Nível de emprego e legislação trabalhista



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Transcrição:

Nível de emprego e legislação trabalhista Fernando Boarato Meneguin Sumário 1. Introdução. 2. O que está sendo proposto. 3. O Mercado de trabalho. 4. Por que é preciso uma reforma trabalhista? 5. Possíveis itens para uma reforma trabalhista. 6. Políticas públicas de emprego. 7. Conclusão. Fernando Boarato Meneguin é Mestre em Economia do Setor Público e Doutorando em Economia pela Universidade de Brasília. Consultor Legislativo do Senado Federal. 1. Introdução A flexibilização das leis trabalhistas tem sido objeto de intenso debate no país. Há quem defenda ardorosamente a prevalência do negociado sobre o legislado e há também os que se opõem a isso com a mesma intensidade. Na mídia, aparecem argumentações pregando que o desemprego crescente no Brasil é fruto principalmente da rigidez das normas trabalhistas em vigor. Em contrapartida, surgem também explicações no sentido de que o desemprego tem sua origem no ambiente macroeconômico adverso associado à globalização. Deixando de lado o aspecto passional do tema, é fato que as instituições e regulamentações têm enorme influência sobre o funcionamento do mercado de trabalho e devem ser ajustadas sempre que as circunstâncias econômicas mudam. Este estudo pretende discutir o Projeto de Lei nº 5483/2001, aprovado na Câmara dos Deputados e tramitando atualmente no Senado Federal, que trouxe à tona o tema. Em seguida, debateremos, com um enfo- Brasília a. 40 n. 159 jul./set. 2003 1 3

que econômico, baseado em estudos do Banco Mundial e do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), sobre como funciona o mercado de trabalho, os motivos para haver reformas trabalhistas, algumas sugestões do que pode ser feito e quais políticas públicas de emprego e renda podem ser implementadas independentemente de alteração na legislação trabalhista. 14 2. O que está sendo proposto Primeiramente, antes de discutirmos o tema flexibilização trabalhista sob o enfoque econômico, cabe estudarmos o que está sendo apreciado no Congresso Nacional. O Projeto de Lei nº 5483/2001 tramitou na Câmara e atualmente está na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, sob o código PLC 134/2001. Essa proposição altera o artigo 618 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Inicialmente, o Projeto veio do Executivo com a seguinte redação: As condições de trabalho ajustadas mediante convenção ou acordo coletivo prevalecem sobre o disposto em lei, desde que não contrariem a Constituição Federal e as normas de segurança e saúde do trabalho. Com as emendas sofridas na Câmara dos Deputados, o texto do Projeto passou a ser o seguinte: Na ausência de convenção ou acordo coletivo firmados por manifestação expressa da vontade das partes e observadas as demais disposições do Título VI desta Consolidação, a lei regulará as condições de trabalho. A despeito de tudo o que foi comentado na mídia pelos interlocutores interessados no assunto, cabe enfatizar que, no caso do Brasil, de acordo com a Constituição de 1988, pode haver redução de direitos trabalhistas em apenas três casos: salários (art. 7º, inc. VI); jornada de oito horas diárias (art. 7º, inc. XIII); ou jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento (art. 7º, inc. XIV). Portanto, nenhum projeto de lei pode ir além dessas possibilidades. Somente esses três direitos podem ser flexibilizados, cabendo às partes determinar as normas que passarão a reger suas relações, de acordo com seus interesses, mediante convenção ou acordo coletivo de trabalho. 3. O mercado de trabalho O mercado de trabalho tem a função de fazer a ponte entre a procura por mão-deobra e a oferta de trabalho. É de suma importância, portanto, que esse vínculo esteja funcionando perfeitamente. Caso contrário, o crescimento econômico pode não causar impacto positivo sobre os empregos ou, ainda, os investimentos em educação e novas tecnologias podem não significar ganhos de produtividade e melhores salários. Para que tenhamos um bom funcionamento do mercado de trabalho, este deve ser apenas um facilitador do encontro entre oferta e demanda de mão-de-obra. Não se deve pensar no mercado de trabalho como um agente que influencie a redistribuição de recursos. O funcionamento do mercado de trabalho pode ser afetado de três formas: a) pelas instituições, como os tribunais trabalhistas; b) pelas regulamentações, a exemplo das normas que regem a demissão de trabalhadores; c) pelas intervenções, como os programas de seguro-desemprego. As instituições que regem os litígios trabalhistas e a negociação coletiva sofreram pouca mudança desde que foram estabelecidas na década de 40. O Brasil precisa manter o que está funcionando e alterar o que não está, da mesma forma como a Constituição foi mudando ao longo dos anos. Revista de Informação Legislativa

É indiscutível o fato de nossas leis trabalhistas, que provavelmente foram bastante apropriadas para as condições das décadas de 50 e 60, estarem apresentando sinais de obsolescência. A regulamentação para o mercado de trabalho é necessária para garantir condições de trabalho seguras e justiça nos contratos de emprego. Algumas regulamentações destinamse a garantir o pagamento mínimo e a segurança do emprego, mas, quando obrigam trabalhadores e empregadores a contratos demasiadamente restritivos, podem acabar prejudicando a capacidade do mercado de trabalho de se ajustar com flexibilidade para promover o emprego e a produtividade. Além de regulamentações corretas e instituições adequadas, não se pode menosprezar o uso de intervenções do governo. Elas são necessárias especialmente quando a situação macroeconômica não está favorável. Por exemplo, o treina- mento público de assistência ao desempregado pode melhorar o nível de emprego e a produtividade. O Brasil precisa encontrar a dosagem certa de regulamentações e intervenções, além de um desenho institucional correto, para atingir os objetivos de emprego, produtividade e segurança. 4. Por que é preciso uma reforma trabalhista? Neste tópico, apresentamos os principais argumentos que indicam a necessidade de reforma no mercado de trabalho no Brasil. Nos gráficos abaixo, temos a evolução do número de pessoas que integram a População Economicamente Ativa PEA, medida pelo IBGE nas regiões metropolitanas, bem como o crescimento da taxa de desemprego aberto, também aferido pelo IBGE nas regiões metropolitanas. População Economicamente Ativa (pessoas) 20.0 00.0 00 19.0 00.0 00 18.0 00.0 00 17.0 00.0 00 16.0 00.0 00 15.0 00.0 00 14.0 00.0 00 Fonte: Pesquisa Mensal de Emprego/IBGE 19 91 1992 19 93 1 994 1 99 5 19 96 1997 1 99 8 1999 2 00 0 20 01 20 02 É fácil perceber que a geração de emprego não tem acompanhado o ritmo do crescimento da força de trabalho, fazendo com que o desemprego tenha saltado de 4,65% em 1990 para 7,88% em 2002. Isso significa que o mercado de trabalho não está tendo sucesso em assegurar que a demanda de mão-de-obra seja atendida pela oferta a um preço aceitável para ambas as partes. 9 8 7 6 5 4 3 1990 19 91 Taxa de Desemprego Aberto (%) Fonte: Pesquisa Mensal de Emprego/IBGE 1992 1993 1994 19 95 1 996 1997 1998 19 99 2 000 2001 2002 Claro que nem toda a queda no crescimento do emprego é explicada pela ineficiência do mercado de trabalho. Existem outros fatores decorrentes da conjuntura macroeconômica, como as baixas taxas de crescimento do PIB. Se o crescimento econômico acontece a uma taxa menor do que a soma das variações da população economicamente ativa e da produtividade, os salários deveriam declinar para que não houvesse mais desemprego. Brasília a. 40 n. 159 jul./set. 2003 1 5

A ineficiência do mercado de trabalho brasileiro fica caracterizada também pelo crescimento do setor informal. O gráfico abaixo retrata a dimensão do problema. Participação dos Empregados sem Carteira Assinada na Ocupação Total por Região Metropolitana (%) 29 27 25 23 21 19 17 15 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 Fonte: Mercado de Trabalho, nº 20 O mais grave do setor informal está no fato de que essas pessoas não contribuem para a previdência social, têm pouco ou nenhum acesso a programas de apoio à renda e ao seguro-desemprego e enfrentam um grau de incerteza muito mais alto quanto à sua renda futura. Em suma, o trabalho informal é responsável por um grande contingente de pessoas que não gozam de qualquer tipo de proteção social. Outra distorção é a grande rotatividade da mão-de-obra. Estudo realizado pelo Banco Mundial e pelo IPEA estima que um de cada três trabalhadores muda de emprego a cada ano. Apesar de a rotatividade ser inerente a qualquer mercado de trabalho, ela gera custos. Se esses custos são altos, os empregadores, na expectativa de ter sua força de trabalho renovada constantemente, têm menos incentivos para investir no treinamento individual dos trabalhadores. Um dos motivos para essa alta rotatividade do mercado do mercado de trabalho é o desenho do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço FGTS. Quando a conta vinculada do trabalhador acumula um saldo 16 grande, o empregado tem incentivo a ser demitido, de forma a se apoderar do dinheiro. Com essa característica do fundo, patrões e empregados não esperam que os contratos durem muito tempo. Além disso, a multa rescisória (40% dos depósitos no FGTS) é paga diretamente ao empregado, que tem interesse em provocar sua demissão, especialmente num período de crescimento econômico, em que arrumaria outro emprego facilmente. Pelo lado do empregador, o preço da demissão é alto quando o funcionário tem muito tempo de emprego, pois maior será o valor da indenização que lhe é devida. Isso significa que as empresas que têm como política investir em seu quadro de funcionários vão ser as grandes apenadas. As maiores beneficiárias serão as empresas que rodam seu pessoal de três em três meses. Por fim, as relações de trabalho são altamente afetadas pela Justiça Trabalhista. Todos os anos, trabalhadores interpõem cerca de dois milhões de ações judiciais contra empregadores. As empresas assumem o custo das taxas federais e legais, mas o maior custo resulta do fato de as Revista de Informação Legislativa

empresas se tornarem mais cautelosas no tocante às novas contratações, reduzindo assim o emprego formal. 5. Possíveis itens para uma reforma trabalhista O correto seria empreender reformas trabalhistas que permitissem determinar corretamente o preço da mão-de-obra e promovessem o crescimento do emprego, além de alinhar os incentivos de que os trabalhadores precisam para aumentar a produtividade da mão-de-obra e os salários. Para isso, primeiramente, o mercado de trabalho deveria ser mais flexível. Seria bemvinda, dessa maneira, qualquer proposta que faça os contratos refletirem as condições específicas da empresa empregadora, desobrigando as firmas e os trabalhadores de seguirem o modelo rígido da CLT. Nesse caso, os sindicatos seriam os grandes negociadores. No entanto, seria ideal permitir a existência de várias entidades representativas de cada categoria e, ainda, tornar a contribuição sindical facultativa, pois, dessa maneira, os sindicatos teriam mais incentivos para conseguir acordos benéficos para os trabalhadores, de forma a obter mais associados. Podemos dizer que isso levaria a um ambiente de concorrência entre sindicatos. Com relação aos empregados de baixa produtividade, que não têm poder de barganha junto aos empregadores, a melhor forma de ajudar esse segmento mais fraco da população é coibir os aumentos do salário-mínimo e reduzir gradualmente os benefícios não-salariais exigidos por lei. A proposta pode parecer contraditória, mas devemos considerar que esses benefícios já são negados cada vez mais aos trabalhadores assalariados; basta ver que, em 2000, o número de trabalhadores informais no Brasil ultrapassou o número de pessoas empregadas no setor formal. Esse argumento se baseia na previsão do modelo teórico de mercado de trabalho competitivo, ou seja, o aumento do mínimo faz com que a oferta de mão-de-obra seja maior que a demanda por mão-de-obra. Tal descompasso gera desocupação. Cabe ainda frisar que existem diferenças de renda entre os estados, o que indica a necessidade de se discutir a regionalização do salário mínimo, pois, dependendo do estado da federação, um aumento do salário mínimo pode acarretar ganhos para os trabalhadores que passam a perceber o novo valor, mas pode também trazer redução de bem-estar para um grupo de trabalhadores devido à diminuição dos empregos com remuneração igual ou superior ao mínimo ou ao aumento da informalidade. A maneira como os tribunais trabalhistas funcionam na solução de disputas e no cumprimento dos contratos dificulta a geração de emprego, uma vez que há diversas ações protelatórias e o custo é alto para as firmas, que ficam cautelosas no tocante a novas contratações. Uma solução potencial seria mudar a legislação e permitir negociações de direitos individuais por meio de contratos coletivos em nível de empresa com a participação dos sindicatos. As normas que atualmente regem a rescisão também geram incentivos incorretos, como no caso do Fundo de Garantia comentado no tópico anterior. Os trabalhadores têm direito a receber quatro benefícios principais por ocasião da rescisão: pagamentos de seguro-desemprego, aviso-prévio, direito a sacar o acumulado na sua conta FGTS e a multa rescisória. Assim, as políticas recomendadas seriam: a) aumentar a remuneração dos saldos depositados no FGTS de forma a não incentivar seu saque; b) eliminar a multa rescisória, o que diminuiria a rotatividade e permitiria maior investimento em qualificação ou transferir a multa rescisória para um fundo público com finalidades específicas (como auxílio aos desempregados) em vez de dar o valor diretamente ao trabalhador. Brasília a. 40 n. 159 jul./set. 2003 1 7

18 6. Políticas públicas de emprego As ações comentadas no tópico anterior exigem alterações na legislação trabalhista. No entanto, há outras possibilidades de criação de emprego por meio de políticas públicas. Uma das maneiras é pela qualificação da mão-de-obra, que visa a combater tanto o desemprego quanto a baixa produtividade da força de trabalho. O treinamento profissional tem efeito sobre o desemprego na medida em que dá acesso ao trabalhador a uma série de postos de trabalho que necessitam de treinamento adicional, ou seja, a qualificação age diminuindo o descasamento entre a demanda e a oferta de trabalho. Existem também as políticas ativas de microcrédito. A obtenção de crédito é um dos maiores problemas da pequena produção, ao lado do excesso de burocracia, de impostos e das dificuldades de acesso à tecnologia e ao conhecimento. O governo pode estudar maneiras de aumentar a abertura de linhas de capital de giro para microempreendedores de baixa renda que não têm acesso ao crédito formal negociado pelo sistema bancário. Sistemas de intermediação de mão-deobra também podem ter impacto positivo no combate ao desemprego. De fato, na medida em que a intermediação aumenta a informação disponível a trabalhadores e firmas, ela reduz o período de desemprego. Por fim, cabe citar a principal causa do desemprego: a desaceleração do nível de atividade da economia, provocada principalmente pelas altas taxas de juros. Sabemos, entretanto, que o governo não pode diminuir deliberadamente os juros, pois essa ação depende de condicionantes macroeconômicos. 7. Conclusão Este estudo teve a intenção de mostrar que reformas trabalhistas são necessárias, pois estas devem acompanhar as mudanças ocorridas na sociedade. Cabe explicitar que, apesar de determinadas ações significarem aparentemente perda de direitos, elas podem acarretar enormes ganhos para a economia, na medida em que criam novos postos de trabalho e promovem uma queda acentuada do desemprego. Por fim, enfatiza-se que também podem ser implementadas medidas geradoras de emprego, por meio de políticas públicas, sem alteração nas leis trabalhistas. O ideal seria uma combinação de várias frentes, com a união de vários segmentos da sociedade, todos visando a combater esse mal social que é o desemprego. Bibliografia BANCO MUNDIAL E INSTITUTO DE PESQUI- SA ECONÔMICA APLICADA. Empregos no Brasil: sessão informativa sobre política. 2002. v. 1. BARROS, R. P; Carvalho, M. Políticas ativas de emprego e renda. Mercado de Trabalho, Conjuntura e Análise, Brasília, v. 20, out. 2002. CONSTANZI, R. N. Microcrédito no âmbito das políticas públicas de trabalho e renda. Mercado de Trabalho, Conjuntura e Análise, Brasília, v. 19, jun. 2002. FERRANTI, D. Thomas, V.; Arriagada, A. M.; Amsberg, J. V.; Gill, I. S. Empregos no Brasil: Prioridades de políticas. [s. l.]: Banco Mundial/IPEA, 2002. GÓIS, A. C. L.; Paiva, M. A. L.; Sardegna, M. A. O novo direito do trabalho. Disponível em: <http:// www.jus.com.br>. Acesso em: 6 dez. 2002. INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLI- CADA E MINISTÉRIO DO TRABALHO E EM- PREGO. Anexo estatístico. Mercado de Trabalho, Conjuntura e Análise, Brasília, v. 20, out. 2002. INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLI- CADA. Base de dados macroeconômicos. Disponível em : < http://www.ipeadata.gov.br >. Acesso em: 21 fev. 2003. MENEGUIN, F. B.; Amaro, M. N. Política de salário mínimo: efetividade, condicionantes e alternativas. Revista de Informação Legislativa, Brasília, n. 157, jan./mar. 2003. Revista de Informação Legislativa