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Transcrição:

Revista Latino-Americana de Enfermagem ISSN: 0104-1169 rlae@eerp.usp.br Universidade de São Paulo Brasil Bezerra Rodrigues, Andrea; Corrêa Chaves, Eliane Fatores estressantes e estratégias de coping dos enfermeiros atuantes em oncologia Revista Latino-Americana de Enfermagem, vol. 16, núm. 1, enero-febrero, 2008 Universidade de São Paulo São Paulo, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=281421887004 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe, Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

Rev Latino-am Enfermagem 2008 janeiro-fevereiro; 16(1) Artigo Original FATORES ESTRESSANTES E ESTRATÉGIAS DE COPING DOS ENFERMEIROS ATUANTES EM ONCOLOGIA Andrea Bezerra Rodrigues 1 Eliane Corrêa Chaves 2 Na especialidade oncologia, são muitos os fatores que podem conduzir o profissional de enfermagem ao stress ocupacional. Para tentar controlar essa situação, o indivíduo pode utilizar estratégias de coping, que é um esforço cognitivo e comportamental utilizado frente a evento estressor. Os objetivos desse estudo foram identificar os fatores estressantes para enfermeiros que atuam em oncologia e verificar as estratégias de coping utilizadas pelos mesmos. Foram utilizados dois questionários: um inventário de dados demográficos, construído pela autora, e o inventário de estratégias de coping de Folkman e Lazarus. Os resultados da pesquisa mostram que os fatores considerados mais estressantes para os enfermeiros de oncologia são: o óbito dos pacientes (28,6%), as situações de emergência (16,9%), os problemas de relacionamento com a equipe de enfermagem (15,5%) e as situações relacionadas ao processo de trabalho (15,5%). Na população estudada, a estratégia de coping mais utilizada foi a reavaliação positiva. DESCRITORES: adaptação psicológica; enfermagem; estresse; oncologia STRESSING FACTORS AND COPING STRATEGIES USED BY ONCOLOGY NURSES In the oncology specialty, many factors can result in occupational stress in nursing professionals. As an attempt to controlling this situation, individuals may use coping strategies. Coping is a cognitive and behavioral effort one uses to face a stressful situation. The aims of this study were to identify the stressful factors regarding oncology nurses, and to verify what coping strategies they use. Two questionnaires were used: a demographic data inventory, designed by the researcher, and the Folkman and Lazarus coping strategies inventory. The results showed that the main stressful factors for oncology nurses are patient death (28.6%), emergency situations (16.9%), relationship issues with the nursing team (15.5%), and work-process situations (15.5%). In the studied population, the main coping strategy used was positive reappraisal. DESCRIPTORS: adaptation, psychological; nursing; stress; medical oncology FACTORES ESTRESANTES Y ESTRATEGIAS DE COPING UTILIZADAS POR LOS ENFERMEROS QUE ACTÚAN EN ONCOLOGÍA En la especialidad de Oncología son muchos los factores que pueden conducir al profesional de enfermería al estrés ocupacional. Para tratar de controlar esa situación, el individuo puede utilizar estrategias de coping, que es un esfuerzo cognitivo y de comportamiento utilizado frente a un evento que causa estrés. Los objetivos de este estudio fueron identificar los factores que causan estrés en los enfermeros que actúan en Oncología y verificar las estrategias de coping utilizadas por los mismos. Se utilizaron dos cuestionarios: uno para el inventario de datos demográficos construido por la autora y otro para el inventario de estrategias de coping de Folkman y Lazarus. Los resultados de la investigación muestran que los factores considerados más estresantes por los enfermeros de Oncología son: la muerte de los pacientes (28,6%), las situaciones de emergencia (16,9%), los problemas de relación dentro del equipo de enfermería (15,5%) y las situaciones relacionadas al proceso de trabajo (15,5%). En la población estudiada, la estrategia de coping más utilizada fue la de reevaluación positiva. DESCRIPTORES: adaptación psicológica, enfermería; estrés; oncología médica 1 Enfermeira, Especialista em Enfermagem Oncológica, Doutoranda da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Docente da Faculdade de Enfermagem do Hospital Israelita Albert Einstein, Brasil, e-mail: andreabrodrigues@ig.com.br; 2 Enfermeira, Bacharel em Filosofia, Doutora em Psicologia, Docente da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil, e-mail: ecchaves@usp.br

Fatores estressantes e estratégias... INTRODUÇÃO Rev Latino-am Enfermagem 2008 janeiro-fevereiro; 16(1) CASUÍSTICA E MÉTODO Dada a complexidade das demandas assistenciais do paciente oncológico, diversos estudos têm tratado dos problemas a que estão expostos os profissionais de saúde, em especial a equipe de enfermagem que lida com esse grupo de pacientes. O exercício da enfermagem em oncologia requer atividades de controle e exercício mental maiores que em outras áreas, uma vez que implica lidar com doença grave, cuidar de pacientes fora de possibilidades terapêuticas e terminais, a necessidade de cuidados intensivos e também prolongados e a elevada proximidade com a família, com vivência de situações emocionais desgastantes para o profissional. Esses fatores podem conduzir o profissional que atua na área ao stress ocupacional (1-3). Para tentar controlar uma situação de stress, o indivíduo pode utilizar estratégias de coping. O coping foi definido como um esforço cognitivo e comportamental, realizado para dominar, tolerar ou reduzir as demandas externas e internas. Para os autores todo evento é submetido à avaliação cognitiva do sujeito que a experimenta. Essa avaliação é um processo de categorização de um encontro, com o foco no propósito ou no significado desse encontro (4). A forma com que o indivíduo escolhe suas estratégias de coping está determinada, em parte, por seus recursos internos e externos, os quais incluem saúde, crenças, responsabilidade, suporte, habilidades sociais e recursos materiais. Numa perspectiva cognitivista, foi proposto um modelo que divide o coping em duas categorias funcionais: coping focalizado no problema e coping focalizado na emoção. No primeiro, há a procura de estratégias que derivam de processos defensivos como evitar, distanciar-se e buscar valores positivos em eventos negativos como forma de diminuir a importância emocional do estressor. Já o coping focalizado no problema a pessoa tenta definir o problema que vivencia, procurando soluções alternativas e optando entre elas (4). São os seguintes os fatores de coping: confronto, afastamento, autocontrole, suporte social, aceitação da responsabilidade, fuga-esquiva, resolução do problema e reavaliação positiva. Os objetivos do presente estudo foram: identificar os fatores estressantes para enfermeiros que atuam em oncologia e verificar as estratégias de coping utilizadas pelos mesmos. O presente estudo utiliza os recursos da abordagem quantitativa e é do tipo descritivoexploratório. A investigação foi desenvolvida em unidades de internação de oncologia de cinco hospitais de grande porte, localizados no município de São Paulo. A população da pesquisa foi constituída por enfermeiros assistenciais, há, no mínimo, um ano. Para atender os objetivos, foram utilizados dois questionários auto-aplicáveis. O primeiro questionário refere-se ao inventário de dados demográficos, construído pela autora, e o segundo questionário é o Inventário de estratégias de Coping de Folkman e Lazarus, adaptado para a língua portuguesa (5). Trata-se de questionário que contém 66 itens, englobando pensamentos e ações que as pessoas utilizam para lidar com demandas internas ou externas de um evento estressante específico, além de questões distrativas, que não são pontuadas na escala de conversão. Todas as questões são pontuadas pela escala de Likert, variando de 0 - não utilizei essa estratégia; 1 - usei um pouco; 2 - usei bastante; 3 - usei em grande quantidade. A escala consiste de 8 diferentes fatores sugeridos pela análise fatorial: confronto, afastamento, autocontrole, suporte social, aceitação da responsabilidade, fugaesquiva, resolução de problema e reavaliação positiva. A pesquisa foi conduzida após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa das instituições, autorização da gerência dos hospitais e os participantes terem assinado o termo de consentimento livre e esclarecido, concordando em participar da pesquisa. Os entrevistados foram orientados a pensar em uma situação profissional passada ocorrida em uma semana típica de trabalho, que tenha sido motivo de preocupação e stress. Essa semana foi, obrigatoriamente, a semana anterior à entrevista. O enfermeiro procedeu, então, ao preenchimento do Inventário de Coping, onde escolhia a pontuação de cada frase que mais se adequou à maneira como enfrentou a situação descrita por ele no início do inventário. Após a coleta, todas as informações foram inseridas em um banco de dados no programa Excel, versão 2002. Para verificar a confiabilidade dos instrumentos da pesquisa, optou-se por utilizar o coeficiente de correlação alfa de Cronbach. O instrumento foi admitido como confiável para utilização e com consistência interna quando o respectivo valor do alfa de Cronbach fosse maior que 0,7.

Rev Latino-am Enfermagem 2008 janeiro-fevereiro; 16(1) RESULTADOS Tabela 1 - Distribuição da população de enfermeiros oncológicos, segundo sexo, faixa etária, estado civil, possuir título de especialista em oncologia e opção por trabalhar em Oncologia. São Paulo, SP, 2005 Variável N % Sexo Masculino 4 5, 2 Feminino 73 94, 8 Faixa etária (anos) 20 a 30 26 33, 8 31 a 40 39 50, 6 41 a 50 12 15, 6 Estado civil Casado 33 42, 9 Solteiro (sem companheiro) 31 40, 3 Solteiro (com companheiro) 10 12, 9 Divorciado 3 3, 9 Título de especialista em oncologia Sim 23 29, 9 Não 54 70, 1 Opção por oncologia Sim 56 72, 7 Não 21 27, 3 Pode-se verificar que a população caracterizou-se por ser, em sua maioria, composta por mulheres (94,8%), na faixa etária compreendida entre trinta e um e quarenta anos de idade (50,6%). O estado civil predominante foi o casado (42,9%). A maioria da população não possui título de especialista em oncologia (70,1%) e optou por trabalhar nessa especialidade (72,7%). Tabela 2 - Coeficiente de fidedignidade alfa de Cronbach para os fatores de coping. São Paulo, SP, 2005 Fatores N de iten s Coeficiente de Cronbac h F1 (confronto) 6 0,54 1 F2 (afastamento) 6 0,55 6 F3 (auto-controle) 7 0,61 7 F4 (suporte social) 6 0,53 0 F5 (aceitação da responsabilidade) 4 0,61 0 F6 (fuga-esquiva) 8 0,72 7 F7 (resolução de problema) 6 0,73 2 F8 (reavaliação positiva) 7 0,75 2 Foram considerados valores com alfa de Cronbach acima de 0,70 como adequados. Nesta análise, obteve-se coeficiente de Cronbach superior a 0,70 para os seguintes fatores: fuga-esquiva (0,727), resolução de problema (0,732) e reavaliação positiva (0,752) como se pode observar na Tabela 2. Tabela 3 - Distribuição da população de enfermeiros oncológicos, segundo a situação estressora para utilização de coping. São Paulo, SP, 2005 Situação estressora N % Óbito 22 28, 6 Emergência 13 16, 9 Relacionamento com equipe de enfermagem Fatores estressantes e estratégias... 13 16, 9 Processo de Trabalho 12 15, 5 Relacionamento com paciente ou família 10 13, 0 Relacionamento com médico 7 9, 1 Total 100 Na Tabela 3 aparece discriminada a situação estressora descrita pelos enfermeiros, o número de enfermeiros que percebe a situação como estressora e a porcentagem desses enfermeiros. As principais situações estressoras que mobilizam os enfermeiros para o coping são o óbito dos pacientes (28,6%), as situações de emergência (16,9%), os problemas de relacionamento com a equipe de enfermagem (16,9%) e as situações relacionadas ao processo de trabalho (15,5%). Dentre as situações de emergência foram citadas a parada cardiorespiratória, as reações anafiláticas durante uso de quimioterápicos e a piora no quadro clínico do paciente. As situações descritas pelos enfermeiros, relacionadas à convivência com a equipe de enfermagem, envolvem discussões quanto a algumas condutas do enfermeiro com relação ao paciente que não eram aceitas pela equipe e elaboração da escala de serviço. Tabela 4 - Distribuição dos escores dos fatores de coping apresentados pelos enfermeiros. São Paulo, SP, 2005 Fatores de Coping N Mínim o Máxim o M édia Desvio Padrã o Confronto 0 14 6,01 3,23 5 Afastamento 0 15 6,26 3,09 1 Autocontrole 0 18 9,86 3,97 9 Suporte social 0 17 8,76 3,17 9 Aceitação da responsabilidade 0 9 3,71 2,68 2 Fuga-esquiva 0 18 6,07 4,62 0 Resolução de problema 2 18 9,91 3,94 7 Reavaliação positiva 0 20 10,3 4 4,96 0 Pode-se constatar que a estratégia de coping mais utilizada pelos enfermeiros é a reavaliação

Fatores estressantes e estratégias... Rev Latino-am Enfermagem 2008 janeiro-fevereiro; 16(1) positiva (10,34), seguida da resolução de problema (9,91) e autocontrole (9,86). No entanto, para esse estudo, a estratégia autocontrole não foi considerada com valor de alfa de Cronbach adequado (0,617). A estratégia de coping menos utilizada pelos enfermeiros foi a aceitação da responsabilidade. DISCUSSÃO A área de oncologia é carregada de peculiariades que, freqüentemente, são desconhecidas pelo profissional enfermeiro que não possui formação específica na área no decorrer do ensino superior, uma vez que, na maior parte das instituições de ensino brasileiras, não é abordado o ensino da cancerologia no decorrer do curso de graduação em enfermagem. Assim, a verdadeira opção pela oncologia pode ocorrer após a experiência profissional na área, como foi averiguado no estudo de Ramalho, realizado com enfermeiros que atuam em um hospital especializado no atendimento a crianças oncológicas de São Paulo. O profissional relata ainda se sentir especial e possuir proteção divina para enfrentar os fracassos como desafios (6). Embora a maior parte dos enfermeiros (72,7%) tenha optado pela especialidade, 70,1% deles não possui formação específica em oncologia. Esse é um dado relevante, uma vez que na especialidade existe uma série de dispositivos venosos muito peculiares, protocolos de condutas específicos para cada tipo de câncer e tratamentos, como a radioterapia, a quimioterapia e a imunoterapia que demandam conhecimento específico. Esses assuntos, na maior parte das instituições de ensino brasileiras, não são abordados no decorrer do curso de graduação em enfermagem, levando o profissional recémformado, que deseja atuar na área, a procurar um curso de especialização. Não foi o que se verificou nesta pesquisa, onde a grande maioria dos enfermeiros atuantes na área não possui formação específica em oncologia. Provavelmente, esses enfermeiros adquiriram conhecimento no decorrer do desenvolvimento de suas funções assistenciais na prática. Deve ser considerado que os profissionais possuem tempo de atuação em oncologia médio de 72,7 meses, o que permitiria proporção maior de enfermeiros especialistas na área. Para a população de enfermeiros deste estudo, as situações que mais geram stress no trabalho foram os óbitos dos pacientes (28,6%), as situações de emergência (16,9%), os problemas de relacionamento com a equipe de enfermagem (15,5%) e as situações relacionadas ao processo de trabalho (15,5%). Assim como neste estudo, algumas situações aparecem comumente percebidas como estressantes para os enfermeiros em outros estudos como a relação com pacientes fora de possibilidades terapêuticas e a morte dos pacientes, as situações inesperadas e novas, a preparação inadequada para o papel a desempenhar, os conflitos interpessoais, a falta de pessoal, a demora no atendimento médico e a carga excessiva de trabalho (7-9). Dentre as situações de óbito descritas pelos enfermeiros, pode-se destacar aquelas em que o óbito ocorreu em crianças ou adolescentes. Foram descritas essas situações por seis (27,2%) dos vinte e dois enfermeiros que relataram sentir-se estressados com o óbito. A morte da criança e do adolescente é interpretada como interrupção no seu ciclo biológico e isso pode provocar na equipe sentimentos de impotência, frustração, tristeza e angústia (10). Os problemas de relacionamento citados, sejam intradisciplinares, interdisciplinares ou mesmo com o paciente e seus familiares, é preocupante, pois permeia todas as atividades desenvolvidas pelos enfermeiros, seja na assistência ou no gerenciamento. O compartilhamento de vivências, que poderia possibilitar canal de identificação e reflexão sobre a prática profissional em oncologia, pode ser dificultado pelos problemas de relacionamento intra e interdisciplinares referidos pelos enfermeiros. Todos esses fatores considerados estressantes pelos enfermeiros, que atuam em oncologia devem ser considerados potenciais desencadeadores da síndrome de burn out, síndrome caracterizada por desgaste emocional, despersonalização e sentimento de incompetência profissional, que pode conduzir o enfermeiro até ao abandono da especialidade. Especificamente, na área de oncologia, essa é uma repercussão muito negativa já que ainda existe escassez de profissionais especialistas. Preocupação com relação às conseqüências do burn out é a percepção dos pacientes quanto à

Rev Latino-am Enfermagem 2008 janeiro-fevereiro; 16(1) Fatores estressantes e estratégias... qualidade do cuidado recebido, que foi investigada e descrita em pesquisa realizada com 711 enfermeiros, relacionando o desenvolvimento de burn out com a satisfação quanto ao cuidado prestado para 605 pacientes que estavam hospitalizados em dezesseis diferentes unidades de um hospital. Nas unidades onde os enfermeiros apresentavam desgaste emocional e despersonalização, os pacientes referiram menos satisfação com a qualidade do cuidado prestado (11). Por outro lado, o coping poderia vir a ser uma forma de evitar o stress profissional. No entanto, na população estudada, o coping focado na emoção é o mais utilizado, essencialmente a reavaliação positiva, onde o indivíduo tenta reestruturar o acontecimento, com o intuito de encontrar alguns aspectos mais favoráveis, fala coisas a si próprio com a intenção de amenizar a gravidade da situação e concentra-se nos aspectos positivos da situação, como forma de amenizar a carga emotiva do acontecimento, buscando alterar a situação. Outro coping utilizado foi o coping focado no problema, a resolução de problema. Alguns autores referem que certos tipos de coping são mais úteis do que outros, enfatizando que o coping focado no problema pode levar à redução do stress (12). Algumas subescalas de coping como, por exemplo, a aceitação da responsabilidade e o autocontrole apresentaram baixa confiabilidade para a população estudada, segundo o índice alfa de Cronbach. Esses índices variam conforme a população estudada, cabendo ressaltar que as estratégias de coping podem ser aprendidas. Na verdade, não existe coping correto ou errado, existe coping efetivo ou não. A escolha do tipo de coping é muito individual. Enquanto, para algumas pessoas, ter a possibilidade de utilizar técnicas de relaxamento pode ter um ótimo efeito, para outras pode ser altamente estressante. Por isso, respeitar as características individuais é de extrema importância. É necessário que novos estudos sejam desenvolvidos com enfermeiros que atuam em oncologia no sentido de avaliar correlações entre as estratégias de coping e variáveis como personalidade, experiência prévia e suporte social, fatores implicados na utilização das estratégias de coping. Conclui-se com esse estudo que as situações mais estressantes para a amostra de enfermeiros são os óbitos dos pacientes (28,6%), as situações de emergência (16,9%), os problemas de relacionamento com a equipe de enfermagem (15,5%) e as situações relacionadas ao processo de trabalho (15,5%). Na população estudada o coping focado na emoção é o mais utilizado, essencialmente a reavaliação positiva. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Chacón Roger M, Grau Abalo J. Burn out em enfermeros que brindan atención a pacientes oncológicos. Rev Cuba oncol 1997; 13(2):118-25. 2. Penson RT, Dignan FL, Canellos GP, Picard CL, Lynch TJ. Burn out: Caring for the caregivers. Oncologist 2000; (5):425-34. 3. Medland J, Howard-Ruben J, Whitaker E. Fostering psychosocial wellness in oncology nurses: addressing burn out and social support in the workplace. Oncol Nurs Forum 2004; 31(1):47-54. 4. Folkman S, Lazarus RS. Personal control and stress and coping processes: A theoretical analysis. Personality and Social Psychol 1984; 46:839-52. 5. Savóia MG, Santana PR, Mejias NP. Adaptação do inventário de estratégias de coping de Folkman e Lazarus para o português. Psicologia USP 1996; 7(1/2):183-201. 6. Ramalho MAN. Conhecendo as vivências dos cuidadores: estudo exploratório com profissionais da área de oncologia pediátrica. [dissertação]. São Paulo (SP): Escola de Ciências da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo; 2005. 7. Dewe JP. Identifying the causes on nurses stress: a survey of New Zeland nurses. Work Stress 1983; 1(1):15-24. 8. Barros ALBL, Humerez DC, Fakih FT, Michel JLM. Situações geradoras de ansiedade e estratégias para seu controle entre enfermeiras: estudo preliminar. Rev Latino-am Enfermagem 2003 setembro-outubro; 11(5):585-92. 9. Mendes AM, Linhares NJR. A prática do enfermeiro com pacientes da UTI: uma abordagem psicodinâmica. Rev Bras Enferm 1996; 49:267-80. 10. Spíndola T, Macedo MCS. A morte no hospital e seu significado para os profissionais. Rev Bras Enferm 1994; 47(2):108-17. 11. Leiter MP, Harvie P, Frizzell C. The correspondence of patient satisfaction and nurse burn out. Soc Sci 1998; 47(10):1611-17. 12. Jones MC, Johnston DW. Distress, stress and coping in first year student nurses. J Adv Nurs 1997; 26:475-82. Recebido em: 25.9.2006 Aprovado em: 17.10.2007