AVALIAÇÃO DE COMPOSTOS BIOATIVOS EM RESÍDUO DE PROCESSAMENTO DE POLPA DE MIRTILO J. B.Fioravante 1, V.R.D.de Souza 2,V.M.Gonçalves 3, R. S. Rodrigues 4, P.D. Oliveira 5, A. da S. Moreira 6 1-Programa de Pós Graduação de Ciência e Tecnologia de Alimentos, Departamento de Ciência e Tecnologia 7585 e-mail: (juliabfioravante@hotmail.com) 2-Programa de Pós Graduação de Ciência e Tecnologia de Alimentos, Departamento de Ciência e Tecnologia 7585 e-mail: (vanessatrak@yahoo.com.br). 3-Programa de Pós Graduação de Ciência e Tecnologia de Alimentos, Departamento de Ciência e Tecnologia 7585 e-mail: (victoriahgoncalves@hotmail.com) 4- Centro de Ciências Químicas, Farmacêuticas e de Alimentos, curso de Química de Alimentos. CEP: 96900-010 Pelotas RS Brasil, Telefone: 55 (53) 3275-7585 email: (fragatao@gmail.com) 5 Centro de Desenvolvimento Tecnológico, núcleo de Biotecnologia, Laboratório de Biopolímeros. CEP: 96900-010 Pelotas RS Brasil, Telefone: 55 (53) 3275-7585. Email: (bilicadiaz@yahoo.com.br). 6- Centro de Ciências Químicas, Farmacêuticas e de Alimentos, curso de Química de Alimentos. Laboratório de Biopolímeros CEP: 96900-010 Pelotas RS Brasil, Telefone: 55 (53) 3275-7585 email: (fragatao@gmail.com) RESUMO O mirtilo é mundialmente reconhecido por seu elevado conteúdo de compostos bioativos, mas seu plantio não é tão disseminado em função das exigências climáticas. Muitos resíduos do processamento de frutas têm potencialidade para utilização em outros alimentos industrializados. Frente a isso, o objetivo deste trabalho foi caracterizar, quanto ao perfil de compostos bioativos, o resíduo de extração de polpa de mirtilo. Foram realizadas análises no fruto in natura e no resíduo de teores de compostos fenólicos totais e antocianinas totais monoméricas. Para todas as variáveis analisadas houve um aumento percentual no resíduo em relação ao fruto, sendo 10,98% para compostos fenólicos e 56,12% para antocianinas. Esse fenômeno pode ser explicado devido à composição do resíduo, originado predominantemente pelas cascas dos mirtilo, as quais concentram a maior parte dos compostos analisados. Assim, pode-se concluir que o resíduo de despolpamento de mirtilo tem elevado potencial de utilização pelo seu conteúdo de compostos bioativos. ABSTRACT The blueberry is recognized worldwide for its high content of bioactive compounds, but its cultivation is not so widespread due to climatic requirements. Many waste processing fruits have potential for use in other processed foods. Faced with this, the objective of this study was to characterize, as the profile of bioactive compounds, the residue of blueberry pulp extraction. Analyses were performed in the fruit in natura and residue levels of total phenolic compounds and monomeric anthocyanin. For all variables there was a percentage increase in the residue in relation to the fruit, being 10.98% for phenolic compounds and 56.12% for anthocyanins. This phenomenon may be due to the waste composition, mostly originated by shells blueberry, which concentrate most of the analyzed compounds. Thus, it can be concluded that the residue blueberry pulping has high potential for use by the content of bioactive compounds. PALAVRAS-CHAVE: compostos fenólicos, despolpamento, pequenas frutas.
KEYWORDS: phenolic compounds, depulperin, small fruits. 1. INTRODUÇÃO O mirtilo ou blueberry é uma das frutas mais ricas em antioxidantes já estudadas, possui um conteúdo elevado de polifenóis, tanto na casca quanto na polpa (Fachinelo, 2008). É rico em substâncias que pertencem à classe dos compostos fenólicos, como antocianinas, pigmento que, além de conferir a cor característica do fruto, atua como antioxidante celular (Pertuzatti, 2009). As antocianinas são compostos instáveis, dessa maneira, alguns aspectos são importantes de serem observados quando a fruta é destinada ao processamento e elaboração de produtos, a variação da temperatura, ph, presença de luz e oxigênio (Kuck, 2012). Os resíduos do processamento de frutas que apresentam elevada concentração de compostos bioativos são apontados como fontes promissoras de antioxidantes naturais, podendo ser utilizados como ingredientes na formulação de outros alimentos industrializados; associado a isto, o reaproveitamento desses resíduos também contribui para a diminuição da contaminação do meio ambiente, resultando em benefícios à sociedade (Zardo, 2014). Dependendo do processo de obtenção do suco do mirtilo, seu resíduo apresenta características que o tornam um candidato potencial à utilização como matéria-prima para outros produtos. No Brasil existem muitas agroindústrias processadoras de frutas. Estas acumulam toneladas de resíduos que são, na maioria das vezes, descartados no meio ambiente. O aproveitamento desta matéria-prima para o desenvolvimento de novos produtos alimentícios apresenta enorme relevância para indústria e sociedade em geral, tornando-se uma escolha viável para resolver o problema da eliminação dos resíduos, além de agregar valor comercial (Pereira, 2009; Reque, 2012). Em geral, polpas de mirtilo contêm um grande percentual de material mucilaginoso, que dificulta seu processamento (Fraga, 2009). Ainda assim, o resíduo é viável para obtenção de produtos processados com alto de teor de compostos bioativos, o que determina o potencial de utilização deste subproduto. O objetivo deste trabalho foi caracterizar quanto ao perfil de compostos bioativos, o resíduo de extração de polpa de mirtilo. 2. MATERIAIS E MÉTODOS O mirtilo utilizado foi proveniente de pomar comercial localizado na cidade de Morro Redondo - RS, da cultivar Powderblue, safra 2016. O resíduo dos mirtilos utilizados (cascas, sementes e partes fibrosas) foi gerado no processo de despolpamento realizado com frutas pré-aquecidas a 90 C por aplicação direta de vapor de água. O mesmo foi recolhido da despolpadeira mecânica horizontal de simples estágio, com malha de 0,5 mm, (Kirchfeld POB4626/ Dusseldorf) ao término do processo e armazenado sob congelamento (-18 C) até o momento das análises. 2.1 Extração dos compostos bioativos Para a determinação do teor dos compostos bioativos (compostos fenólicos e antocianinas monoméricas), primeiramente foi preparado um extrato metanólico ácido a partir de amostras do mirtilo congelado e do resíduo, com metodologia adaptada de Giusti e Worlstad (2001), usando como solução extratora metanol acidificado (HCl 1 N, ph 1,0). Pesou-se 1 g da amostra em tubo Falcon de
50 ml e diluiu-se em 25 ml de solução extratora, agitou-se em vórtex e centrifugou-se (10.000 x g) por 15 minutos. Após, retirou-se o sobrenadante e o pellet foi ressuspendido na solução, sendo essa etapa repetida por 3 vezes. Os sobrenadantes foram reunidos e concentrados em evaporador rotativo (40 C/5 ), até aproximadamente 5 ml; para obtenção de volume conhecido, as amostras foram avolumadas com a solução extratora em balão volumétrico de 25 ml. Cada extrato foi armazenado, congelado (-20 C), em frasco âmbar. 2.2 Compostos fenólicos totais A determinação dos compostos fenólicos totais foi realizada por método colorimétrico, de acordo com Roesler et al. (2007). Uma alíquota de 500 μl de extrato metanólico concentrado foi adicionada de 2,5 ml de solução aquosa a 10 % (v/v) do reativo de Folin-Ciocalteau e 2 ml de carbonato de sódio a 7,5 % (m/v). As leituras de absorbância foram realizadas em espectrofotômetro Jenway single cell holder a 760 nm, utilizando-se metanol acidificado como o branco da amostra. A quantificação de fenóis totais da amostra foi realizada por meio de uma curva padrão preparada com ácido gálico contendo 10 pontos de concentrações variando entre 10-100 µg.ml -1 e expressa como equivalente de ácido gálico (EAG). 2.3 Antocianinas monoméricas totais A avaliação de antocianinas monoméricas totais foi realizada conforme Giusti e Worlstad (2001), com a amostra dividida em duas alíquotas às quais são adicionadas, separadamente, soluções tampão com ph 1 (cloreto de potássio 0,025 M) e com ph 4,5 (acetato de sódio 0,4 M). As leituras das amostras foram feitas em espectrofotômetro Jenway single cell holder a 700 nm. O fator de absortividade molar utilizado para cálculo foi para a antocianina majoritária cianidina-3-glicosídeo (ɛ absortividade molar = 26,900). 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO A Tabela 1 apresenta o conteúdo de compostos bioativos extraído dos frutos in natura e do resíduo do despolpamento de mirtilo, bem como seu aumento percentual em relação ao fruto. Tabela 1 - Compostos bioativos em fruto e resíduo de processamento de polpa de mirtilo. Avaliações Frutos in natura Resíduo Aumento percentual Compostos fenólicos totais * 615,74±38,09 683,38±19,12 10,98 Antocianinas monoméricas totais** 11,28±1,40 17,61±0,60 56,12 *Compostos fenólicos expressos em mg de ácido gálico.100g -1. **Antocianinas totais expressas em mg cianidina-3-glicosídeo.100g -1. O mirtilo possui a grande maioria dos seus pigmentos concentrados na casca e, dessa forma, quando é submetido a um tratamento térmico previamente ao despolpamento, ocorre uma migração dos pigmentos da casca para o núcleo do fruto, reduzindo assim, as perdas de pigmentos no resíduo (Brambilla et al. 2011). Apesar da migração destes compostos após o tratamento térmico para a polpa do fruto, ainda assim o resíduo do processamento apresenta valores superiores ao do fruto in natura para todas as variáveis analisadas. Skrede, Wrolstad e Durst (2000) provaram que ocorrem perdas significativas de compostos fenólicos durante o processamento de suco de mirtilo, principalmente durante a desintegração dos frutos, devido à presença de polifenoloxidases (PPO). Uma maneira de
evitar estas reações é através da inativação das enzimas, utilizando-se tratamentos térmicos prévios, o que foi realizado neste trabalho. O teor de compostos fenólicos nos frutos in natura e no resíduo do despolpamento encontra-se na Tabela 1. O valor verificado é condizente com os relatados na literatura; Garcia-Diaz e colaboradores (2014) encontraram valores de fenóis totais para mirtilo in natura, de 850,52 ± 4,77 (mg GAE/100 g). Os valores encontrados na literatura também variam conforme a cultivar estudada, como citado por Vizotto et al. (2013) que encontraram valores nas cultivares Elliot e a Earlyblue de 546 ± 51 a 638±124 mg/100g -1 respectivamente, semelhantes ao da cultivar deste estudo. O teor de compostos fenólicos encontrado no resíduo de mirtilo, 683,38 mg.100g -1, é maior do que resultados relatados por Goldmeyer et. al. (2014) que foi de 297,20 mg.100g -1, para bagaço de mirtilo fermentado. É provável que a formação de álcool durante o processo fermentativo tenha favorecido uma maior extração dos compostos fenólicos, resultando em menor teor residual no bagaço. No presente trabalho, observou-se, ainda, um aumento percentual de 10,98% para os compostos fenólicos, em relação aos frutos in natura. Para antocianinas se observou a maior concentração de compostos no resíduo, com um aumento percentual de 56,12%. Essa diferença na concentração pode ser explicada devido à coloração roxa intensa deste pigmento presente na casca do fruto (Lopes et al. 2007). O resíduo de mirtilo apresentou um teor de antocianinas monoméricas mais baixo em comparação com dados encontrados na literatura, 57,32 mg/100g -1 e 175 mg/100g -1 para antocianinas totais (Goldmeyer et al. 2014; Paes et al. 2014). A diferença nos resultados apresentados é justificada em função das diferentes técnicas usadas para determinar antocianinas monoméricas e totais, onde para as antocianinas totais o extrato é submetido ao ph 4,5, e assim as identifica por espectrometria. Já para as antocianinas monoméricas o métodos avalia esse grupo de compostos os expondo a variações de ph 1 e 4,5 e assim identifica apenas as monoméricas, o que gera concentrações menores em relação as totais, mas com valores mais precisos, uma vez que essa diferença de ph exclui os açúcares que são interferentes quando ligados a elas (Giusti e Wrolstad, 2001). 4. CONCLUSÃO Pode-se concluir que o resíduo de processamento de mirtilo tem potencial de utilização pelo seu elevado conteúdo de compostos bioativos. Tais compostos tiveram as concentrações aumentadas em relação ao fruto in natura pela concentração das cascas, que tipicamente concentram o maior teor, e pelo tratamento térmico aplicado previamente ao processamento, o qual desativa as enzimas PPO, responsáveis pela degradação desses compostos que, se mal disposto, podem ocasionar danos ao meio ambiente. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Brambilla, A., Maffi, D., Rizzolo, A. (2011). Study of the influence of berry-blanching on syneresis in blueberry purées. Procedia Food Science, 1, 1502-1508. Fachinello, J. C. (2008). Blueberry. Revista Brasileira de Fruticultura, 30(2), 285-576. Fraga, C. G. (2009). Plant phenolics and human health: biochemistry, nutrition and pharmacology. New Jersey: Wiley & Sons.
Giusti, M. M., Wrolstad, R.E. (2001). Anthocyanins: characterization and measurement with uvvisible spectroscopy. In: Wrolstad, R.E. Current protocols in food analytical chemistry. New York: John Wiley & Sons. Goldmeyer, B., Penna, N. G., Melo, A., Rosa, C. S. (2014). Características físico-químicas e propriedades funcionais tecnológicas do bagaço de mirtilo fermentado e suas farinhas. Revista Brasileira de Fruticultura, 36(4), 980-987. Kuck, L. S. (2012). Desenvolvimento de polpa de mirtilo (Vaccinium ashei Reade) e preservação de suas antocianinas para aplicação em alimentos (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Pelotas, Pelotas. Lopes, T. J., Xavier, M. F., Quadri, M. G. N., Quadri, M. B. (2007). A brief review of structural characteristics and stability, Revista Brasileira de Agrociência, 13(3), 291-297. Paes, J., Dotta, R., Barbero, G. F., Martínez, J. (2014). Extraction of phenolic compounds and anthocyanins from blueberry (Vaccinium myrtillus L.) residues using supercritical CO 2 and pressurized liquids. Journal of Supercritical Fluids, 95(1), 8 16. Pereira, P. A. P. (2009). Elaboração de geleia utilizando resíduo do processamento de goiaba (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Lavras, Lavras. Pertuzatti, P. B. (2009). Compostos bioativos em diferentes cultivares de mirtilo (VacciniumasheiReade) (Dissertação de mestrado). Universidade Federal de Pelotas, Pelotas. Reque, P. M. (2012). Frutos de mirtilo (vaccinium spp.) e produtos derivados: caracterização e estabilidade de suas propriedades bioativas (Dissertação de mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Roesler, R., Malta, L. G., Carrasco, L. C., Holanda, R. B., Sousa, C. A. S., Pastore, G. M. (2007). Atividade antioxidante de frutas do cerrado. Ciência e Tecnologia de Alimentos, 27(1), 53-60. Skrede, G., Wrolsdat, R. E., Durst, R. W. (2000). Changes in anthocyanins and polyphenolics during juice processing of Highbush blueberries (Vaccinium corymbosum L.). Journal of Food Science, 65, 357-364. Zardo, I. (2014). Extração e microencapsulação de compostos antociânicos do bagaço de mirtilo (Vaccinium corymbosum L.) (Dissertação de mestrado). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. Zhishen, J., Mengeheng, T., Jianming, W. (1999). The determination of flavonoid contents in mulberry and their scavenging effects on superoxide radicals. Food Chemistry, 64(1), 555 559.