TRIBUNAL DE JUSTIÇA PODER JUDICIÁRIO São Paulo Registro: 2014.0000104277 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos do Apelação nº 9000088-33.2009.8.26.0562, da Comarca de Santos, em que é apelante BRILLA APARECIDA FAGUNDES DOS SANTOS (JUSTIÇA GRATUITA), é apelado RIVALDO PINHEIRO DA SILVA (JUSTIÇA GRATUITA). ACORDAM, em 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ENIO ZULIANI (Presidente), MAIA DA CUNHA E TEIXEIRA LEITE. São Paulo, 20 de fevereiro de 2014. ENIO ZULIANI RELATOR Assinatura Eletrônica
VOTO N.º: 28684 APELAÇÃO Nº: 9000088-33.2009.8.26.0562 COMARCA: SANTOS APELANTE: BRILLA APARECIDA FAGUNDES DOS SANTOS APELADO: RIVALDO PINHEIRO DA SILVA JUIZ PROLATOR: CLAUDIO TEIXEIRA VILLAR AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS 2ª FASE - Art. 914 do CPC Venda de estabelecimento comercial pelos sócios Documentos que comprovam que a ré recebeu sozinha a totalidade do valor pago Autor que detinha 50% da cotas da sociedade - Dever de prestar contas, independentemente de o autor ter abandonado a administração da sociedade poucos meses após seu início Sentença mantida Recurso não provido. Vistos. RIVALDO PINHEIRO DA SILVA ingressou com a presente ação de prestação de contas em face de BRILLA APARECIDA FAGUNDES DOS SANTOS ficando vencida na primeira fase (sentença de fls. 103/106) o que ensejou apelo reiterando os termos da defesa. O acórdão de fls. 134/138 negou provimento ao recurso. Embargos declaratórios (fls. 141/142) rejeitados (fls. 145/148). Dando-se cumprimento àquela decisão, a ré foi intimada a prestar contas no prazo de 48 horas (fls. 151). A ré peticionou requerendo prazo suplementar o que foi indeferido às fls. 154. Em razão da ausência de prestação de contas, o autor apresentou o valor que lhe é devido, qual seja, R$35.356,54 (fls. 156/158). Manifestação da ré (fls. 162/230) requerendo a juntada da planilha de prestação de contas e a extinção da ação, dando por satisfeita sua obrigação de prestar contas. Manifestação do autor (fls. 234/235) alegando que a petição da ré é extemporânea e que beira a má-fé. Alega que Apelação nº 9000088-33.2009.8.26.0562 - Santos - Voto nº 28684 - V 2
os documentos juntados são imprestáveis para o fim proposto e requereu, por fim, o pagamento de R$35.356,54 no prazo improrrogável de 15 dias, sob pena de aplicação do artigo 475-J do CPC. Adveio sentença (fls. 236/238) considerando bons os cálculos apresentados pelo autor às fls. 158, declarando, com isso, em favor do autor um crédito de R$35.356,54. Inconformada apela a ré reafirmando os termos aduzidos ao longo do processo; que as contas já foram prestadas quando da conclusão do contrato e que o apelado as recebeu sem impugná-las; que tais contas não foram apreciadas na ocasião do julgamento; requereu a reforma da decisão para que sejam aceitas as contas prestadas pela requerente dando como quitada sua obrigação; ou subsidiariamente seja determinada a remessa dos autos à contadoria judicial. Contrarrazões às fls. 252/255. É o relatório. A r. sentença deve ser integralmente mantida. Antes de se adentrar no mérito da questão, cumpre esclarecer que aquele que administra bens, negócios ou interesses alheios deve prestar contas. Ao fazê-lo, exporá, pormenorizadamente, todos os componentes de crédito e débito que provierem da relação jurídica, apontando o resultado aritmético do saldo credor ou devedor. O escopo da ação de prestação de contas é, portanto, apurar, a partir dos créditos e débitos comprovados, a existência ou não de saldo em favor do titular dos bens administrados por terceiro. Apelação nº 9000088-33.2009.8.26.0562 - Santos - Voto nº 28684 - V 3
São variadas as situações em que há o dever de prestar contas. O Código Civil obriga o tutor e o curador, em face do tutelado e do curatelado (arts. 1755 e 1774); o sucessor provisório, em relação aos bens do ausente (art. 33); o inventariante e o testamenteiro (arts 2020 e 1980) e o mandante em relação ao mandatário (art. 668). No CPC também há dispositivos impondo esse dever ao administrador da massa na insolvência, ou do imóvel ou empresa no usufruto executivo; ao curador da herança jacente e, eventualmente, ao depositário judicial. Pois bem. O presente caso já foi sentenciado, como demonstrado no relatório, impondo ao requerido o dever de prestar contas, pois não houve controvérsia de que as partes eram sócias da pessoa jurídica BRILLA E SILVA LANCHONETE LTDA. ME, 50% de cotas para cada, que foram vendidas para terceiro, com a cessão do ponto pelo valor de R$50.000,00. Além de ter documento nos autos comprovando o recebimento do valor referente a venda pela apelante, ela mesma admite tal fato, não demonstrando que repassou ao autor o que lhe era devido (50%) apenas afirmando que o autor concordou em não receber nada, pois não tinha mais interesse no negócio. Ademais, como anteriormente observado pelo juiz sentenciante: pouco importa que o autor tenha se desinteressado pelos negócios, o que importa é que ele detinha 50% das cotas, de maneira de que, por este percentual, respondia (fls. 105) Portanto, inexistindo controvérsia de que a apelante recebeu créditos relativos à venda do estabelecimento comercial, fato por ela confirmado, é evidente que tinha que prestar contas ao autor, seu ex-sócio, de maneira pormenorizada, dos valores recebidos [independentemente de serem Apelação nº 9000088-33.2009.8.26.0562 - Santos - Voto nº 28684 - V 4
inferiores ao valor da venda] e também das dívidas existentes e que foram geradas a partir do abandono dele da sociedade empresária, a fim de sanar qualquer dúvida sobre a existência ou não de crédito a seu favor. Neste sentido, a jurisprudência do colendo STJ: DIREITO SOCIETÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 535, II, DO CPC. VÍCIO NÃO CONFIGURADO. ABANDONO DE SÓCIO-COTISTA DA SOCIEDADE. RETIRADA NÃO REGISTRADA NA JUNTA COMERCIAL. ART. 914, I, DO CPC. DIREITO À PRESTAÇÃO DE CONTAS. CABIMENTO. (...) 2. Ao mesmo tempo em que recai sobre o sócio-cotista, apesar de haver abandonado a administração da sociedade empresária, mas continua formalmente a pertencer ao seu quadro societário, todas as responsabilidades próprias da atividade da pessoa jurídica, mantém ele os direitos decorrentes de sua participação no capital social. 3. A relação jurídica entre os sócios-cotistas não fora formalmente desfeita, o que assegura ao sócio-recorrido o direito à prestação de contas pleiteada referente ao período em que esteve ausente da administração da sociedade. [AgRg no Ag n 1373227- MG, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Dje de 18.04.2011]. As contas apresentadas às fls. 162 pela apelante não servem para isentá-la do dever de pagar ao autor o que lhe é devido. Apresentou uma planilha de gastos que totaliza $39.304,65 aduzindo, com isso, que as despesas decorrentes do estabelecimento comercial comum superaram o valor efetivamente recebido. Observa-se, entretanto, que isso não modifica em nada o dever da ré de pagar ao autor sua cota parte. A alegação da apelante de que as contas por ela Apelação nº 9000088-33.2009.8.26.0562 - Santos - Voto nº 28684 - V 5
apresentadas deve ser julgadas boas não prospera, pois no tramite do processo ficou claramente demonstrado qual é o valor devido. Pelo mesmo motivo não há se falar em envio dos autos à contadoria judicial, visto que os fatos alegados estão cabalmente provados nos autos. Diante do exposto, nega-se provimento ao recurso. ÊNIO SANTARELLI ZULIANI Relator Apelação nº 9000088-33.2009.8.26.0562 - Santos - Voto nº 28684 - V 6