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Data enia REVISTA JURÍDICA DIGITAL 9 NOVEMBRO 2018

índice Data enia Publicação científico-jurídica em formato digital ISSN 2182-8242 Ano 06 N.º 09 Periodicidade semestral Novembro de 2018 Propriedade e Edição: DataVenia Marca Registada n.º 486523 INPI Internet: www.datavenia.pt Contacto: correio@datavenia.pt DIREITO DA NACIONALIDADE 005 Alterações em sede de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa António Xavier Beirão, Procurador da República DIREITO PROCESSUAL PENAL E DIREITO CONSTITUCIONAL 027 Conformação constitucional das presunções hominis no âmbito do processo penal Aquilina Ribeiro, Advogada DIREITO PENAL E DIREITO CONSTITUCIONAL 067 A natureza jurídico-penal das imunidades dos titulares dos órgãos políticos de soberania Afonso Leitão, Advogado PROVA EM DIREITO PROCESSUAL 121 Os limites da valoração da prova gravada por parte dos Tribunais de Recurso Aquilina Ribeiro, Advogada DIREITO CONSTITUCIONAL E ARBITRAGEM 161 Da inconstitucionalidade do artigo 5.º, n.º 1, da Lei n.º 63/2011 de 14 de Dezembro Narciso Magalhães Rodrigues, Juiz de Direito A Data Venia é uma revista científico-jurídica em formato digital, tendo por objeto a publicação de doutrina, artigos, estudos, ensaios, teses, pareceres, crítica legislativa e jurisprudencial, apoiando igualmente os trabalhos de legal research e de legal writing, visando o aprofundamento do conhecimento técnico, a livre e fundamentada discussão de temas inéditos, a partilha de experiências, reflexões e/ou investigação. As opiniões expressas são da exclusiva responsabilidade dos respectivos autores e não traduzem necessariamente a opinião dos demais autores da Data Venia nem da sua administração. A citação, transcrição ou reprodução dos conteúdos desta revista estão sujeitas ao Código de Direito de Autor e Direitos Conexos. É proibida a reprodução ou compilação de conteúdos para fins comerciais ou publicitários, sem a expressa e prévia autorização da Administração da Data Venia e dos respectivos Autores PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS 197 A Eurojust e a proteção de dados pessoais Fátima Galante, Juíza Desembargadora PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS 223 A Internet e o Direito ao Esquecimento: análise jurisprudencial Fátima Galante, Juíza Desembargadora DIREITOS FUNDAMENTAIS / DIREITO CIVIL 251 Direitos das pessoas com deficiência José Francisco Moreira das Neves, Juiz Desembargador DIREITO FISCAL 271 Adriana Monteiro, Advogada

Data Venia Ano 6 n.º 09 [pp.271-281] DIREITO FISCAL Contrato de agência: Tributação em IVA Adriana Monteiro Advogada SUMÁRIO: O presente artigo, visa descrever o enquadramento jurídico em sede de Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA), na execução do Contrato de Agência outorgado entre a uma empresa de direito português ( Alfa, S. P. A. ) e uma empresa italiana Beta, S. P. A., materializado na promoção e celebração de contratos a concluir em nome e por conta da empresa principal, mediante uma retribuição variável sob a forma de comissão ou percentagem, calculada sob o volume de negócios alcançados por via da intervenção do Agente. DESCRITORES: Contrato de agência Imposto sobre Valor Acrescentado Contrato em nome e por conta de empresa principal comissão volume de negócios I Enquadramento jurídico tributário 1- Pressupostos de facto A) A Alfa é uma sociedade de direito português, e que tem por objecto a prospecção de mercado, angariação de clientes, difusão de produtos e negociação de artigos de moda de grandes nomes e produtores da alta-costura francesa e italiana, quer na linha feminina, quer na linha infanto-juvenil. B) A Alfa encontra-se registada em sede de IVA, assumindo a qualidade de sujeito passivo de IVA, nos termos da al. a), do n.º 1, do art. 2º do CIVA. DV9 271

Adriana Monteiro C) A Beta é uma sociedade de direito italiano, que tem como escopo a produção e comercialização de peças de vestuário de alta-costura francesa e italiana. D) A Beta assume a qualidade de sujeito passivo de IVA, registado num Estado Membro da E.U. Itália. E) A Beta (na qualidade de Principal) outorgou com a Alfa (que assume a qualidade de Agente) um contrato de agência. F) Ao abrigo do contrato de agência a Alfa promove em Portugal Continental, produtos e negócios de artigos de moda da alta-costura francesa e italiana, quer na linha feminina, quer na linha infanto-juvenil. G) A outorga dos contratos de compra e venda de bens promovidos pela Alfa junto de terceiros é realizada directamente pela Beta. H) Pelos serviços de promoção, angariação e intermediação, a Alfa aufere uma retribuição variável com base no volume de negócios concluídos em Portugal em nome do Principal. 2- Do regime jurídico-tributário em IVA O IVA incide sobre as transmissões de bens e prestações de serviços efectuadas em território nacional (tal como ele é definido nos termos do art. 5º da Constituição da República Portuguesa ex vi al. a), do n.º 2 do art. 1º do CIVA), a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal. Deste princípio geral decorre que determinada operação apenas poderá ser tributada em IVA se em concreto se verificarem quatro pressupostos, a saber: (i) ser efectuada por um sujeito passivo agindo como tal; (ii) ser realizada no âmbito de uma actividade económica, (iii) ser regra geral onerosa, e (iv) ocorrer em território nacional. 272 DV9

Data Venia 2.1- Da incidência subjectiva Ser sujeito passivo de IVA, significa dever liquidar imposto nas operações efectuadas durante o período de tributação, isto é, nas vendas e serviços prestados (nos outputs). Excepcionalmente, tal obrigação de liquidação de imposto poderá igualmente surgir nas operações de aquisição de bens e serviços (nos imputs). Assim, por referencia ao seu objecto societário - prospecção de mercado, angariação de clientes, difusão de produtos e negociação de artigos de moda de grandes nomes e produtores da alta costura francesa e italiana deverá qualificarse a sociedade Alfa como sujeito passivo de IVA, nos termos da al. a), do n.º 1, do art. 2º do CIVA. Pois que, de modo habitual e com carácter de independência, exerce uma actividade de prestação de serviços. Dado que a execução de funções atinentes ao cumprimento do contrato de agência é levada a cabo por um não particular e um não consumidor final, mas por um agente económico, conclui-se pela verificação do requisito de incidência subjectiva estatuído na al. a) do n.º 1, do art. 2º do CIVA. 2.2- Da incidência objectiva e/ou da operação Por imposição da al. a), do n.º 1, do art. 1º do CIVA são tributadas em IVA as transmissões de bens e, as prestações de serviços efectuadas em território nacional a título oneroso. Da hipótese em exame, emerge que a entidade consulente outorgou com a empresa italiana Beta um contrato de agência, por via do qual se obrigou a, promover contratos em nome da entidade Principal em território nacional. DV9 273

Adriana Monteiro Mais concretamente, a sociedade Alfa, por força do contrato de agência, exerce uma complexa e multifacetada actividade material de prospecção de mercado, angariação de clientes, difusão de produtos e marcas e de negociação, que antecede e prepara a conclusão dos contratos na qual não intervêm (sendo os mesmos concluídos entre a entidade Principal e o Terceiro Adquirente). Legitimada no contrato de agência, a sociedade Alfa no exercício da sua actividade e de acordo com a sua função (promover a celebração de contratos) actua sempre por conta do Principal, repercutindo-se na sua esfera jurídica os efeitos de todos os actos praticados na qualidade de Agente, actuando por isso em nome e defesa dos seus interesses. Ora dada a descrição da operação comercial desenvolvida entre a entidade consulente e a italiana Beta, não poderá deixar de se concluir que a mesma preenche o conceito de prestação de serviços vertido no art. 4º do CIVA. Pois que, dada a sua especificidade, não configura uma transmissão de bens (que na hipótese sub judice é realizada via directa entre o Principal e o Terceiro Adquirente). Com efeito, tratando-se de uma operação realizada no âmbito de uma actividade económica deverá concluir-se pelo preenchimento do pressuposto de incidência objectiva. 2.3- Da localização da operação A tributação de uma determinada operação em sede de IVA dependerá sempre da sua localização em território nacional (cfr. art. 1º, n.º 1, al a) do CIVA). Assim, para cada operação em concreto, é essencial averiguar se estão reunidas as condições para que a mesma possa ser considerada realizada em território nacional, e como tal sujeita a tributação. Ou, se pelo contrário, tais condições não estão reunidas, considerando-se então que a realização da operação 274 DV9

Data Venia ocorre fora do território nacional, encontrando-se consequentemente, excluída da tributação em território nacional. Não obstante a localização das operações de prestações de serviços para efeitos de tributação em sede de IVA ser uma realidade complexa (devido à imaterialidade destas operações), estabeleceu-se como regra geral que a operação se encontra localizada na sede, estabelecimento estável ou domicilio do prestador de serviços. Falando-se a este propósito de princípio da origem como elemento de conexão (cfr. art. 6º, n.º 6, al. a) do CIVA). Sendo o princípio da origem a regra da localização das prestações de serviços em território nacional, são muitas as excepções em que o mesmo princípio é afastado. De entre as diversas ressalvas (e para o que na hipótese sub judice se pretende) destacam-se as prestações de serviços de intermediação em geral, e comummente denominadas de mandato sem representação. Em derrogação do princípio da origem, consigna-se na al. e) do n.º 10, do art. 6º do CIVA que estão sujeitas a IVA todas as prestações de serviços que sejam ( ) efectuadas por intermediários agindo em nome e por conta de outrem, quando a operação a que se refere a intermediação tenha lugar no território nacional. O que vale por dizer que a localização da prestação de serviços em território nacional, depende da verificação cumulativa de dois requisitos: i) que o serviço seja executado por um intermediário em nome e por conta de outrem; ii) que a operação objecto de intermediação ocorra dentro do território nacional. Diversamente, estatui-se na al. e) do n.º 9, do art. 6º do CIVA uma hipótese de não sujeição apenas aplicável às prestações de serviços ( ) efectuadas por intermediários agindo em nome e por conta de outrem, quando a operação a que se refere a intermediação tenha lugar fora do território nacional. DV9 275

Adriana Monteiro Concretizando, decorre do normativo em exame que não haverá lugar a tributação em sede de IVA, quando em concreto e cumulativamente estejam reunidos dois requisitos: i) que o serviço seja executado por um intermediário em nome e por conta de outrem; ii) que a operação objecto de intermediação ocorra fora do território nacional. Em sinopse, poderá dizer-se que a prestação de serviços de intermediação, por norma, ocorrerá no local onde se considerar realizada (localizada) a operação a que se reporta a intermediação (operação principal). Sendo este o regime de tributação em sede de IVA que emerge do ordenamento jurídico tributário vigente, revela-se de todo imperioso proceder à localização da operação de prestação de serviços executada pela sociedade Alfa para a italiana Beta, ao abrigo do contrato de agência, mediante prévia localização da operação principal, entabulada entre o Sujeito Principal e o Terceiro Adquirente. Decorre do elenco de factos enunciados no ponto um que na vigência e ao abrigo do contrato de agência, agindo como sujeito passivo de IVA, a sociedade Alfa faz prospecção de mercado, angariação de clientes, difusão de produtos de moda de criadores franceses e italianos. Ou seja, no interesse e em nome da gestão de interesses alheios, desenvolve todo um conjunto de actos destinados a promover a celebração de contratos de compra e venda de bens entre o Principal e o Terceiro Adquirente, angariado pelo Agente para o aviamento do Principal. Dito de outro modo, os serviços prestados pela entidade consulente, ao abrigo do contrato de agência, esgotam-se numa intervenção a jusante, que antecede e prepara a outorga do contrato final e efectiva de venda de artigos de moda de alta-costura francesa e italiana, no território português, quer na linha feminina, quer na linha criança. 276 DV9

Data Venia Ou seja, e na hipótese sobre a qual debruçamos o nosso estudo, a sociedade Alfa exerce serviços de intermediação e/ou mandato sem representação, o que faz em nome e no interesse da italiana Beta. A operação de transmissão de bens operação principal é celebrada entre a italiana Beta e o Terceiro Adquirente, angariado pelo Agente - sociedade Alfa. Não obstante a intermediação do Agente, a transmissão da propriedade dos bens ocorre por via directa da esfera de actuação da italiana Beta para a esfera patrimonial do Terceiro Adquirente. O que pressupõe a expedição dos bens do local ou sede da italiana Beta para a sede ou estabelecimento comercial do Terceiro Adquirente. Por referência à operação de prestação de serviços, materializada na intermediação na celebração de contratos, a tributação em sede de IVA ocorrerá no local onde se considerar localizada a operação principal e objecto de intermediação transmissão de bens. No que refere à localização das transmissões de bens em território nacional, dispõe o n.º 1 do art. 6º do CIVA que São tributáveis as transmissões de bens que estejam situados no território nacional no momento em que se inicia o transporte ou expedição para o adquirente ou, no caso de não haver expedição ou transporte, no momento em que são postos à disposição do adquirente. Simplificando, decorre do preceito em análise, que apenas se consideram localizadas em território nacional, e aqui tributáveis em IVA: i) as transmissões dos bens que estejam situados em Portugal no momento em que se verifique o início da expedição ou transporte para o adquirente; ii) as transmissões dos bens, em que na falta de expedição ou transporte para o adquirente, sejam colocados à disposição do adquirente em Portugal. Escalpelizando a relação jurídica de transmissão de bens concluída entre a italiana Beta e o Terceiro Adquirente, é possível observar que os bens DV9 277

Adriana Monteiro transaccionados são expedidos de França ou Itália para a sede ou domicílio do Terceiro Adquirente, sita em território português. Não podendo por essa mesma razão localizar-se a operação em território nacional (cfr. art. 6º, n.º 1 à contrario do CIVA). Por outro lado, não poderá deixar de se frisar que as transmissões de bens in questio configuram uma aquisição intracomunitária de bens, sujeita ao regime jurídico consignado no Regime Jurídico das Transacções Intracomunitárias de Bens (RITI), nos termos do qual a tributação em sede de IVA ocorre no país destino (i. é, no país onde o consumo é realizado) e de acordo com as taxas nele vigentes. Pelo que, também por esta razão não se poderá falar de uma transmissão interna de bens, escapando assim à disciplina vertida no CIVA. Aqui chegados, em face de quanto vem de se alinhar, considerando que a operação principal (operação objecto de intermediação transmissão de bens), ocorre fora do território nacional, tal como ela é definido no art. 5º da Constituição da República Portuguesa, a prestação de serviços de intermediação levada e efeito pela sociedade Alfa ao abrigo do contrato de agência, por aplicação da al. e), do n.º 9 do art. 6º do CIVA, não está sujeita a tributação em sede de IVA. Como se referiu, a prestação de serviços de intermediação é executada pela entidade consulente, é desenvolvida em nome e no interesse da italiana Beta (ou seja, por conta de outrem) e, a operação de transmissão de bens realiza-se fora do território nacional (designadamente em França e Itália). Em conclusão, poderá dizer-se que por não se considerar localizada em território nacional a operação a que se reporta a intermediação (operação principal), também a prestação de serviços de intermediação não se pode considerar localiza em Portugal. 278 DV9

Data Venia Com efeito, deverá entender-se que por via da não sujeição estatuída na al. e) do n.º 9 do art. 6º do CIVA a prestação de serviços de intermediação desempenhada pela sociedade Alfa em benefício da italiana Beta não está sujeita a tributação em sede de IVA. 2.4- Do valor tributável A operação de liquidação de imposto exige que o sujeito passivo conheça, além da taxa e/ou taxas aplicáveis aos bens e serviços transmitidos, os valores sobre que devem incidir as referidas taxas. Isto é, imperioso se torna que o sujeito passivo identifique o valor tributável da operação. No âmbito das operações internas (transmissão de bens e prestação de serviços), a regra é a de que o valor tributável corresponde ao valor da contraprestação obtida ou a obter do adquirente ou do destinatário dos bens e/ou serviços. Na hipótese em escrutínio, o valor tributável, há-de corresponder ao valor que se obtiver da aplicação da percentagem atribuída à sociedade Alfa no valor que assumir cada uma das operações de intermediação em que tiver intervenção na qualidade de agente. II. Conclusões A) Praticando de modo habitual e com carácter de independência uma actividade comercial, a entidade consulente assume a qualidade de sujeito passivo de IVA, nos termos da al. a), do n.º 1, do art. 2º do CIVA. B) Por imposição da al. a), do n.º 1, do art. 1º do CIVA são tributadas em IVA as transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas em território nacional a título oneroso. DV9 279

Adriana Monteiro C) Localizando-se a operação principal (operação objecto de intermediação transmissão de bens), fora do território nacional, a prestação de serviços de intermediação levada e efeito pela prestadora de serviços ao abrigo do contrato de agência, não está sujeita a tributação em sede de IVA, devido à não sujeição a tributação consignada na al. e), do n.º 9 do art. 6º do CIVA. O valor tributável corresponde ao valor que se obtiver da aplicação da percentagem atribuída à entidade prestadora de serviços no valor que assumir cada uma das operações de intermediação em que tiver intervenção na qualidade de agente. III. Bibliografia ALEXANDRE, Mário, As Aquisições Intracomunitárias de Bens no Regime Transitório do IVA, Fisco n.º 48/49, 1992. CARVALHO, António Joaquim e TOMÁS, João Amaral, Manual do Imposto sobre o Valor Acrescentado, Porto Editora, 1986. CASALTA NABAIS, José, Direito Fiscal, Almedina, 2000. DA SILVA FERNANDES, José Domingos, Manual do IVA, Publisher Team, 2006. LAIRES, Rui, A Incidência e os Critérios de Territorialidade em IVA, Almedina, 2008. PALMA, Clotilde Celorico, Introdução ao Imposto Sobre o Valor Acrescentado, Cadernos do IDEFF, N.º 1, 5ª Edição, Almedina, 2012. PINTO MONTEIRO, António, Direito Comercial, Contratos de Distribuição Comercial, Almedina 2002. SALDANHA SANCHES, J. L., Manual de Direito Fiscal, Coimbra Editora, 2001. VASQUES, Sérgio, Imposto Sobre o Valor Acrescentado, Almedina, 2015. VIDAL LIMA, Emanuel, IVA Comentado e Anotado, Porto Editora, 2003. 280 DV9

Data Venia IV. Biografia da autora Formação académica: Mestre em Ciências Jurídico Políticas, menção em Direito Fiscal, pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (2015 2017); Pós- Graduada em Fiscalidade pela Faculdade de Direito da Universidade do Porto, em 2012; Curso de Contabilidade para Juristas pela Faculdade de Direito da Universidade do Porto, em 2011; Pós-Graduada em Direito e Empresas pela Universidade Portucalense Infante D. Henrique, em 2010; Pós-Graduada em Direito Fiscal das Empresas pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em 2008; Pós-Graduada em Contencioso Tributário pelo Instituto Superior de Gestão de Lisboa, em 2006; Licenciatura em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em 2004. Experiência profissional: Advogada no escritório Adriana Monteiro Advogados RL, desde Maio de 2018; Advogada na sociedade Nuno Cerejeira Namora, Pedro Marinho Falcão Sociedade de Advogados, RL, de Janeiro de 2006 a Abril de 2018; Inscrita na Ordem dos Advogados, desde 2005; Membro da Associação Fiscal Portuguesa; Membro da Internacional Fiscal Association; Autora do livro Iva nos actos médicos, Almedina 2018; Anotadora ao artigo 46º da LGT, Lexit, 2018; Anotadora ao artigo 25º da LGT, Lexit, 2017; Oradora convidada em diversos congressos e conferências Autora de diversos artigos e separatas na área da fiscalidade Sócia fundadora da sociedade Valdemar & Filhos, Lda.; Sócia fundadora da sociedade Alltop Consultores, Lda.. Áreas de actuação: Tributação do Rendimento, Tributação da Despesa, Tributação do Património, Tributação Internacional, Direito Penal Fiscal, Direito Fiscal Contra- Ordenacional, Contencioso Tributário e Arbitragem Fiscal Direito Societário Família a Sucessões Direito Penal. DV9 281

Data enia REVISTA JURÍDICA DIGITAL ISSN 2182-6242 Ano 6 N.º 09 novembro 2018