Anais do 2º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária Belo Horizonte 12 a 15 de setembro de 2004



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Anais do 2º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária Belo Horizonte 12 a 15 de setembro de 2004 Brinquedoteca - Espaço Criativo e de Vivências Lúdicas Resumo Em pediatria, a hospitalização em decorrência de uma doença física, provoca alteração das relações da criança na família, na escola e com os amigos, impondo-lhe um ambiente com rotinas e regras desconhecidas e com estímulos restritos necessários ao desenvolvimento infantil. Desta forma, outros espaços vêm sendo criados no ambiente hospitalar, como a brinquedoteca, para brincar e minimizar os efeitos negativos da doença e hospitalização. O projeto visa capacitar diversos alunos da área de saúde, componentes da equipe multidisciplinar e acompanhantes, promovendo o conhecimento do brincar em diferentes contextos culturais, melhorando na adaptação e desenvolvimento das potencialidades das crianças e dos adolescentes hospitalizadas, contribuindo na recuperação de uma saúde mais integral. A metodologia utilizada é: análise dos brinquedos e jogos existentes na Brinquedoteca; intervenção terapêutica ocupacional na Brinquedoteca; orientação dos alunos dos diversos cursos, dos acompanhantes e da equipe multidisciplinar quanto à função do brincar no desenvolvimento infantil. Como resultado tem-se uma sensibilização quanto o papel do brincar neste contexto; a valorização do brinquedo como atividade geradora de desenvolvimento intelectual, emocional e social; o acesso a um número maior de brinquedos, de experiências e de descobertas. Assim, o uso da brinquedoteca tem melhorado a qualidade de vida dos envolvidos no projeto. Autores Aneide Rocha de Marcos Rabelo - mestre em Saúde Materno Infantil Ana Claudia Vasconcelos Martins de Souza Lima - doutora em Nutrição Florentino de Melo Guerra - psicólogo Instituição Universidade Federal de Pernambuco - UFPE Palavras-chave: brincar; hospitalização; desenvolvimento infantil Introdução e objetivo Em pediatria, o processo de hospitalização gera restrição de estímulos sensóriomotores, cognitivos, afetivos e sociais, necessários ao desenvolvimento infantil; alteração nas relações da clientela na família e na escola e imposição de um ambiente com rotina e regras desconhecidas (MAIA et al., 2000). Durante esse período, situações inesperadas e indesejadas passam a compor a sua nova rotina, ou seja, separação das pessoas e dos objetos de seu convívio, interrupção da ida a escola e do brincar, modificações no seu desempenho funcional, perdas significativas em geral, acontecimentos frustrantes, dietas alimentares, terapêuticas dolorosas e invasivas, modificações no seu cotidiano e dos seus hábitos de vida, promovendo um aumento do sofrimento físico, mental e social pela situação vivenciada (KUDO; PIERRE, 1997). De acordo com Mitre e Gomes (2002), a hospitalização provoca ainda um grande impacto na criança e no adolescente, aumentando o seu grau de estresse, de ansiedade, do medo e da angústia que, se somados a um ambiente desestruturado e não adaptados para as suas necessidade, pode comprometer diretamente o processo de recuperação e influenciar no tempo da sua internação.

Brasil (2003) refere que a crescente preocupação com a qualidade de vida do indivíduo hospitalizado tem aumentado as investigações nessa área e, atualmente, têm ocorrido mudanças quanto à dinâmica de tratamento, consoantes com a tendência de práticas de humanização no atendimento à saúde, baseadas no Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH), cujos objetivos são: melhorar a estrutura e a dinâmica hospitalar, além de promover a formação educacional dos profissionais da área com relação à valorização e o respeito ao ser humano internado. Essa clientela, de acordo com Estatuto da Criança e o Adolescente, o que demonstra um grande avanço das ações políticas em saúde, tem garantido o direito não apenas de uma assistência terapêutica global, bem como da permanência de um acompanhante durante o período da sua internação, buscando minimizar as alterações sensório-motoras, cognitivas e, principalmente, sócio-afetivas, decorrentes da vivência dessa nova realidade, facilitando o seu processo de adaptação (BRASIL, 2003). Isso implica que, a família que acompanha todo esse processo também sofre as conseqüências das modificações em seu ritmo de vida e nas suas relações sociais, o que provoca mudança na forma de agir com o seu filho e de lidar com essa situação, muitas vezes pela falta de privacidade, pelo não conhecimento sobre as questões relacionadas à internação e aos procedimentos clínicos realizados, pela ausência de informações acerca do quadro clínico do seu filho, bem como pelas suas dificuldades pessoais (KUDO; PIERRE, 1997). Os autores citados anteriormente afirmam ainda que, a atitude dos pais e da equipe de saúde, como um todo, pode predizer a capacidade de adaptação e a maneira como a criança e o adolescente enfrentam o processo de hospitalização. Daí a importância de um atendimento multidisciplinar dirigido não apenas para a criança e o adolescente hospitalizado, mas uma assistência mais ampla que inclua a família, e a própria equipe, para que os envolvidos possam dar um melhor suporte a essa população (MAIA et al., 2000). Dessa forma, a conscientização da equipe, quanto a sua função durante o processo de hospitalização, é fundamental para o bom andamento do mesmo e está intimamente relacionada ao processo de formação e capacitação profissional (LIMA; RABELO; GUERRA, 1998). Outro aspecto a ser considerado, nessa nova concepção no que se refere ao atendimento mais humanizado, inclui ainda uma reflexão quanto ao papel mais ativo da criança, do adolescente e da família durante o período de internação e em todo o tratamento terapêutico, induzindo-os a uma participação mais efetiva no processo, pelo envolvimento e pelo monitoramento das ações desenvolvidas no hospital, transformando-os em co-autores da história apresentada (LIMA; RABELO; GUERRA, 1998; MITRE; GOMES, 2002). Dentre as ações relacionadas ao processo de humanização, surge também a brinquedoteca hospitalar como um espaço alternativo para garantir o acesso da criança e do adolescente ao brincar, fazendo com que a mesma possa vivenciar o seu lado saudável, desenvolvendo suas capacidades e potencialidades, lidar com as suas limitações, estabelecer novas relações sociais, amenizando as conseqüências advindas dos fatores inerentes ao processo de hospitalização (MAIA et al, 2000). A criança e o adolescente, quando internado, na maioria das vezes, sente-se incapaz de manusear os brinquedos e de se envolver nas brincadeiras, ação primária do mesmo, pela limitação que o ambiente hospitalar impõe e pela condição de estar doente, tendendo a se manter isolado. Daí a importância de conservar o direito de brincar do indivíduo, de exercer o seu lado lúdico, como uma forma de organizar o seu dia a dia e de reestruturar a sua vida (KUDO, PIERRE, 1997).

A atividade lúdica utilizada como um recurso terapêutico, nesse momento, auxilia no enfrentamento dos conflitos, dos medos, da despersonalização e dos tratamentos dolorosos a qual é submetida (LIMA; RABELO; GUERRA, 1998). Segundo Gouvea (2003), o caráter lúdico da criança e do adolescente permite, que pelo brincar, ela possa estabelecer trocas com o ambiente, entender o mundo do adulto e dar um novo significado para o que lhe vem sendo apresentado, adaptando-o a sua realidade, proporcionando uma melhor adaptação à hospitalização, contato com os diferentes materiais e pessoas que são impostas. Viegas (1999) aponta para um outro objetivo da brinquedoteca que é o de preparar para a alta. Pela realidade sócio-cultural da clientela em questão, muitas vezes há uma certa resistência em deixar o hospital, uma vez que nele a criança e o adolescente encontrou mais atenção e uma melhor alimentação do que em casa. Para Kishimoto (1999), outro aspecto fundamental é o valor cultural dos brinquedos e brincadeiras, pois eles podem vir carregados de preconceitos relacionados ao gênero (qual o brinquedo ideal para o menino ou para a menina?), a classe social (para uma classe social menos favorecida pode ser dado qualquer tipo de brinquedo, já que ela é desprovida de tudo ) e a etnia (as diferentes atividades multiculturais que são realizadas podem impor os valores e a cultura externa aos da comunidade). Esse ponto é imprescindível para a escolha da atividade e do material a ser trabalhado, para que no momento da análise da atividade, a prescrição seja a mais indicada para atender a demanda da clientela (MITRE; GOMES, 2002). Vale salientar que o brincar pode ser utilizado para dar início ao vínculo terapeutapaciente, para avaliar a condição real da criança e do adolescente e para a intervenção terapêutica propriamente dita. Por ser, a ação lúdica inerente a criança e ao adolescente, ela age como uma intermediadora nesse contato primário estabelecido entre a equipe e o cliente, facilitando a coleta de informações iniciais necessárias para a definição do programa de tratamento. E durante a atuação da equipe, a atividade lúdica promove a interação do indivíduo com o meio, valorizando-o, fazendo com que o mesmo perceba o ambiente hospitalar como algo que pode ser significativo, motivador e acolhedor (KUDO; PIERRE, 1997). De acordo com Gouvea (2003), pela ação a criança e o adolescente se apropriam do mundo que o cerca, agindo sobre o mesmo de diferentes formas, segundo as características da sua faixa etária: inicialmente manipulando os objetos e descobrindo a sua constituição e função; após a aquisição da linguagem, dando nome aos mesmos e explorando-os pela palavra; em seguida, é capaz de representá-los por meio de símbolos (linguagem, desenho, modelagem, música, gestos); e depois transformá-los em objetos conceituais, onde ele pode ser identificado tanto pela sua forma e utilidade, como pelo seu símbolo e conceito formal, usado no mundo dos adultos. Assim, justifica-se que as atividades lúdicas mais utilizados no hospital, com crianças e adolescente, adequando-as a faixa etária a ser trabalhada, sejam: os jogos sensório-motores (dirigidos às crianças pequenas com o intuito de estimular o desenvolvimento infantil, base para as aquisições futura), a dramatização (pelo brincar de faz-de-conta elas podem compreender e melhor elaborar determinadas situações vividas nesse momento), desenho e pintura (onde podem ser expressos os sentimentos relacionados à doença, a hospitalização, a família e a equipe), leitura de livros de histórias infantis (elas podem desenvolver a atenção, a concentração, a aquisição e a compreensão de conceitos, facilitando a sua interação com meio), atividades com materiais de encaixe e de construção (onde elas desenvolvem estruturas sensório-motoras, cognitivas e sociais) e jogos de um modo em geral (favorecendo habilidades diversas e em especial as interações interpessoais) (KUDO; PIERRE, 1997; MITRE; GOMES, 2002).

Há, ainda, as atividades sócio-culturais, como a comemoração das datas festivas que ajudam a manter a orientação têmporo-espacial (facilmente perdida pela rotina e pelo ócio hospitalar), a promover a manifestação cultural do grupo internado (respeitando os diferentes valores e expressões culturais existentes) e a melhorar as relações interpessoais (difícil de serem estabelecidas pelas várias histórias de vida dos que compõem o universo das enfermarias, com momentos e com narrativas diversificadas) (LIMA; RABELO; GUERRA, 1998). Por isso, devem ser considerados, também, os parceiros envolvidos no ato de brincar, pois a ação infantil tem um caráter coletivo, o que indica a necessidade de um par para interagir, seja outra criança, seja o adulto (GOUVEA, 2003). No hospital, a participação em atividades com outras crianças e adolescentes, favorece a integração com o grupo e uma postura mais ativa, deixando de ser um sujeito passivo transformando-se em um sujeito desejante, passível de escolher as suas brincadeiras (MITRE; GOMES, 2002). Além disso, o envolvimento com o adulto permite o contato com o universo sócio-cultural, no qual ele também está inserido, tomando conhecimento das regras sociais e dos valores vigentes em sua comunidade (KUDO; PIERRE, 1997). A exemplo do que acontece em outros estados do Brasil como São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, dentre outros, que vêem utilizando a brinquedoteca no ambiente hospitalar, o objetivo deste trabalho é apresentar o projeto de brinquedoteca desenvolvido no espaço hospitalar, em Recife/PE, que tem com meta a capacitação dos diversos alunos da área de saúde, dos componentes da equipe multidisciplinar e dos acompanhantes, promovendo uma sensibilização da importância do brincar das crianças e dos adolescentes, no contexto hospitalar, e uma melhoria da qualidade de vida dos seus usuários. Ele possui um caráter humanizador com base nos princípios do Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH) e procura contribuir para a melhoria do serviço público de saúde, em benefício dos que nele trabalham e dos que dele se utilizam. Quanto aos objetivos específicos tem-se: proporcionar aos estudantes dos diversos cursos da área de saúde uma visão humanística no atendimento ao paciente, valorizando aspectos sociais e afetivos; integrar os estudantes, os acompanhantes, bem como a equipe hospitalar na melhoria da prestação de assistência, nesse contexto; humanizar o espaço terapêutico por intermédio das relações interpessoais e da ambientação da unidade funcional (enfermaria); recriar o espaço hospitalar as crianças e adolescentes hospitalizados pelas vivências criativas, lúdicas e sociabilizadoras; incentivar a valorização do brinquedo como atividade geradora do desenvolvimento intelectual, emocional e social, pelo acesso a um número maior de brinquedos e brincadeiras, de experiências e de descobertas; e despertar a consciência da criança, do adolescente e da família acerca da importância da continuidade de seus hábitos cotidianos, respeitando os limites impostos pelo processo de hospitalização vivenciado. Vale salientar que a brinquedoteca ligada à universidade, mesmo que funcionando no ambiente hospitalar, prioriza os princípios da instituição que são: ensino (contribuindo para a formação de recursos humanos), pesquisa (funcionando como um laboratório próprio para o estudo, neste caso, da atividade lúdica) e extensão (prestando assistência direta a comunidade). Metodologia O trabalho é realizado na Enfermaria de Pediatria do Hospital das Clínicas/UFPE, desde o ano de 2002, sendo nos dois últimos anos favorecido com uma bolsa da Proext/UFPE, e é coordenado por um docente do Departamento de Terapia Ocupacional da UFPE. Tem como público beneficiado as crianças e os adolescentes hospitalizados na enfermaria e seus

acompanhantes; a equipe hospitalar da enfermaria de pediatria; os alunos de diversos cursos da área de saúde e os profissionais de outras instituições hospitalares. As atividades desenvolvidas pelos docentes e técnicos envolvidos no projeto consistem em catalogação e análise dos brinquedos e jogos existente na brinquedoteca; intervenção terapêutica ocupacional, ou outra especialidade que se fizer necessário e que tenha a disponibilidade do profissional específico; orientação de alunos dos diversos cursos da área de saúde (na sua maioria voluntários), dos acompanhantes e da equipe multidisciplinar quanto à função do brincar no desenvolvimento infantil; além de apresentação do trabalho em jornadas, congressos e outros, com o intuito de divulgar e discutir o que vem sendo feito. Pelos discentes as atividades são recreativas em conjunto com os acompanhantes para as crianças e adolescentes da enfermaria; preparação e participação das datas festivas; realização de levantamento bibliográfico e apresentação de seminários. À comunidade, pais e cuidadores, cabe o acompanhamento e o monitoramento das atividades realizadas na brinquedoteca; a participação nas comemorações das datas festivas e a confecção de material lúdico durante as oficinas lúdicas oferecidas. Os atendimentos são realizados individualmente ou em grupo, de acordo com a necessidade da clientela. Podem acontecer na própria brinquedoteca ou ainda no leito, com o material lúdico da enfermaria. O espaço foi adaptado e adequado para funcionar, dividido em dois ambientes, um direcionado para as crianças menores, onde é também desenvolvido o programa de estimulação precoce, e o segundo para as crianças maiores e os adolescentes, de forma que convide o usuário a se envolver com a programação diária, respeitando as suas diferenças individuais. Aos acompanhantes são oferecidas oficinas lúdicas, para confecção de brinquedos e aprendizagem de brincadeiras indicadas a sua criança e ao seu adolescente, e palestras com o tema central dirigido para o papel do brincar no desenvolvimento humano, dando esclarecimento de como, quando, por que, com que e com quem brincar. No que se refere à equipe, são desenvolvidas ações conjuntas com os demais membros, buscando uma visão mais global do indivíduo hospitalizado e a sensibilização quanto ao papel da ação lúdica. Resultados e discussão Como resultados tem-se um aumento do número de participantes nas atividades recreativas e oficinas lúdicas, pela sensibilização da importância da atividade lúdica no desenvolvimento da criança e do adolescente; um aumento da freqüência dos alunos dos diversos cursos da área de saúde, dando continuidade ao processo de formação acadêmica; uma maior busca e permanência da criança e do adolescente hospitalizado em atendimento na brinquedoteca, minimizando os fatores inerentes da hospitalização e da doença; uma continuidade da catalogação e análise dos jogos e brinquedos, apontando novas necessidades, e uma divulgação científica do trabalho, por meio de palestras e apresentação em jornadas e congressos. Todos esses dados são fundamentais para a seqüência do projeto, para a sua adequação a realidade atual de acordo com as características da população alvo e do espaço e materiais disponíveis e para a formação profissional diferenciada. Sampaio e Novaes (2001) relatam que, mesmo doente e hospitalizada, a atividade, como o brincar, é parte natural da existência humana. Afirmam ainda que, além da terapêutica medicamentosa adequada, cabe ao adulto proporcionar a ação no hospital que tem funções específicas como: recreativa (alegria e prazer), terapêutica (bem-estar físico e emocional) e educacional (cultura e aprendizagem). Nesse contexto, percebe-se que as atividades desenvolvidas na brinquedoteca mantêm a criança e o adolescente em contato direto com a ação lúdica, minimizando os efeitos negativos da hospitalização, promovendo o desenvolvimento infantil e resgatando o lado

saudável dessa população, o que é reforçado por Maia et al (2000). A análise das atividades propostas inclui as peculiaridades da faixa etária, as condições clínicas, as limitações (físicas e ambientais), o material disponível, o conhecimento da técnica (brinquedo ou brincadeira), as características individuais (habilidades e capacidades) e a expectativa da criança e do adolescente em relação à atividade, respaldado por Lima, Rabelo e Guerra (1998). Outro ponto a ser considerado é o papel desempenhado, pelo projeto, na formação dos alunos e na capacitação do profissional da equipe de saúde. Por estar acontecendo dentro de um hospital escola, a experiência vem atender ações políticas atuais de uma assistência mais humanizada, definidas pelo Ministério da Saúde, onde o interesse profissional deixa de estar centrado na doença ou no comportamento técnico, sendo prioridade também a qualidade da relação humana estabelecida no processo de tratamento. Dessa forma, a brinquedoteca passa a compor a universidade, como um local diferenciado, facilitando também todo o processo de educação, pelas atividades de ensino, pesquisa e extensão que podem ser desenvolvidas (SANTOS, 1999). Conclusões Assim, observa-se que as ações desenvolvidas na brinquedoteca têm melhorado a qualidade de vida dos envolvidos no projeto, através da minimização dos fatores inerentes ao processo de doença e de hospitalização; da sensibilização do papel das atividades lúdicas no desenvolvimento da criança e do adolescente hospitalizado; da integração dos diversos alunos, dos componentes da equipe e dos acompanhantes; e da influência positiva na capacitação dos estudantes e dos profissionais no que se refere à humanização hospitalar. Referências bibliográficas BRASIL, Ministério da Saúde, 2003. Disponível em:http://www.portalhumaniza.org.br. Acesso em: 15 abril, 2004 GOUVEA, M. C. S. Infância, sociedade e cultura. In: CARVALHO, A.; SALLES. F.; GUIMARÃES, M. Desenvolvimento e aprendizagem. 1ª reimpressão. Editora UFMG, Proex- UFMG, 2003. KISHIMOTO, T. M. Brinquedo e brincadeira usos e significações dentro de contextos culturais. In: SANTOS, S. M. P. (org) Brinquedoteca: o lúdico em diferentes contextos. 4ª ed. Rio de janeiro: Vozes, 1999. p. 23-40 KUDO, A. M.; PIERRE, A. S. A Terapia Ocupacional com crianças hospitalizadas. In: KUDO, A. M. Fisioterapia, Fonoaudiologia e Terapia Ocupacional em Pediatria. 2ª ed. São Paulo: Sarvier, 1997, p. 239-242 LIMA, A. C. V. M. S.; RABELO, A. R. M.; GUERRA, F. M. Recriando o espaço e a dimensão ocupacional da criança hospitalizada. Cadernos de Extensão. Recife: Pró-Reitoria de Extensão PROEXT da Universidade Federal de Pernambuco: Editora Universitária da UFPE, n 1, p. 99-102, dez., 1998 MAIA et al. Brinquedoteca Hospitalar Shishiro Otake. In: SANTOS, S. M. P. (org) Brinquedoteca: a criança, o adulto e o lúdico. Rio de Janeiro: Vozes, 2000. p. 114-118 MITRE, R. M. A.; GOMES, R. O papel do brincar na hospitalização de crianças: uma reflexão. Pediatria Moderna. Rio de Janeiro, v 38, nº 07, p 339-342, jul, 2002 SAMPAIO, E. A.; NOVAES, L.H.V.S. Brincar é também aprender? Pediatria Moderna. Rio de Janeiro, v. XXXVII, nº 04, abril, 2001 SANTOS, S. M. P. Brinquedoteca de universidade. In: SANTOS, S. M. P. (org). Brinquedoteca: o lúdico em diferentes contextos. 4ª ed. Rio de janeiro: Vozes, 1999. p. 97-100

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