A VARIABILIDADE OCEÂNICA E ATMOSFÉRICA NA REGIÃO DO ATLÂNTICO TROPICAL NOS DADOS DA REDE PIRATA A PARTIR DA ANÁLISE DE ONDELETAS

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Transcrição:

Revista Brasileira de Meteorologia, v.20, n.1, 43-58, 2005 A VARIABILIDADE OCEÂNICA E ATMOSFÉRICA NA REGIÃO DO ATLÂNTICO TROPICAL NOS DADOS DA REDE PIRATA A PARTIR DA ANÁLISE DE ONDELETAS GABRIEL CLAUZET 1, ILANA WAINER 1 E JAQUES SERVAIN 2 1 Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo. Praça do Oceanográfico, 191 - CEP 05508-900 - São Paulo, Brasil 2 Centre IRD de Bretagne, BP 70, 29280 Plouzané, France E-mail: gclauzet@usp.br Recebido Outubro 2003 - Aceito Novembro 2004 RESUMO Neste trabalho utilizam-se dados de alta resolução das bóias Pilot Research Array in the Tropical Atlantic (PIRATA), para avaliar as escalas de variabilidade temporal existentes na temperatura da superfície do mar (TSM) e no regime de ventos para a região do oceano Atlântico tropical. Procurou-se avaliar e comparar os resultados obtidos com dados e climatologias cuja variabilidade já foi exaustivamente analisada. Séries de dados de alta resolução (10 minutos) para o período de 1997 a 2000 são examinadas através da análise de ondeletas. Os resultados obtidos mostram grande concordância entre os dados e anomalias de TSM coletados pela rede PIRATA com os observados pelo Integrated Global Ocean Services System, demonstrando a capacidade da rede em registrar não só variações sazonais com também desvios térmicos interanuais, influenciados por fenômenos de escala global (El Niño/Oscilação Sul). O regime de ventos está de acordo com o observado nos dados de da Silva (1994), representando satisfatoriamente o deslocamento latitudinal da ZCIT e variação sazonal dos alísios. A análise de ondeletas evidenciou a forte influência do ciclo sazonal sobre a variabilidade de alta freqüência. Nesta predominam os ciclos diurnos e semidiurnos para atmosfera e oceano. Para períodos maiores que o diário, três bandas aparecem como dominantes: 20-40, 12-18 e 2-7 dias. Grande parte da variabilidade encontrada ocorre em períodos onde a variação sazonal é mais pronunciada, ou seja, meses quentes. Palavras-chave: Atlântico Tropical, Rede de Bóias PIRATA, TSM, Ventos, Análise de Ondeletas. ABSTRACT: OCEANIC AND ATMOSPHERE VARIABILITY ON THE TROPICAL ATLANTIC FROM THE PIRATA ARRAY DATA REVEALED BY WAVELET ANALYSIS In this study we use the high-resolution time series from the Pilot Research Moored Array in the Tropical Atlantic (PIRATA) buoys to evaluate the scales of variability of the sea surface temperature (SST) and wind fields in the tropical Atlantic. Results are compared with known (and validated) data products. Wavelet analyzes is used to examine the high resolution time series (10 minutes) from 1997 to 2000. Results show good agreement between the PIRATA SST and that of the Integrated Global Ocean Services System data set, showing the ability of the array to record not only seasonal variations but also Interannual signals, probably affected by the El Niño and the Southern Oscillation cycle. The observed wind field agrees that of the da Silva data set, registering well the latitudinal shift of the ITCZ and the intensification of the trade winds. The wavelet analyses show the strong influence of the seasonal cycle on the variability at high frequencies. At high frequencies the dominant signals are the diurnal and semidiurnal cycles for both for the atmosphere and for the ocean. For frequencies lower than diurnal, three bands are statistically significant: 20-40, 12-18 and 2-7 days. A major part of the variability found in the PIRATA data occurs where seasonal variations are most pronounced, i.e. warm months. Key words: Tropical Atlantic, PIRATA Buoy Array, SST, Winds, Wavelets Analysis. 1. INTRODUÇÃO O oceano Atlântico tropical é caracterizado por um forte ciclo sazonal que se manifesta principalmente pelo deslocamento meridional da Zona de Convergência Inter- Tropical (ZCIT). O período e características da evolução sazonal da ZCIT e da temperatura da superfície do mar (TSM) dependem do acoplamento dinâmico entre eles e dos contrastes entre terra-mar que ainda não são inteiramente compreendidos. Sobrepostos ao ciclo sazonal existem dois principais modos de variabilidade no Atlântico tropical, com importantes conseqüências no clima regional das Américas e África (Servain et al, 2000). O primeiro modo de variabilidade climática no Atlântico tropical é similar ao ENOS (El Nino/Oscilação Sul) no oceano Pacífico, na região equatorial (Zebiak, 1993). Este modo equatorial varia em escala de tempo sazonal e interanual. Durante a fase quente, os ventos alísios do lado oeste na região equatorial se enfraquecem contribuindo para uma elevação anômala da TSM, principalmente na parte leste da bacia. Na fase oposta (fria) isso se inverte, os ventos alísios

44 Gabriel Clauzet et al. Volume 20(1) se intensificam diminuindo a TSM. Estes eventos quentes e frios ocorrem geralmente, em escalas de tempo que variam de 2 a 8 anos. O inicio de um evento frio ou quente pode ocorrer rapidamente em escalas de tempo que variam de semanas a meses. Os eventos quentes no Atlântico tropical provocam grandes impactos climáticos nas regiões nordeste do Brasil e do Sahel, África (Crawford, et al, 1990; Wagner and da Silva, 1994). O segundo modo de variabilidade no Atlântico tropical não possui similar no Pacífico. Este é caracterizado por um gradiente na TSM entre os hemisférios Norte e Sul. Este modo é conhecido como Dipolo do Atlântico (Moura and Shukla, 1981; Servain, 1991; Servain et al., 1999, Servain et al., 2003) e envolve variações de fases opostas na TSM em cada hemisfério em diversas escalas de tempo. As variações na TSM têm conseqüências climáticas em diversas regiões da África e América. Particularmente quando a região norte da bacia se encontra mais quente que ao sul. A ZCIT se posiciona mais ao norte de sua posição normal, ocasionando secas na região Nordeste do Brasil e fortes chuvas na região do Sahel. Ao contrario, quando a ZCIT localiza-se mais ao sul, as águas ao sul da bacia se encontram mais quentes que ao norte, ocasionando chuvas na região Nordeste do Brasil e secas na região do Sahel (Wainer and Soares, 1997). A variabilidade temporal no Atlântico tropical foi estudada em diversos trabalhos (Weisberg, 1979; Garzoli, 1987; Zebiak, 1993; Servain and Merle, 1993). Estes foram baseados em dados coletados durantes campanhas e projetos oceanográficos na região. O primeiro experimento internacional que possibilitou um banco de dados adequado a este propósito foi o Global Atmospheric Research Program (GARP) Atlantic Tropical Experiment (GATE), durante o inverno austral de 1974 e posteriormente em 1979, o First Global GARP Experiment (FGGE). Em 1983, mais dois experimentos coletaram dados de alta freqüência durante aproximadamente dois anos da região equatorial o Seasonal Response of Equatorial Atlantic (SEQUAL) e o Français Ocean et Climat dans l Atlantique Equatorial (FOCAL). Praticamente 14 anos depois do último grande experimento de coleta de dados é implantada na região do Atlântico tropical a rede de bóias Pilot Research Moored Array in the Tropical Atlantic (PIRATA) (Servain et al., 1998). O programa PIRATA teve o início de sua fase piloto em 1997 e hoje caminha para a fase de consolidação da rede. O projeto envolve esforço conjunto de Brasil, França e EUA. As bóias usadas no PIRATA são do tipo Autonomous Temperature Line Aquisition System (ATLAS) (Mangum et al., 1994), iguais às usadas no Pacífico equatorial pela rede Tropical Atmosphere Ocean (TAO) (Mc Phaden et al., 1998). As variáveis medidas são ventos de superfície (VS), temperatura da superfície do mar (TSM), salinidade da superfície (SSS), temperatura do ar (TA), umidade relativa (Ur), radiação solar (Rd), precipitação (PPT), temperatura abaixo da superfície (TAS) (10 pontos entre a superfície e 500 metros), salinidade abaixo da superfície (SAS) (3 pontos até 500 metros) e pressão (P) a 300 e 500 metros. A rede consiste de 12 bóias ATLAS ancoradas numa faixa entre 15ºN-10ºS e 38ºW-0ºE (figura 1). Essa configuração foi escolhida para cobrir ao longo do equador regiões de fortes ventos vindos da região oeste e regiões de significativa variabilidade sazonal e interanual da TSM, na parte central e ao leste do equador. Os espaçamentos entre as bóias no equador (10º a 15º de longitude) foram escolhidos a fim de resolver as rápidas ondas Kelvin responsáveis pelo ajuste equatorial do oceano Atlântico em resposta ao regime de ventos. Os espaçamentos meridionais se estendem ao norte ao longo de 38ºW, de 4ºN a 15ºN e ao sul ao longo de 10ºW, de 2ºN a 10ºS, com o objetivo de monitorar a variabilidade de TSM, associadas ao modo do dipolo do Atlântico (Clauzet, 2001). Diversos trabalhos recentes utilizam a análise de ondeletas como ferramenta para investigar a variabilidade nos oceanos (Liu P., 1994; Gu and Philander, 1995; Setoh and Imawaki, 1999; Melice and Servain, 2003). A análise de ondeletas representa uma ferramenta matemática em rápido desenvolvimento, com aplicações em diversas áreas da ciência. Sua utilização para estudos geofísicos se originou em análises sinais sísmicos e apenas nas últimas duas décadas seu uso se difundiu entre as demais ciências. O conceito de transformada de ondeleta foi formalizado no começo dos anos 80 em uma série de trabalhos publicados por Morlet (1981). Neste artigo pretende-se utilizando dados de alta resolução temporal coletados pela rede de bóias PIRATA caracterizar a séries temporais de TSM e ventos e examinar através da análise de ondeletas as escalas de variabilidade temporal e processos responsáveis pela evolução destes parâmetros na região do Atlântico equatorial. Na Seção 2 são descritos os conjuntos de dados utilizados para as análises e a metodologia empregada. Na Seção 3 são analisadas as séries temporais de cada um dos parâmetros, os respectivos espectros de ondeletas e a variabilidade temporal a eles associados. Na Seção 4 são apresentadas as discussões e conclusões dos resultados obtidos. Figura 1: Localização geográfica das bóias da rede PIRATA.

Abril 2005 Revista Brasileira de Meteorologia 45 2. METODOLOGIA Foram analisadas séries temporais de TSM e ventos adquiridas pelas bóias do programa PIRATA a partir de setembro de 1997 até março 2001. Infelizmente as muitas lacunas existentes nos dados dificultam as análises. Estas lacunas são atribuídas a diversos fatores como a quebra de sensores, falhas na alimentação de energia dos equipamentos e até atitudes depredatórias por parte de pescadores (Servain et al., 1998). As bóias da rede PIRATA transmitem via satélite médias diárias de todos os dados coletados. Também são armazenados dados adquiridos a cada 10 minutos que são posteriormente coletados durante os cruzeiros de manutenção das bóias. Neste trabalho foram utilizadas médias horárias feitas apartir dos dados coletados a cada 10 minutos e médias diárias. Estes dados estão disponíveis no endereço do site oficial do projeto PIRATA: http: //www.pmel.noaa.gov/pirata. Em vista da presente limitação da quantidade de dados, decorrente da recente implantação da rede, procurou-se avaliar e comparar os resultados obtidos com dados e climatologias cuja variabilidade já foi exaustivamente analisada. Para caracterização da climatologia da TSM foram utilizados dados do Integrated Global Ocean Services System (IGOSS) (Reynolds and Smith, 1994). Os dados mensais do IGOSS são obtidos através de médias dos dados semanais derivados de uma interpolação linear numa resolução espacial de 1º x 1º a partir de dados in situ e de satélite, ajustados pelo método de Reynolds (1994). Os dados do período de 1981 a 1989 são provenientes do Comprehensive Ocean-Atmosphere Data Set (COADS) (Slutz et al., 1985) enquanto os mais recentes, desde 1990, foram extraídos do Global Telecommunication System (GTS). Os dados de satélite foram obtidos do National Environmental Satellite Data and Information Service (NESDIS). Também foram utilizados dados de anomalias da TSM do conjunto IGOSS para validar oscilações na TSM observadas nos dados da rede PIRATA. O regime de ventos foi caracterizado apartir do conjunto de dados de da Silva (1994). Estes são baseados no conjunto COADS compreendendo o período de 1945 a 1993, com resolução de.5º x.5º. A variabilidade temporal das séries foi analisada através da análise de ondeletas. A grande vantagem desta análise sobre a transformada de Fourier é a capacidade da ondeleta em alterar sua escala permitindo capturar componentes de diferentes freqüências. Ela funciona como uma janela que aumenta para capturar componente de alta freqüência e diminui para capturar componentes de baixa freqüência. As ondeletas conseguem descrever o comportamento local do sinal, enquanto que a análise de Fourier descreve o comportamento global do sinal. Isso faz com que o espectro de on daletas seja menos afetado por uma não estacionaridade em um intervalo pequeno de tempo do que o espectro de Fourier (Morettin, 1999). A idéia básica da análise de ondeletas é a de aproximar uma função por uma combinação linear de ondeletas permitindo a localização de um sinal periódico no tempo (ou espaço). Neste estudo utilizase a transformada continua baseada na ondeleta de Morlet, principal ondeleta utilizada em diversos trabalhos (Lau and Weng, 1995; Gu and Philander op. cit.; Setoh and Imawaki op. cit.). A ondeleta de Morlet foi usada e sua transformada foi feita no espaço de Fourier usando o método descrito em Torrence and Compo (1998; doravante TC98). A ondeleta de Morlet consiste em uma exponencial complexa modulada por uma Gaussiana,, onde t é o tempo, s é a escala da ondeleta e ω 0 é a freqüência não dimensional (Torrence and Webster, 1998). Neste trabalho utilizou-se ω 0 = 6, permitindo aproximadamente três oscilações dentro do envelope gaussiano e ao mesmo tempo satisfazendo a condição de admissibilidade para ondeleta, ou seja, média igual a zero e energia finita (Weng and Lau, 1994). O espectro de ondeletas é definido como a raiz quadrada do modulo da transformada de ondeletas e fornece a medida da variância da série em cada escala e a cada tempo. Para testar a significância dos picos no espectro de ondeletas utilizou-se um espectro de fundo de Fourier. Os espectros de ondeletas são representados utilizando-se uma escala de cores que representam sua magnitude. Esta escala varia em tons de azul do escuro ao claro à medida que cresce a magnitude do espectro. Adotouse o limite de confiança de 90%, estes estão representados por contornos vermelhos englobando a região acima do limite de confiança adotado. Uma vez que a variabilidade de alta freqüência (principalmente diurna) não foi filtrada das séries optou-se por um limite relativamente baixo permitindo validar regiões de variabilidades de mais baixa freqüência. Uma análise similar foi empregada por Wainer et al., (2003) utilizando um limite de 95% (comunicação pessoal), este praticamente invalidou variabilidades de alta freqüência. Também é representado por uma linha preta grossa o chamado Cone de Influência (CI) (TC98). Os dados que se encontram abaixo desta linha não são considerados validos, estando sujeitos a grande influência de erros estatísticos. Uma descrição completa da metodologia empregada na análise de ondeletas esta minuciosamente detalhada no trabalho de TC98. 3. RESULTADOS Para a análise de dados e discussão dos resultados dividiu-se as bóias em três seções. Duas linhas meridionais, ao longo de 38ºW e 10ºW, e uma linha zonal ao longo do equador. A figura 2 (a) e (b) mostra o período de aquisição de dados de cada bóia para TSM e vento, respectivamente. As linhas pontilhadas indicam dados coletados a cada 10 minutos e as linhas contínuas médias diárias. Os resultados obtidos estão dispostos em duas seções compreendendo a análise dos dados de TSM e ventos. As séries temporais estão representadas em gráficos cujo eixo do tempo abrange todo o período de operação da rede PIRATA investigada neste trabalho (setembro de 1997 a maio de 2000), possibilitando comparar mais facilmente os diferentes períodos de aquisição de dados de cada bóia. As séries temporais horárias estão representadas por linhas continuas enquanto as respectivas climatologias por linhas pontilhadas.

46 Gabriel Clauzet et al. Volume 20(1) Figura 2: Disponibilidade dos dados coletados pela rede de bóias PIRATA atualizado até março de 2001. A linha continua representa os dados de alta resolução (coletados a cada 10 minutos) e a linha pontilhada médias diárias: (a) Temperatura da Superfície do Mar (TSM); (b) Velocidade do Vento. 3.1. TSM As figuras 3, 4 e 5 mostram os dados de TSM da rede PIRATA e a climatologia do IGOSS para as linhas de 38ºW, equador e 10ºW, respectivamente. Para a linha de 38ºW as séries coletadas pelas três bóias mostram o ciclo sazonal bem evidenciado com máximos de TSM entre agosto e outubro e mínimos de fevereiro a abril. Em 15ºN pode-se observar que o ano de 1998 foi anomalamente quente. A TSM apresenta uma amplitude em trono de 4ºC, variando entre 24,7ºC e 28,7ºC. Em 12ºN, observa-se um diferente período de aquisição de dados (fevereiro de 1999 a março de 2000). Entre fevereiro e julho de 1999 nota-se um período mais frio que a média climatológica, este padrão se inverte entre setembro de 1999 a março de 2000 mostrando valores mais elevados que a climatologia. A amplitude da TSM é ligeiramente maior que a observada em 15ºN, da ordem de 4,9ºC. Mais ao sul, em 8ºN, observa-se os valores mais elevados de TSM de toda a seção, atingindo máximos de 30ºC. O ano de 1998 se encontra mais quente que a climatologia. Em maio de 1999 essa característica se inverte e um período mais frio predomina até setembro de 1999. A partir de setembro de 1999 até janeiro de 2000 ocorre novamente um aquecimento das águas na região. Figura 3: Dados de alta resolução (10 minutos) da TSM obtidos da rede de bóias PIRATA (linha continua) e respectivas climatologias obtidas com dados do IGOSS (linha pontilhada) para as bóias da linha de 38ºW: (a) 15ºN; (b) 12ºN; (c) 8ºN. A radial ao longo do equador mostra um aumento na amplitude da TSM à medida que se caminha para o leste. Em 35ºW as variações máximas na TSM são da ordem de 3ºC, para 23ºW da ordem de 5ºC e em 10ºW de 7ºC. Esta maior amplitude na região leste do equador é atribuída à intensa ressurgência que ocorre na região. Observa-se ao longo de toda a radial um aquecimento anômalo no ano de 1998. O período frio observado anteriormente em 12ºN e 8ºN, ao longo da linha de 38ºW para 1999, não é tão pronunciado. O ciclo sazonal também é bem evidenciado com elevados valores da TSM entre fevereiro e abril e mínimos entre junho e agosto. A linha ao longo de 10ºW esta representada por apenas duas bóias, uma comum à linha equatorial (0º 10ºW) e outra em 10ºS 10ºW. A série temporal de TSM em 10ºS 10ºW, mostra uma interrupção na aquisição dos dados de abril a novembro de 1998. De setembro de 1997 a março de 1998 nota-se uma tendência quente como observada nas demais bóias. Um período mais frio que a climatologia esta presente entre novembro de 1998 e fevereiro de 1999. Este período frio não é observado em nenhuma outra bóia. Apartir de fevereiro até outubro de 1999, final do período de aquisição, nota-se uma tendência quente na TSM. A variação da TSM em ambos os períodos de aquisição dos dados apresentam variação na amplitude da ordem de 5ºC, inferior à observada em 0º 10ºW.

Abril 2005 Revista Brasileira de Meteorologia 47 Para caracterizar o comportamento da TSM da região do Atlântico tropical durante os anos de 1997 a 2000 foram analisados dados de anomalias de TSM (ATSM) do IGOSS. A figura 6 mostra os diagramas Hovmoeller das ATSM ao longo das linhas de 38ºW, do equador e de 10ºW. Os retângulos em preto englobam as localidades das bóias analisadas. O final do ano de 1997 mostra-se anomalamente frio, principalmente na parte sul da linha de 38ºW (figura 6(a)). Em 1998 nota-se uma tendência de aquecimento em todas as linhas. Durante todo o ano pode-se observar anomalias positivas, com duas pequenas regiões negativas próximas a julho de 1998 ao longo do equador entre 25ºW e 20ºW (figura 6(b)) e em dezembro de 1998 ao longo de 10ºW entre 10ºS e 5ºS (figura 6(c)). Para 1999 observa-se um resfriamento anômalo durante o primeiro semestre principalmente na linha de 38ºW. Na segunda metade do ano esta característica fria se inverte. As características quentes e frias, em 1998 e 1999, estão de acordo com o observado nas séries de TSM para as bóias ao longo da linha de 38ºW. O enfraquecimento das anomalias negativas ao longo de 1999 para a linha do equador também esta de acordo com os dados de TSM coletados pelas bóias para esta seção. Para a linha de 10ºW um período frio entre novembro de 1998 a março de 1999 é bem evidente no diagrama Hovmoeller Figura 5: Dados de alta resolução (10 minutos) da TSM obtidos da rede de bóias PIRATA (linha continua) e respectivas climatologias obtidas com dados do IGOSS (linha pontilhada) para a bóia da linha de 10ºW localizada em 10ºS. Figura 4: Dados de alta resolução (10 minutos) da TSM obtidos da rede de bóias PIRATA (linha continua) e respectivas climatologias obtidas com dados do IGOSS (linha pontilhada) para as bóias ao longo do equador: (a) 35ºW; (b) 23ºW; (c) 10ºW. Figura 6: Diagramas Hovmoeller das anomalias de temperatura da superfície do mar (ATSM) obtidas com dados do IGOSS para os anos de 1997 a 2000: (a) ao longo da linha de 38ºW (4ºN-15ºN); (b) ao longo do equador (38ºW-0ºE); (c) ao longo da linha de 10ºW (2ºN-10ºS).

48 Gabriel Clauzet et al. Volume 20(1) (figura 6(c)) principalmente ao sul de 6ºS. Nos dados de TSM para a bóia de 10ºW 10ºS esta característica também é bem evidenciada (ver figura 5). O aquecimento de grande magnitude observado durante 1998 pode ser observado ao longo de praticamente toda a região tropical. Especula-se que este aquecimento seja influência do fenômeno ENOS, que se manifestou com grande intensidade no Oceano Pacífico entre 1997 e 1998 (McPhaden, 1999; Wang and McPhaden, 2001). Para evidenciar esta possível relação realizou-se uma média das ATSM do IGOSS para a região noroeste do Atlântico tropical (15ºN-0º /50ºW-25ºW), região que engloba a linha de 38ºW onde o aquecimento foi mais significativo e procurou-se correlacionar esta série com a série do NINO3.4, comumente utilizada como representativa dos eventos de ENOS. Este índice é obtido calculando-se a média da ATSM na região do Pacifico tropical na região denominada NINO3.4 (5ºN-5ºS / 170ºW-120ºW). A figura 7 mostra a correlação com defasagem temporal entre estas duas séries. Pode-se observar que a maior correlação obtida (próxima a -0.45) ocorre para uma defasagem entre 7 e 8 meses, ou seja, após este período de ocorrência de um máximo no evento do ENOS no Pacifico tropical pode-se observar um máximo na ATSM na região noroeste do atlântico equatorial. Para determinar a significância deste coeficiente de correlação utilizou-se a análise de variância, baseada no teste de F (Panofsky and Brier, 1976). O numero de graus de liberdade de cada série foi estimado calculando-se a autocorrelação das mesmas, encontrando o valor em que a autocorrelação torna-se zero e dividindo-se o numero total de dados por esta escala. Para ambas as séries calculou-se a significância baseada em 18 graus de liberdade. Considerando-se 18 graus de liberdade em cada série, a correlação precisa ser acima de 0.34 para ser significativa a 95%. Estes resultados corroboram com a hipótese Figura 7: Coeficiente de correlação com defasagem temporal entre a série do NINO 3.4 e a média das anomalias do IGOSS para região noroeste do Atlântico tropical (15ºN-0º / 50ºW- 25ºW). de que o padrão anomalamente quente e a menor variação sazonal observada durante o ano de 1998, principalmente ao longo de 38ºW, na região do Atlântico tropical possam ser atribuídos à influência do fenômeno ENOS 97-98. A análise de ondeletas para os dados de TSM foi realizada para a linha de 38ºW (figura 8), para a linha equatorial (figura 9) e para a bóia em 10ºS 10ºW (figura 10). Ao longo de 38ºW observa-se que apesar da grande magnitude encontrada em grandes escalas temporais, a maioria de regiões significativas (englobadas por contorno vermelho) no espectro está entre 12 e 36 horas, centradas no período de 24 horas. Em 15ºN (figura 8(a)) nota-se uma maior concentração destas regiões entre julho e setembro de 1998 e algumas regiões isoladas em janeiro e abril do mesmo ano. Duas regiões significativas com grandes períodos podem ser observadas em abril com período próximo a 64 dias e em julho e agosto de 1998 com período próximo a 100 dias. Apesar de ambas as regiões estarem dentro do limite de significância adotado sua grande proximidade do CI levam a questionar a validade dos mesmos. Para 12ºN (figura 8(b)) observa-se uma concentração das regiões de variabilidade significativas entre junho e outubro de 1999. Uma região significativa com período entorno de 4 dias pode ser observada no inicio de julho. O maior período de aquisição de dados em 8ºN (figura 8(c)) permite identificar dois períodos bem distintos onde se concentram as regiões de variabilidade significativas com períodos em torno de 1 dia. Estes períodos são entre julho e outubro de 1998 e apartir da metade do mês de maio a outubro de 1999. Duas regiões significativas podem ser observadas entre janeiro e abril de 1999 com período entre 65-70 dias e entre julho e dezembro de 1998 com período em torno de 100 dias. Este segunda região também se encontra muito próxima ao CI. Ao longo do equador novamente as oscilações próximas a 12 e 24 horas se mostram dominantes. Em 35ºW (figura 9(a)) as regiões de períodos próximos ao diário estão agrupadas entre janeiro e julho de 1998 e 1999 e entre o final de dezembro de 1999 e fevereiro de 2000. Observam-se também regiões significativas com período entre 12-18 dias em outubro de 1999; entre 14-28 dias em julho de 1999; 16-32 dias entre maio e junho de 1998 e entre 34-65 dias entre agosto de 1998 e janeiro de 1999. Uma região com período próximo a 130 dias é observada nas proximidades do CI. O espectro em 23ºW (figura 9(b)) mostra oscilações próximas a um dia concentradas de março a maio de 1999. Regiões isoladas de mesmo período são observadas em agosto, setembro e novembro do mesmo ano. Duas regiões de maior período são observadas em agosto de 1999 com período entre 20-30 dias e entre dezembro de 1999 e janeiro de 2000 com período entorno de 28-34 dias. O espectro em 10ºW mostra para períodos entorno de um dia uma região significativa entre fevereiro e maio; entre agosto e outubro de 1999 e em fevereiro e março de 2000. Em agosto de 1999 também observa-se duas regiões de períodos entre 5-6 e 7-15 dias. Outra região de período entre 20-34 dias é observada entre julho e o inicio de outubro de 1999.

Abril 2005 Revista Brasileira de Meteorologia 49 Figura 8: Espectro de potência de ondeleta dos dados de alta resolução (10 minutos) da TSM coletados pela rede de bóias PIRATA e respectivos limites de confiança de 90% (contornos vermelhos intensos) para a linha de 38ºW: (a) 15ºN; (b) 12ºN; (c) 8ºN. Figura 9: Espectro de potência de ondeleta dos dados de alta resolução (10 minutos) da TSM coletados pela rede de bóias PIRATA e respectivos limites de confiança de 90% (contornos vermelhos intensos) para as bóias ao longo do equador: (a) 35ºW; (b) 23ºW; (c) 10ºW.

50 Gabriel Clauzet et al. Volume 20(1) Para a linha de 10ºW apenas os dados da bóia em 10ºS 10ºW foram analisados. Esta série contém uma grande interrupção (ver figura 5), assim a análise de ondeletas foi feita apenas para o segundo período de aquisição (novembro de 1999 a novembro de 2000). O espectro mostra regiões significativas de períodos próximos a um dia concentradas entre janeiro e abril de 2000. As demais regiões mostram-se muito próximas ao CI. A análise da variabilidade de alta freqüência dos espectros de TSM mostra o ciclo diurno e semidiurno como a variabilidade mais energética. Também foram observadas oscilações com períodos em torno de 2-3 e 4-6 dias. Estas oscilações, também foram identificadas em outros estudos (Colin & Garzoli, 1988; Garzoli, op. cit.), como sendo atmosfericamente forçadas por ondas de gravidade inercial. Outra característica observada nos espectros é a influência do ciclo sazonal na variabilidade de alta freqüência. Para as bóias ao longo de 38ºW, se observa que as oscilações ocorrem em maior número e amplitude durante os meses de junho a outubro (mais evidente nas bóias de 12ºN e 8ºN), meses quentes para o hemisfério norte onde os contrastes de TSM entre noite e dia são mais acentuados. Ao longo do equador, região que sofre influência do ciclo sazonal de ambos os hemisférios, observase uma maior influência do ciclo sazonal do hemisfério sul uma vez que a maior concentração de oscilações no espectro ocorre entre dezembro e maio (mais evidente nas bóias de 35ºW e 23ºW), meses quentes no hemisfério sul. 3.2. Ventos Para análise das séries temporais dos ventos foram representadas as componentes zonal e meridional da velocidade do vento. Devido à falta de dados são analisados os dados coletados pelas bóias ao longo da linha de 38ºW e das bóias localizadas em 0º 35ºW e 10ºW 10ºS. As demais bóias apresentam diversas interrupções na coleta de dados, totalizando um período de dados insuficientes para caracterizar as respectivas variações sazonais. A figura 11 mostra as séries temporais das componentes zonal e meridional da velocidade do vento para as bóias da linha de 38ºW. Na mesma figura a linha pontilhada representa as respectivas climatologias baseadas no conjunto de da Silva para cada localidade. Em 15ºN a componente zonal (figura 11(a)) é de leste praticamente durante todo o período de aquisição dos dados. Nota-se uma maior intensidade em janeiro de 1999, com valores próximos a 10 m/s. Durante dois períodos, em setembro de 1998 e agosto de 1999, o vento zonal inverte para oeste atingindo valores da ordem de 2 m/s. A componente meridional do vento (figura 11(b)) é predominantemente negativa (de norte) para todo o período de aquisição dos dados. As variações na amplitude da componente meridional são menos intensas que as da componente zonal. A componente meridional torna-se positiva durante alguns períodos do ano, com um máximo entorno de 4 m/s em novembro de 1999. Um pico negativo máximo de 7 m/s é observado na mesma época que para a componente zonal, próximo a janeiro de 1999. Assim salvo alguns meses onde as componentes zonal e meridional alteram sua direção o regime predominante em 15ºN é de ventos de nordeste. Em 12ºN a componente zonal do vento (figura 11(c)) é de leste (negativa) e menos intensa que a climatologia durante quase todo período de dados. A componente meridional (figura 11(d)) também apresenta velocidades negativas (de norte) durante a maior parte do período, próximas aos valores climatológicos. Durante os meses de agosto e setembro de 1999 ocorre uma inversão no sinal da velocidade de ambas as componentes. A amplitude das variações na velocidade do vento é maior para a componente zonal, da ordem de 12 m/s que para a meridional, de 8 m/s. No período de fevereiro de 1999 a março de 2000 os ventos predominantes nesta localidade foram de nordeste, com uma alteração para sudoeste entre agosto e setembro de 1999. Em 8ºN da mesma forma que para demais bóias ao longo de 38ºW o regime de ventos é predominantemente de nordeste. As componentes zonal e meridional (figuras 11(e) e (f)) apresentam velocidade negativas na maior parte do período, ocorrendo uma inversão de sentido entre os meses de julho a outubro de 1998. Nestes meses o vento predominante é de sudoeste com intensidades relativamente fracas entre 0 e 5 m/s. Novamente a componente zonal apresenta uma maior amplitude, 16 m/s, que a meridional da ordem de 11 m/s. A influência do ciclo sazonal nas séries temporais é evidente para toda a linha de 38ºW, com o enfraquecimento dos ventos durante os meses quentes para o hemisfério norte (março a agosto) e uma intensificação durante os meses frios (setembro a fevereiro). Figura 10: Espectro de potência de ondeleta dos dados de alta resolução (10 minutos) da TSM coletados pela rede de bóias PIRATA e respectivos limites de confiança de 90% (contornos vermelhos intensos) para a bóia da linha de 10ºW localizada em 10ºS.

Abril 2005 Revista Brasileira de Meteorologia 51 Figura 11: Dados de alta resolução (10 minutos) das componentes da velocidade do vento obtidos da rede de bóias PIRATA (linha continua) e respectivas climatologias obtidas com dados de da Silva (linhas pontilhadas) para as bóias ao longo da linha de 38ºW: (a) componente Zonal para 15ºN; (b) componente meridional para 15ºN; (c) componente Zonal para 12ºN; (d) componente meridional para 12ºN; (e) componente Zonal para 8ºN; (f) componente meridional para 8ºN. Na figura 12 estão representadas as séries temporais das componentes da velocidade do vento para as bóias localizadas em 0º 35ºW e em 10ºS-10ºW. Supôs-se que as características observadas na bóia de 0º 35ºW possam ser estendidas para a parte oeste da região equatorial. A componente zonal negativa durante todo período e com valores inferiores aos da climatologia (figura 12(a)). A componente meridional (figura 12(b)) tem sua velocidade positiva na maioria do período analisado, ocorrendo algumas inversões de baixa magnitude em fevereiro e março de 1998 e 1999. O regime de vento predominante é de sudeste, com variação para nordeste em fevereiro e março aproximadamente. O ciclo sazonal apresenta características inversas às observadas ao longo de 38ºW, com uma intensificação dos ventos nos meses de março a agosto e uma diminuição durante os meses de setembro a fevereiro. A amplitude do ciclo sazonal também mostra uma maior variação para a componente meridional, inverso do observado ao longo da linha de 38ºW. As séries temporais em 10ºW 10ºS possuem características bem diferentes das observadas no lado oeste do Atlântico tropical. As componentes zonal e meridional (figuras 12(c) e (d)) não alteram suas direções ao longo do ano. Ambas componentes apresentam valores muito próximos a climatologia. O ciclo sazonal na região apresenta características semelhantes às observadas em 0º 35ºW, mas com menor amplitude para ambas componentes. O vento predominante é de sudeste com maior intensidade entre maio e outubro enfraquecendo entre novembro e abril.

52 Gabriel Clauzet et al. Volume 20(1) Figura 12: Dados de alta resolução (10 minutos) das componentes da velocidade do vento obtidos da rede de bóias PIRATA (linha continua) e respectivas climatologias obtidas com dados de da Silva (linhas pontilhadas) para as bóias localizadas em 0º 35ºW e em 10ºS 10ºW: (a) componente Zonal para 0º 35ºW; (b) componente meridional para 0º 35ºW; (c) componente Zonal para 10ºS 10ºW; (d) componente meridional para 10ºS 10ºW. Diferentemente da análise das séries temporais de vento, a análise de ondeleta para os dados de vento foi feita para magnitude da velocidade. A figura 13 mostra os espectros para os dados coletados pelas bóias ao longo de 38ºW. Em 15ºN (figura 13(a)) notam-se dois períodos de maior concentração de regiões significativas para altas freqüências, de julho a outubro de 1998 e de dezembro a março de 1999. Estas diversas regiões significativas possuem períodos entre 3 e 24 horas, com uma maior densidade em períodos inferiores a 12 horas. Regiões significativas com períodos entre 2 e 8 dias podem ser observadas em julho, agosto e setembro de 1998. Em março de 1998 e janeiro de 1999 observam-se períodos entre 8 e 12 dias. Três outras regiões podem ser destacadas em 1998: em maio, entre agosto e outubro e entre dezembro de 1998 e janeiro de 1999 com períodos entre 12-16 dias, 12-26 dias e 16-24 dias, respectivamente. Em 12ºN (figura 13(b)) nota-se uma concentração das regiões significativas principalmente nos meses de julho a novembro de 1999. Nestes meses predomina oscilações de período entre 3-48 horas. Entre julho e setembro de 1999 observam-se regiões de períodos entre 2 e 6 dias. Duas regiões de períodos maiores que são observadas entre setembro e outubro de 1999 e setembro de 1999 e janeiro de 2000 com períodos entre 16 e 25 dias e 26 a 70 dias, respectivamente. Esta última região possui os maiores períodos junto à linha do CI. Em 8ºN (figura 13(c)), nota-se áreas significativas localizadas entre junho e dezembro de 1998, com períodos entre 3 e 30 horas, mais concentrados em períodos menores que 12 horas. Diversas regiões significativas isoladas de períodos entre 2 e 7 dias são observada entre os meses de junho a outubro de 1998. Entre agosto e setembro de 1998 também se observa uma região de período entre 14 e 20 dias. A figura 14 mostra os espectros de ondeletas para a bóia localizada em 0º 35ºW (figura 14(a)) e para a bóia localizada em 10ºS 10ºW (figura 14(b)). A bóia localizada no equador mostra regiões significativas de alta freqüência localizas predominantemente entre fevereiro e junho de 1998 e entre dezembro de 1998 e fevereiro de 1999 com períodos entre 3 e 30 horas. Podem-se destacar outros quatro períodos significativos; maio de 1998 e janeiro de 1999 com períodos entre 5 e 7 dias, janeiro de 1999 com período entre 8 e 15 dias, março a abril de 1998 com período entre 14 e 18 dias e em janeiro de 1999 com período entre 20 e 30 dias, este ultimo nas proximidades do CI. Para a bóia de 10ºS 10ºW o espectro mostra as regiões de alta freqüência igualmente distribuídas ao longo de todo período de aquisição de dados. Esta região apresenta variações entre 3 e 24 horas com uma maior concentração em período inferiores a 12 horas. Diversas regiões significativas isoladas podem ser observadas principalmente entre abril e julho de 1999 com períodos de 14 a 17 dias e 14 a 24 dias. Em janeiro de 1998 e abril de 1999 observam-se períodos entre 7 e 12 dias.

Abril 2005 Revista Brasileira de Meteorologia 53 Em julho de 1998 notam-se regiões de períodos entre 6 e 24 dias e entre 28 e 32 dias. Uma região entre maio e junho de 1999 apresenta períodos entre 50 e 70 dias. A análise de ondeleta dos dados da velocidade do vento também mostra a presença da variabilidade diurna e semidiurna, sendo esta última predominante. Uma variabilidade próxima à escala semanal e próxima a 20 dias também esta presente em todas as análises. Ao longo de 38ºW, de maneira geral, a maior variabilidade é encontrada durante os meses de junho a dezembro, de maneira semelhante ao observado na análise de TSM. A migração da ZCIT para latitudes mais elevadas durantes estes meses provoca perturbações no regime de ventos ao longo da linha de 38ºW, com maior intensidade em 15ºN e 12ºN contribuindo para a maior oscilação neste período. Em 0º 35ºW, a maior variabilidade é observada entre dezembro e junho, meses em que os ventos de oeste estão enfraquecidos e a ZCIT se encontra próxima ao Equador. Figura 13: Espectro de potência de ondeleta dos dados de alta resolução (10 minutos) da velocidade do vento coletados pela rede de bóias PIRATA e respectivos limites de confiança de 90% (contornos vermelhos intensos) para a linha de 38ºW: (a) 15ºN; (b) 12ºN; (c) 8ºN. Figura 14: Espectro de potência de ondeleta dos dados de alta resolução (10 minutos) da velocidade do vento coletados pela rede de bóias PIRATA e respectivos limites de confiança de 90% (contornos vermelhos intensos) para as bóias localizadas em: (a) 0º 35ºW; (b) 10ºS 10ºW.

54 Gabriel Clauzet et al. Volume 20(1) Na tabela 1 pode ser visto um resumo dos períodos encontrados nas análises de ondeletas para a TSM e vento. Nesta tabela esta representada a localização das bóias, os períodos e localização no tempo da variabilidade encontrada. Dividiram-se as escalas de tempo das oscilações em horas e dias para facilitar a visualização da tabela. Os períodos marcados com * se encontram muito próximos ao CI e não são considerados nas conclusões. Tabela 1: Localização das bóias, variabilidade temporal em dias e horas e respectivos meses em que esta foi encontrada para os dados de TSM e Vento. Períodos marcados com * se encontram muito próximos ao CI e não são considerados nas conclusões. 4. CONCLUSÃO As análises dos dados de TSM das bóias mostraram a capacidade da rede PIRATA em capturar com êxito as variações de TSM nas três seções analisadas quando comparadas com dados do IGOSS. As bóias ao longo de 38ºW registraram o aquecimento anômalo da ordem de 1º-2ºC acima da média climatológica, principalmente em 15ºN e 8ºN, de janeiro a maio de 1998. Este também foi observado nos dados do IGOSS. Essa anomalia de TSM indica a influência sofrida na região noroeste do Atlântico tropical do evento ENOS de 1997/98. As bóias ao longo do equador também captaram com êxito o padrão anomalamente quente (1º-2ºC) durante 1998, principalmente no lado oeste da radial. Durante o ano de 1999 observaram-se nos dados do IGOSS um resfriamento anômalo na TSM da ordem de -1.25ºC abaixo da climatologia, com máxima intensidade em fevereiro-março. Esta característica fria na TSM pode estar correlacionada ao fenômeno La Niña, que se manifestou com grande intensidade no Pacífico ao longo de 1999. Este resfriamento anômalo é evidente na TSM, observado nas bóias de 12ºN e 8ºN, onde ocorre um mínimo de temperatura bem pronunciado em março de 1999. Portanto as bóias ao longo da meridional de 38ºW e da radial equatorial têm capacidade de monitorar não só a variação local da TSM, bem como possíveis variações influenciadas por fenômenos de escalas globais. A análise dos dados de ventos para a linha de 38ºW mostra um regime predominante de ventos de nordeste, com alterações para sudoeste entre agosto e setembro para 15ºN e 12ºN e de julho a agosto em 8ºN. Estas alterações registradas no regime de ventos estão associadas a variação sazonal da ZCIT. Em 0º 35ºW os ventos são predominantemente de sudeste, com baixa intensidade na primeira metade do ano e se intensificando ao longo da segunda metade do ano. Durante os meses de fevereiro e março a componente meridional do vento torna-se negativa, resultando ventos de nordeste. Esta inversão se deve ao deslocamento da ZCIT para as proximidades do equador durante este período. Em 10ºS 10ºW observa-se um padrão bem definido, com ventos de sudeste, mais intensos entre maio e outubro, enfraquecendo entre novembro e abril. Este padrão está de acordo com a climatologia de ventos conhecida (da Silva, op. cit) para o hemisfério sul, onde existe uma intensificação dos ventos durante os meses frios e um enfraquecimento durante os meses quentes. A utilização da análise de ondeleta permitiu além de identificar a variabilidade temporal contida nos dados de TSM e ventos coletados in situ, determinar a época em que esta ocorre. Para baixas freqüências a bacia equatorial responde como um todo a variações sazonais no regime de ventos. O sinal dominante do sistema equatorial é o ciclo anual, composto pela forte variação sazonal do vento que tem impacto no sistema de ressurgência do Atlântico leste (Vauclair and Penhoat, 2001; Garzoli, op. cit.). Para altas freqüências os ciclos diurnos e semidiurnos são as oscilações mais energéticas para o oceano e atmosfera. A variabilidade diurna e semidiurna estão presentes nos dados de TSM, ventos. Para períodos maiores que o diário, 3 bandas aparecem como dominantes nos espectros: 2-7, 12-18 e 20-60 dias. As oscilações entre 2-7 dias são dominantes para períodos maiores que o diário. No oceano esta banda de oscilação é forçada pela atmosfera, conhecida como banda de ondas gravitacionais inerciais (Garzoli, op.cit.). Estas oscilações forçadas pelo vento têm períodos predominantes centrados em 5 e 3 dias. A banda de período de oscilação próxima a 13-16 dias foi observada anteriormente na estratosfera associada à propagação das ondas de Kelvin (Yanai, 1971), mas aparentemente sem exercer influências sobre a troposfera (Yanai & Maruyama, 1966). Análise espectral dos dados de vento nas camadas superior e inferior da troposfera mostrou a presença de oscilações com período de 15 dias, associadas à

Abril 2005 Revista Brasileira de Meteorologia 55 propagação de ondas de Rossby (Parker, 1973). No oceano esta banda de oscilação é atribuída a forçantes atmosféricas. As oscilações de maior período encontradas estão na banda entre 20-60 dias. No oceano, na região equatorial, oscilações com períodos próximos a 30 dias não são forçadas pela atmosfera sendo atribuídas às ondas de instabilidade tropical. Fora da região equatorial esta banda pode ser explicada pelas ondas internas de Rossby-gravidade. Na atmosfera o período entre 20-40 dias é conhecido por ser uma freqüência energética para a troposfera tropical. Na região equatorial a característica dominante da escala sinóptica é justamente a banda de freqüência de oscilação centrada em 30 dias. Madden and Julian (1971) identificaram uma oscilação no sistema acoplado oceano-atmosfera com período entre 30-50 dias. A esta oscilação que se propaga zonalmente em escala global para leste foi denominada como Oscilação de Madden-Julian (OMJ). Esta oscilação induz perturbações nos campos de pressão, convergência de ventos nos baixos níveis e conseqüentemente no regime de precipitação (Repelli et al., 1998). Lau and Chang (1986), propuseram que esta oscilação de 40-50 dias poderia estar relacionada ao fenômeno do ENOS. O inicio do fenômeno do ENOS pode ser provocado como resultado da amplificação episódica das ondas de 40-50 dias através das interações entre o sistema acoplado oceano-atmosfera (Lau, 1985 a,b). Weickmann (1983) investigou os campos de circulação atmosférica e de radiação de onda longa e concluiu que as oscilações entre 30-90 dias são as principais componentes das variações intra-sazonais da convecção tropical. A localização no tempo da variabilidade obtida através da análise de ondeleta dos dados de TSM e vento mostra dois padrões distintos: O primeiro é observado nas bóias ao longo de 38ºW. A maior parte da variabilidade encontrada nos dados de TSM e vento ocorrem durante os meses de julho a outubro-novembro. Estes são meses quentes para o hemisfério norte, com ventos mais intensos e com um deslocamento ao norte do equador a ZCIT, seguindo os padrões da TSM. O segundo padrão é observado ao longo da linha equatorial. A maior parte da variabilidade nos dados de TSM e vento é observada durante os meses de novembro a maio e dezembro a julho, respectivamente. Estes são meses quentes na região equatorial com ventos mais intensos entre novembro e janeiro e a ZCIT localizada próxima ao equador. Pode-se concluir que para região tropical a variação sazonal no regime de ventos, tem influência tanto sobre a variabilidade de baixa freqüência quanto de alta freqüência. Através da análise de ondeletas podese observar que grande parte da variabilidade encontrada nos dados de TSM e ventos ocorrem em períodos onde a variação sazonal é mais pronunciada, ou seja, meses quentes. 5. AGRADECIMENTOS A Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pela ajuda financeira durante o desenvolvimento de trabalho via projeto nº 00/04920-0 e a dois anônimos revisores que muito contribuíram para a versão final deste trabalho. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CLAUZET, G. Escalas de variabilidade no atlântico tropical inferidas a partir da rede de bóias PIRATA. São Paulo, 2001, 109pp. Dissertação (Mestrado em Ciências da Terra), Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo. CRAWFORD, R. J. M., W. R. SIEGFRIED, L. V. SHANNON, C. VILLACASTIN-HERRORO, AND L. G. UNDERHILL. Environmental influences on marine biota off southern Africa. S. Afr. J. Sci., 86, 330-339, 1990. COLIN, C. AND S. GARZOLI. High-frequency variability of in situ wind, temperature and current measurements in the equatorial Atlantic during the FOCAL-SEQUAL experiment. Oceanol Acta, 11 (2), 139-148, 1988. DA SILVA, A. C. YOUNG, AND S. LEVITUS. Atlas of Surface Marine Data 1994, Volume 1: Algorithms and Procedures. NOAA Atlas NESDIS 6, U.S. Department of Commerce, Washington, D.C. 1994. GARZOLI, S. L. Forced oscillations on the equatorial Atlantic basin. J. Geophys. Res., 92, 5, 5089-5100, 1987. GU, D. F. AND S. G. H. PHILANDER. Secular changes of annual and interannual variability in the tropics during the past century. J. Climate, 8, 864-876, 1995. LAU, K. M. Bimodal climatic state, subseasonal oscillation and the El Niño/Southern Oscillation. Coupled Oceanatmosphere models, J. Nihoul, Ed., Elsevier Oceanography series, 40, 29-40, 1985a.

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