A aventura de Descartes da dúvida à certeza Prof. João Borba Nov. De 2009



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Transcrição:

A aventura de Descartes da dúvida à certeza Prof. João Borba Nov. De 2009 Descartes desenvolve sua filosofia tentando combater o ceticismo pirrônico do filósofo Montaigne. Por isso, o melhor modo de entendê-lo é entender primeiro o pirronismo e o modo como Montaigne põe em prática esse ceticismo pirrônico. O ceticismo pirrônico O ceticismo pirrônico é uma filosofia que nasceu na antiguidade, e que se dedica a combater todas as certezas e verdades que os filósofos dizem ter encontrado e faz isso sem substituir essas certezas e verdades por nenhuma outra. O filósofo cético (pirrônico) não defende nenhuma tese a respeito de nada. Ele apenas valoriza o próprio movimento da investigação. Uma investigação que não termina nunca. O ceticismo pirrônico tem esse nome porque foi fundado por um filósofo chamado Pirro. A expressão vitória de Pirro, que às vezes encontramos em um texto, quer dizer uma falsa vitória, uma vitória inútil, que não dá em nada, na qual não se ganha nada como acontece com os filósofos pirrônicos, que usam mil argumentos até derrubarem as teorias filosóficas dos adversários, mas também não parecem ganhar nada com isso, porque não sobra nada para colocarem no lugar daquelas ideias que eles derrubaram. Mas quem criou a expressão vitória de Pirro não era pirrônico, porque era alguém que achava que uma vitória só é válida quando tomamos o lugar de quem foi vencido, e os céticos pirrônicos não pensam assim. Se eles derrubam as teorias dos outros, não é porque gostariam de colocar a sua própria teoria no lugar delas, mas porque valorizam a própria luta mais do que a vitória, a investigação mais do que os resultados, o debate e o confronto de argumentos com os outros filósofos mais do que a vitória sobre as teorias deles. Ceticismo, ao pé da letra, significa investigacionismo. É uma filosofia que está sempre em movimento, sua investigação e sua argumentação não param em nenhum resultado, a não ser provisoriamente, como uma espécie de descanso que também é um momento muito valorizado entre os céticos. O cético pirrônico só consegue descansar da sua investigação interminável quando chega a um impasse. Quando examina um problema, ele joga as possíveis respostas uma contra a outra, arranjando todos os argumentos que consegue encontrar para cada uma delas, até que elas parecem respostas tão igualmente boas (ou tão igualmente ruins), que se torna impossível decidir qual é a mais verdadeira (ou a mais falsa): esse é o impasse. Quando chega a isso, o cético se sente a vontade para parar de investigar aquele assunto e descansar... e enquanto descansa da discussão daquele assunto, trata de examinar outros assuntos de outro lado. Esse descanso do cético na discussão de um assunto é sempre provisório: dura até alguém mostrar (ou ele mesmo encontrar) algum bom argumento a favor de um dos lados no impasse, quebrando o equilíbrio... quando isso acontece, o cético sai do seu descanso e volta a investigar o assunto. A filosofia acadêmica platônica dessa época: um ceticismo moderado? Existe uma outra filosofia da mesma época, na antiguidade, que não é a pirrônica, mas que às vezes também é chamada de cética, e é preciso tomar cuidado para não confundir as duas. É a filosofia da Academia platônica dessa época. Os acadêmicos platônicos dessa época se apoiam muito nos textos de juventude de Platão, quando ele era muito próximo de seu mestre Sócrates. Os textos dessa primeira fase de Platão sempre acabam em impasses que não dão solução para os problemas, apenas provocam as pessoas a pensarem a respeito, como o velho mestre Sócrates gostava de fazer. Mas nessa época, já faziam vários séculos que Platão havia morrido, e não era possível consultá-lo para saber o que ele pensava. Também não era possível saber exatamente o que Sócrates pensava, já que havia morrido ainda antes, quando Platão era jovem. Os filósofos da Academia não tinham, naqueles tempos, um estudo de história suficientemente desenvolvido para isso. De qualquer modo, esses filósofos acadêmicos não deixavam de ter a própria filosofia deles, e não sabemos o que fariam se conhecessem melhor as ideias de Platão e as de Sócrates. Não sabemos qual dos dois os

acadêmicos prefeririam seguir, ou se prefeririam continuar fazendo os que seguem essa linha de pensamento fazem até hoje. E o que eles fazem? Eles negam as verdades e certezas dos outros filósofos. Jogam as teorias deles umas contra as outras até chegarem num impasse. Mas isso não é exatamente a mesma coisa que os céticos pirrônicos fazem? Qual é a diferença então? A diferença é que os acadêmicos fazem isso dando a entender que, se não é possível provar essas certezas e verdades, então são todas falsas. Os céticos pirrônicos, por outro lado, não negam de maneira absoluta as certezas e verdades, porque são mais radicais do que isso: segundo os pirrônicos, dizer que elas são todas falsas, como os acadêmicos fazem, ainda é dizer uma espécie de verdade. É como se os acadêmicos tentassem provar que não existe nenhuma verdade. Mas provar isso, é o mesmo que dizer que a única verdade é que não existe nenhuma verdade, ou que não é possível chegar a nenhuma (isto é, nenhuma outra além desta). Em outras palavras, o que os acadêmicos dizem é que a única certeza que conseguimos ter é, justamente, a de que não podemos chegar a verdade nenhuma, porque provavelmente não existe nenhuma outra verdade além dessa certeza. É uma filosofia negativista, que procura negar qualquer teoria sobre a verdade. A crítica dos pirrônicos aos negativistas acadêmicos Pois bem: o ceticismo pirrônico nasceu de dentro dessa Academia negativista. Nasceu a partir de um grupo de rebeldes que começaram a criticar esse negativismo, dizendo que não fazia sentido negar as verdades dos outros para afirmar que a única verdade é que elas são todas falsas. Segundo os pirrônicos, isso não faz sentido porque, desse modo, os acadêmicos acabam fazendo quase a mesma coisa que todas aquelas filosofias que eles combatem, porque na verdade estão propondo mais uma teoria sobre a verdade mesmo sendo a teoria de que todas as (outras) teorias sobre o assunto são falsas. O único jeito de ser coerente com isso, segundo esses rebeldes que começam a se afastar do grupo acadêmico, é admitir que até essa teoria negativista também podia ser falsa. E é isso o que os céticos pirrônicos fazem, quando se afastam definitivamente dos acadêmicos e formam o seu próprio grupo: eles apenas declaram que até o momento, não conseguiram saber se as teorias são verdadeiras ou falsas. Portanto, pode ser que se descubra que a teoria examinada é falsa, mas também pode ser que se descubra que é verdadeira. Só que o momento de saber isso não chega nunca, porque os céticos pirrônicos jamais terminam a sua investigação a esse respeito: no máximo, dão uma parada provisória para um gostoso descanso. Eles fazem esse descanso (que chamam de ataraxia ) quando chegam a um impasse equilibrado, em que não dá pra dizer se os melhores argumentos estão de um lado ou de outro no debate. A palavra ataraxia quer dizer ausência de perturbações, e no caso do ceticismo pirrônico parece mesmo bem cabível traduzir isso como um descanso na investigação. É um momento em que eles não se sentem mais perturbados pela necessidade de chegar a alguma resposta, já que, diante do impasse entre as respostas possíveis, isso parece impraticável ( por enquanto). Quando um cético pirrônico decide parar definitivamente uma investigação (e não provisoriamente, só para descansar), declarando que descobriu que uma teoria é realmente verdadeira, ou que uma teoria é realmente falsa, isso quer dizer que ele acabou de deixar de ser um cético pirrônico. Era cético enquanto ficava na dúvida e não parava de investigar. Deixou de ser quando começou a acreditar que descobriu definitivamente que alguma teoria é verdadeira, ou que alguma teoria é falsa. O cético pirrônico só é cético pirrônico justamente enquanto não cai em nenhuma verdade, em nenhuma certeza absoluta, em nenhuma crença. As únicas coisas em que o cético pirrônico se apoia são: 1) as meras aparências (do modo como aparecem, sem julgar se elas são verdades ou ilusões ); 2) o seu próprio movimento de investigação, com os seus argumentos descartáveis (que ele usa até conseguir chegar num impasse, depois joga fora ou guarda para usar em alguma outra situação); 3) a busca do descanso (ataraxia) que se consegue quando se chega a um impasse. É quando se separaram dos seus colegas acadêmicos negativistas, que esses rebeldes radicais

formam, portanto, um grupo separado de filósofos, e adotam para sua filosofia o nome de ceticismo (que quer dizer investigacionismo) ou pirronismo. A partir daí, eles declaram que, ao invés de seguirem Platão como os antigos colegas acadêmicos, preferem seguir um outro filósofo da antiguidade, um filósofo sobre o qual se sae muito pouco, chamado Pirro que parecia ter uma filosofia bem próxima daquele estilo cheio de contradições de Sócrates, que usava essas contradições para forçar as pessoas a pensarem, isto é, para não deixar o pensamento das pessoas cair no comodismo das respostas que parecem resolver tudo. É essa linha mais socrática de Pirro, de constante questionamento de tudo, que os rebeldes céticos pirrônicos preferem adotar. Hoje em dia temos uma tendência muito grande de confundir o ceticismo (ou pirronismo) com a filosofia dos seus antigos colegas acadêmicos, e muitas vezes acabamos admitindo que as duas são dois tipos de ceticismo, o negativista e o radical. Mas originalmente, os acadêmicos não aceitavam o nome de céticos, porque não queriam ser confundidos com aqueles rebeldes radicais, e os rebeldes também não queriam ser confundidos com seus colegas acadêmicos, mais moderados por isso, justamente, é que se afastaram deles e criaram o nome de ceticismo para o que estavam fazendo. As confusões de hoje em dia acontecem porque ficou muito comum na linguagem popular chamar de cético aquele que firmemente não acredita em nada, isto é, aquele que acredita que não existe nenhuma verdade para se acreditar a respeito de algum assunto. Dizemos então que ele é cético quanto àquele assunto. Mas esse modo de não acreditar é coisa de filósofos negativistas, como os acadêmicos, e não de filósofos pirrônicos (ou céticos). Quando ouvimos falar em ceticismo filosófico, trata-se do ceticismo pirrônico, aquele mais radical, que não para nunca de investigar as coisas. O ceticismo de Montaigne, séculos e séculos mais tarde (já depois da Idade Média), é desse tipo mais radical (pirrônico) que não tem certeza nem de que existe nem de que não existe verdade, e fica sempre investigando o assunto. O que Montaigne ataca com seu ceticismo pirrônico? Montaigne vive um pouco antes de Descartes (Descartes nasce poucos anos depois da morte de Montaigne), e como as coisas naquela época não mudam muito durante as vidas dos dois, podemos dizer que vivem no mesmo contexto histórico, isto é, na mesma situação, na época em que já estão formados países que são mais ou menos os que conhecemos hoje. Além disso, os dois filósofos são do mesmo país os dois são franceses. Estamos falando do século XVI d.c. Com o fim da Idade Média, a Europa toda nesta época já saiu do feudalismo, isto é, já não está mais dividida em grandes fazendas (feudos), e no lugar delas já existem muitos países organizados e poderosos, dirigidos por reis que têm o apoio militar de um exército nacional para controlar as fronteiras territoriais. A França foi um dos primeiros países a se formarem nessa época. Nesses novos países, há uma grande quantidade de comerciantes que estão enriquecendo nos burgos (que são cidades onde eles formam feiras e centros comerciais nesses novos países). Nas gerações passadas, da época medieval, a crença mais sólida que existia, aquela que dava mais segurança para as pessoas, era a de que Deus existe. A palavra Deus inspirava segurança. Nesta nova época que veio em seguida, a de Montaigne, de Descartes e dos grandes países com burgueses enriquecendo, a ideia de que Deus está presente para nos proteger, como todas as ideias usadas pela Igreja para dominar as pessoas na Idade Média, ainda existe e ainda tem sua força, mas começa a não parecer tão sólida e segura quanto antes. Conforme a Igreja perdia mais e mais o seu poder, suas ideias também iam parecendo menos sólidas. A crença mais sólida que vem surgindo nessa nova época para dar segurança às pessoas, no lugar das antigas crenças religiosas, é uma crença burguesa: é a crença de que cada um pode lutar para melhorar as suas próprias condições de vida e as de seus familiares. Está se tornando cada vez mais forte, nesse período, um sentimento do tipo eu posso, eu consigo, minha força de trabalho vai mudar minha vida para melhor. A palavra Eu começa aos poucos a inspirar quase tanta confiança e segurança quanto aquela que antes as pessoas sentiam com a palavra Deus.

Assim, podemos dizer que, nessa época, as duas ideias que mais oferecem um sentimento de segurança para as pessoas são a velha e tradicional ideia do bom Deus presente e protetor, mesmo por detrás das coisas que parecem ruins (apesar dessa idéia na época já estar um pouquinho abalada), e a nova e cada vez mais forte ideia de Eu que traz não apenas segurança, mas orgulho. As pessoas desse período começam a sentir-se felizes com sua capacidade de trabalhar e mudar de vida, e dizem a palavra Eu com orgulho. Isso porque no período anterior, na Idade Média, as condições de vida eram consideradas uma questão de destino decidido por Deus: quem tivesse nascido pobre, seria pobre para o resto da vida, porque esse era o lugar que Deus havia destinado à sua família incluindo todos os seus descendentes. O raciocínio por detrás disso era: como Deus é bom e infinitamente sábio, deve haver alguma razão superior e bondosa para todo esse sofrimento! Do mesmo modo, quem tivesse nascido rico, era considerado rico por vontade de Deus. Foi isso o que mudou da Idade Média para a época de Montaigne e Descartes, se examinarmos no que é que as pessoas de cada uma dessas duas épocas se apoiam para se sentirem seguras. De uma época para a outra, o apoio em Deus continua, mas já não é o único e já não parece bastar sozinho para dar a mesma segurança de antes, dividindo terreno com a ideia de uma força de que cada pessoa dispunha para melhorar de vida. Pois bem: as certezas que o cético Montaigne mais ataca com sua dúvida são exatamente essas duas a de que Deus existe, e (por estranho que possa parecer) a de que existe realmente isso que nós costumamos chamar de Eu. Qual é o efeito do ceticismo de Montaigne sobre os seus leitores naquela época? Montaigne passa para seus leitores a ideia de que não se consegue provar a existência de Deus (assim como também não se consegue provar que Deus não existe). Segundo ele, se tentamos ser completamente racionais com relação a isso, somos obrigados a ficar na dúvida, não conseguimos achar uma resposta. Para os religiosos (como é o caso do próprio Montaigne), a única saída acaba sendo a pura fé irracional, sem nenhuma prova possível. Isso não satisfaz as pessoas da época. Desde o fim da Idade Média, com a Igreja tendo perdido aquele poder todo que tinha, simplesmente acreditar não parece mais suficiente para as pessoas. Elas sentem a necessidade de alguma explicação racional para as coisas. Então, conforme Montaigne vai ficando famoso, quem ai lendo seus textos deles (e muita gente os lê nessa época) vai ficando mais inseguro em relação a isso. Será mesmo que se sabe tanto a respeito disso que chamamos de Deus, para dizer com certeza que ele, no fundo, está nos protegendo como uma força sempre presente, e que o que vivemos é o melhor possível? Dúvidas, dúvidas, dúvidas... Além disso, Montaigne também passa em seus textos a ideia de que não é possível ter tanta certeza de que realmente existe isso que chamamos de Eu. Ele diz mais ou menos o seguinte: nossos sentimento mudam com o tempo, e muitas vezes temos vários sentimentos ao mesmo tempo, inclusive sentimentos contraditórios. Além disso, quando raciocinamos, também não raciocinamos sempre da mesma maneira, às vezes nossos raciocínios são contraditórios, nos levam em uma direção, depois na direção contrária. E por último, nossos sentimentos e nossos raciocínios muitas vezes podem se contradizer, razão diz uma coisa, o coração diz o contrário. E o nosso corpo, é sempre o mesmo? Não: ele também muda com o tempo. Nosso corpo não é sempre o mesmo. O que somos então? Um aglomerado de coisas que mudam o tempo todo, e que a qualquer momento podem se contradizer! Nesse caso, com base em quê podemos afirmar que somos uma coisa só e sempre a mesma, essa que nós chamamos de Eu? Com base em quê podemos afirmar que somos sempre uma mesma pessoa, afinal? Segundo Montaigne, com base em nada. Em outras palavras, não podemos afirmar isso. Não dá pra ter tanta certeza a esse respeito. Parece que a única coisa que é uma só e sempre a mesma em nós quer dizer, nisso que nós chamamos de Eu é o nosso nome. E em alguns casos, além do nome, talvez a imagem que temos de nós mesmos, e a imagem que as pessoas têm de nós. Isto é, o modo como nós imaginamos que somos, e o modo como os outros imaginam que nós somos ( aliás, às vezes até essas imagens mudam!).

Então, em todo esse aglomerado confuso, contraditório e mutante de coisas que nós chamamos de Eu, parece que só o nosso nome se mantém com toda segurança sempre o mesmo. Mas o que é um nome, afinal de contas? O nosso nome é a essência daquilo que nós somos? Claro que não. É só um rótulo, um conjunto de palavras. O nosso nome, junto com a imagem que temos de nós mesmos e a imagem que as outras pessoas têm de nós, tudo isso diz Montaigne forma apenas uma grande máscara que cobre todo esse aglomerado confuso, contraditório e mutante de coisas que nos compõe. Será que somos apenas uma máscara (ou um conjunto de máscaras)? Será que não existe nenhuma essência, nenhum verdadeiro Eu por detrás dessas máscaras? Será que tudo em nós é falsidade, jogo de cena, máscara, superficialidade, e nada mais do que isso? Segundo Montaigne, tudo indica que não há como saber. É possível que sim, é possível que não. Talvez a gente não passe mesmo de um conjunto de máscaras e falsidade superficial. Bom... neste caso, talvez fosse possível a gente se conformar com isso... mas acontece que Montaigne também não tem certeza de que as coisas sejam assim. Ele não afirma realmente e com toda a certeza que não exite mais nada em nós por detrás dessas máscaras. Como bom cético pirrônico, ele apenas fica na dúvida... e naturalmente, deixa todos os seus leitores na dúvida também, angustiados, aflitos. Quem sou? essa pergunta, para as pessoas da época, acabou se transformando em um símbolo da filosofia montaigniana, como se de algum modo resumisse toda a base do seu pensamento, embora toda a sua fama tenha começado não tanto com o questionamento do Eu (que veio depois), mas justamente com suas críticas contra certas tentativas de provar racionalmente a existência de Deus que estavam sendo feitas na época. Como Descartes reage a essas dúvidas de Montaigne? Mesmo depois da morte de Montaigne, os textos dele continuam tendo enorme influência sobre as pessoas, e o clima geral de insegurança alimentado pelas dúvidas que ele levanta (não só essas duas, mas muitas outras) acaba até atrapalhando o desenvolvimento de teorias. Ninguém se sentia muito seguro para afirmar ou tentar provar firmemente e com certeza alguma verdade. Descartes se mostra muito preocupado com isso desde jovem. Depois de toda a Europa ter passado tanto tempo na Idade Média, em que era considerado pecado mexer com o corpo humano, era preciso desenvolver melhor por exemplo a medicina, mas as pessoas parecem tão preocupadas com aquelas dúvidas de Montaigne, que não sentem firmeza para ter certeza de alguma coisa q respeito da biologia humana. Descartes, que desde criança teve uma saúde bem frágil, não podia deixar de se preocupar com isso. Mas a mesma insegurança montaigniana contamina muitas outras áreas, naquela época. Descartes quer vencer esse clima geral de incerteza alimentado pelas dúvidas de Montaigne, e conseguir alguma segurança para o desenvolvimento da medicina, da física e de outros campos de conhecimento. Acha que pode encontrar essa segurança se conseguir pelo menos alguma prova sólida da existência disso que chamamos de Eu. Quer que as pessoas se sintam mais seguras para usarem a capacidade de raciocinar, para aprenderem as coisas por si mesmas, raciocinando. Assim as pessoas ficariam menos inseguras, e ao mesmo tempo dependeriam menos daquilo que, nessa época, aprendem nas escolas e na Igreja. Raciocinariam mais antes de irem acreditando de saída em qualquer coisa. Essa é a luta em que Descartes resolve se empenhar. Descartes usa a própria dúvida para chegar a uma certeza absoluta Para vencer o ceticismo pirrônico de Montaigne, Descartes decide transformar a própria dúvida em um método para encontrar a certeza. Ele raciocina da seguinte maneira: se quer encontrar uma certeza absoluta, ela tem que ser impossível de se duvidar então o melhor teste para saber se uma certeza é realmente absoluta e completamente segura, é justamente tentar duvidar dela de qualquer maneira que seja possível, mesmo usando a imaginação mais louca. Se for possível imaginar algum modo de duvidar daquela certeza, mesmo que seja uma dúvida absurda, então ela não passou no teste, o que quer dizer que não é tão certa e segura quanto parece, porque não é absolutamente impossível duvidar dela. Descartes chama esse método para testar as certezas de Dúvida Metódica, ou então de

método da Dúvida Hiperbólica que quer dizer dúvida exagerada. Ele pretende duvidar de tudo o que puder e de maneira mais exagerada ainda que a de Montaigne, da maneira mais exagerada que for possível até encontrar alguma coisa da qual ele não consiga duvidar de jeito nenhum, por mais exagerada e imaginativa que seja a sua tentativa de duvidar. O que Descartes quer com esse método é justamente isso: encontrar uma certeza tão sólida, tão segura, que nem ele nem ninguém consiga duvidar dela, mesmo usando muita criatividade e exagerando essa dúvida ao máximo. Ele começa examinando uma coisa da qual costumamos ter muita certeza: as nossas sensações físicas. Será que elas são tão sólidas e seguras quanto parecem? Será que podemos ter absoluta certeza de tudo o que vemos, ouvimos, tocamos, cheiramos ou sentimos o gosto? As sensações físicas não passam no teste de Descartes, porque acaba sendo bastante fácil usar a imaginação para criar uma maneira de duvidar delas: basta lembrar do modo como nos sentimos quando sonhamos. Nos sonhos, temos todas as sensações físicas, e geralmente nem sabemos que estamos sonhando, é como se estivéssemos acordados. Se for um sonho bem realista, mais ainda: só percebemos que era um sonho depois que acordamos. Então Descartes pensa o seguinte: na nossa vida diária, como é que podemos ter certeza de que estamos realmente acordados, e de que isso tudo ao nosso redor não é apenas um sonho? É importante notar que Descartes não está realmente acreditando que tudo isso que nós vivemos no nosso dia-a-dia é um sonho. Ele está apenas imaginando isso, porque se é possível imaginar isso, então também é possível imaginar que nada do que percebemos com as nossas sensações físicas é absolutamente certo e seguro, porque tudo isso que percebemos pode ser apenas um sonho. Se é possível imaginar esse modo de duvidar das nossas sensações físicas, então elas não são tão seguras que possam ser consideradas como uma certeza absoluta! Descartes quer encontrar uma certeza tão segura que passe nesse teste da dúvida exagerada. Como as sensações físicas não passam no teste, são descartadas por ele, e então ele trata de procurar algo que seja ainda mais seguro algo que passe no teste. Existe algum conhecimento que não dependa das nossas sensações físicas, e que pareça tão seguro quanto as sensações pareciam ser? Existe a matemática. Será que ela passaria no teste? Temos tanta certeza de que 2 + 2 = 4, por exemplo, que parece impossível duvidar disso. Mas será impossível mesmo? Sabemos que pelo menos é um um conhecimento que não depende das sensações físicas, que já foram descartadas como incertas: como é um cálculo, depende apenas do nosso raciocínio. Para testar a certeza dos nossos cálculos matemáticos, Descartes aplica novamente a sua dúvida metódica exagerada. Duvidar da matemática parece mais difícil, já não basta lembrar de algo que já existe, como aquilo que vemos, ouvimos, tocamos, cheiramos ou de que sentimos o gosto nos nossos sonhos. Não importa se estamos tendo essas sensações acordados ou sonhando, porque a matemática não depende de nenhuma delas. É uma questão de cálculo. Se fizermos os cálculos da maneira certa, podemos ter certeza de que o resultado está certo. Então, para fazer realmente o teste e descobrir se essa certeza é absoluta, é preciso nos esforçarmos um pouco mais, e criarmos alguma coisa nova, diferente dos sonhos, que ajude a duvidar da matemática. Se não for possível encontrar nada capaz de ajudar nisso, a matemática terá passado no teste. Mas Descartes encontra. Para duvidar da matemática, ele imagina o seguinte: e se existisse um gênio maligno invisível, um demoniozinho enganador que, sem percebermos, passasse a vida toda nos hipnotizando e nos convencendo de que os nossos cálculos estão certos, quando na verdade estão todos errados? E se 2 + 2 for igual a 5, e só pensamos que é igual a 4 por causa desse gênio maligno enganador? Nesse momento, fica bastante evidente que Descartes não está realmente acreditando nas duvidas que levanta, porque é óbvio que não acredita que exista um gênio maligno invisível hipnotizador: essas dúvidas são apenas um instrumento bem criativo para testar até aonde chega a certeza que podemos ter de alguma coisa. Quanto mais difícil imaginar um modo de duvidar de uma coisa, quanto mais absurda for a dúvida, quanto mais ela exigir da nossa imaginação e criatividade, menos essa coisa de que estamos duvidando é incerta e insegura. Isso quer dizer que a matemática é bem mais certa e segura, bem mais difícil de se duvidar, do que as sensações físicas. Mas mesmo

assim, não é tão segura quanto Descartes gostaria que fosse, porque não passa no teste: lembremos que o que Descartes quer, é encontrar uma certeza tão sólida e segura, que seja absolutamente impossível qualquer dúvida, mesmo a dúvida mais criativa que possamos imaginar. Até que finalmente, Descartes encontra o que procurava. Ele pensa no seguinte: depois de duvidar de tudo o que existe ao meu redor, fora de mim, e até da matemática, o que sobra para duvidar afinal? Sobra isso que estou fazendo, esse meu pensamento que vai tentando duvidar das coisas. Será que é possível duvidar dele? Vejamos: o que é isso que estou fazendo o tempo todo desde o começo desse caminho? Estou pensando. Isto é, raciocinando, imaginando maneiras de duvidar das coisas, cogitando possibilidades de duvidar, e ao mesmo tempo buscando uma certeza absoluta, querendo encontrar essa certeza, e por isso é que estou duvidando. O que existe aqui, é uma vontade pensante, uma vontade de pensar (cogitar) maneiras e possibilidades diferentes para se duvidar das coisas, a fim de chegar em alguma certeza que se mostre impossível de se duvidar e isso quer dizer que essa minha vontade pensante também está pensando o tempo todo nessa possibilidade de encontrar uma certeza absoluta. Resumindo tudo isso, Descartes chega à seguinte conclusão: posso duvidar de tudo o que existe fora de mim, mas não é possível duvidar de que existe uma dúvida acontecendo, de que existe um pensamento que cogita possibilidades para duvidar das coisas. Não é possível duvidar disso, porque o próprio ato de duvidar já prova que a dúvida existe. Quando tentamos duvidar da dúvida, o próprio ato de duvidar já desmente o que estamos tentando fazer. É como se disséssemos as palavras: não estou dizendo palavras dizer isso não faz sentido, porque o próprio ato de dizer essas palavras já desmente o que elas querem dizer. Da mesma maneira, não faz sentido duvidar de que estamos duvidando. O famoso cogito cartesiano Como se vê, a certeza absoluta, impossível de duvidar, à qual Descartes chega, é justamente a de que, pelo menos enquanto estivermos pensando, isto é, querendo alguma coisa (por exemplo uma certeza), raciocinando, imaginando, cogitando possibilidades, duvidando etc., existe um pensamento acontecendo. Tudo isso vontade, imaginação, raciocínio, dúvida etc. é pensamento. Esse pensamento, que vai para um lado ou para outro de acordo com a vontade que ele tem de pensar em alguma coisa ou em outra, é o que Descartes vai chamar de Eu. Portanto, finalmente, Descartes pode dizer que Montaigne estava errado, porque não é possível duvidar de que existe alguma coisa uma vontade pensante que podemos chamar de Eu. Podemos ter certeza absoluta disso. Isso que chamamos de Eu não é apenas um jogo de máscaras: por detrás das máscaras, existe uma vontade pensante. Descartes declara isso com uma frase em latim, que ficou conhecida como o famoso cogito cartesiano: Cogito ergo sum é o que ele diz. O que quer dizer isso? Quer dizer, grosso modo, cogito, logo sou. Cogito o quê? Cogito possibilidades de duvidar e a possibilidade de uma certeza absoluta. Cogitar é pensar. E sou o quê? Ora, sou justamente isso, alguma coisa que cogita possibilidades, alguma coisa que pensa. Isto poderia ser traduzido assim: Penso, portanto sou quer dizer, existo, sou alguma coisa afinal de contas, ao contrário da impressão deixada por Montaigne. Não sou um mero jogo de máscaras e falsidades, porque sou justamente esse pensamento que que se dirige às vezes para um lado, às vezes para outro... sou esse pensamento que se dirige para onde quer, sou uma vontade pensante que se quiser, pode buscar a verdade, e superar toda essa angustiante incerteza. A verdade, segundo Descartes, é que cada um de nós é, essencialmente, um pensamento capaz de duvidar ou de buscar verdades. Esta é a essência do que realmente somos, por detrás de todas as máscaras que afligiam Montaigne. Eis a conclusão de Descartes. Essa conclusão expressa por ele em latim na frase Cogito ergo sum, e que costuma ser chamada de cogito cartesiano, acabou recebendo uma tradução que ficou muito famosa, e que é a seguinte: Penso, logo existo!