A concepção estrutural e a engenharia



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Transcrição:

OUT. NOV. DEZ. 2007 ANO XIII, Nº 51 309-314 INTEGRAÇÃO 309 A concepção estrutural e a engenharia YOPANAN CONRADO PEREIRA REBELLO* Resumo Uma estrutura bem resolvida é o resultado de esforços intelectuais e físicos bastante grandes. Sua realização exige uma fase inicial de grande cooperação entre arquitetos e engenheiros, passando por outra de trabalhos solitários, em que o conhecimento teórico e a experiência do profissional são de fundamental importância. Pode-se, para efeito de análise, dividir o trabalho de projetar estrutura nas seguintes fases: Palavras-chave Concepção estrutural. Pré-dimensionamento. Análise estrutural Title Structural Conception and Engineering Abstract A well-developed structure is the result of great intellectual and physical efforts. Its accomplishment demands an initial phase of great cooperation between architects and engineers, going through another phase of lonely works, in which theoretical knowledge, as well as the professional s experience, is basically important. Keywords Structural conception. Pre-dimensioning. Structural analysis 1. concepção estrutural Entende-se por concepção estrutural a criação de um sistema capaz de manter uma determinada forma. A concepção estrutural depende da experiência do profissional, de seu repertório de soluções, de seu bom senso e de grande intuição. A concepção estrutural pode ser um procedimento bastante pessoal, subjetivo mesmo, mas de maneira geral não é o melhor caminho; a discussão de idéias com outros profissionais, gera trocas de experiências que podem contribuir para uma solução mais aprimorada. O estudo de caso apresentado, mais adiante, neste artigo comprova de maneira contundente essa afirmação. Na etapa da concepção estrutural são levados em conta fatores bastante objetivos, como economia, facilidades construtivas, e outros mais difíceis de serem objetivados, como estética e bem-estar. Essas variáveis, diferentes em quantidade e qualidade, e tão difíceis de ser concatenadas, não permitem que se criem critérios objetivos e precisos que Data de recebimento: 15/04/2007. Data de aceitação: 19/09/2007. * Professor do Programa de Pós-graduação stricto sensu em Arquitetura e Urbanismo da USJT. E-mail: ycpr@uol.com.br. possam auxiliar na escolha de uma boa solução estrutural. Para deixar a questão mais difícil, os engenheiros de estrutura, em conseqüência de sua formação prática, tendem a centrar suas preocupações em fatores nem sempre esperados pelos autores do projeto arquitetônico. A falta de formação dos engenheiros nas questões da arquitetura das edificações faz com que as soluções estruturais, apesar de corretamente propostas, quanto aos aspectos da estabilidade, custos e facilidade construtiva, não apresentam soluções criativas, diferentes daquelas propostas em obras semelhantes. O engenheiro de estrutura pode e deve ser criativo. Peter Rice, importante engenheiro estrutural, falecido em 1992, dizia que o engenheiro de estruturas criativo não deve dormir sossegado. Ele queria com isso dizer que o engenheiro criativo está sempre exposto a riscos, pois ele trabalha na fronteira de sua área de conhecimento; lida, portanto, com situações novas e que ainda não estão sistematizadas. Sob este aspecto, a formação atual que o engenheiro de estruturas recebe, nas escolas de Engenharia, deixa muito a desejar. O MIT, famoso instituto americano, percebeu, de longa data, que os alunos egressos das escolas de Engenharia apresentavam grande habilidade no trato com os números, mas não sabiam transformar esse importante conhecimento em possibilidades criativas. Constatação

310 INTEGRAÇÃO REBELLO A concepção estrutural e a engenharia que motivou esse instituto, a partir de 1990, a reformular seu currículo, objetivando tornar seus alunos mais criativos. As palavras do chefe do Departamento de Engenharia Civil, David E. Ewland, à época das reformas, demonstram bem essa preocupação: Sadly, traditional engineering courses do not encourage creativity. Uma concepção estrutural criativa exige o diálogo com outras áreas, principalmente entre engenheiros e arquitetos. Estes devem pôr à disposição do projeto todo seu potencial criativo. É preciso que esses profissionais acreditem que o projeto é, também, um exercício de pesquisa. Para ilustrar esse processo de interação, será apresentado neste artigo o caso de um projeto de que este autor participou como engenheiro estrutural. Nele houve uma grande cooperação entre o trabalho do engenheiro e o do arquiteto. Trata-se do projeto de uma passarela que faz parte de um conjunto de edificações que compõem uma residência unifamiliar de alto padrão, em Barra do Una, no litoral norte de São Paulo. O projeto de arquitetura é de autoria dos arquitetos Newton Massafumi e Tânia Parma. O critério básico que norteou a concepção do projeto de arquitetura foi o de evitar grandes interferências das construções com o sítio em que seriam implantadas, já que se tratava de área de preservação de Mata Atlântica. Para isso era fundamental que as edificações tivessem o mínimo de contato com o solo, ou seja, as estruturas deveriam ser projetadas com poucos pilares. O projeto nasce de um processo de trabalho conjunto entre o arquiteto e o engenheiro, com um resultado que é, ao mesmo tempo, arquitetura e estrutura. Este procedimento, infelizmente, não é comum, devido às próprias circunstâncias, de prazo e custo, que cerceiam a liberdade do projetar. Não há dúvidas de que o processo de projetar, quando compartilhado por esses dois profissionais, só pode criar um resultado sinergético que, sem dúvida, beneficia ambas as áreas. Não há estrutura sem forma (arquitetura), nem forma sem estrutura. As fotos anexas procuram mostrar um pouco do que foi esse processo. A passarela, aqui apresentada, é o elemento integrador entre as diversas edificações, e nela, como nas demais construções, era desejado o mínimo de pilares. Em vista dessas condicionantes, foi projetada uma passarela, de madeira certificada, com 3,80 m de largura, altura variável em torno de 4,00 m, apoiada em pilares centrais, também de madeira, espaçados a cada 6,30 m. Para criar uma superestrutura de passadiço bastante leve, os vãos do piso não ultrapassam 1,70 m. Para atender essa condicionante, optou-se por conceber os pilares de madeira com ramificações, como árvores. Desta maneira, apesar de junto ao chão a quantidade de pilares ser bem reduzida, próximo Figura 1. Imagens da passarela Fonte: Fotos do autor

OUT. NOV. DEZ. 2007 ANO XIII, Nº 51 309-314 INTEGRAÇÃO 311 da estrutura do passadiço a quantidade de apoios é bastante generosa. Mas qual a inclinação dos galhos estruturalmente mais adequada? A resposta está na idéia de que estrutura é o caminho das forças. A disposição dos galhos nessa estrutura em árvore deve ser tal, que o caminho percorrido pelas cargas até a fundação seja mínimo. Para obter-se essa disposição, lançou-se mão de um ensaio simples, em que foi usado um modelo qualitativo, no qual os galhos e tronco foram simulados com barbantes. Como se pode ver pelas fotos anexas, os barbantes, após serem untados em cola branca, são juntados. Em seguida, são abandonados à ação de um pequeno peso, quando, então, abrem-se até que seja obtida uma configuração de equilíbrio, sendo, em seguida, fotografados. Posteriormente, a foto é reproduzida em desenho, de forma invertida, ou seja, na posição em que os galhos estarão na estrutura real. Com esse ensaio, obtém-se o caminho ótimo de transferência das forças ao longo dos galhos e tronco do pilar árvore. Ver Figura 2. Por outro lado, infelizmente, não é sempre que procedimentos como esses acontecem; é muito mais freqüente do que se imagina o desencontro entre os objetivos dos arquitetos e dos engenheiros. A obra mostrada na figura adiante, uma passarela na Alemanha, é considerada, pela literatura da área, como a obra mais errada do ponto de vista do comportamento estrutural. Isso porque sua forma arquitetônica, um arco, não é compatível com o carregamento dado pelos pilares da passarela que se apóiam sobre ele. Sabe-se que um bom arco, ou seja, aquele em que predomina a compressão, deve ter a forma do funicular das cargas que atuam sobre ele. Neste caso, as duas cargas resultariam em um funicular trapezoidal, a forma ideal para o arco desenvolver só compressão simples. Claro que, do ponto de vista estético, a passarela com forma trapezoidal seria bem menos interessante que a forma curva. Um bom diálogo entre engenheiro e arquiteto poderia transformar o resultado, procurando uma melhor relação entre a estrutura do passadiço da passarela e a do arco. O aumento na quantidade de apoios do passadiço sobre o arco resultaria num carregamento cujo funicular aproximar-se-ia da forma arquitetônica desejada. Ver Figura 3. 2. pré-dimensionamento A fase de pré-dimensionamento serve para ter-se uma avaliação das prováveis dimensões da estrutura, tanto para determinação de seu peso próprio como para verificação das interferências com os espaços arquitetônicos e as instalações. Para pré-dimensionamento dos elementos estruturais, o engenheiro pode usar fórmulas empíricas, tabelas e gráficos, que hoje estão disponíveis para uma grande diversidade de sistemas estruturais. Quando a estrutura foge das soluções conhecidas, o cálculo expedito, de uma versão mais simplificada da estrutura, pode ajudar na previsão das dimensões prováveis das seções dos elementos estruturais. Esta fase do projeto de estrutura é bastante objetiva, pois baseia-se em procedimentos independentes da subjetividade do profissional. Figura 2. Imagens do ensaio Fonte: Fotos do autor

312 INTEGRAÇÃO REBELLO A concepção estrutural e a engenharia Figura 3. Vista da passarela como foi construída Fonte: Wittfoht, 1977 3. análise estrutural A análise estrutural, por sua vez, pode, ainda, ser dividida em duas etapas: uma que trata da escolha do modelo físico que melhor simule o comportamento físico real da estrutura e outra na qual se desenvolve a análise numérica do modelo escolhido. O processo de escolha do modelo físico, também chamado de modelagem estrutural, pode ser rápido ou não. Será rápido, se a estrutura concebida constituir-se de um modelo estrutural consagrado, como, por exemplo, uma treliça, cujo comportamento é por demais conhecido. No entanto, mesmo sistemas estruturais já conhecidos, quando analisados em conjunto com outros elementos pertencentes à mesma estrutura, podem resultar em modelos mais complexos e que ensejem novas interpretações. Para dar um exemplo muito simples, considere-se o apoio de uma viga sobre um pilar. Neste caso, um modelo aparentemente consagrado de viga apoiada em pilar pode, dependendo da maneira com que for projetada a ligação pilar x viga, permitir diversas interpretações, tais como viga biapoiada ou pórtico. O modelo que melhor representar a realidade será o mais adequado para a análise numérica e, com certeza, levará a uma solução mais econômica e de melhor desempenho. Interpretações muito afastadas do comportamento real ou mesmo erradas podem levar a um super ou subdimensionamento da estrutura. Figura 3a. Vista da passarela com a sugestão de novos apoios Fonte: Wittfoht, 1977

OUT. NOV. DEZ. 2007 ANO XIII, Nº 51 309-314 INTEGRAÇÃO 313 Na fase de modelagem da estrutura, a experiência do profissional, seu bom senso e intuição são de fundamental importância. Profissionais com pouca experiência cometem, muitas vezes, enganos básicos, que felizmente, na maioria dos casos, são absorvidos pelos coeficientes de segurança. Uma formação acadêmica mais voltada para esse tipo de análise seria extremamente desejável, o que nem sempre se encontra, pois as escolas estão, na maior parte, mais voltadas para a análise de sistemas estruturais padronizados e isolados, preocupadas principalmente com sua análise numérica, dando pouca ou nenhuma atenção à questão da análise sistêmica da estrutura e de sua modelagem. A análise do comportamento global da estrutura e uma boa interpretação do seu modelo de comportamento podem fazer com que as soluções se aproximem mais do comportamento real da estrutura, obtendo-se, com isso, melhores resultados estéticos e econômicos. Quando se trata de estruturas complexas e que fogem das convencionais, como no caso da passarela apresentada neste trabalho, o uso de modelos reduzidos, qualitativos em um primeiro instante e quantitativos em um segundo, é de fundamental importância na análise estrutural. Algumas vezes, em função da importância da obra e da disponibilidade financeira, a construção de protótipos em escala real, executados com base em uma análise teórica, serve como fonte para estudo do comportamento real da estrutura, e como verificação das hipóteses utilizadas na análise teórica. Esses estudos servem de feedback para análises teóricas de estruturas futuras que apresentem semelhança com a estudada no protótipo. A análise numérica, atualmente, é elaborada por meio de programas de computador extremamente sofisticados e complexos. Se, por um lado, isso pode ser bom, por outro, pode alijar o usuário, o engenheiro de estruturas, dos processos matemáticos subjacentes ao funcionamento do programa. Isto pode acarretar uma má interpretação dos resultados. O jovem e inexperiente profissional pode, sem uma análise crítica, aceitar cegamente os resultados fornecidos pelo computador, cometendo erros grosseiros, que podem traduzir-se em estruturas de estabilidade duvidosa ou com excessivo uso de materiais. Para lidar com esses programas, é de capital importância que o usuário tenha em mente uma boa previsão dos resultados, quanto à coerência e ordem de grandeza, para que possa detectar possíveis enganos cometidos na informação de dados. Nem sempre resultados inesperados devem-se ao mau manuseio dos dados, a modelagem estrutural mal feita também conduz a esses imprevistos. Nos dias atuais, infelizmente, o mau uso dos computadores em nossa área não é raro. Muitos vêem o computador apenas como uma ferramenta para diminuir trabalho físico, e não de pesquisa, Na verdade, a velocidade e facilidade de manuseio dos computadores devem ser aliadas para a procura de soluções ótimas. Infelizmente o que prolifera, com essa nova tecnologia, são os maus profissionais que vêem o projeto, apenas, como uma tarefa, objetivando assim realizá-la no mais curto prazo. Situação essa que se reflete na qualidade dos trabalhos apresentados e no aviltamento dos honorários profissionais. Com baixos honorários, visam a agradar um cliente, que, de maneira até certo ponto compreensível, só pensa em prazo e custo, e que só tardiamente descobre a má qualidade do serviço que lhe foi prestado. 4. detalhamento Esta é a última fase, mas nem por isso a menos importante. É bastante conhecida a frase que diz o desenho aceita tudo. Portanto, é necessário ficar-se atento ao que se desenha. É de fundamental importância que o projetista conheça o ferramental de execução disponível. Nem sempre um detalhe, aparentemente bem resolvido, tem possibilidade de ser executado; as ferramentas existentes podem ser inadequadas para executá-lo. Outra questão, também muito importante, é a de que o desenho dos detalhes deve levar em conta a possibilidade de transmissão adequada dos esforços, tais como pensados no modelo teórico. Detalhes aparentes e mesmo não aparentes devem apresentar formas esteticamente aceitáveis. Felizmente, detalhes feios são, normalmente, difíceis de serem executados.

314 INTEGRAÇÃO REBELLO A concepção estrutural e a engenharia 5. conclusão Não só a concepção e análise estrutural corretamente elaboradas, e nem só detalhes bem projetados, garantem uma obra de qualidade. Além de todas essas premissas importantes, é necessário que o engenheiro de estruturas pense na boa aplicação dos materiais, em que as perdas sejam minimizadas e a mão-de-obra bem aproveitada. O engenheiro de estruturas deve conhecer bem os processos de execução, saber como os materiais são fornecidos, suas dimensões de mercado e as atividades de cada operário envolvido, para que possa projetar uma estrutura com o mínimo de perdas, tanto de materiais como de tempo. Referência bibliográfica WITTFOHT, H. Puentes Exemplos internacionales. Barcelona: Gustavo Gili, 1977.