MULTICULTURALISMO E UNIVERSALIDADE DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS Amanda Juncal Prudente Mariana Tavares Pedi UENP 1. Direitos fundamentais e humanos: conceito e evolução. 2. Os direitos fundamentais no panorama internacional e a questão do multiculturalismo. 3. Conciliando diversidade e universalidade. 1. Direitos fundamentais: Conceito e evolução. Há a possibilidade de aproximação ou de diferenciação entre Direitos Fundamentais e Direitos Humanos. A aproximação de tais conceitos ocorre no seio da perspectiva constitucionalista, que prega serem os direitos fundamentais os direitos humanos positivados nas constituições de cada Estado, em determinado momento histórico. Percebe-se que a diferença, neste caso, das terminologias é apenas de status, tendo a mesma significação prática. Já a diferenciação, fundamenta-se na perspectiva universalista. Através dela, os direitos humanos são encarados como inerentes à todas as pessoas em qualquer espaço, encontrados em tratados, pactos e convenções. É importante salientar, nesta teoria, que universais, ou seja, abrangente a todos, são os direitos humanos; a terminologia direitos fundamentais traz consigo uma grande diferença quanto ao conteúdo, pois engloba além dos direitos humanos, as características fundamentais típicas de cada cultura, de acordo com suas crenças e tradições. Isto funciona como
uma espécie de teoria dos círculos concêntricos, onde o posicionamento do circulo dos direitos humanos é inscrito no dos direitos fundamentais: tudo que é humano, é fundamental; mas nem tudo que é considerado fundamental é humano, pois está intrinsecamente ligado à cultura de cada região. Conclui-se, com a idéia de Faustino da Rosa Júnior, que quando didaticamente abordados, os direitos humanos atuam no âmbito do direito internacional, enquanto os fundamentais são consagrados pelo direito constitucional no âmbito do direito interno. (2011, online) Depois de analisadas as terminologias, para a melhor compreensão dos direitos fundamentais, observa-se que eles correspondem à positivação da liberdade, valor intrínseco à condição humana. Também são anteriores à constituição, sendo inalienáveis, imprescritíveis, impenhoráveis e intributáveis. São negativos, porque o Estado não pode criar qualquer constrangimento ao individuo, quanto ao seu poder de auto-determinação, liberdade de ação ou de omissão. Postulam garantias institucionais e processuais. Independem de complementação legislativa, tendo eficácia imediata. Abrangem as condições mínimas de existência humana. Há quem defenda que os direitos fundamentais tenham eficácia que valem para todos; são universais. Entretanto, reafirmamos que tais características estão intimamente ligadas aos direitos humanos, pois são estes que correspondem à totalidade dos homens. Em se tratando do contexto histórico, atenta-se para o fato de que os direitos fundamentais, assim como os humanos, sempre existiram, sendo delineados de acordo com o espaço-tempo em que se inseriam. Há de se constatar, contudo, a existência de alguns documentos históricos que marcam a sua positivação. São eles: a Declaração de Independência dos EUA (1776), a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na
Revolução Francesa e a Declaração Universal dos Direitos do Homem das Nações Unidas (1948). A idéia que une esses três documentos é a de que as diferenças sócioeconômicas, culturais, biológicas devem ser consideradas, mas apesar disso devemos encontrar um ponto supremamente importante que una todos os homens, porque são exatamente esses ideais que consagram os direitos humanos. 2.Os direitos fundamentais no panorama internacional e a questão do multiculturalismo. Como foi anteriormente assinalado, alguns documentos marcaram a inserção dos direitos fundamentais no panorama internacional. Há de se atentar, porém, que a Declaração de Independência do EUA (1776) e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão propõem ao mundo a idéia de um direito fundamental baseado em suas próprias concepções do que é fundamental. Equivale a isso dizer que esses documentos tentaram impor ao resto do mundo uma posição vista apenas sob a ótica ocidental. Em um segundo momento, as atrocidades cometidas durante a Segunda Grande Guerra despertaram a atenção do mundo para a necessidade de uma proteção internacional de direitos humanos, haja vista que o reconhecimento dos mesmos em constituições internas não foram suficientes para assegurar a dignidade humana e evitar um conflito de tamanha magnitude. Sendo assim, em 1948 proclamou-se a Declaração Universal dos Direitos do Homem. Segundo Vladimir Brega Filho, não houve concessão ou reconhecimento de direitos, mas proclamação deles, revelando que a sua existência independe de qualquer vontade ou formalidade (2002, p.17, grifo do autor). Em outras palavras, os direitos fundamentais preexistem ao ordenamento jurídico, contudo esse documento talvez represente a primeira tentativa de positivá-los e estendê-los a todos. Tentativa essa, falha, pois a Declaração tem valor apenas moral, já que não
vincula os Estados a sua observância obrigatória. Não foi criado nenhum órgão responsável pela manutenção de tais direitos ou pela punição em caso de seu descumprimento. Nota-se, também, que os direitos em questão configuram-se como fundamentais, quando na verdade os direitos humanos é que deveriam estar postulados, dado o seu poder de abrangência universal. Verifica-se, assim, um choque entre essa configuração da Declaração e o multiculturalismo. Como já explanado, os direitos fundamentais trazem consigo a especificidade do contexto geográfico, cultural e sócioeconômico em que se insere. É exatamente nesse ponto em que se encontra o choque: o mundo não se resume a uma única forma de pensar e agir, mas ao contrario disso, reúne uma quantidade expressiva de culturas e crenças. Basta olhar para o Oriente Médio e perceber o quanto a burca diferencia as muçulmanas das nossas mulheres, ou então que semelhança pode haver, a ponto de se estabelecer os mesmos direitos fundamentais, entre as crianças da Etiópia e as da Europa? Sendo assim, como elaborar um documento único para toda uma multiplicidade de nações? 2.Conciliando diversidade e universalidade: São 194 países e 6.990.470.913 pessoas vivendo no mundo. Como pensa Josué Emilio Möller, quando verificado o pluralismo cultural, revelando e fundamentando a diversidade de visões de mundo, remete-se a reflexões sobre o valor da tolerância em um ambiente compartilhado. (2006, p. 55). É necessário, portanto, a construção de um projeto que caminhe rumo à harmonização cultural do globo, trazendo consigo a eficácia de uma lei no sentido de que vincule de forma obrigatória todos os Estados, estabelecendo inclusive sanções punitivas em caso de seu descumprimento. A única maneira plausível de que tal projeto se concretize, é que cada país abra mão de uma pequena parcela do que julga ser correto, mediante sua
própria crença, encontrando um ponto de equilíbrio que ligue todos os homens pelo que há de mais comum neles: a natureza humana. De fato, existe uma gama de tratados e convenções que tentam postular os direitos humanos em um contexto internacional, contudo, seu ponto falho está em obrigar apenas os países signatários. Faz-se mister a elaboração de uma nova declaração de direitos humanos universais, mas que, diferentemente dos tratados atuais, vincule a todos os países. Contrario também à Declaração de 1948, que funciona como uma Soft Law, deve-se criar órgãos que garantam sua eficácia de forma obrigatória, tal como um Tribunal internacional ligado efetivação dos direitos positivados na Declaração. Fala-se tanto da correlação entre direitos fundamentais e a dignidade humana que se esquece que o real valor da liberdade é ser respeitado dentro das suas diferenças. BIBLIOGRAFIA: ACCIOLY, Hildebrando; BORBA, Paulo Casella; DO NASCIMENTO, G.E. Silva. Manual de Direito Internacional Público. Ed. Saraiva. 2009 BREGA, Vladimir Filho. Direitos Fundamentais na Constituição de 1988. Ed. Juarez de Oliveira. 2002 CASTILHO, Ricardo. Direito Humanos. Ed. Saraiva. 2010 COSTA SOUSA, Mônica Teresa. Direito Internacional Humanitário. Ed. Juruá. 2007
DIAS, Maria Clara; BARRETTO, Vicente de Paulo (organizador).dicionário de Filosofia do Direito. Direitos Humanos. Ed. Unisinos. 2009 LOBO TORRES, Ricardo; BARRETTO, Vicente de Paulo (organizador). Dicionário de Filosofia do Direito. Direitos Fundamentais. Ed. Unisinos. 2009 MOLLER, Josué Emilio. A Fundamentação Ético-Política dos Direitos Humanos. Ed. Afiliada. 2006