EXTERNALIDADES ASSOCIADAS À GERAÇÃO DISTRIBUÍDA DE ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR DE BIOMASSA NA INDÚSTRIA SUCROALCOOLEIRA



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Transcrição:

EXTERNALIDADES ASSOCIADAS À GERAÇÃO DISTRIBUÍDA DE ENERGIA ELÉTRICA A PARTIR DE BIOMASSA NA INDÚSTRIA SUCROALCOOLEIRA PROF. DR. JOSÉ ROBERTO MOREIRA PROFª. DRª. SUANI TEIXEIRA COELHO M. SC. MARCELO COSTA ALMEIDA ENGª. VANESSA PECORA ENG. THIAGO GUILHERME FERREIRA PRADO CENBIO Centro Nacional de Referência em Biomassa Presidente CENBIO Centro Nacional de Referência em Biomassa Secretária Executiva CENBIO Centro Nacional de Referência em Biomassa Pesquisador CENBIO Centro Nacional de Referência em Biomassa Pesquisadora CENBIO Centro Nacional de Referência em Biomassa Pesquisador Resumo As externalidades relacionadas com projetos de geração de energia elétrica, incluindo a cogeração na indústria sucroalcooleira, não estão presentes nas considerações econômicas e técnicas tradicionais que dão suporte à tomada de decisão. Tal fato implica numa distorção na avaliação entre tecnologias tradicionais e aquelas baseadas em fontes renováveis. A indústria sucroalcooleira brasileira possui um potencial crescente de participação no segmento da geração de eletricidade. Este trabalho apresenta resultados parciais de um projeto temático sobre externalidades da cogeração de energia elétrica usando bagaço de cana produzido na indústria sucroalcooleira. As externalidades são identifiadas com base nas consequências da geração distribuída. A possibilidade de compensação das externalidades negativas advindas das atividades da indústria sucroalcooleira para produção de açúcar e álcool, pelas externalidades positivas advindas dos benefícios sociais da geração distribuída é a principal conclusão deste estudo. Abstract The externalities related with projects of power generation, the cogeneration in the sugarcane industry including, traditionally are not present in the economic and technical evaluations that support decision making. Such fact implies in a distortion in the evaluation between traditional technologies and the ones based on renewable sources. The Brazilian sugarcane industry presents increasing potential for the participation in the segment of power generation. This study presents partial results from a workgroup project concerned on research of the externalities associated to the cogeneration using bagasse from sugar cane processing. Externalities are identified from the distributed generation consequences. The possibility of minimizing negative externalities from the sugarcane industry, caused by the production of sugar and alcohol, with positive externalities from the social benefits of distributed generation is the most important conclusion reached as so far. Introdução Este trabalho constitui resultados parciais de um projeto de pesquisa sobre externalidades na cogeração de energia elétrica no setor sucroalcooleiro, considerando desde a produção de canade-açúcar até o consumo industrial e/ou despacho da energia no sistema interligado. As externalidades associadas à geração distribuída são apresentadas e discutidas com base em dados e informações da cogeração de energia elétrica pelo setor sucroalcooleiro comparando a situação onde energia excedente é comercializada em relação à situação onde não é gerado excedente ou este não é comercializado. De acordo com Brighenti (2001), barreiras para a disponibilização deste potencial de excedente de energia incluem dificuldades de acesso à rede,

falta de atratividade no preço ofertado para comercialização, falta de interesse das concessionárias para contratos de longo prazo, financiamentos com condições melhores, entre outras. Contudo, espera-se que com o desenvolvimento do PROINFA estas barreiras sejam minimizadas. A utilização dos recursos energéticos em um País é consequência do perfil de suas atividades econômicas e das tecnologias de processamento e utilização de recursos disponíveis, inseridas no modelo de desenvolvimento planejado (MAIURI, 2001). Existe um potencial expressivo para geração de energia elétrica no setor sucroalcooleiro que pode ser explorado em benefício de vários setores da economia, tais como, produtores de cana, usinas de açúcar e álcool, fornecedores de máquinas e equipamentos para a indústria sucroalcooleira, empresas do setor elétrico e consumidores de modo geral. Estas vantagens por setor da economia afetado estão mais detalhadas em (INEE, 2001). No setor sucroalcooleiro, a energia é gerada em usinas que se encontram espalhadas em uma ampla região próxima a centros consumidores. A importância da geração distribuída a partir da cogeração no setor sucroalcooleiro no contexto energético nacional se baseia em questões estratégicas, ambientais, sociais e econômicas. O objetivo principal deste trabalho é identificar e discutir as externalidades adicionais do setor sucroalcooleiro advindas da Geração Distribuída. Estas externalidades adicionais podem compensar as externalidades já existentes relacionadas ao setor sucroalcooleiro. Neste sentido, uma revisão dos conceitos de Geração Distribuída e Externalidades e dados e informações sobre a cogeração de energia elétrica no setor sucroalcooleiro é apresentada. A Geração Distribuída Um levantamento de informações realizado para o 15 o CIRED mostra que não há um consenso sobre a definição de Geração Distribuída. Alguns países usam a definição baseada no nível de tensão, enquanto outros consideram como geração distribuída àquela ligada a circuitos a partir dos quais os consumidores podem ser diretamente alimentados. Há também definições baseadas no tipo de origem da energia, por exemplo, renovável ou cogeração, e outras que definem que a geração distribuída é aquela que não é despachada, sendo consumida no próprio local de geração. Finalmente, algumas definições são baseadas em valores máximos de potência (CIRED, 1999). O IEEE define Geração Distribuída como a geração de eletricidade em usinas que são suficientemente pequenas, comparadas a usinas centrais de geração, de modo que permitem interconexão em qualquer ponto do sistema (PEPERMANS, 2003). No Brasil, o termo Geração Distribuída refere-se à geração elétrica, com potência até 30MW, produzida no próprio local de consumo e/ou próxima a um centro de carga, independentemente do porte da usina, da propriedade, da fonte de energia ou da tecnologia empregada. A Geração Distribuída tem vantagem sobre a geração central, pois, economiza investimentos em transmissão e reduz as perdas nestes sistemas, melhorando a estabilidade do serviço de energia elétrica. A geração elétrica próxima do consumidor chegou a ser a regra na primeira metade do século XX, quando a energia industrial era praticamente toda gerada localmente. A partir da década de 40, no entanto, a geração em centrais de grande porte ficou mais barata, reduzindo o interesse dos consumidores pela Geração Distribuída e, como conseqüência, o desenvolvimento tecnológico para incentivar esse tipo de geração também parou. A crise do petróleo introduziu fatores perturbadores que alteraram este cenário, revelando a importância. A partir da década de 90, a reforma do setor elétrico brasileiro permitiu a competição no serviço de energia, criando a concorrência e estimulando todos os potenciais elétricos com custos competitivos. Com o fim do monopólio da geração elétrica, em meados dos anos 80, o desenvolvimento de tecnologias voltou a ser incentivado com visíveis resultados na redução de custos (INEE, 2003). Este desenvolvimento é mostrado na Figura a seguir.

Figura 1 Evolução do tamanho ótimo de termelétricas (Modificado de INEE, 2003) A Geração Distribuída possui uma série de vantagens (INEE, 2001b): atendimento mais rápido ao crescimento da demanda (ou à demanda reprimida) por ter um tempo de implantação inferior ao de acréscimos à geração centralizada e reforços das respectivas redes de transmissão e distribuição; aumento da confiabilidade do suprimento aos consumidores próximos à geração local, por adicionar fonte não sujeita a falhas na transmissão e distribuição; aumento da estabilidade do sistema elétrico, pela existência de reservas de geração distribuídas, consequentemente, exigindo menores reservas centrais; redução das perdas na transmissão e dos respectivos custos, e adiamento no investimento para reforçar o sistema de transmissão; redução dos investimentos para implantação, inclusive os das concessionárias para o suprimento de ponta, dado que este passa a ser compartilhado ("peak sharing"), e os de todos os produtores para reservas de geração (que podem ser alocadas em comum); redução dos riscos de planejamento; Aumento da eficiência energética, redução simultânea dos custos das energias elétrica e térmica, e colocação dos excedentes da primeira no mercado a preço competitivo; redução de impactos ambientais da geração, pelo uso de combustíveis menos poluentes, pela melhor utilização dos combustíveis tradicionais e, em certos tipos de cogeração, com a eliminação de resíduos industriais poluidores; benefícios gerais decorrentes da maior eficiência energética obtida pela conjugação da geração distribuída com a geração centralizada, e das economias resultantes; e, maiores oportunidades de comercialização e de ação da concorrência no mercado de energia elétrica, na diretriz das Leis que reestruturaram o setor elétrico. Complementarmente às vantagens citadas acima, temos ainda (PORTALGD, 2004): Equacionamento do Power Purchase Agreement (PPA) Prestação de serviços ancilares Baixa exposição cambial Menores reservas centrais Uso intensivo de mão de obra Ganhos externos Custos marginais decrescentes Créditos de carbono Por outro lado, a Geração Distribuída acarreta também desvantagens, relacionadas ao aumento do número de empresas e entidades envolvidas e à desvinculação entre interconexão física e intercâmbio comercial (a concessionária a que vai se conectar um produtor independente pode ser

apenas transportadora e não compradora da energia que lhe é entregue por aquele produtor para um cliente remoto). Estas desvantagens são apresentadas a seguir (INEE, 2001b): maior complexidade no planejamento e na operação do sistema elétrico, inclusive na garantia do "back-up"; maior complexidade nos procedimentos e na realização de manutenções, inclusive nas medidas de segurança a serem tomadas; maior complexidade administrativa, contratual e comercial; maiores dificuldades de coordenação das atividades; e, em certos casos, diminuição do fator de utilização das instalações das concessionárias de distribuição, o que tende aumentar o preço médio de fornecimento das mesmas. Para o produtor independente, a interligação à rede acarreta obviamente certa redução de autonomia, por não poder mais agir visando apenas a maximização do próprio benefício, nos casos em que possa ser prejudicado o benefício global de todos os usuários (INEE, 2001b). A Cogeração de Energia Elétrica no Setor Sucroalcooleiro O Brasil possui mais de 300 usinas e processa mais de 300 milhões de toneladas de cana anualmente. Cada tonelada de cana gera 0,28 tonelada de bagaço (50% umidade) e 0,18 tonelada de palha (15% umidade), além do caldo para produção de álcool e açúcar como produtos principais. Este bagaço tem um poder calorífico de 7.500 MJ enquanto esta palha tem um poder calorífico de 12.000 MJ. Cerca de 90% do bagaço é consumida nas caldeiras das usinas para a geração de vapor e energia elétrica, e a palha é queimada ou deixada no campo. A tecnologia de cogeração mais utilizada nas usinas brasileiras é com caldeiras de 21bar e turbinas de contrapressão (MACEDO, 2003). O uso da biomassa favorece a Geração Distribuída e tem efeito positivo na criação de empregos, em especial no setor agrícola. Nos estados da região Nordeste, Centro Oeste e Sudeste, existe uma grande capacidade de geração de excedente de energia no setor sucroalcooleiro, com um potencial de quase 4.000MW, em termos de energia firme. Entretanto, os projetos existentes no setor sucroalcooleiro destes estados, para curto, médio e longo prazo, totalizavam um excedente de apenas 1.600MW em 2001 (CENBIO, 2001). O Estado de São Paulo, maior produtor de canade-açúcar do País, pode obter inúmeras vantagens energéticas, ambientais, econômicas e sociais. As cerca de 140 usinas paulistas de cana-de-açúcar em 2001 totalizaram 851MW de potência, com excedente de 110MW para o mercado de energia elétrica (SMA-SP, 2002). De acordo com (NASTARI, 2003), a cogeração vai representar para o setor sucroalcooleiro brasileiro, o mesmo que a produção de álcool significou quando o açúcar deixou de ser o principal produto da cana-de-açúcar, ou seja, um importante ganho de competitividade. Ainda segundo este mesmo autor, a geração de 82,5KWh por tonelada de cana é uma alternativa economicamente viável, o que representaria um potencial de cogeração superior a 5.000MW levando-se em conta a quantidade de cana moída. As Tabelas 1 e 2 apresentam dados sobre alternativas de cogeração no setor sucroalcooleiro. Tabela 1 Valores para alternativas de cogeração no setor sucroalcooleiro (LAMONICA, 2003) Tecnologia Operação Consumo de Potencial Brasil Energia excedente vapor no processo kwh/tc GWh MW kgv/tc 22Bar 300 o C TG contra-pressão Safra 500 0 10 3.000 700 80Bar 480 o C TG contra-pressão Safra 500 40 60 18.000 4.500 80Bar 480 o C TG condensação Ano todo 340 100 150 45.000 6.000 BIG/GT Ano todo <340 200 300 90.000 12.000

Tabela 2 Valores para alternativas de cogeração no setor sucroalcooleiro (CENBIO, 2001b) Tecnologia Exc. médio gerado (kwh/tc) Operação (horas/ano) Pot. inst. (MW) Invest. esp. (R$/kW) Caldeiras de 21 bar, turbinas de 10 4104 3,65 650,00 Múltiplo Estágio Caldeiras de 40 bar, turbinas de 20 4104 3,65 1.100,00 Múltiplo Estágio Caldeiras de 60 bar, turbinas de 30 4104 10,96 1.500,00 Múltiplo Estágio Caldeiras de 60 bar acionamento 40 4104 14,62 2.000,00 elétrico ou hidráulico, turbinas de Múltiplo Estágio Caldeiras de 60 bar, turbinas de Condensação 120 7446 24,17 2.500,00 A consideração do uso do gás natural de forma complementar à biomassa elimina a sazonalidade da disponibilidade de combustível. A inclusão do gás natural como complemento energético à biomassa apresenta as seguintes vantagens (ESTADO DE ALAGOAS, 2004): eliminação da sazonalidade operativa, uma vez que a mistura de 20% a 80% dos dois combustíveis permite operar 8.000 horas por ano, ou seja por 11 meses; aumenta consideravelmente a energia produzida no ano ou disponibilizada, permitindo a comercialização dos energéticos como PIE Produtor Independente de Energia; e, em termos térmicos, garante qualidade de queima mais homogênea e com maior densidade térmica, se comparada ao uso exclusivo da biomassa. Externalidades Externalidades (custos externos ou custos ambientais) são custos ou benefícios que não estão incluídos nos preços (BOLOGNINI, 1996), mas que acabam por serem pagos, de forma indireta, pela sociedade devido à degradação ambiental, de saúde, necessidade de mais impostos, etc. As externalidades não se limitam a impactos ambientais ou sobre a saúde. No setor sucroalcooleiro, existe um considerável número de externalidades, tais como a queimada que precede o corte, a destinação da vinhaça e do bagaço, o padrão de uso dos recursos naturais, etc. Desta forma, as externalidades podem incluir tanto os efeitos negativos (danos) como efeitos positivos (benefícios) (COELHO, 1999). Nos projetos de geração de energia elétrica, na maioria dos casos o valor dos custos ambientais não são incluídos no custo total do projeto. São considerados custos de capital, de combustível de operação e manutenção, entre outros. Assim, ocorre que os custos de geração obtido para projetos que usam as tecnologias convencionais acabam sendo inferiores aos custos para produção de eletricidade a partir de fontes renováveis (COELHO, 1999). Dessa forma, custos com danos ambientais, tais como contribuição para chuva ácida e para efeito estufa, degradação da qualidade do ar, que representam impactos significativos para a população, não são incluídos nas análises econômicas. Algumas vezes, os custos ambientais incluídos limitam-se àqueles necessários para reduzir o impacto, mas somente o necessário para atender alguma legislação específica sobre o tema. Como analisam (OTTINGER et al.; 1991), algumas concessionárias de eletricidade nos Estados Unidos consideram a incorporação destes custos de diversas formas, quando se trata da inclusão de externalidades ao planejamento, licitações ou qualquer outro procedimento de utilização de recursos. Externalidades Associadas à Geração Distribuída no Setor Sucroalcooleiro A geração distribuída contribui para tornar o sistema elétrico mais eficiente, mitigando os efeitos da incerteza, uma vez que o intervalo de tempo entre a contratação dos serviços de geração e o

atendimento da demanda prevista é menor. Este aumento da eficiência do sistema se traduz no médio e longo prazos em menores tarifas e externalidades positivas para a sociedade (MERCADO DE ENERGIA / PSR, 2004), pois de acordo com (HOLLANDA, 2004) estariam sendo evitados os custos apontados associados à super avaliação da demanda (investimentos de bilhões de dólares em grandes projetos hidrelétricos e de energia nuclear, que colaboraram para a inflação e déficit de escolas e hospitais externalidades negativas) e à sub-estimação da demanda (apagão de 2001 e todas as externalidades decorrentes). No curto prazo, a Geração Distribuída apresentaria externalidades positivas relacionadas com as vantagens desta operação. Estas externalidades positivas compensariam externalidades negativas associadas ao setor sucroalcooleiro, que decorrem das atividades necessárias à produção de álcool e açúcar. As concessionárias de energia elétrica muitas vezes não percebem as vantagens dos sistemas de cogeração, e acabam considerando que o crescimento da cogeração possa diminuir seu mercado. Porém na verdade a cogeração apresenta para as concessionárias a possibilidade de que outros capitais, que não o seu, invistam no aumento da geração de energia, postergando os seus próprios investimentos. Dessa forma, tendo assegurado um fornecimento maior, ela pode aumentar seu número de clientes, e passa a ter eletricidade para vender a outros clientes, que podem ser mais interessantes comercialmente (BRIGHENTI, 2003). Conclusões Especificamente para o setor sucroalcooleiro o aumento da eficiência do sistema elétrico será ainda maior, pois desde 2001, várias usinas têm buscado aumentar sua capacidade de geração de energia elétrica havendo portanto um potencial já instalado pronto para ser inserido na rede. Este aumento de eficiência pela redução de incertezas podem resultar no adiamento da necessidade de investimento de recursos públicos para novas obras de geração de energia, os quais poderiam ser destinados a ações sociais relacionados à saúde e educação, entre outras carências da sociedade brasileira. No que tange desenvolvimento socio-econômico, especialmente no meio rural, o setor sucroalcooleiro como alternativa para a expansão do sistema elétrico através da Geração Distribuída permite o crescimento dos níveis de emprego e renda, que afetam diretamente as comunidades consumidoras da energia cogerada. Também, o desenvolvimento de um novo mercado de equipamentos e prestação de serviços relacionados com a Geração Distribuída pode afetar a economia em nível local e nacional, pela abertura de novas indústrias e empresas prestadoras de serviço. Os benefícios econômicos e sociais são desta forma direcionados às comunidades das áreas de influência das usinas, compensando outras externalidades advindas do ciclo produtivo da cana-de-açúcar. Palavras-chave Setor Sucroalcooleiro; Externalidades; Geração Distribuída. Agradecimentos Os autores agradecem à FAPESP Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo pelo financiamento do projeto temático número 01/14302-1 do qual este trabalho faz parte dentro do contexto do sub-projeto 2. Referências BOLOGNINI, M. F. Externalidades na Produção de Álcool Combustível no Estado de São Paulo. (Dissertação de Mestrado) Programa Interunidades de Pós-Graduação em Energia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1996.

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