BOA-FÉ DO CONSUMIDOR NA RELAÇÃO CONTRATUAL Pós-Graduação em Direito do Consumidor - Módulo II - Contrato em Espécie - Aula n.45
Disposições gerais dos contratos Artigo 421 do Código Civil: A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Princípio da socialidade: os contratantes devem se sujeitar às normas de ordem pública.
Artigo 422 do Código Civil Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.
Os princípios da probidade e da boa-fé objetiva estão ligados não só à interpretação do contrato, mas também ao interesse social de segurança das relações jurídicas. (Maria Helena Diniz)
Boa-fé: os contratantes têm de agir com honradez, denodo, lealdade, honestidade e confiança recíprocas.
Boa-fé objetiva (informação, destaque, cooperação e cuidado) para os fornecedores, especialmente tendo em conta o modo coletivo de contratação e por adesão.
Boa-fé objetiva (art. 4º, inc. III, do CDC) - regras de condutas Boa-fé objetiva é o dever das partes de agir conforme certos parâmetros de honestidade e lealdade, a fim de se estabelecer o equilíbrio nas relações de consumo. Trata-se, portanto, de um padrão comportamental a ser seguido na probidade e na lealdade. (art. 422 do CC)
Boa-fé subjetiva refere-se ao fato de o contratante desconhecer algum vício do negócio jurídico.
Boa-fé subjetiva: a boa-fé subjetiva mantém relação interna com o próprio indivíduo, relacionado-se diretamente com os aspectos psicológicos, buscando-se saber se o titular do direito era conhecedor ou não do vício que estava por trás de determinado ato.
Artigo 423 do Código Civil Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente. (Cf. arts. 47 e 54 do CDC)
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. DECISÃO UNIPESSOAL. AGRAVO REGIMENTAL. NULIDADE. INEXISTENTE. PLANO DE SAÚDE. ENTIDADE DE AUTOGESTÃO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INAPLICABILIDADE. CONTRATO DE ADESÃO. CLÁUSULAS AMBÍGUAS E GENÉRICAS. INTERPRETAÇÃO EM FAVOR DO ADERENTE. NEGATIVA DE COBERTURA DE TRATAMENTO. SÍNDROME CARCINOIDE. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS E REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. DANOS MORAIS. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. AGRAVAMENTO PSICOLÓGICO. VALOR ARBITRADO. SÚMULA 7/STJ. HONORÁRIOS RECURSAIS. LIMITE MÁXIMO ATINGIDO. 1. Ação ajuizada em 11/09/13. Recurso especial interposto em 25/07/16 e concluso ao gabinete em 18/11/16. Julgamento: CPC/15. 2. O propósito recursal é definir se há violação ao princípio do colegiado ante o julgamento monocrático da controvérsia, se incide o Código de Defesa do Consumidor nos plano de saúde de autogestão e se há abusividade na conduta da operadora, passível de compensação por danos morais, ao negar cobertura de tratamento ao usuário final. 3. O julgamento pelo órgão colegiado via agravo regimental convalida eventual ofensa ao art. 557, caput, do CPC/73, perpetrada na decisão monocrática. Tese firmada em acórdão submetido ao regime dos repetitivos. 4. A Segunda Seção do STJ decidiu que não se aplica o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de plano de saúde administrado por entidade de autogestão, por inexistência de relação de consumo.
5. A avaliação acerca da abusividade da conduta da entidade de autogestão ao negar cobertura ao tratamento prescrito pelo médico do usuário atrai a incidência do disposto no art. 423 do Código Civil, pois as cláusulas ambíguas ou contraditórias devem ser interpretadas em favor do aderente. 6. Quando houver previsão contratual de cobertura da doença e respectiva prescrição médica do meio para o restabelecimento da saúde, independente da incidência das normas consumeristas, é dever da operadora de plano de saúde oferecer o tratamento indispensável ao usuário. 7. O médico ou o profissional habilitado - e não o plano de saúde - é quem estabelece, na busca da cura, a orientação terapêutica a ser dada ao usuário acometido de doença coberta. Precedentes. 8. Esse entendimento decorre da própria natureza do Plano Privado de Assistência à Saúde e tem amparo no princípio geral da boa-fé que rege as relações em âmbito privado, pois nenhuma das partes está autorizada a eximir-se de sua respectiva obrigação para frustrar a própria finalidade que deu origem ao vínculo contratual. 9. Honorários advocatícios recursais não majorados, pois fixados anteriormente no patamar máximo de 20% do valor da condenação. 10. Recurso especial conhecido e não provido. (REsp 1639018/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/02/2018, DJe 02/03/2018)
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. CONTRATO DE SEGURO. QUESTIONÁRIO DE RISCO. DECLARAÇÕES INEXATAS OU OMISSAS FEITAS PELO SEGURADO. NEGATIVA DE COBERTURA SECURITÁRIA. DESCABIMENTO. INEXISTÊNCIA, NO CASO CONCRETO, DE AGRAVAMENTO DO RISCO E DE MÁ-FÉ DO SEGURADO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7. EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA LIMITATIVA COM DUPLO SENTIDO. APLICAÇÃO DA SÚMULA 5. 1. Vigora, no direito processual pátrio, o sistema de persuasão racional, adotado pelo Código de Processo Civil nos arts. 130 e 131, não cabendo compelir o magistrado a acolher com primazia determinada prova, em detrimento de outras pretendidas pelas partes, se pela análise das provas em comunhão estiver convencido da verdade dos fatos. 2. As declarações inexatas ou omissões no questionário de risco em contrato de seguro de veículo automotor não autorizam, automaticamente, a perda da indenização securitária. É preciso que tais inexatidões ou omissões tenham acarretado concretamente o agravamento do risco contratado e decorram de ato intencional do segurado. Interpretação sistemática dos arts. 766, 768 e 769 do CC/02. 3. "No contrato de seguro, o juiz deve proceder com equilíbrio, atentando às circunstâncias reais, e não a probabilidades infundadas, quanto à agravação dos riscos" (Enunciado n. 374 da IV Jornada de Direito Civil do STJ).
4. No caso concreto, a circunstância de a segurada não possuir carteira de habilitação ou de ter idade avançada - ao contrário do seu neto, o verdadeiro condutor - não poderia mesmo, por si, justificar a negativa da seguradora. É sabido, por exemplo, que o valor do prêmio de seguro de veículo automotor é mais elevado na primeira faixa etária (18 a 24 anos), mas volta a crescer para contratantes de idade avançada. Por outro lado, o roubo do veículo segurado - que, no caso, ocorreu com o neto da segurada no interior do automóvel - não guarda relação lógica com o fato de o condutor ter ou não carteira de habilitação. Ou seja, não ter carteira de habilitação ordinariamente não agrava o risco de roubo de veículo. Ademais, no caso de roubo, a experiência demonstra que, ao invés de reduzi-lo, a idade avançada do condutor pode até agravar o risco de sinistro - o que ocorreria se a condutora fosse a segurada, de mais de 70 anos de idade -, porque haveria, em tese, uma vítima mais frágil a investidas criminosas. 5. Não tendo o acórdão recorrido reconhecido agravamento do risco com o preenchimento inexato do formulário, tampouco que tenha sido em razão de má-fé da contratante, incide a Súmula 7. 6. Somase a isso o fato de ter o acórdão recorrido entendido que eventual equívoco no preenchimento do questionário de risco ter decorrido também de dubiedade da cláusula limitativa. Assim, aplica-se a milenar regra de direito romano interpretatio contra stipulatorem, acolhida expressamente no art. 423 do Código Civil de 2002: "Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente". 7. Recurso especial não provido. (REsp 1210205/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 01/09/2011, DJe 15/09/2011)
A grande contribuição do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) ao regime das relações contratuais no Brasil foi ter positivado normas específicas impondo o respeito à boa-fé na formação e na execução dos contratos de consumo, confirmando o princípio da boa-fé como um princípio geral do direito brasileiro, como linha teleológica para a interpretação das normas de defesa do consumidor (artigo 4º, III, do CDC), como cláusula geral para a definição do que é abuso contratual (artigo 51, IV do CDC), como instrumento legal para a realização da harmonia e equidade das relações entre consumidores e fornecedores no mercado brasileiro (artigo 4º, I e II, do CDC) e como novo paradigma objetivo limitador da livre iniciativa e da autonomia da vontade (artigo 4º, III, do CDC combinado com artigo 5º, XXXII, e artigo 170, caput e inc. V, da Constituição Federal). Cláudia Lima Marques
Artigo 798 do Código Civil O beneficiário não tem direito ao capital estipulado quando o segurado se suicida nos primeiros dois anos de vigência inicial do contrato, ou da sua recondução depois de suspenso, observando o disposto no parágrafo único do artigo antecedente.
O beneficiário do seguro tem direito a receber a indenização quando o segurado se suicida? Para responder a essa questão, faz-se necessário entender
Parágrafo único Ressalvada a hipótese prevista neste artigo, é nula a cláusula contratual que exclui o pagamento do capital por suicídio do segurado.
Súmula 61 do Superior Tribunal de Justiça O seguro de vida cobre o suicídio não premeditado.
DIREITO CIVIL. SEGURO DE VIDA. SUICÍDIO. ART. 798 DO CC/02. INTERPRETAÇÃO LITERAL. IMPOSSIBILIDADE. PRESUNÇÃO DE BOA FÉ DO SEGURADO. PROVA DA PREMEDITAÇÃO. NECESSIDADE. 1. As regras relativas aos contratos de seguro devem ser interpretadas sempre com base nos princípios da boa-fé e da lealdade contratual. Essa premissa é extremamente importante para a hipótese de indenização securitária decorrente de suicídio, pois dela extrai-se que a presunção de boa fé deverá também prevalecer sobre a exegese literal do art. 798 do CC/02. 2. O biênio previsto no art. 798 do CC/02 tem como objetivo evitar infindáveis discussões judiciais a respeito da premeditação do suicídio do segurado, geralmente ocorrido anos após a celebração do contrato de seguro. À luz desse novo dispositivo legal, ultrapassado o prazo de 02 anos, presumir-se-á que o suicídio não foi premeditado, mas o contrário não ocorre: se o ato foi cometido antes desse período, haverá a necessidade de prova, pela seguradora, da premeditação. 3. É desrazoável admitir que, na edição do art. 798 do CC/02, o legislador, em detrimento do beneficiário de boa-fé, tenha deliberadamente suprimido o critério subjetivo para aferição da premeditação do suicídio. O período de 02 anos contido na norma não deve ser examinado isoladamente, mas em conformidade com as demais circunstâncias que envolveram sua elaboração, pois seu objetivo certamente não foi substituir a prova da premeditação do suicídio pelo mero transcurso de um lapso temporal.
4. O planejamento do ato suicida, para fins de fraude contra o seguro, nunca poderá ser presumido. Aplica-se à espécie o princípio segundo o qual a boa-fé é sempre pressuposta, enquanto a má-fé deve ser comprovada. 5. Há de se distinguir a premeditação que diz respeito ao ato do suicídio daquela que se refere ao ato de contratar o seguro com a finalidade única de favorecer o beneficiário que receberá o capital segurado. Somente a última hipótese permite a exclusão da cobertura contratada, pois configura a má-fé contratual. 6. Recurso especial provido. (REsp 1188091/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/04/2011, DJe 06/05/2011)
A jurisprudência também estabelece em linhas mais ágeis, concedendo tutelas provisórias para proteção dos direitos do consumidor.
Prazo prescricional pagamento indenizatório para seguro Súmula 229 do STJ: O pedido do pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão.
Artigo 206 do Código Civil: Prescreve: 1º Em um ano: II - a pretensão do segurado contra o segurador, ou a deste contra aquele, contado o prazo: b) [...] da ciência do fato gerador da pretensão.
Súmula 101 do Superior Tribunal de Justiça A ação de indenização do segurado em grupo contra a seguradora prescreve em um ano.
Súmula 229 do Superior Tribunal de Justiça O pedido de pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão.