Terapia hormonal prévia e adjuvante à radioterapia externa no tratamento do câncer de próstata



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Transcrição:

Terapia hormonal prévia e adjuvante à radioterapia externa no tratamento do câncer de próstata N o 145 Março/2015

2015 Ministério da Saúde. É permitida a reprodução parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte e que não seja para venda ou qualquer fim comercial. A responsabilidade pelos direitos autorais de textos e imagens desta obra é da CONITEC. Informações: MINISTÉRIO DA SAÚDE Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos Esplanada dos Ministérios, Bloco G, Edifício Sede, 8 andar CEP: 70058-900, Brasília DF E-mail: conitec@saude.gov.br http://conitec.gov.br

SUMÁRIO 1. APRESENTAÇÃO... 4 2. CONSIDERAÇÕES... 4 3. RECOMENDAÇÃO DA CONITEC... 6 4. DECISÃO... 6 5. REFERÊNCIAS... 8

1. APRESENTAÇÃO Algumas propostas de incorporação tecnológica no SUS são avaliadas pela CONITEC de forma simplificada, não sendo submetidas à consulta pública e/ou audiência pública. São propostas de relevante interesse público que tratam de ampliação de uso de tecnologias, nova apresentação de medicamentos ou incorporação de medicamentos com tradicionalidade de uso. Todas essas demandas envolvem tecnologias de baixo custo e baixo impacto orçamentário para o SUS e estão relacionadas à elaboração ou revisão de protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas (PCDT). 2. CONSIDERAÇÕES A utilização de hormonioterapia em pacientes que irão submeter-se à radioterapia externa para tratamento de câncer de próstata localizado ou localmente avançado tornou-se a terapia padrão neste cenário clínico. A utilização de esquemas de supressão androgênica foi testada em diferente cenários em ensaios clínicos randomizados (ECR), variando também quanto ao momento de início da terapia, a duração da terapia e o momento de sua utilização, seja neoadjuvante (prévio), adjuvante ou ambos (1). No ECR EORTC 22863, 415 homens com tumores de próstata de alto risco foram randomizados para receber Radioterapia (RT) Externa ou Radioterapia Externa combinada com análogo LHRH gosserrelina e ciproterona. A utilização da gosserrelina tinha início no primeiro dia de aplicação de radioterapia com extensão por 36 meses. A

Ciproterona era utilizada somente no período inicial da aplicação do análogo LHRH (1mês) para evitar o flare com o início de uso da gosserrelina. Após um seguimento mediano de 9 anos, houve diferença significativa na sobrevida livre de doença em 10 anos (48%vs. 23%, HR 0,42, 95%CI 0,33-0,53), bem como na sobrevida global e na diminuição de mortalidade por câncer de próstata pelo mesmo período (58% vs.40%, HR 0,6, 95% CI 0,45-0,8) e (10% vs. 30%, HR 0,38, 95%CI 0,24-0,6), respectivamente. (2) Da mesma forma, a extensão da duração da terapia hormonal adjuvante foi comparada em períodos variando entre 4 a 36 meses de duração. (3,4) D Amico et al. estudou os desfechos em 206 pacientes com estadiamento clínico T1b a T2bNx, PSA 10 ng/ml, ou Gleason 7, sendo randomizados para RT ou RT mais seis meses de terapia hormonal. Todos os pacientes receberam radioterapia conformacional do tipo Modulação da Intensidade do Feixe de Radiação (IMRT) com dose de 70 Gy. Houve melhora da sobrevida câncer-específica e global no braço RT mais terapia hormonal. (5) Quanto ao papel da neoadjuvância na utilização da hormonioterapia, não há benefício demonstrado na literatura quanto à extensão do período de neoadjuvância maior que 2 a 3 meses, que é o período utilizado rotineiramente nos protocolos. (6,7) Há pouca variação nos critérios usados para definição de alto risco para recidiva no câncer de próstata (8-10), sendo mais aceito a presença de pelo menos uma das seguintes condições: estadiamento clínico igual ou maior que T3a, escore tumoral de Gleason igual ou maior que 8, ou dosagem de PSA maior que 20 ng/ml. Com base nos dados descritos e em outros estudos podemos concluir que: Há benefício para hormonioterapia adjuvante à radioterapia no câncer de próstata de alto risco, tratamento a ser iniciado concomitantemente à irradiação, resultando em maior sobrevida livre de doença e impacto favorável em mortalidade câncer-específica e global;

A duração da hormonioterapia adjuvante pode variar entre 6-36 meses, de acordo com a estratificação de risco do paciente e protocolo de tratamento adotado, porém o benefício foi maior nos tratamentos com duração superior a 24 meses; A hormonioterapia prévia à radioterapia pode ser realizada por período máximo de 3 meses quando for indicada, pois não há demonstração de vantagem clínica para uso mais prolongado. 3. RECOMENDAÇÃO DA CONITEC Os membros da CONITEC presentes na 31ª reunião ordinária do plenário do dia 04/12/2014, deliberaram por unanimidade por recomendar a incorporação dos procedimentos de hormonioterapia prévia e adjuvante à radioterapia externa no tratamento do câncer de próstata. Foi assinado o Registro de Deliberação nº 104/2014. 4. DECISÃO PORTARIA Nº 8, DE 16 DE MARÇO DE 2015 Torna pública a decisão de incorporar os procedimentos de hormonioterapia prévia e adjuvante à radioterapia externa no tratamento do câncer de próstata no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS. O SECRETÁRIO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INSUMOS ESTRATÉGICOS DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, no uso de suas atribuições legais e com base nos termos dos art. 20 e art. 23 do Decreto 7.646, de 21 de dezembro de 2011, resolve:

Art. 1º Ficam incorporados os procedimentos de hormonioterapia prévia e adjuvante à radioterapia externa no tratamento do câncer de próstata no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS. Art. 2º O relatório de recomendação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (CONITEC) sobre a tecnologia estará disponível no endereço eletrônico: http://conitec.gov.br/. Art. 3º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação. JARBAS BARBOSA DA SILVA JR.

5. REFERÊNCIAS Guideline for the management of clinically localized prostate cancer: 2007 Update. Reviewed in 2011. American Urological Association. Bolla M, Van Tienhoven G, Warde P, et al. External irradiation with or without long-term androgen suppression for prostate cancer with high metastatic risk: 10 year results of an EORTC randomized study. Lancet Oncol 2010; 11:1066 Horwitz EM, Bae K, Hanks GE, et al. Ten year follow-up of radiation therapy oncology group protocol 92-02: a phase III trial of the duration of elective androgen deprivation in locally advanced prostate cancer. J Clin Oncol 2008;26:2497 Bolla M, de Reijke TM, Van Tienhoven G, et al. Duration of androgen suppression in the treatment of prostate cancer. NEJM 2009;360:2516 D'Amico AV, Manola J, Loffredo M, Renshaw AA, DellaCroce A, Kantoff PW. 6- month androgen suppression plus radiation therapy vs radiation therapy alone for patients with clinically localized prostate cancer: a randomized controlled trial. JAMA 2004, Aug 18;292(7):821-7. Roach M 3rd, Bae K, Speight J, et al. Short term neoadjuvant androgen deprivation therapy and external-beam radiotherapy for locally advanced prostate cancer: long-term results of RTOG 8610. J Clin Oncol 2008;26:585 Crook J, Ludgate C, Malone S, et al. Report of a multicentric Canadian phase III trial of 3 months vs. 8 months neoadjuvant androgen deprivation before standarddose radiotherapy for clinically localized prostate cancer. Int J Radiat Oncol Biol Phys, 60: 15,2004. Boorjian SA, Karnes RJ, Rangel LJ, et al. Mayo Clinic validation of the D'amico risk group classification for predicting survival following radical prostatectomy. J Urol 179(4):1354-60, 2008.

National Comprehensive Cancer Network (NCCN) clinical practice guidelines in Oncology. Prostate Cancer, version I.2014. Disponível em: www.nccn.org. Cooperberg MR, Pasta DJ, Elkin EP, et al. The University of California, San Francisco Cancer of the Prostate Risk Assessment score: a straightforward and reliable preoperative predictor of disease recurrence after radical prostatectomy. J Urol 173(6):1938-42, 2005.