguros, de parede dupla, por exemplo. Os maiores problemas de contaminação em postos são atribuídos aos hidrocarbonetos monoaromáticos de maior mobilidade presentes na gasolina. Nesse sentido, além do solo, as águas subterrâneas também estão expostas, sendo que sua contaminação por vazamentos é uma das possíveis ameaças à qualidade desse recurso natural devido à alta toxicidade dos BTEX, poderosos depressores do sistema nervoso central. Nesse sentido, a exposição a hidrocarbonetos em baixas concentrações por um longo período pode causar uma série de efeitos crônicos. O benzeno, o mais tóxico, pode causar depressão das células sanguíneas, danos à medula óssea, leucemia e câncer de fígado. O tolueno apresenta toxicidade sistêmica moderada, porém, quando inalado, compromete o sistema nervoso central, além de desencadear efeitos embriotóxico e fetotóxico. O etilbenzeno e o xileno são depressores do sistema nervoso central (SILVA et al., 2002). Os centros urbanos, devido à elevada quantidade de postos de combustíveis, são áreas muito sujeitas a contaminações ambientais por hidrocarbonetos. Uma vez introduzidos na subsuperfície, os combustíveis costumam alcançar o lençol freático e, carreados pelas águas subterrâneas, podem se acumular sob fundações, redes de telefonia ou elétrica e galerias pluviais, dentre outros, elevando os riscos de explosões, inclusive. Devido à escassez de informações científicas sobre o possível comprometimento das coleções hídricas subterrâneas de Goiânia por hidrocarbonetos, principalmente de sua região central, onde se localizam alguns dos postos de combustíveis mais antigos da cidade, é necessário o desenvolvimento de pesquisas sobre o tema. Portanto, o objetivo deste trabalho foi identificar possíveis áreas da região central de Goiânia cujas águas subterrâneas tenham sido contaminadas por BTEX advindos de postos. MATERIAIS E MÉTODOS Primeiramente, foi feita a seleção aleatória de cinco postos de abastecimento localizados no centro de Goiânia (denominados de Posto 1, 2, 3, 4 e 5), cidade com mais de duzentos estabelecimentos que comercializam combustíveis. Optou-se por empreendimentos situados nessa região devido à elevada concentração de pessoas, o que confere maior risco aos cenários de contaminação ambiental possivelmente existentes na área. Em campo, foi realizada uma avaliação qualitativa preliminar das instalações dos estabelecimentos selecionados para identificação de possíveis irregularidades que pudessem indicar sinais de contaminação ambiental, como manchas e rachaduras nos pisos, extravasamentos de efluentes em caixas separadoras de água e óleo e presença de tanques inutilizados (MPRN, 2012). Para a determinação dos parâmetros benzeno, tolueno, etilbenzeno e xilenos, reconhecidamente os mais solúveis em água (CORSEUIL e FERNANDES, 1999), foram coletadas amostras hídricas provenientes de poços de monitoramento existentes dentro do terreno de cada empreendimento, perfazendo o total de cinco alíquotas. Uma vez obtidas com auxílio de bailers plásticos, as amostras foram acondicionadas em frascos de polietileno de 1 L posteriormente armazenados em caixa de isopor com gelo (4ºC) até a chegada ao laboratório, ocorrida no mesmo dia da coleta. Quando o poço de monitoramento não apresentou volume de água suficiente, foram obtidas amostras compostas advindas de outros poços existentes no mesmo estabelecimento. A campanha de campo foi desenvolvida em março/2016, final do período chuvoso, quando o nível freático se apresenta mais elevado (tabela 1, figura 1). Tabela 1: Dados das amostras de água subterrânea coletadas nos poços de monitoramento. Identificação Data da Coordenadas dos Tipo de Hora da coleta coleta pontos de coleta amostra Posto 1 8:48 16 40 01.66 S 49 15 29.86 W Simples Posto 2 9:25 16 39 54.84 S 49 15 37.72 W Posto 3 23/03/2016 16 39 49.08 S 10:00 49 15 30.66 W Posto 4 10:18 16 39 54.20 S 49 15 49.11 W Posto 5 10:40 16 40 7.86 S 49 15 37.31 W 3

Figura 1: Um dos bailers utilizados na obtenção das amostras. RESULTADOS OBTIDOS Durante a inspeção preliminar, verificou-se que embora todos os estabelecimentos inspecionados fossem dotados dos dispositivos mínimos de engenharia para evitar a contaminação do meio natural, tais como piso impermeável na pista de abastecimento e área de tancagem, canaletas coletoras de efluentes interligadas ao sistema de tratamento de efluentes e sumps de tanques e bombas, algumas inconformidades foram observadas e podem favorecer o surgimento de contaminações ambientais. Nesse sentido, foram constatados tanques com mais de vinte anos de uso, pisos com rachaduras e canaletas coletoras de efluentes danificadas e caixas separadoras de água e óleo sem a devida manutenção (figura 2). Figura 2: Duas imagens referentes aos Postos 1 e 4, respectivamente. Na primeira, se observa uma caixa separadora de água e óleo com presença de resíduos sólidos em suspensão, o que reduz sua eficiência. Na segunda, rachaduras no piso da pista de abastecimento favorecem a infiltração de contaminantes. Essa inspeção qualitativa demonstrou que apesar do avanço considerável de caráter ambientalmente protetivo nas instalações físicas dos estabelecimentos inspecionados, a simples existência de dispositivos de controle não garante a ausência de situações de risco de poluição. É necessário que cada unidade de proteção ambiental seja rigorosamente monitorada e submetida às devidas manutenções, de forma a garantir sua máxima eficiência durante todo o tempo de atividade do empreendimento. 4

Em termos quantitativos, os resultados das concentrações de BTEX são apresentados na tabela 2, assim como os Valores de Investigação estabelecidos pela Resolução n 420/2009 do Conselho Nacional do Meio Ambiente. Tabela 2: Resultados das análises de BTEX para as amostras de águas analisadas. Concentrações Limite µg/l CONAMA Parâmetro 420/09 Posto 1 Posto 1 Posto 1 Posto 1 Posto 1 µg/l Benzeno <0,02 <0,02 <0,02 <0,02 <0,02 5 Tolueno <0,02 <0,02 <0,02 <0,02 <0,02 300 Etilbenzeno <0,01 <0,01 <0,01 <0,01 <0,01 700 Xilenos <0,01 <0,01 <0,01 <0,01 <0,01 500 Embora durante os trabalhos de campo tenham sido obtidas informações de históricos de vazamentos em três dos cinco estabelecimentos e observadas situações que podem favorecer a introdução de hidrocarbonetos no subsolo, as concentrações de BTEX nas amostras coletadas durante a realização deste estudo se apresentaram abaixo dos limites máximos estabelecidos pela legislação. Resultados semelhantes foram obtidos em estudo desenvolvido por Bezerra et al. (2012) e Brito et al. (2004), pois a maior parte das amostras de água subterrânea analisadas por esses pesquisadores também apresentou concentrações de BTEX abaixo dos limites legais. Por outro lado, Silva et al. (2002) constataram que dois anos após a ocorrência de um grande vazamento em um posto de combustível, em cerca de 20% das residências localizadas em suas imediações foram detectadas concentrações de benzeno nas águas subterrâneas cem vezes maiores que o valor máximo permitido pela Portaria de Potabilidade nº 1469, do Ministério da Saúde. Segundo Corseuil et al. (2004), um dos principais fatores para a dispersão acelerada de plumas de contaminação é a presença de etanol, pois a presença de 10% de álcool já é capaz de alterar significativamente a solubilidade de hidrocarbonetos na água, favorecendo a contaminação do lençol freático. É importante salientar que a gasolina brasileira contém cerca de 25% de etanol (BRASIL, 2006). Esses resultados ambientalmente satisfatórios para as águas subterrâneas localizadas nas áreas dos empreendimentos pesquisados podem ter três explicações distintas: (i) ausência de contaminantes no meio natural local; (ii) eficiência dos processos de remediação empregados no passado para remoção dos hidrocarbonetos outrora contaminados ou (iii) existência de contaminações iniciais ou apenas em fase sorvida (restrita ao solo), ou seja, que ainda não atingiram as coleções hídricas subterrâneas, tendo em vista, neste último caso, que no presente trabalho foram analisadas apenas amostras de águas subterrâneas. Por isso, tornase necessária a realização de estudos complementares da qualidade do solo já que, como discutido por Day et al. (2001), o destino e o transporte de componentes de combustível no subsolo são determinados não somente pelas características hidrodinâmicas, mas também geológicas. CONCLUSÕES O estudo demonstrou resultados satisfatórios de qualidade das águas subterrâneas nas áreas dos estabelecimentos pesquisados, não tendo sido comprovada contaminação por hidrocarbonetos do tipo fase livre ou dissolvida. Entretanto, os riscos de contaminação ainda não estão completamente descartados, pois é necessária a realização de estudos da qualidade do solo para avaliar se há indícios de contaminação do tipo fase sorvida nos postos em questão. 5

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