1 EDUCAÇÃO PARA O TRÂNSITO: um estudo sobre as atividades realizadas na educação infantil CHAPADA DOS GUIMARÃES - MT MARÇO 2011
2 EDUCAÇÃO PARA O TRÂNSITO: um estudo sobre as atividades realizadas na educação infantil Monografia apresentada como requisito parcial para a conclusão do Curso de Especialização em Psicologia do Trânsito da Faculdade Cathedral / I- Bras. CHAPADA DOS GUIMARÃES - MT MARÇO 2011
3 EDUCAÇÃO PARA O TRÂNSITO: um estudo sobre as atividades realizadas na educação infantil Trabalho apresentado para a obtenção do título de Especialista em Psicologia do Trânsito, realizado pela Faculdade Cathedral/Instituto Brasil de Pós Graduação. Aprovado em / / nota-------------- Professor Avaliador Professor Avaliador CHAPADA DOS GUIMARÃES - MT MARÇO 2011
4 DEDICO este trabalho à minha família pelo apoio e incentivo para a concretização do curso.
5 AGRADECIMENTOS À Deus, pela sabedoria, pela oportunidade de desenvolver este estudo. À minha família pela compreensão e pelo carinho durante a concretização deste curso. À Coordenação e demais professores do Curso de Especialização em Psicologia do Trânsito, pelo incentivo e apoio. E, em especial, à orientadora, que muito contribuiu para a realização desta Monografia.
6 "Os professores podem guiá-las proporcionando-lhes os materiais apropriados, mas o essencial é que, para que uma criança entenda, deve construir ela mesma, deve reinventar. Cada vez que ensinamos algo a uma criança estamos impedindo que ela descubra por si mesma. Por outro lado, aquilo que permitimos que descubra por si mesma, permanecerá com ela." Jean Piaget
7 RESUMO Esta pesquisa teve como objetivo central identificar e analisar as concepções de educação para o trânsito dos professores de educação infantil da rede municipal de Chapada dos Guimarães-MT. Para tanto, foi necessário analisar o perfil do educador Infantil das escolas municipais pesquisadas; identificar as práticas pedagógicas utilizadas pelos professores de educação infantil pesquisados, bem como apresentar uma proposta de educação para o trânsito em escolas de educação infantil. Trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa tendo em vista a análise do objeto de estudo escolhido, por meio da realização de uma pesquisa exploratória em escolas de educação infantil do município de Chapada dos Guimarães-MT. Aplicou-se um questionário a 4 (quatro) professores que continha 15 (quinze) questões organizadas em 3 (três) blocos: Identificação, Questões sobre docência e Educação para o Trânsito. O referencial teórico utilizado pautou-se, pelas obras de Piaget (1998, 1982, 1976), imprescindível para a pesquisa de campo empreendida. Ao final deste estudo verificou-se que a aprendizagem, para os professores pesquisados, não se limita a questões acadêmicas, mas morais, éticas e de cidadania, evidenciando serem esses os aspectos mais importantes em relação à proposta de educação para o trânsito, o que implica, também, em desenvolvimento da autonomia do aluno. Palavras-chave: Educação para o Trânsito. Educação Infantil. Criança.
8 ABSTRACT This research aimed at identifying and analyzing the concepts of traffic education teachers of kindergarten in the municipal Chapada dos Guimarães-MT. It was thus necessary to analyze the profile of the educator Children at local schools surveyed, to identify the pedagogical practices used by teachers of kindergarten researched, and present a proposal for traffic education in preschools. This is a qualitative study aimed at examining the object of study chosen by means of conducting exploratory research in preschools in the municipality of Chapada dos Guimarães-MT. We applied a questionnaire to 4 (four) teachers containing fifteen (15) questions arranged in 3 (three) blocks: Identification, Issues Teaching and Education in Transit. The theoretical analysis was based, by the works of Piaget (1998, 1982, 1976), essential for the field research undertaken. At the end of this study it was found that learning for the teachers surveyed, is not limited to academic issues, but moral, and ethical citizenship, showing that these are the most important aspects in relation to the proposed traffic education, which also means developing learner autonomy. Keywords: Education for Transit. Early Childhood Education. Child.
9 SUMÁRIO Introdução... 10 1 A Prática Pedagógica Na Educação Infantil... 13 1.1 A Educação Infantil no Brasil... 13 1.2 A construção de uma proposta pedagógica na Educação Infantil... 19 2 A Educação Para O Trânsito Como Proposta Curricular. 25 2.1 Uma proposta construtivista... 27 2.2 Objetivos e propostas da educação para o trânsito... 30 3 Uma Proposta De Educação Para O Trânsito: A Pesquisa 34 3.1 Contextualização do locus da pesquisa 34 3.2 A educação infantil no município e na região 34 3.3 Procedimentos metodológicos 35 3.4 Análise dos resultados 36 Considerações Finais... 42 Referências... 45 Apêndice... 49
10 INTRODUÇÃO Esta pesquisa tem como proposta analisar a educação para o trânsito na educação infantil, bem como apresentar propostas de trabalho que contribuam para esse nível de ensino, tendo em vista sua importância para a formação e a construção de uma sociedade que tem como pressuposto a democracia e a cidadania. A escolha pela temática se justifica por vários motivos. Um deles é que a autora deste trabalho é psicóloga da rede municipal de ensino da cidade de Chapada dos Guimarães-MT e, continuamente, entra em contato com gestores, professores e alunos dessa etapa de ensino. Desse modo, percebe a necessidade de uma proposta mais efetiva em relação à educação para o trânsito. Outra razão, complementar à primeira, se refere ao fato de que uma pesquisa dessa natureza contribuirá para os estudos sobre essa temática, por meio de novas análises e reflexões que favoreçam uma formação mais sólida dos docentes da educação infantil. Assim, revela-se a necessidade de se verificar as práticas pedagógicas empreendidas por esses profissionais com relação à educação para o trânsito de crianças pequenas. Nessa mesma perspectiva, como foi salientado, este trabalho tem como propósito, também, contribuir para a formação docente do município, tendo em vista que pesquisas sobre a região são relevantes para análises e organização de propostas governamentais para esse nível de ensino. Outra questão importante é que esta pesquisa não se restrinja ao mundo acadêmico e transponha os muros da escola, fundamentando a prática do professor, por meio de análises, reflexões e ações que promovam mudanças no cotidiano das escolas de educação infantil. Nesses termos, realizou-se uma pesquisa bibliográfica sobre a temática desta monografia, que subsidiasse a linha teórica da autora, fundamentada em uma perspectiva construtiva. Por isso, o referencial teórico utilizado foi Piaget (1998, 1982), imprescindível para a pesquisa de campo empreendida. A pesquisa de campo teve uma abordagem qualitativa, tendo em vista a análise do objeto de estudo escolhido, por meio da realização de uma pesquisa
11 exploratória em escolas de educação infantil do município de Chapada dos Guimarães-MT. Aplicou-se um questionário a 17 (dezessete) professores que continha 15 (quinze) organizadas em 3 (três) blocos: Identificação, Questões sobre docência e Educação para o Trânsito. O último bloco de questões foi referente ao conhecimento que os docentes possuíam, especificamente, sobre a temática desta pesquisa. Cabe ressaltar que apenas 4 (quatro) professores devolveram o questionário respondido. Cabe frisar também que as perguntas feitas aos professores foram elaboradas com o intuito de responder aos seguintes questionamentos: O que os professores de educação infantil entendem por educação para o trânsito? Participam ou participaram de algum curso sobre o tema? Em sua prática pedagógica, essa temática aparece nas aulas? Que metodologias utilizam? Nesse contexto apresenta-se a hipótese desta pesquisa. - Os professores de educação infantil acreditam que educação para o trânsito é um conteúdo interdisciplinar que deve ser trabalhado, de forma integrada, aos eixos que norteiam a proposta de educação infantil. Tendo em vista a problematização deste trabalho, apresenta-se como objetivo geral: - Identificar e analisar as concepções de educação para o trânsito dos professores de educação infantil da rede municipal de Chapada dos Guimarães-MT. E como objetivos específicos: - Analisar o perfil do educador Infantil das escolas municipais pesquisadas. - Identificar as práticas pedagógicas utilizadas pelos professores de educação infantil pesquisados. - Apresentar uma proposta de educação para o trânsito em escolas de educação infantil. Para alcançar os objetivos supracitados, esta pesquisa foi estruturada em 3 (três) partes, sendo assim constituídas: A primeira parte apresenta uma análise da proposta curricular de educação para o trânsito, por meio de uma perspectiva histórica, ressaltando seus objetivos e propostas.
12 A segunda parte fundamenta-se em analisar a educação para o trânsito na educação infantil, por meio de perspectiva construtivista, ressaltando a formação do professor. A terceira parte trata da pesquisa realizada em escolas municipais de educação infantil do município de Chapada dos Guimarães, analisando os resultados obtidos com base nos questionários, bem como apresenta uma proposta de educação para o trânsito nas escolas de educação infantil do município. A seguir apresenta-se a primeira parte.
13 1- A PRÁTICA PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL 1.1 A EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL A Educação Infantil é um período da vida escolar, uma etapa educacional muito importante na vida do ser humano, que compreende, atualmente, as crianças com idade entre 0 (zero) e 5 (seis) anos de idade 1. Legalmente, a Constituição Federal, aprovada em 5 de outubro de 1988, estabeleceu os direitos específicos da criança, definindo também como dever do Estado o atendimento em creche e pré-escola. Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, Lei n.º 9394, reconheceu as crianças entre 0 (zero) a 6 (seis) anos, cidadãs de direitos. Nessa perspectiva, a Educação Infantil passa a fazer parte da Educação Básica, embora não seja obrigatória. No Artigo 211, parágrafo 2.º, verifica-se que: Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil (BRASIL, 1988). E quando se refere aos direitos da criança, tem-se o respaldo pelo que estabelece o Artigo 227 que define os direitos da infância brasileira: É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 1988, p.45) 1 Recentemente, surgiram medidas legais que modificaram o atendimento das crianças da pré-escola, pois alunos com seis anos de idade devem obrigatoriamente estar matriculados no primeiro ano do Ensino Fundamental. Esses dispositivos legais podem ser visualizadas no Projeto de Lei nº 144/2005, aprovado pelo Senado em 25 de janeiro de 2006, que estabelece a duração mínima de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Cabe ressaltar que, em 06/02/2006, o Presidente Lula sancionou a Lei nº 11.274 que altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da LDB, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade.
14 À promulgação da nova Carta verifica-se a tarefa de elaborar legislação complementar, formular políticas sociais, estabelecer prioridades orçamentárias e expandir o atendimento em creches e pré-escolas. Evidencia-se que a nova concepção de direitos implica numa nova visão de Infância e, portanto, a prática pedagógica amplia em seu desenvolvimento, num processo longo e gradual de mudanças. A Educação Infantil, como uma etapa da Educação Básica, proporcionou maior acesso das crianças à escola, expandindo seu atendimento, como dever de Estados e, principalmente, Municípios. Essa mudança teve consequências fundamentais da organização da política de atendimento e na definição de estratégia para garantir qualidade, melhoria e expansão social dos serviços voltados para creches e pré-escolas. Segundo Matias e Paula (2009, p.14) conforme apontam Campos, Rosemberg e Ferreira (1995), a subordinação do atendimento em creches e pré-escolas à área da Educação representa, pelo menos no nível do texto constitucional, um grande passo na direção da superação do caráter assistencialista predominante nos anos anteriores a Constituição. A história da educação infantil brasileira revela que essa etapa da educação básica pautou-se pela falta de prestígio social, pois inicialmente foi criada para atender aos filhos das escravas libertas, expandindo-se, paulatinamente, com o processo de industrialização dos anos 1930 e 1940 que intensificou as matrículas escolares e a maior participação das mulheres no mercado de trabalho capitalista, nos anos 1950 (KHULMANN JR., 1998). Nesse sentido, com a Política de Bem-Estar Social 2 e a aceleração dos processos de industrialização e urbanização, manifestam-se elevados graus de nacionalização das políticas sociais, assim como a centralização do poder. O Estado de bem-estar não atingiu toda a população da mesma forma; trouxe desenvolvimento e qualidade de vida só para alguns. As políticas sociais reproduziram o sistema de desigualdade existente na sociedade, pois as teorias sociais foram muito discutidas, o que poderia ser feito também, mas poucas foram as ações efetivas. 2 O Estado que possui uma função interventiva e regulatória na área do Bem Estar Social. (Disponível em: dialnet.unirioja.es/servlet/fichero_articulo?codigo=2928221...0. Acesso em: 20 nov.2010.)
15 O período dos anos 60 e meados da década de 70 do século XX foi de inovação nas políticas sociais na área da educação, saúde, assistência social e previdência. Nessa perspectiva, Rosemberg (1997) fundamenta que até o início da década de 70, o modelo de educação Pré-escolar, denominada Pré-primária, perseguido pela administração educacional, pautava-se por diretrizes recomendadas pela XXVI Conferência Internacional da Instrução Pública da UNESCO 3, de 1961 (ROSEMBERG, 1997). No entanto, o modelo praticado em pequena escala no país, já implantado nas redes de pré-escola, era considerado como um atendimento elitista, diante do novo projeto de extensão da cobertura visando compensar carências de populações empobrecidas e prepará-las para o ingresso no Ensino Fundamental (ROSEMBERG, 1999, p.15) Ao referir-se à nomenclatura: Ensino Fundamental, vale ressaltar sobre essa denominação começou passou a ser utilizada a partir das décadas de 60 e de 70 até os dias atuais. De acordo com a Lei n.º 4.024, de 20 de dezembro de 1961, conforme o Capítulo I, Da Educação Pré-Primária, Artigo 23: A educação préprimária destina-se aos menores até sete anos, e será ministrada em escolas maternais ou jardins-de-infância (BRASIL, 1961, p.4). E, ainda, no Capítulo II, Do Ensino Primário, no Artigo 26: O ensino primário será ministrado, no mínimo, em quatro séries anuais (BRASIL, 1961, p.4). Progressivamente, tem-se o ensino secundário, conforme Capítulo III, Do Ensino Secundário, no Artigo 44, 1º: O ciclo ginasial terá a duração de quatro séries anuais e o colegial, de três no mínimo (BRASIL, 1961, p.6). Assim, até a década de 70, o sistema compreendia quatro níveis básicos, que atendiam a diferentes faixas etárias, enquanto o ensino obrigatório restringia-se à escola primária de quatro anos, conforme a estrutura a seguir (Quadro 1): 3 A UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) era integrada por 71 países e formada por uma Conferência Geral que a cada dois anos estabelecia um programa de atuação. Ela teve importante papel no desenvolvimento de pesquisas sociais e educacionais no Brasil e na America Latina.
16 QUADRO 1 Estrutura do sistema educacional brasileiro anterior à reforma de 1971 Nível Duração Faixa Etária Pré-escola 3 anos de 4 a 6 anos Escola primária 4 anos de 7 a 10 anos Ginásio 4 anos de 11 a 14 anos Colégio 3 anos de 15 a 17 anos Ensino superior Variável Após 18 anos Fontes: Lei n.º 4.024, de 20 de dezembro de 1961, e Lei n.º 5.540, de 28 de novembro de 1968. Com a Lei nº. 5.692/71, a escola primária e o ginásio foram fundidos e denominados de ensino de 1.º grau. O antigo colégio passou a se chamar ensino de 2.º grau. O ensino obrigatório estendeu-se, assim, para oito anos, embora a terminologia unificada não correspondesse a uma organização integrada das oito séries. As quatro primeiras séries continuaram a ser atendidas por um único professor, do qual não era exigido nível superior, mas apenas formação para magistério em nível médio. As quatro séries finais do 1.º grau e o 2.º grau permaneceram divididas em disciplinas ministradas por diferentes docentes, dos quais se exigia, ao menos formalmente, educação superior. A organização sofreu alterações, conforme apresenta o Quadro 2. QUADRO 2 Estrutura do sistema educacional brasileiro após a reforma de 1971 Nível Duração Faixa Etária Pré-escola 3 anos De 4 a 6 anos 1º grau obrigatório 8 anos De 7 a 14 anos 2º grau 3 anos De 15 a 17 anos Ensino superior Variável Após 17 anos Fontes: Lei n.º 5692, de 12 de agosto de 1971, e Lei n.º 5.540, de 28 de novembro de 1968. Assim, verificam-se as principais diferenças como a longa duração do ensino fundamental obrigatório (oito anos) e seu início aos 7 anos de idade (e não aos 6, como é o mais comum). Retornando às bases para novas propostas de educação pré-escolar de massa no Brasil que se constituíram destaca-se a realização de uma Conferência
17 pelo Departamento Nacional da Criança DNCr 4 que também esteve presente na reunião da Comissão Executiva do UNICEF 5 (Fundo das Nações Unidas para a Infância) de 1965, em que se discutiu sobre Como proteger em massa préescolares. Segundo Rosemberg (1997), o Departamento Nacional da Criança, em 1967, preparou-se para apresentar na reunião um diagnóstico sobre o pré-escolar no Brasil e dela trouxe as idéias que guiaram a elaboração do Plano de Assistência ao Pré-escolar, realizado no Rio de Janeiro em 1968. Nesse documento estão presentes as orientações que guiaram as propostas governamentais da pré-escola de massa elaboradas no Brasil durante a década de 70 e parte de 80. De acordo com Rosemberg (1997, p. 11), em relação à implantação do modelo de Educação Infantil de massa, evidencia-se que: No MEC, os primeiros sinais da gestação de um novo modelo de educação pré-escolar de massa foram emitidos pelo CFE (Conselho Federal de Educação), no início da década de 70, através de pareceres e recomendações. Esses pareceres, ao cobrirem lacunas sobre a pré-escola da Lei 5.692/71, evidenciam uma absorção das idéias da educação compensatória do novo modelo de pré-escolar de massa. A similaridade entre as propostas do UNICEF e da UNESCO e a que foi se festando no MEC através de pareceres é evidente. Trata-se de implementar uma verdadeira política de educação compensatória que vise equalizar as oportunidades educacionais (Parecer CFE 2018/74), através da adoção de modelos não-convencionais procurando mobilizar toda a comunidade. Dessa forma, a Lei nº. 5.692/71 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional trouxe o princípio da municipalização do Ensino Fundamental. Contudo, a pré-escola não possuía caráter formal, não havia contratação de professores 4 O Departamento Nacional da Criança foi criado em 1940, e primava pela colaboração de pessoas da sociedade civil como professoras, mulheres, médicos, etc. e tinha uma concepção assistencialista por meio da realização de campanhas de cuidado e educação da infância, em relação à higiene. 5 A UNICEF foi criada em Dezembro de 1946 com a finalidade de ajudar as crianças da Europa vítimas da 2.ª Guerra Mundial. No início dos anos de 1950, o seu mandato foi alargado de maneira a englobar também as crianças e mães dos países em desenvolvimento. Em 1953, torna-se uma agência permanente das Nações Unidas passando a ocupar-se especialmente das crianças dos países mais pobres da África, Ásia, América Latina e Médio Oriente. É no ano de 1959 que a Declaração dos Direitos da Criança é adotada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, passando assim a existir um instrumento que regula os direitos das crianças principalmente no que diz respeito à educação, cuidados de saúde e nutrição adequada. Em 1965, ganha o Prêmio Nobel da Paz pelo seu contributo para a promoção da fraternidade entre as nações. (UNICEF. Disponível em: http://files.us.splinder.com/750db1e698f104ebc61db2e8f6a6a74e.pdf)
18 qualificados e remuneração condigna, de modo a permitir a realização de trabalho pedagógico eficaz. Diante desse quadro, evidenciou-se que a maioria das creches públicas prestava atendimento de caráter assistencialista, que visava oferecer alimentação, condições de higiene e segurança física de forma precária e com baixo padrão de qualidade. Vale ressaltar que as creches particulares desenvolviam atividades educativas voltadas para os aspectos emocionais, sociais e cognitivos das crianças. (SARAIVA, 2010, p.5) Após os anos 80, por meio da promulgação da Constituição de 1988 a educação infantil tornou-se obrigação do Estado e parte integrante da educação básica, o que contribuiu para a constituição de um caráter pedagógico a essa etapa de ensino. Ao referir-se à concepção pedagógica da Educação Infantil Khulmann Júnior (2009, p.1) revela que: O final do século XIX e o início do século XX demarcam um período em que a infância e a sua educação integram os discursos sobre a edificação dessa sociedade moderna. [...] O quadro das instituições educacionais se reconfigura durante a segunda metade do século XIX, compondo-se da creche e do jardim-de-infância, ao lado da escola primária, do ensino profissional, da educação especial e de outras modalidades. [...] De lá até meados da década de 1970, as instituições de educação infantil viveram um lento processo de expansão, parte ligada aos sistemas de educação, atendendo crianças de 4 a 6 anos, e parte vinculada aos órgãos de saúde e de assistência, com um contato indireto com a área educacional. Na quarta última parte dos anos 1900, a educação infantil brasileira vive intensas transformações. É durante o regime militar, que tantos prejuízos trouxeram para a sociedade e para a educação brasileiras, que se inicia esta nova fase, que terá seus marcos de consolidação nas definições da Constituição de 1988 e na tardia Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996. Desse modo, as inovações no ensino, em especial, na educação infantil, acontecem dentro da sala de aula e em sintonia com a realidade local, global, em coerência com o que os alunos esperam aprender. Assim, as concepções existiram anteriormente, mas no momento atual elas se fortalecem, realçando o que estabelece a Constituição Federal de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, enfatizando-se a de 1996.
19 Alguns princípios vêm orientando o trabalho pedagógico, no sentido de refletir a educação de modo que privilegie o desenvolvimento integral da criança no processo de ensino. 1.2 A CONSTRUÇÃO DE UMA PROPOSTA PEDAGÓGICA NA EDUCAÇÃO INFANTIL A necessidade de uma proposta pedagógica para a Educação Infantil surgiu diante dos conhecimentos dos alunos em suas múltiplas dimensões e quanto ao processo ensino-aprendizagem. Nesse sentido, a preocupação dos educadores da Educação Infantil priorizou o que ensinar, para que ensinar, como ensinar e quando ensinar, buscando uma programação adequada, planejamento, que atenda de forma mais abrangente, o que atualmente pode ser definido como proposta pedagógica. Por meio de um currículo que priorize essas questões, percebe-se que as crianças são estimuladas, cotidianamente, a pensar e expressar suas idéias, a se relacionar com as outras crianças e com a professora no ambiente escolar. Desse modo, há um conjunto responsável pelo planejamento da prática pedagógica, e, assim, constitui-se a cooperação como um valor construído em sua vivência; porém deve-se constatar a individualidade de cada um, destacando a importância dada ao conhecimento e à valorização da cultura das crianças e de suas famílias (BRASIL, 1997). Nesse sentido, Oliveira (2002, p. 168), salienta que: Há que reconhecer que se as instituições de educação infantil enraízam-se em uma cultura, contribuem para transformar o contexto cultural. Daí a importância de avaliar a qualidade do trabalho por elas realizado. Essa qualidade, sem dúvida, depende do que é pretendido para as futuras gerações, ou seja, de um projeto político elaborado pelas comunidades escolares.
20 Nessa perspectiva, percebe-se o valor das experiências que as crianças vivem em suas relações, assim como a realidade cultural em que elas se desenvolvem. Dessa forma, os educadores devem buscar meios para que esse universo cultural se amplie, por meio da parceria com as famílias, ou mesmo em seu cotidiano escolar planejando projetos, festas, reuniões e outras atividades educativas (BRASIL, 1998) Segundo Oliveira (2002, p. 168): A concretização de boas propostas pedagógicas em creches e pré-escolas inicia-se pela consideração de que os professores de educação infantil apropriam-se de modelos pedagógicos e de representações sociais aprendidos em programas de formação profissional ou vividos em suas experiências pessoais como elementos canalizadores das ações educativas, mas não os revêem criticamente nem os integrem adequadamente ao seu cotidiano profissional. Além disso, as várias perspectivas históricas de trabalho com as crianças já adotadas na área recreacional dirigida, lúdico-expressivo-espontaneísta, aprendizado centrado em tarefas e outras continuam convivendo na prática dos docentes. Desse modo, percebe-se a necessidade de uma proposta para a Educação Infantil que busque estruturas curriculares abertas e flexíveis, atividades diversificadas como reconhecimento que enriquecem as propostas e criam novas oportunidades de desenvolvimento das crianças, quando do seu envolvimento em termos cognitivos, afetivos, motores e linguísticos. A construção de uma proposta pedagógica para a Educação Infantil deve ser permeada de criatividade, uma metodologia baseada num processo cognitivo, afetivo, social, visando compreender o caráter lúdico que poderá ajudar o educador a organizar melhor a sua prática, respeitando as necessidades das crianças. (FRIEDMANN, 1992, p.68-69) Nessa perspectiva, a professora é norteada pela crença de que o mundo é multidisciplinar, como Salles e Faria (2002, p. 139) propõem, que a busca do conhecimento não se reduz a acessar os conteúdos que foram sistematizados e organizados através das tradicionais disciplinas escolares, pois acreditam que a instituição da educação infantil é um espaço de cuidado e educação das crianças Cuida/educa para que se sintam seguras/protegidas; Cuida/educa para que aprendam a respeitar o outro na sua diferença;
21 Cuida/educa para que se apropriem, de forma crítica e autônoma, da linguagem, dos valores e costumes da cultura em que estão inseridos, necessários à vida coletiva; Cuida/educa para que se sintam sempre desafiadas e não percam a relação prazerosa com a busca de compreensão do mundo; Cuida/educa para que se sintam bem, felizes; Cuida/educa, enfim, para que as crianças se desenvolvam em sua integralidade, tanto nos aspectos cognitivos, quanto afetivos, físicos, sociais, éticos e estéticos, contribuindo para sua formação humana. Desse modo, cuidar de uma criança num contexto educativo demanda a integração de vários campos de conhecimentos e cooperação de profissionais de diferentes áreas. Segundo o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI), volume I (BRASIL, 1998), a base do cuidado humano é compreender como ajudar o outro a se desenvolver como ser humano. Percebe-se que o professor de Educação Infantil necessita ter, atualmente, conhecimento, não apenas do caráter legal que circunda a educação infantil, mas, sobretudo, do ideário que o inspira. A qualidade da Educação Infantil tornou-se uma preocupação dos envolvidos com a educação e, assim, um desafio que apresentou uma dimensão maior, tendo em vista a necessidade de contemplar duas funções: cuidar e educar (DIDONET, 2001). Segundo o RCNEI (BRASIL, 1998), a base do cuidado humano é compreender como ajudar o outro a se desenvolver como ser humano. Cuidar significa valorizar e ajudar a desenvolver capacidades. Assim o RCNEI propõe: Para cuidar é preciso antes de tudo estar comprometido com o outro, com sua singularidade, ser solidário com suas necessidades, confiando em suas capacidades. Disso depende a construção de um vínculo afetivo entre quem cuida e é cuidado (BRASIL, 1998, p. 75). Já a LDBEN estabelece sobre a formação dos profissionais da educação: Art. 61 A formação de profissionais da educação, de modo a atender os objetivos dos diferentes níveis e modalidades de ensino e às características de cada fase do desenvolvimento do educando, terá como fundamentos: I a associação entre teorias e práticas, inclusive mediante a capacitação sem serviço; II aproveitamento da formação e experiências anteriores em instituições de ensino e outras atividades. (BRASIL, 1996, p. 45)
22 Conforme salienta Brandão (2003), o Artigo 61 explicita os objetivos que devem nortear a formação dos profissionais em Educação no Brasil. Apresentam-se como pontos principais a valorização das experiências anteriores dos docentes e a associação entre teorias e práticas, atividades que devem ser indissociáveis. Ao tratar da formação de docentes da educação básica afirma a LDBEN (1996, p. 46), em seu artigo 62, que: A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na Educação Infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal. O artigo acima citado tornou-se alvo de polêmicas quanto à sua interpretação; portanto, tornou-se claro que qualquer docente já atuante na Educação Infantil e/ou nas séries iniciais do ensino fundamental não precisa vir a frequentar, obrigatoriamente, qualquer curso de nível superior, a não ser por vontade própria. E, isso, ultimamente tem acontecido, principalmente, no que se refere à busca de cursos de formação continuada por parte dos professores. O Artigo 63, da LDBEN apresenta as determinações quanto aos institutos superiores de educação que deverão oferecer: I cursos formadores de profissionais para a educação básica, inclusive o curso normal superior, destinado à formação de docentes para a Educação Infantil e para as primeiras séries do ensino fundamental; II programas de formação pedagógica para portadores de diplomas de educação superior que queiram se dedicar à educação básica; III programas de educação continuada para os profissionais de educação dos diversos níveis. (BRASIL, 1996, p.47) Desse modo, em termos de futura atuação profissional, na prática, tanto os egressos dos cursos de graduação em Pedagogia serão professores de educação básica como os do curso Normal Superior, que habilita os profissionais para as séries iniciais e para a Educação.