MODERNIZAÇÃO OU MONITORAMENTO? MOVIMENTOS DISCURSIVOS DA POLÍTICA DE RESPONSABILIZAÇÃO EDUCACIONAL EM PERNAMBUCO



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Transcrição:

MODERNIZAÇÃO OU MONITORAMENTO? MOVIMENTOS DISCURSIVOS DA POLÍTICA DE RESPONSABILIZAÇÃO EDUCACIONAL EM PERNAMBUCO Juliana Camila Barbosa Mendes 1 Resumo Este trabalho se desenvolve no âmbito da pesquisa de doutorado, propondo um estudo sobre política avaliativa e a sua relação com a questão curricular. Possui a intenção de investigar os movimentos da Política de Responsabilização Educacional, descrita como modernização da gestão pública para o accountability a partir da promulgação da Lei 13.273 (PERNAMBUCO, 2007; 2012). Este é o foco inicial de pesquisa por representar uma quebra de paradigma em relação à ênfase no quesito avaliação como determinante na qualidade do ensino. Não se trata, porém, de uma análise linguística, mas a busca por deslizamentos que endereçam sentidos para pensar a articulação entre responsabilização e qualidade, que acaba por delinear discursivamente um sentido para a política educacional. Abordando essa mudança política da Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco (SEE/PE), entendida como discurso, um espaço de significações e negociação, por meio das diferentes demandas e enunciações que emergem dessa proposta. Dentro do campo investigativo, buscam-se os sentidos da política de responsabilização, tendo como evidência maior as metas, indicadores e sistemas de bonificação que advém da lógica accountability e a discussão produzida por esse imbricamento entre política de avaliação e currículo, que vem ocorrendo no estado de Pernambuco, desde 2007. O modelo de análise proposto por Ball (1992), articula a política como texto e discurso em dimensões simultâneas, salientada pela abordagem do Ciclo de Políticas, o que possibilitaria explicitar os sentidos que estão sendo constituídos ao se relacionar qualidade social e responsabilização, alinhados à discussão sobre ressignificação da produção curricular a partir da política de avaliação. No campo discursivo, tendo a pesquisa em diálogo com perspectiva teórica pós-estruturalista de Homi Bhabha, bem como o aparato teórico-político construído por Ernesto Laclau, se faz necessário perceber como o discurso da política de responsabilização incorpora posições simultâneas, metafóricas, ao tentar garantir a qualidade através 1 Universidade Federal de Pernambuco Programa de Pós Graduação em Educação PPGE/UFPE

de um modelo e, metonímicas, por marcar a ausência da qualidade pelo mesmo, percebendo também quais processos de articulação permitem a hegemonização de determinados sentidos. Palavras-chave: Avaliação; Política de Responsabilização; Qualidade. Introdução O presente texto traz como ponto discussão a relação entre a produção de política e a avaliação. Possui a intenção de investigar os movimentos da Política de Responsabilização Educacional da Secretaria de Educação do Estado de Pernambuco (SEE/PE), descrita como modernização da gestão pública para o accountability, a partir da promulgação da Lei 13.273 (PERNAMBUCO, 2007; 2012). Este é o foco inicial da pesquisa por representar uma quebra de paradigma em relação à ênfase no quesito avaliação como determinante na qualidade do ensino e ao mesmo tempo seu monitoramento. Dentro do campo investigativo sobre qualidade da educação, a partir das pesquisas que exploram política de avaliação, a proposta é não levar ao estreitamento a discussão sobre responsabilização hoje, que defino como um contexto de monitoramento para o campo do educacional. Defendo a ideia de que a pesquisa permite um avanço, ao buscar os sentidos da política de responsabilização, tendo como evidência maior as metas, indicadores e sistemas de bonificação que advém da lógica accountability e a discussão produzida por esse imbricamento entre política de avaliação e currículo, que vem ocorrendo no estado de Pernambuco, desde 2007. A imprecisão dessa política está no atravessamento discursivo de uma grandiosa rede de educação a partir da ideia qualidade com equidade, excluindo da cadeia discursiva a diferença. Ao propor esse estudo, questiono essa dupla centralidade entre qualidade social e accountability, com a tarefa de compreender as articulações discursivas que hegemonizam um sentido para a Política de Responsabilização Educacional. Essa questão se desdobra em objetivar a análise dos deslocamentos de sentido da política, como estratégia de legitimação de conhecimentos e práticas, bem como na análise dos sentidos do projeto educativo e os discursos que estão sendo constituídos ao se relacionar qualidade e responsabilização que, no entanto, permanecem circunscritos nessa política.

E sigo indagando que o sentido possível de qualidade social no processo de globalização, se dá de forma sitiada. Existe, uma falsa correlação de que pelo fato da responsabilização se dar na pressão por eficiência e eficácia das escolas, na medida em que a eficiência dos professores melhorar, a avaliação potencialmente irá elevar a produtividade em termos de aprendizagem e, consequentemente, aumentar o retorno da educação descrita de qualidade. Logo, a política de responsabilização torna-se foco de análise neste momento, por entender que é a partir dessas políticas que se fixam sentidos hegemônicos para qualidade da educação, o que ressalta sua dimensão discursiva a ser investigada. Política de Responsabilização: entre a modernização e o monitoramento A importância que a avaliação vem tomando nas políticas justifica-se pela busca de melhoria da qualidade, em resposta às solicitações do mercado, às agências de fomento e órgãos internacionais. A centralidade da avaliação pode ser vista ao longo das transformações na trajetória das políticas curriculares para a melhoria do sistema educacional. A política de aumento da qualidade tem se fixado na elaboração de inúmeras propostas curriculares centradas em sistemas de avaliações que regulam a educação, bem como seu delineamento curricular. Do mesmo modo, a necessidade de justificar aos contribuintes os resultados alcançados pela escola, surgem condições sociais de implantação de mecanismos de responsabilização, accountability, como resposta administrativa relacionada ao maior controle do que se ensina e como se ensina nas escolas públicas. A opção por responsabilização no uso do termo accountability, quando também o mesmo se refere à prestação de contas, indica muito mais do que a existência de um sistema de divulgação pública de resultados sobre a escola, indica também que sua força está na imputação de responsabilidade, ao exigir uma justificação pedagógica e administrativa da ação educativa (AFONSO, 2000, p. 44). Este modelo se estrutura como um novo paradigma para a gestão do sistema de ensino estadual de Pernambuco e como uma forma de responder ao desafio de ofertar uma educação pública de qualidade social como direito fundamental de todas as pessoas, fundamentada no respeito aos direitos humanos, na equidade, na relevância, na pertinência, na eficácia e na eficiência. (PERNAMBUCO, 2012, p.06)

Neste sentido, a SEE entende que o objetivo principal de um sistema de ensino é ofertar uma educação pública de qualidade social como direito fundamental de todas as pessoas, alicerçada no respeito aos direitos humanos, na equidade, na relevância e na pertinência e tendo, como pressupostos operacionais, a eficácia e a eficiência. (PERNAMBUCO, 2012, p.20) A pretensão por parte dos órgãos de gestão em atingir uma qualidade social, em determinadas condições de um controle severo da organização escolar, conduz à anulação dos espaços de relativa autonomia. Tendo em vista a necessidade de um controle total da vida da escola e a confluência forçada de objetivos e projetos educacionais, para serem depois medidos em resultados quantificáveis, essa conjuntura se transforma numa ameaça à autonomia dos professores e à criação pedagógica. Assim, a avaliação aparece como um prérequisito para que seja possível a incorporação desses mecanismos, algo capaz de criar índices e medir performances com vista a níveis internacionais. E o que irá marcar esse discurso é a noção de eficiência tomada ao campo produtivo e que remete aos conceitos de competitividade e êxito, ou seja, um sistema educacional é tido como eficiente se é competitivo e se garante êxitos mensuráveis. Seja como for, existe uma concordância quanto às avaliações externas para medição de êxitos e as consequentes bonificações, como constituinte de uma política que controla a qualidade da educação oferecida pelas escolas. É a partir desta concepção reducionista que se justifica o uso de uma política de responsabilização para medir o grau de eficiência da instituição escolar, bem como todo o conjunto que pertence ao sistema. Neste contexto, a credibilidade dada aos indicadores mensuráveis passa a ser a base paradigmática das mudanças neoliberais mais evidentes nas políticas e práticas avaliativas. A avaliação passou a servir como instrumento para introduzir a lógica de mercado na esfera do Estado e da educação pública. No que diz respeito à educação pública, a expressão neoconservadora se dá na emergência do Estadoavaliador, já em termos neoliberais o mais importante terá sido a introdução de mecanismos de mercado. Essas dimensões articulam-se de forma a encontrar na prática avaliativa a capacidade de dar conta dessas particularidades, a avaliação fica em desequilíbrio entre o pilar da responsabilização e da emancipação entendida como projeto social da modernidade.

A compreensão da política como texto e discurso considera o texto como as representações, propostas e intervenções nas práticas, quanto à política como discurso, compreende-se como a esfera de produção de conhecimentos, efeitos que fornecem a moldura de interpretação das políticas (RAMOS et al, 2011, p. 76). Logo, o foco da análise incide sobre o discurso da política e sobre essa construção política ressignificada a cada contexto e ao longo do tempo, estabelecendo essa relação entre os textos da política e o seu discurso. Envolve identificar processos de resistência, acomodações, subterfúgios e conformismo dentro e entre as arenas políticas, os delineamento de conflitos e as disparidades entre os discursos nessas arenas (MAINARDES, 2006, p. 96). Isto representa a possibilidade de ampliar a visão de política como estadocêntrica, que favorece a investigação com enfoque na educação quanto às políticas de responsabilização. Como política cultural é uma luta discursiva pela constituição de representações que envolve negociação, isto é, articulação discursiva na qual alguns grupos sociais particulares buscam defender determinadas demandas curriculares e para tal constituem representações. É com esta significação de currículo, em que se confere centralidade aos conceitos de poder e de cultura, que conectamos os aportes teóricometodológicos de Stephen Ball a teoria do discurso de Ernesto Laclau, visando a superar as lacunas que o ciclo contínuo de políticas apresenta. [...] Embora os dois autores concordem com a ideia de que o social deve ser percebido a partir da lógica do discurso, para Laclau, discurso deve ser entendido como uma categoria que une palavras e ações, que tem natureza material e simbólica simultaneamente, na medida em que o material não existe separado de sua significação. Discurso é prática daí a ideia de prática discursiva uma vez que quaisquer ações empreendidas por sujeitos, identidades, instituições são ações de significação. (LOPES;OLIVEIRA, 2011, p.27-31) Cabe, portanto, discutir essa prática-política educativa como ato enunciativo e social, interrupto e provisório e num esforço para ver além da palavra responsabilização, mas atrás do que diz um discurso, há o que ele quer dizer, e, atrás do que quer dizer, há ainda outro querer dizer, e nada será nunca será esgotado (FRANGELLA; BARREIROS, 2010, p. 236). Para isso, trabalhar na perspectiva discursiva coloca como central nessa pesquisa o entendimento dos processos que amarram essa política de responsabilização, a partir da qualidade social atrelada ao accountability e o que se concebe como realidade dessa significação discursiva. Pois, ainda que este estudo indique a representação dessa formulação política, sempre haverá o privilégio de ressignificação das políticas.

[...] ao entender o discurso como uma unidade de significação que vai além da frase, isto é, ao entender o discurso como um conjunto de regras de produção social de sentido, confere centralidade à dimensão da significação e ao caráter constitutivo da realidade e potencializa o conceito de política. Assim, discurso é uma consequência de práticas políticas articulatórias que unem palavras e ações, no sentido de produzir sentidos que vão disputar espaço no social. Com isto, defendemos que a constituição de um discurso hegemônico nas políticas curriculares resulta de uma rede de processos políticos articulatórios. (BURITY apud LOPES; OLIVEIRA, 2011, p.32) Nesse sentido, a proposta de uma política curricular é entendida como arena de lutas e embates para hegemonizar uma concepção de avaliação e qualidade, visando orientar a transformação do sistema educacional para alcançar a chamada modernização, através do consenso conflituoso da responsabilização. Percepções iniciais da pesquisa num terreno discursivo híbrido Dessa maneira é possível compreender a criação de sentidos para qualidade nos limites desse discurso, produzido na representação da política de responsabilização. Entende-se que a necessidade de significação da qualidade social pode ser marcada pela própria necessidade de significar as demandas sociais, aliadas às ações pedagógicas, o que, por conseguinte, acaba por delinear as características do sistema de ensino. A partir do discurso presente nos documentos oficiais e que de certo modo sugere uma constituição curricular reguladora, enunciada nessa relação, delimitada não só pelo accountability, mas também pelos aparatos pedagógicos utilizados na rede. Assim, pode-se evidenciar que a política de responsabilização traz marcas de sentidos que se equivalem de forma contingencial em torno de um discurso, aqui definido pela demanda por qualidade social, isto é, hibridizando um sentido hegemônico, autodeterminado do accountability em relação a um exterior constitutivo ao qual se opõe, no caso em questão, à ideia de uma falta de qualidade. Num movimento articulatório de representação universal, uma vez que ele é produzido na particularidade de um discurso político: um sentido de qualidade aglutinado à equidade, mas que é traduzido como medida. A qualidade social da educação se aproxima de uma visão econômica associada à necessidade de padrões e mensuração da eficiência e da eficácia dos sistemas educativos, como estratégia para atingir a equidade, a partir da padronização dos processos. Considerando a questão da qualidade como uma

questão política e assumindo a polissemia do termo, os significados em disputa para um projeto hegemônico acabam por construir articulações distintas em torno da demanda por qualidade. Nessa perspectiva duas vertentes de qualidade se antagonizam numa relação híbrida entre o termo social e responsabilização, por uma educação com equidade. Os padrões discursivos associados aos sentidos de qualidade, ainda que de forma antagônica, são: eficácia, eficiência e equidade. Criase uma representação de qualidade a partir da tradução de discursos, que por vezes se aproximam dos objetivos da avaliação, ora visando à produtividade do ensino, ora por uma educação que promova transformação social. Desse modo são estabelecidos critérios diferenciados para a promoção de igualdade educacional, qualidade torna-se um termo ambíguo com funções significativas diferenciadas dentro de um mesmo sistema discursivo, utilizada num arranjo estratégico para significação política. Para além da demanda comum por qualidade, podemos perceber um processo de construção de significação articulados pela ideia de falta ou melhoria, para atender a uma delimitação discursiva que distingue a qualidade atribuída à educação voltada para a justiça social. Ainda que o sentido produzido no texto político seja contingente e provisório, pois inclui relações de poderes assimétricos (LOPES, 2011, p. 35) na arena política. A análise dos textos, a partir de uma definição política como discursopráticas que constituem o objeto do qual se fala, representa investigar as regras que norteiam a prática. Logo, os efeitos da política como texto e discurso são contextuais, são múltiplos de sentidos e significados em disputa. Portanto, o discurso só se estabelece como totalidade em decorrência de uma prática articulatória, os sentidos do texto são produzidos na relação com o complexo discursivo (LOPES, 2011). Esclareço que o foco de análise na dimensão textual não desconsidera o sentido da prática, por entender que estes sentidos estão hibridizados aos sentidos em disputa, nos demais contextos de produção da política e consequentemente expressos nas propostas curriculares (LOPES, 2011, p. 44). E quando remeto à concepção de tradução e negociação, faço-o na perspectiva de que esta pode significar outro lugar cultural e político de enfrentamento, ao trazer a possibilidade de articulação de elementos contraditórios em uma construção que não é nem um nem outro, mas um híbrido (FRANGELLA; BARREIROS, 2009, p. 244).

Logo, o significado de qualidade e os instrumentos apropriados para avaliá-la podem ser vistos como espaços de poder e de conflito. Assim, entendemos que as políticas curriculares são também discursos, práticas constituídas por lutas e embates em torno de significados e/ou sentidos, em que o campo curricular compreende mecanismos de hibridização, na medida em que é possível encontrar discursos híbridos, ou seja, discursos que não assumem uma única posição, mas que se constituem de diferentes posições que concorrem e lutam por legitimidade, que envolvem tradução e uma produção cultural contínua. A se considerar... Numa época de maior participação e controle sobre as políticas de educação, a relação que associa avaliação e responsabilização, faz com que a avaliação tenha maior visibilidade pelos resultados escolares obtidos através dos exames estandardizados. Esta prática acaba por contribuir para uma associação de conceitos diferenciados. Afinal, se a prestação de contas pelos resultados obtidos pressupõe avaliação, esta última não deveria necessariamente implicar tão somente em prestação de conta. Assim, qualquer tipo de responsabilização tenderá a condicionar as modalidades de avaliação que servirão para verificar os resultados dos sistemas educativos, bem como a preparação que os alunos deverão ter, suas aquisições acadêmicas e o seu nível de conhecimento. E o que irá marcar esse discurso é a noção de eficiência tomada ao campo produtivo e que remete aos conceitos de competitividade e êxito, ou seja, um sistema educacional é tido como eficiente se é competitivo e se garante êxitos mensuráveis. Seja como for, existe uma concordância quanto às avaliações externas para medição de êxitos e as consequentes bonificações, como constituinte de uma política que controla a qualidade da educação oferecida pelas escolas. É a partir desta concepção reducionista que se justifica o uso de uma política de responsabilização para medir o grau de eficiência da instituição escolar, bem como todo o conjunto que pertence ao sistema. Logo, o significado de qualidade e os instrumentos apropriados para avaliá-la podem ser vistos como espaços de poder e de conflito. A política de responsabilização como condição para accountability, hoje se tornou um instrumento vinculado à melhoria na educação, de modo que essa

associação do qual devemos suspeitar, definiria a qualidade do sistema de ensino de acordo com o sistema de avaliação que é utilizado, pois a centralidade da avaliação está não apenas em mensurar, mas também em garantir tal qualidade social. E assim, a atual política de responsabilização tenta se legitimar por meio da prescrição de uma perspectiva calcada na qualidade pela homogeneidade. Assim, o discurso da política de responsabilização incorpora posições simultâneas, metafóricas, ao tentar garantir a qualidade através de um modelo e, metonímicas, por marcar a ausência da qualidade pelo mesmo. Logo, conviver com essa qualidade fetichizada significa admitir certo hibridismo, além desta qualidade não ser tão nítida, ainda resta o traço do incômodo da não certeza que ao mesmo tempo questiona, mas também impulsiona outra produção curricular. Pressupõe o reconhecimento anterior da existência daquilo que é recusado, o objeto fetichizado qualidade que está em constante estado de sítio. Referências AFONSO, Almerindo J. Avaliação educacional: regulação e emancipação para uma sociologia das políticas avaliativas contemporâneas. São Paulo: Cortez, 2000. BALL, S.; BOWE, R.; GOLD, A. Reforming Education & Changing Schools: case studies in policy sociology. London, New York: Routledge, 1992. BARRETO, Edna A. Hibridismo e ambivalência na análise de política de currículo: lutas por significação. Revista Teias, [online], v. 10, n. 19, p. 17, 2009. BHABHA, Homi. O local de cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2001. FRANGELLA, Rita de Cássia P.; BARREIROS, Débora. Currículo como enunciação: discurso e produção curricular. In: MACEDO, Elizabeth; MACEDO, Roberto Sidnei; AMORIM, Antônio Carlos (Orgs.). Discurso, texto, narrativa nas pesquisas de currículo. Campinas: FE/Unicamp, 2009. p. 66-76. LACLAU, Ernesto. Emancipação e diferença. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2011. LOPES, Alice Casimiro. Políticas de Currículo: questões teórico-metodológicas. In: LOPES, A. C.; DIAS, R. E.; ABREU, R. G. Discursos nas Políticas de Currículo. Rio de Janeiro: Quartet, 2011. p. 19-45.

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