Surdez em Crianças Situação Atual



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Transcrição:

Surdez em Crianças Situação Atual Thomas P. Nikolopoulos Epidemiologia Desde 1981, o Relatório da Comunidade Européia sobre a Surdez na Criança (European Community Report on Childhood Deafness) determina o limite inferior de prevalência de perda auditiva em aproximadamente 1 em cada 1.000, para as crianças com perda de audição igual ou maior que 50dB, e um limiar de audibilidade envolvendo a média de 0,5, 1, 2, e 4 khz na orelha com melhor audição. Enquanto o papel desempenhado pela rubéola como uma causa de surdez em países desenvolvidos tem diminuído, há um aumento crescente do número de bebês nascidos pré-termo que sobrevive com problemas na audição. Este grupo pode ser responsável por até 40% das crianças com perda auditiva. Consequentemente pode ser sugerido que este fato deva contribuir para um aumento geral da surdez na infância, independente da redução na incidência de rubéola. Contudo, a situação é mais complexa na medida em que existem muitos fatores que podem causar confusão, tais como a disponibilidade de recursos financeiros a fim de fornecer estes serviços, a falta de bancos de dados confiáveis em muitos países, etc. A etiologia da surdez é uma questão muito difícil na medida em que a classificação entre os centros pode variar e causas desconhecidas tornam-se uma explicação fácil e comum para os pacientes/pais quando não há nenhuma causa evidente de perda de audição (mais de 40% dos casos). Isto ocorre principalmente em casos de surdez congênita. Em casos de surdez adquirida, a meningite é o principal fator etiológico em países em desenvolvimento. O impacto na linguagem Em seres humanos, o desenvolvimento da linguagem é uma das realizações mais espetaculares de uma criança. O desenvolvimento da linguagem começa provavelmente antes do nascimento e se desenvolve por toda a vida. A linguagem torna-se mais significativa como uma ferramenta notável que pode ser manipulada para ajudar as pessoas a pensar, aprender e interagir de modo satisfatório. A capacidade de compartilhar informações sobre intenções, idéia e sentimentos desempenha um papel fundamental na interação humana, visto que, ao termos conhecimento das emoções e intenções do nosso parceiro, podemos acelerar a resposta ou provável comportamento, planejando, então, uma resposta adequada. A linguagem é fundamental para a maioria dos aspectos da vida de uma criança, e desempenha papel importante na aquisição de um senso de individualidade e de conquista de uma identidade social. Três situações gerais são amplamente aceitas na área de aquisição de linguagem pelas crianças:

236 VII MANUAL DE OTORRINOLARINGOLOGIA PEDIÁTRICA DA IAPO a) desde o nascimento, os bebês são expostos à linguagem, o que ocorre em ambientes onde há bastante conversa feita por aqueles que estão por perto; b) a linguagem primitiva é adquirida por crianças em sua tenra idade através da interação comunicativa com usuários competentes daquela linguagem; c) a linguagem direcionada para a criança apresenta algumas características que a tornam especialmente útil para o pequeno aprendiz que é um parceiro imaturo das conversas. Estas características incluem não apenas aspectos estruturais e semânticos da linguagem, mas comportamentos comunicativos específicos, tais como o controle da atenção da criança pelo adulto que estiver tentando se comunicar com a criança. Estas três situações estão quase sempre presentes nos primeiros anos da vida de crianças com um desenvolvimento normal em todas as culturas, que recebem estímulos lingüísticos em quantidade e qualidade suficientes para que ocorra um desenvolvimento bem sucedido de linguagem. Em outras palavras, para as crianças com um desenvolvimento normal, a aquisição da linguagem é um processo difícil que falha apenas em casos de privação extrema, visto que há informações de linguagem normalmente muito mais relevantes e úteis do que é necessário para ativar os processos de aquisição de linguagem. Contudo, para as crianças com uma perda auditiva congênita profunda, freqüentemente este não é o caso, e o entendimento da línguagem falada pela criança pode ser tão empobrecido que há muitas dificuldades para chegar ao nível da mesma. Efeito de estímulos lingüísticos auditivos inadequados no vocabulário das crianças O crescimento certo do vocabulário varia entre as crianças e as definições de crescimento normal são difíceis. As estimativas variam de 2.000 a 10.000 palavras para uma criança de cinco anos de idade. Uma criança com dois anos de idade pode conhecer até aproximadamente 200 palavras diferentes, uma criança com três anos de idade sabe cerca de 1.000 palavras e uma criança com quatro anos de idade, por volta de 2.000. A maioria das crianças se depara com cerca de dezenas de milhares palavras novas por ano e aprende milhares delas; para muitas crianças a fala dos pais, dos colegas e amigos pode ser a única fonte mais significativa de crescimento de vocabulário. Ao comparar estes números com aqueles de uma criança com deficiência auditiva, tem-se alguma indicação da imensa desvantagem que a perda auditiva pode apresentar. Uma criança típica de cinco anos de idade que apresenta perda auditiva pode saber apenas 25 palavras (enquanto que uma criança com cinco anos de idade sem problemas auditivos conhece entre 2.000 a 10.000 palavras). O vocabulário da língua inglesa de alunos com problemas auditivos no final da vida escolar pode ser equivalente àquele de uma criança com seis anos de idade sem problemas auditivos. Contudo, alguém poderia questionar estas declarações, ou pelo menos a extensão da diferença entre as crianças com audição normal e aquelas com deficiência auditiva, com relação à validade do teste usado e a forma como as palavras foram apresentadas às crianças com deficiência auditiva. Crough sugere que as crianças sem nenhuma perda auditiva naturalmente terão um vocabulário

VII MANUAL DE OTORRINOLARINGOLOGIA PEDIÁTRICA DA IAPO 237 entre 5.000 e 26.000 palavras, enquanto que as crianças com a mesma idade, mas apresentando perda auditiva, podem apresentar um vocabulário muito mais restrito de apenas 200 palavras, quer em linguagem de sinais quer em palavras faladas. Entretanto, o autor afirma que este é o resultado de uma negligência lingüística e educacional das crianças com perda auditiva que são forçadas a um ambiente educacional onde o foco é a aquisição oral da língua inglesa em vez de uma aquisição da linguagem de sinais. Integração educacional A colocação educacional de crianças com perda auditiva é uma questão de debate importante há muitos anos. As escolas especiais ou unidades em escolas convencionais são as opões, mas não disponíveis em todas as regiões ou em todos os países. O movimento em direção à colocação educacional nas escolas convencionais de crianças com perda auditiva ou a integração delas é, ultimamente, uma questão muito importante na educação de deficientes auditivos. Há alegações que os estudantes integrados apresentam um desempenho acadêmico melhor do que aqueles que não são integrados. Entretanto, a questão principal é o que vem primeiro? As escolas convencionais fazem alunos melhores ou os melhores alunos é que freqüentam as escolas convencionais? Além disso, outros fatores óbvios que podem causar confusão tais como a inteligência, o histórico familiar, e deficiências adicionais (que freqüentemente são encontradas em crianças com perda auditiva) não são levados em consideração. Além do mais, o dilema é que enquanto os procedimentos normais de teste freqüentemente não são apropriados aos indivíduos com perda auditiva, se os mesmos forem alterados, os resultados podem ser inválidos. De qualquer modo, ainda não há nenhuma medida padronizada que possa ser usada por profissionais que trabalham com crianças com perda auditiva para avaliar as suas aptidões, ainda em desenvolvimento, na língua falada ou na linguagem de sinais. Períodos críticos de neuroplasticidade Estudos em animais sugerem que a ativação auditiva do cérebro em fase inicial ocorre em uma área localizada do giro temporal superior conhecida como córtex primário. A estimulação desta área faz com que os dendritos prolonguem-se e se coloquem em contato com outras áreas do cérebro. Finalmente é estabelecida uma rede complexa ligando-se a áreas do cérebro secundárias e terciárias associadas. O desenvolvimento desta rede parece ser fundamental para o reconhecimento dos sons e a percepção do seu significado. Há um período crítico durante o qual o cérebro retém a capacidade (plasticidade) de estabelecer esta rede. Experimentos de privação em animais sugerem que os períodos sensíveis existem quando o sistema auditivo é mais responsivo à estimulação sensorial. Em seres humanos, parece haver uma série de funções dependentes do tempo no sistema auditivo com base em adaptações responsivas aos estímulos psicofísicos e eletrofísiológicos. Os períodos sensíveis em que o sistema nervoso central (SNC) em desenvolvimento está mais preparado para usar as informações sensoriais para formar uma estrutura lingüística podem variar em função de elementos da linguagem. Com relação à fonologia, este período pode estar entre os seis meses da vida fetal até os 12 meses de idade de uma criança. De fato, foi demonstrado que o feto humano com

238 VII MANUAL DE OTORRINOLARINGOLOGIA PEDIÁTRICA DA IAPO 26 semanas de vida inequivocamente apresenta a capacidade auditiva de detectar sons, e as habilidades auditivas discriminatórias foram demonstradas em recémnascidos com audição normal que apresentaram uma preferência pela voz que eles ouvem com mais freqüência quando ainda estão no útero. Com relação à sintaxe, o período crítico pode ser de até quatro anos de vida e para a semântica até os 16 anos de idade. Exemplos do dia-a-dia podem ser encontrados na questão fundamental da neuroplasticidade. Henry Kissinger, que imigrou para os Estados Unidos, ainda adolescente, mantém um sotaque alemão, freqüentemente satirizado, que ele não conseguiu modificar mesmo após sessões intensivas de fonoaudiologia. Seu irmão, que era mais novo quando imigrou para os Estados Unidos, não tem nenhum sotaque. Joseph Conrad, cuja língua mãe era o polonês, é considerado um dos melhores escritores em língua inglesa deste século, mas seu sotaque era tão forte que seus amigos quase não conseguiam entendê-lo. Em síntese, Pinker sugere que a aquisição de uma linguagem normal é garantida para as crianças com até seis anos de idade, sendo firmemente comprometida desde aquele momento até logo após a puberdade, sendo rara daí em diante. Ramsden conclui que a plasticidade do sistema auditivo atinge seu auge nos primeiros três ou quatro anos de vida e provavelmente é completa, mas é perdida por volta dos dez anos de idade. Estes períodos de tempo são indicativos do que realmente ocorre nas estruturas muito complexas do cérebro humano, que ainda são muito pouco conhecidas. Espera-se que ocorram exceções e variações. Aparelhos de amplificação sonora individual (AASI) modernos limitações necessidade de estímulação elétrica e de implantes cocleares Todas as crianças com deficiência auditiva devem usar AASI (aparelhos de surdez) adequados, tão logo o diagnóstico seja feito. Os avanços no campo dos aparelhos de surdez são contínuos e marcantes. Os aparelhos digitais multicanais com um processamento avançado de sinais, supressão automática de feedback, sistemas de microfone duplo e de reação rápida prometem uma amplificação direta com alta qualidade de som, mesmo em freqüências altas, e uma ausência de distorções ou distorções mínimas. Além disso, os novos aparelhos digitais estimulam diretamente o estribo e prometem uma compreensão melhor da fala até mesmo em situações onde há muito barulho. Estes avanços na tecnologia dos AASI têm um impacto enorme na prática clínica atual, à medida que mais crianças com perda auditiva se beneficiarão substancialmente dos mesmos. Contudo, sempre haverá um limite ao benefício obtido pelo uso dos AASI. Se o número de células ciliadas restantes/funcionais e a extensão dinâmica forem muito pequenos, os AASI mais poderosos ou mais avançados apresentam um benefício muito pequeno. Conseqüentemente, um número significativo de crianças com perda auditiva continuarão a necessitar de aparelhos eletrônicos que possam desviar das células ciliadas danificadas e estimular diretamente o nervo auditivo. Implantes cocleares Os implantes cocleares tornaram-se um método aprovado mundialmente de tratamento de surdez profunda (mais de 170.000 implantes até esta data).

VII MANUAL DE OTORRINOLARINGOLOGIA PEDIÁTRICA DA IAPO 239 As crianças que receberam implante coclear, ainda no início da vida, apresentam potencial de desenvolver a línguagem falada. Aproximadamente 80% das crianças com implante coclear, com menos de cinco anos de idade, podem entender as conversas, sem leitura labial, cinco anos após a colocação do implante. Com relação a frases comuns, 95% das crianças implantadas compreendem estas frases sem a leitura labial no mesmo intervalo de tempo. No mesmo intervalo de tempo de cinco anos, mais de 90% das crianças que receberam implante coclear desenvolvem uma fala inteligível e aproximadamente metade delas são inteligíveis para todos e também para pessoas com quase nenhuma experiência com a sua fala. Estes resultados podem ser muito melhores se nós excluirmos as crianças com distúrbios adicionais (30% das crianças com perda auditiva) ou levarmos em consideração que a tendência atual é de colocar implantes com a criança cada vez mais jovem e também que o implante seja bilateral. Além disso, os aparelhos e as estratégias de fala relacionadas estão em constante desenvolvimento. O resultado do implante coclear pediátrico é caracterizado pela sua variabilidade. As crianças com perda auditiva pré-lingual, ainda muito jovens, apresentam uma variação grande na sua maturidade auditiva, cognitiva e lingüística, podendo ser impossível de quantificá-la antes da intervenção. Por exemplo, ainda não existem medidas confiáveis de mecanismos de processamento central que sejam fundamentais para o reconhecimento da fala apresentada através do implante. A contribuição conjunta da pouca idade no momento da colocação do implante e do modo de comunicação oral pode ser responsável por 26% a 63% da variância observada das várias medidas dos resultados. Assim, enquanto as decisões sobre o paciente candidato ao implante devem considerar o peso de cada variável, outros fatores provavelmente também têm uma influência significativa no resultado (colocação educacional, apoio da família, QI, etc). A implementação de programas de rastreamento auditivo neonatal é imperativa para garantir a identificação precoce de crianças com perda auditiva e seu encaminhamento oportuno para centros que realizem o implante coclear. O futuro Nos últimos 20 anos ocorreu um progresso significativo na área de tratamento da disacusia profunda. Se a tendência atual de avanços contínuos progredir, é bastante razoável esperar que em poucos anos sistemas de implante coclear bilateral serão uma realidade. As melhoras no processamento da fala permitirão que as pessoas com perda auditiva percebam uma fala de alta qualidade, e os números de candidatos a implante coclear aumentarão significativamente à medida que os critérios audiológicos à candidatura do implante forem relaxados. Ao mesmo tempo em que os programas de rastreamento auditivo universais permitirão a detecção de crianças com perda auditiva congênita, logo após o nascimento, esperamos que, considerando os resultados falso-positivos em qualquer teste médico, a média de idade durante a implantação poderá muito bem ser abaixo de um ano de idade. Os avanços nas ciências básicas e, especialmente na genética molecular, levam a um futuro onde os implantes cocleares podem não ser usados apenas para a restauração da audição, mas também para levar até a orelha interna

240 VII MANUAL DE OTORRINOLARINGOLOGIA PEDIÁTRICA DA IAPO os fatores de crescimento, neutróficos implantáveis, que possam vir a regenerar ou a reparar os processos neuronais danificados. Além disso, os implantes cocleares podem muito bem ser os sistemas de entrega de vírus geneticamente modificados que possibilitarão a terapia gênica para a perda auditiva congênita. O desafio, que os pesquisadores enfrentam nestas áreas tão interessantes, é uma definição adicional dos mecanismos básicos de ação no sistema auditivo, as interações entre os fatores e os genes de crescimento nos neurônios auditivos e a tão necessária pesquisa de tradução que agirá na forma de preencher a lacuna entre os estudos básicos de laboratório e as aplicações clínicas. Entretanto, o desafio que a humanidade enfrenta é que estes principais avanços no tratamento da deficiência auditiva não devem ser o privilégio de alguns poucos que pertencem a minorias ou a sociedades ricas, mas devem estar disponíveis para todos que precisem. Leituras recomendadas 1. Allen CM, Nikolopoulos TP, & O Donoghue GM. Speech Intelligibility in Children following Cochlear Implantation. Am J Otol 1998; 19: 742-6. 2. Crouch RA. Letting the deaf be deaf: Reconsidering the use of cochlear implants in prelingually deaf children. Hastings Center Report July-August 1997: 14-21. 3. Flipsen P Jr. Intelligibility of spontaneous conversational speech produced by children with cochlear implants: a review. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2008; 72(5):559-64. 4. Lane H, Bahan B. Ethics of cochlear implantation in young children: a review and reply from a deaf-world perspective. Otolaryngol Head Neck Surg 1998; 119: 297-313. 5. Miyamoto RT, Hay-McCutcheon MJ, Kirk KI, Houston DM, Bergeson- Dana T. Language skills of profoundly deaf children who received cochlear implants under 12 months of age: a preliminary study. Acta Otolaryngol. 2008;128(4):373-7. 6. Nikolopoulos TP. Md Thesis. University of Nottingham, 2000. 7. O Donoghue GM, Nikolopoulos TP, Archbold SM. Determinants of speech perception in children after cochlear implantation. Lancet. 2000 Aug 5;356(9228):466-8. 8. Pinker S. The Language instinct. London: Penguin Press, 1994 9. Ramsden RT. The Graham Fraser Lecture. Strains that might create a soul. J Laryngol Otol 1997; 111: 907-912. 10. Ruben RJ. A time frame of critical/sensitive periods of language development. Acta Otolaryngol (Stockh) 1997; 117: 202-205. 11. Spencer LJ, Oleson JJ. Early listening and speaking skills predict later reading proficiency in pediatric cochlear implant users. Ear Hear. 2008 Apr;29(2):270-80. 12. Zeitler DM, Kessler MA, Terushkin V, Roland TJ Jr, Svirsky MA, Lalwani AK, Waltzman SB. Speech perception benefits of sequential bilateral cochlear implantation in children and adults: a retrospective analysis. Otol Neurotol. 2008 Apr;29(3):314-25.