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Transcrição:

AVALIAÇÃO DO PRÉ-TRATAMENTO ALCALINO DO BAGAÇO DE CANA-DE- AÇÚCAR COM HIDRÓXIDO DE CÁLCIO VISANDO-SE AO AUMENTO DA DIGESTIBILIDADE ENZIMÁTICA DA CELULOSE L. P. FRASINELLI, C. O. CRISTOVÃO, R. TERÁN-HILARES, SILVIO S. SILVA e JÚLIO C. SANTOS Universidade de São Paulo - Escola de Engenharia de Lorena, Departamento de Biotecnologia E-mail para contato: teranhilares@gmail.com, jsant200@usp.br RESUMO Visando-se ao aproveitamento do potencial dos materiais lignocelulósicos na obtenção de produtos de interesse econômico e social, é necessário o desenvolvimento de métodos que resultem no aumento de sua digestibilidade enzimática. A técnica avaliada neste trabalho foi o pré-tratamento alcalino do bagaço de cana-de-açúcar com Ca(OH) 2. Os ensaios foram realizados em um meio reacional composto por 5% em massa de bagaço e solução de hidróxido de cálcio na razão mássica Ca(OH) 2 :bagaço de 0,4, tendo sido avaliada a influência das variáveis tempo (2, 4 e 8 h) e temperatura (50 e 90 C) na digestibilidade enzimática da celulose presente no material. Os resultados mostraram uma maior remoção da fração de lignina na condição mais severa estudada (8 h a 90 C) e, consequentemente, um maior rendimento de hidrólise do material pré-tratado (46,98%) com celulases comerciais. Com base nos resultados obtidos, verificou-se que o pré-tratamento com Ca(OH) 2 é bastante promissor, em especial considerando seu baixo custo quando comparado a outros álcalis. 1. INTRODUÇÃO A biomassa lignocelulósica, como a de resíduos agroindustriais, constitui-se em matéria prima de baixo custo para a obtenção de produtos químicos e combustíveis. Os principais componentes de materiais lignocelulósicos são: celulose, hemicelulose e lignina. Dentre estas, a fração celulósica corresponde a um polissacarídeo formado por unidades de glicose, açúcar que pode ser empregado na obtenção de uma série de produtos de interesse (Xu et al., 2010). No entanto, as frações lignina e hemicelulose resultam em uma estrutura complexa ao redor da celulose que precisa ser previamente eliminada ou modificada em uma etapa de prétratamento para que seja realizado um processo de hidrólise enzimática eficiente, a qual resulta em um meio rico em glicose que pode ser empregado em bioprocessos (Verna, Kumar e Jain, 2011). Processos de pré-tratamento podem ser físicos, químicos, biológicos ou uma combinação entre eles (Laser, 2002). Os pré-tratamentos alcalinos permitem menor degradação de açúcares e formação de derivados do furano quando comparados a prétratamentos térmicos e ácidos (Gonzales et al., 1986). Além disso, o pré-tratamento alcalino permite eliminar a fração de lignina da biomassa, melhorando a reatividade dos polissacarídeos restantes e a eliminação de grupos acetila e outros substituintes em hemicelulose (Chen et al., 2011).

Estudos feitos por Rocha et al. (2012) para a deslignificação de bagaço de cana-deaçúcar, demonstraram que o pré-tratamento em meio alcalino (NaOH) a 100 C por 1 hora permite a remoção de até 92,7 % da fração de lignina. Os processos alcalinos, além de removerem a lignina, também removem até 85% da fração hemicelulose do bagaço de canade-açúcar (Aguilar et al., 2010). O hidróxido de cálcio apresenta várias vantagens, sendo de fácil manipulação e apresentando um baixo custo; além disso, a cal pode ser recuperada tratando-se a água de lavagem com gás carbônico (Chang et al., 1998). Considerando algumas vantagens do uso de hidróxido de cálcio para o pré-tratamento de bagaço de cana-de-açúcar, avaliou-se a influência das variáveis temperatura e tempo de reação no processo de pré-tratamento sobre a digestibilidade enzimática da celulose. 2. MATERIAIS E MÉTODOS 2.1. Matéria Prima O bagaço de cana-de-açúcar foi adquirido em usina de açúcar do estado de São Paulo. O material foi seco ao sol até que se atingisse um teor de umidade próximo de 10%, sendo então moído em um moinho de martelo Dupla 270 (Moinho Benedetti Ltda., Pinhal- SP). O bagaço seco e moído foi caracterizado em relação a sua composição em extrativos, celulose, hemicelulose, lignina e cinzas, de acordo com a metodologia padrão do NREL- National Renewable Energy Laboratory (Sluiter et al. 2012). 2.2. Pré-Tratamento Alcalino com Hidróxido de Cálcio Foram executados experimentos para avaliar os efeitos das variáveis temperatura e tempo de reação sobre a composição do bagaço de cana-de-açúcar e a influência sobre a digestibilidade enzimática do material pré-tratado por processo alcalino. Os ensaios foram executados em frascos Erlenmeyer de 250 ml contendo um total de 100 g de meio reacional composto por 5% em massa de bagaço e solução de hidróxido de cálcio na razão mássica Ca(OH) 2 :bagaço de 0,4. As reações foram realizadas em um banho com agitação (Lindberd/Blue M, SWB1122C-1, Waterbath, Asheville, Estados Unidos) de 110 rpm durante os tempos de 2h, 4h e 8h e temperaturas de 50 C e 90 C. O hidróxido de cálcio empregado foi da marca Geocálcio (Miika Nacional, Caetanópolis/MG), correspondente a uma forma disponível comercialmente em suspensão aquosa, o que facilita a manipulação e utilização do material. Concluídos os tempos de reação, os meios foram resfriados e, em seguida, o material pré-tratado foi filtrado em um funil de Büchner, sendo lavado com água e solução de ácido acético para solubilizar e remover o hidróxido de cálcio resultante. Finalmente, o bagaço prétratado foi separado para serem realizados os procedimentos de hidrólise enzimática e caracterização em relação a seus componentes (celulose, hemicelulose e lignina) de acordo com a metodologia descrita por Sluiter et al. 2012.

2.3. Hidrólise Enzimática A hidrólise enzimática foi conduzida em frascos Erlenmeyer de 50 ml contendo 15 ml de meio reacional constituído por 0,3 g de bagaço de cana-de-açúcar pré-tratado (massa seca) e tampão de citrato de sódio 0,05M (ph=4,8). À suspensão, foi adicionado coquetel enzimático comercial Dyadic Cellulase CP CONC (Dyadic International, Inc., Jupiter, Flórida, USA), em uma proporção de 10 FPU de enzimas /g de bagaço pré-tratado. A hidrólise foi realizada em incubadora de movimento rotatório Quimis Q816M20 (Quimis Aparelhos Científicos, Diadema, SP, Brasil) sob condições de 50 C, 150 rpm e 24 h. A fração liquida obtida após a hidrólise foi caracterizada em relação ao teor de açúcares, empregando cromatografia liquida de alta eficiência (CLAE), conforme Chandel et al. (2013). O rendimento de hidrólise foi definido como a razão entre a massa de celulose transformada em glicose e a massa teórica que seria liberada a partir desta fração do material. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO O bagaço de cana-de-açúcar in natura apresentou um conteúdo de 44,9% de celulose, 23,3% de hemicelulose e 23,7% de lignina, além de 3,1% de extrativos e 3,2% de cinzas. Os resultados estão de acordo a estudos feitos por Benjamin et al. (2013), Vallejos et al. (2012) e Zhao et al. (2007), nos quais reportou-se que o bagaço de cana-de-açúcar apresenta uma composição variável nas frações de celulose (32,6-45,0%), hemicelulose (23,6-35,0%), lignina (14,4-30%), extrativos (3,1-12,4%) e cinzas (0,6-3,4%). Os resultados da composição de bagaço de cana-de-açúcar pré-tratado em meio alcalino empregando Ca(OH) 2, são mostrados na Tabela 1. Tabela 1- Composição do material pré-tratado em meio alcalino empregando Ca(OH) 2 em diferentes tempos e temperaturas (os resultados apresentados correspondem à média ± desvio padrão) N Exp. Condições de pré-tratamento Bagaço pré-tratado Temp. ( C) Tempo (h) Celulose Hemicelulose Lignina 1 50 2 42,17 ± 0,00 24,87 ± 0,06 24,97 ± 0,00 2 50 4 41,06 ± 0,06 23,70 ± 0,15 25,61 ± 0,33 3 50 8 42,99 ± 4,22 23,68 ± 0,20 23,57 ± 5,21 4 90 2 40,01 ± 0,28 24,85 ± 0,93 27,50 ± 2,62 5 90 4 40,96 ± 1,60 23,92 ± 0,45 24,00 ± 0,31 6 90 8 40,49 ± 0,12 23,64 ± 0,02 22,99 ± 1,30 De acordo com resultados mostrados na Tabela 1, o efeito da temperatura e tempo na composição do material pré-tratado em relação ao material de partida foi mais intenso para o Exp. 6, no qual se empregaram os maiores valores de tempo (8 h) e temperatura (90 C). Neste caso, a fração lignina apresentou uma maior redução em relação ao percentual presente inicialmente no bagaço, apresentando também o menor valor (22,99%) em relação ao outros experimentos, como pode ser melhor visualizado na Figura 1. Observou-se também que o efeito do Ca(OH) 2 na composição dos materiais não foi dependente do tempo de pré-

tratamento, exceção feita à composição em lignina a 90 C. Com relação à celulose, observouse que o material pré-tratado apresentou um percentual menor em relação ao bagaço in natura, indicando possível remoção desta fração, o que pode ocorrer pela degradação de carboidratos em presença de álcalis, produzindo ácidos hidroxicarboxílicos, conforme o reportado por Klinke et al. (2002). As modificações composicionais devidas ao pré-tratamento com Ca(OH) 2 foram, no entanto, relativamente pequenas, o que pode ser atribuído à baixa solubilidade deste reagente (Chang et al, 1998), a qual também dificulta os processos posteriores de filtração e lavagem. Contudo, estudos feitos por Playne (1984), reportaram que o hidróxido de cálcio apresenta maior efetividade que o hidróxido de sódio e amônio, para o pré-tratamento de bagaço de cana-de-açúcar. Neste trabalho, foi alcançado um rendimento de hidrólise de 72% em biomassa pré-tratada a 20 C por 8 dias em relação de um rendimento de hidrólise de 19% da biomassa in natura. Figura 1- Composição percentual em celulose, hemicelulose e lignina do material pré-tratado com Ca 2 (OH) por diferentes tempos e tempertaturas As condições estabelecidas no estudo apresentaram uma influência positiva em relação ao rendimento de hidrólise (Figura 2), observando-se um aumento para na hidrólise da celulose da biomassa pré-tratada, sendo o máximo valor obtido (46,98%) no material prétratado por 8 h a 90 C. O rendimento de hidrólise para o bagaço in natura de acordo com estudos feitos por Basso et al. (2014), foi de 11%. A digestibilidade do material pré-tratado foi em torno de quatro vezes maior em comparação à obtida com o bagaço in natura. Este aumento é devido principalmente a uma maior remoção de lignina e grupos acetil (Santos et al., 2012) e também à elevação da porosidade do material lignocelulósico devido ao aumento da remoção de ligações cruzadas de ésteres da xilana presentes na hemicelulose (Tarkow e Feist, 1969).

Figura 2- Rendimento de hidrólise enzimática da celulose do bagaço pré-tratado com Ca(OH) 2 a 50 e 90 C por diferentes tempos Um aspecto importante do emprego do Ca(OH) 2 em relação aos outros compostos alcalinos é seu baixo custo, o que o destaca como um dos reagentes com grande potencial para o pré-tratamento de biomassa lignocelulósica, apesar de sua baixa solubilidade em relação a outros. 4. CONCLUSÕES O pré-tratamento com hidróxido de cálcio pode facilitar a digestibilidade enzimática, com maior remoção de frações de lignina e grupos acetil, o que permite o aumento da porosidade e ação das enzimas sobre a celulose. Observou-se que as variáveis estudadas influenciaram o rendimento de hidrólise, tornando o pré-tratamento com Ca(OH) 2 vantajoso em relação a outros tratamentos alcalinos, principalmente em aspectos relacionados a o custo e facilidade da recuperação de reagente após a lavagem. 5. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à Universidade de São Paulo e ao CONCyTEC-Perú pelo apoio financeiro.

6. REFERÊNCIAS AGUIAR MM, FERREIRA LFR, MONTEIRO RTR. Use of vinasse and sugarcane bagasse for the production of enzymes by lignocellulolytic fungi. Braz. Arch. Biol. Technol. 53 (5): 1245-1254. 2010. BASSO, R., TANAKA, J., MENDONCA DE JESUS, H., SANTOS, J.C., SILVA, S.S. Pré- Tratamento Alcalino do Bagaço de Cana-de-Açúcar sob Condições Amenas de Pressão e Temperatura: Digestibilidade Enzimática e Avaliação do Potencial de Licor Negro Obtido. IV Simpósio de Bioquímica e Biotecnologia. Londrina Brazil. 2014 BENJAMIN, Y., CHENG, H., GORGENS, J.F. Evaluation of bagasse from different varieties of sugarcane by dilute acid pretreatment and enzymatic hydrolysis. Industrial Crops and Products. 51: 7-18. 2013. CHANDEL, A.K., ANTUNES, F.AF., SILVA, M.B., DA SILVA, S.S. Unraveling the structure of sugarcane bagasse after soaking in concentrated aqueous ammonia (SCAA) and ethanol production by Scheffersomyces (Pichia) stipitis.biotechnology for Biofuels. 6: 102-110, 2013. CHANG, V., NAGWANI, M., HOLTZAPPLE, M. Line pretreatment of crop residues bagasse and wheat straw. Applied Biochemistry and Biotechnology, 74: 135-159, 1998. CHEN WH, YE SC, SHEEN HK. Hydrolysis characteristics of sugarcane bagasse pretreated by dilute acid solution in a microwave irradiation environment. Appl Energ. 93: 237-244, 2011. GONZALEZ, G., LOPES-SANTIN, J., CAMINAL, G., SOLA, C. Dilute acid hydrolysis of wheat straw hemicellulose at moderate temperature: a simplified kinetic model. Biotechnol. Bioeng. 28, 288 293, 1986. KLINKE, H.L., AHRING, B.K., SCHMIDT, A.S., THOMSEN, A.B. Characterization of degradation products from alkaline wet oxidation of wheat straw. Bioresource Technology 82, 15-26, 2002. LAI, Y.Z. Chemical degradation. In: Hon, D.N-S., Shiraishi, N. (Eds.), Wood and Cellulose Chemistry. Marcel Dekker, Inc., New York, Basel, pp. 443-512 (Chapter 10), 2001. ROCHA GJM, GONÇALVES AR, OLIVEIRA BR, OLIVARES EG, ROSSELL, CEV. Steam explosion pretreatment reproduction and alkaline delignification reactions performed on a pilot scale with sugarcane bagasse for bioethanol production. Ind Crop Prod. 35: 274-279, 2012. SANTOS, R. B., LEE, J. M., JAMEEL, H., CHANG, H., & LUCIA, L. A. Bioresource Technology Effects of hardwood structural and chemical characteristics on enzymatic hydrolysis for biofuel production. Bioresource Technology, 110, 232 238. doi:10.1016/j.biortech.2012.01.085, 2012. SLUITER, A., HAMES, B., RUIZ, R., SCARLATA, C., SLUITER, J., TEMPLETON, D., CROCKER, D.Determination of structural carbohydrates and lignin in biomass, National Renewable Energy Laboratory, Golden, CO. Disponível na internet em: http://www.nrel.gov/docs/gen/fy13/42618.pdf. Consulta em: 24 de fevereiro de 2015. TARKOW, H. AND FEIST, W.C. A mechanism for improving digestibility of lignocellulosic materials with dilute alkali and liquid ammonia. In Robert F. Gould (Ed.) Celluloses and their applications, Advances in Chemistry Series, N 95, Amer. Chem. Soc., Washington, D. C., 1969. VALLEJOS, M.E., ZAMBON, M.D., AREA, M.C., CURVELO, A.A.S. Low liquid solid ratio (LSR) hot water pretreatment of sugarcane bagasse. Green Chem. 14, 1982 1989, 2012. VERMA A, KUMAR S, JAIN PK. Key pretreatment technologies on cellulosic ethanol production. Journal of Scientific Research, 55:57-63, 2011. XU, J., CHENG, J.J., SHARMA-SHIVAPPA, R.R., BURNS, J.C. Sodium hydroxide pretreatment of switchgrass for ethanol production. Energy Fuels 24 (3), 2113 2119, 2010. ZHAO, X., WANG, L., LIU, D. Effect of several factors on peracetic acid pretreatment of sugarcane bagasse for enzymatic hydrolysis. J. Chem Technol Biotechnol. 82: 1115-1121, 2007.