TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO DÉCIMA OITAVA CÂMARA CÍVEL

Transcrição

1 APELAÇÃO nº APELANTE: CARLOS VAISMAN APELADO: INFOGLOBO COMUNICAÇÃO E PARTICIPAÇÕES S/ARELATOR: Des. EDUARDO DE AZEVEDO PAIVA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANO MORAL. Pleiteia-se a retirada de matéria publicada em sítio eletrônico por entender desabonadora de sua imagem. Sentença de improcedência. Aparente conflito entre direito de liberdade de imprensa e direito da personalidade, todos de igual hierarquia Constitucional, que deve ser resolvido pela ponderação de interesses. Autor que foi indiciado pelo Ministério Público Federal em ação civil pública de improbidade administrativa. Decisão posterior em Habeas Corpus no sentido de inexistir justa causa para a sua denúncia por falta de contexto probatório mínimo. Fatos narrados na notícia que correspondem ao que realmente ocorreu na época em que a matéria foi divulgada no sítio eletrônico. Notícia pretérita que reflete a verdade da época em que foi publicada no sítio eletrônico. Inocorrência de prática de ato ilícito. Matéria que foi posteriormente editada incluindo o resultado da decisão proferida no Habeas Corpus. Suposto desvio de dinheiro de empresa pública. Assunto de interesse da coletividade. Direito à informação. Ausência de ofensa à imagem. Sentença mantida. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. ACORDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos da Apelação Cível nº , em que figuram como apelante CARLOS VAISMAN e apelada INFOGLOBO COMUNICAÇÃO E PARTICIPAÇÕES S/A Apel. Cível Rel. Des. Eduardo de A. Paiva - ULD Página 1

2 A C O R D A M os Desembargadores que compõem a Décima Oitava Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator. RELATÓRIO Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com danos morais, ajuizada por CARLOS VAISMAN em face da INFOGLOBO COMUNICAÇÃO E PARTICIPAÇÕES S/A e UNIÃO NACIONAL DAS INSTITUIÇÕES DE AUTOGESTÃO EM SAÚDE - UNIDAS, em que se pleiteia a retirada de matérias publicadas em seus sítios eletrônicos e indenização por danos morais no valor de R$ ,00. O autor alega que foi veiculada notícia desabonadora de sua imagem, construída de forma tendente ao ferimento da sua honra. A reportagem tratou de uma Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa intentada pelo Ministério Público Federal. O demandante constou inicialmente como indiciado, mas foi proferida decisão em Habeas Corpus reconhecendo inexistir contexto probatório mínimo para que ele fosse denunciado. Aduz que o sítio de notícia jornalísticas do OGLOBO.COM veiculou manchete com o título: Ex-presidente da TIM e sócio da ODG Sports é réu em caso de fraude no Correios, e apesar do texto mencionar vinte e dois envolvidos na fraude e nominar nove acusados, apenas o autor, que é um empresário de renome, foi mencionado na manchete, o que acarreta uma exposição desnecessária de sua imagem Apel. Cível Rel. Des. Eduardo de A. Paiva - ULD Página 2

3 Esclarece que ao digitar o seu nome no site de pesquisas Google o primeiro item que aparece é a referência a esta reportagem. A primeira ré também mantém esta mesma notícia no site EXTRA. Argumenta que este tipo de exposição é vergonhoso e além de lhe trazer sofrimento, também prejudica os seus negócios e atinge a sua família. Invoca o direito ao esquecimento e que a notícia não tem relevância social ou histórica. O demandante e o segundo réu entabularam acordo, tendo sido informada a voluntária retirada do conteúdo discutido, do endereço eletrônico O primeiro réu apresentou contestação (índice 150). Sentença do Juízo da 19ª Vara Cível da Comarca da Capital (índice 291) na qual foi julgado procedente em parte o pedido, nos seguintes termos: (...) Isto posto: I. Em relação ao primeiro réu, INFOGLOBO COMUNICAÇÕES E PARTICIPAÇÕES S.A, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO, na forma do art. 487, I, do CPC; II. Em relação ao segundo réu, UNIÃO NACIONAL DAS INSTITUIÇÕES DE AUTOGESTÃO EM SAÚDE - UNIDAS, HOMOLOGO O ACORDO firmado, nos termos do art. 487, III, b, do CPC. Dispensadas as custas pelo segundo réu, na forma do art. 90, 3º. Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, na forma do art. 85 2º, do CPC ao patrono do primeiro réu. (...) Apelação interposta pelo autor (índice 346), reiterando os termos da inicial e requerendo a procedência da ação para que sejam retirados do ar os Links: Apel. Cível Rel. Des. Eduardo de A. Paiva - ULD Página 3

4 e federalinvestiga-quatro-hospitais-suspeitos-de-fraudar-plano-desaude-do-correios html, bem como seja fixada indenização por danos morais. Contrarrazões da ré (índice 324). É O RELATÓRIO. PASSO A VOTAR. O recurso é tempestivo e diante da presença dos demais requisitos de admissibilidade merece ser conhecido. A Constituição da República em seu art. 5º, inc. IV estabelece que é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato ; destaca-se, ainda, no inc. IX que é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura e licença. Por outro lado, nos termos do art. 5º, inc. XI da CRFB são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Cumpre, portanto, realizar-se uma ponderação dos interesses em voga, balizando-se o princípio da dignidade da pessoa humana, postulado constitucional norteador, devendo ser assegurado que o direito de informar e a livre manifestação do pensamento não venham a ferir indevidamente a imagem de outrem, da mesma forma que a preservação deste direito individual não pode representar um bloqueio à liberdade de imprensa Apel. Cível Rel. Des. Eduardo de A. Paiva - ULD Página 4

5 A questão de fundo foi acertadamente analisada pela douta sentenciante, à luz dos princípios constitucionais e da prova documental carreada aos autos. Confira-se a fundamentação do julgado: (...) Ademais, conforme fls. 112/114, fora incluída na reportagem a decisão emitida em sede de habeas corpus que considerou não haver provas suficientes contra o autor. Tendo em vista que o direito à imagem, neste caso, teve de ser mitigado pelo direito à liberdade de informação, por se tratar de pessoa que fora à época indiciada como suspeita de desviar dinheiro público, tendo sido os fatos narrados na reportagem verdadeiros, não há que se falar em ocorrência de dano moral. Neste sentido, o informativo 524 de jurisprudência do STJ: (...) Também não há que se falar em direito à remoção da notícia do site. As notícias foram veiculadas na época do ajuizamento da ação civil pública, em que vigiam os fatos informados, ou seja, a questão não foi divulgada após a decisão de que não haviam provas contra o autor, razão pela qual mostra-se descabido o pleito que o relaciona com o direito ao esquecimento. Este instituto, que se coaduna com o princípio da dignidade humana e a vedação do cumprimento de pena em caráter perpétuo, não pode ser utilizado de maneira errônea a ensejar o dever da imprensa de apagar notícias veiculadas no passado, que refletem a verdade da época divulgada. Do contrário, os jornais e demais mídias submeterse-iam a permanente revisão ou eliminação de matérias passadas, conforme o rumo que os fatos noticiados viessem a tomar, o que, em larga escala, traria inegáveis prejuízos à análise histórica de acontecimentos socialmente relevantes e mesmo do contexto social como um todo. Por tais razões, também descabe o pedido condenatório em face do primeiro réu para que retire a matéria do seu sítio eletrônico. (...) Observa-se que a sentença se encontra muito bem fundamentada. Apesar do inconformismo do apelante, os fatos narrados na notícia representam o que de fato ocorreu na época. Ademais, a matéria foi editada, posteriormente, incluindo-se o resultado da decisão proferida no habeas corpus. Resta claro, neste contexto, que não houve a prática de ato ilícito por parte do apelado. Conforme registrado no decisum, a imprensa não pode ser Apel. Cível Rel. Des. Eduardo de A. Paiva - ULD Página 5

6 privada de veicular informações sobre situações atuais, com receio de que no futuro elas possam ser modificadas e representar um ato ilícito. As notícias que foram veiculadas são de interesse da coletividade, pois dizem respeito a suposto desvio de dinheiro de empresa pública, e os fatos narrados foram verídicos, pois o autor foi efetivamente indiciado pelo MPF em Ação Civil Pública. Cuida-se de notícia pretérita que reflete a verdade da época em que foi veiculada. Reproduz-se, por oportuno, entendimento jurisprudencial deste Tribunal de Justiça em caso similar: APELAÇÃO. PROCESSO CIVIL. RITO ORDINÁRIO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS. GOOGLE BRASIL INTERNET LTDA. RELAÇÃO DE CONSUMO. PRETENSÃO DE NÃO VEICULAÇÃO DE NOTÍCIAS CONSIDERADAS DESABONADORAS PELO AUTOR. MATÉRIAS ANTERIORMENTE PUBLICADAS EM JORNAIS DE AMPLA CIRCULAÇÃO. CONTEÚDO PÚBLICO. DIREITO À INFORMAÇÃO. SENTENÇA JULGANDO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. APELAÇÃO DO AUTOR. NÃO PROVIMENTO DA APELAÇÃO. Ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais ajuizada em face da Google Brasil. Autor que pretende que a ré não veicule notícias a seu respeito que considera desabonadoras, relativas a um processo a que respondeu, como incurso no art. 158 do CP. Pretende que o mecanismo de busca do site da ré não apresente qualquer indexação ao seu nome, além de danos morais no valor de R$ ,00. Sentença julgando improcedentes os pedidos. Apelação do autor. Sentença que não merece reforma. Documentos que comprovam que as informações divulgadas pelo provedor da ré relacionam-se a ação judicial na qual o autor é parte, bem como a notícias divulgadas em Diário Oficial e em jornais de âmbito nacional, informações essas que são públicas e disponíveis àqueles que por elas se interessarem. O direito à informação e o direito à imagem são consagrados na Constituição Federal. No entanto, a informação veiculada pela ré, cujo fato tem o apelante como um dos sujeitos, não tem o condão de macular a sua imagem, apenas prestar o serviço de busca solicitado pelo site de pesquisa. Embora se possa compreender que a divulgação do crime imputado ao autor possa ter causado constrangimento ao mesmo, fato é que se trata de informações de caráter público, de interesse Apel. Cível Rel. Des. Eduardo de A. Paiva - ULD Página 6

7 coletivo, cuja divulgação pela ré não pode ser considerada ilícita. Não assiste razão ao apelante quanto à pretendida indenização por danos morais, eis que o fornecedor do serviço só não será responsabilizado quando provar fato extintivo, modificativo ou impeditivo do direito do autor, nos termos do art. 333, II, do CPC, ou, de acordo com o 3º do art. 14 do CDC, demonstrar a inexistência do defeito ou culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, o que, no caso, ocorreu. Precedentes jurisprudenciais do STJ e desta Corte. NÃO PROVIMENTO DA APELAÇÃO. ( APELAÇÃO - Des(a). JUAREZ FERNANDES FOLHES - Julgamento: 24/07/ VIGÉSIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL CONSUMIDOR) APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZATÓRIA. MATÉRIA JORNALÍSTICA. AUSÊNCIA DE OFENSA À HONRA E À IMAGEM DA AUTORA. OS MEIOS DE COMUNICAÇÃO E SEUS FUNCIONÁRIOS TÊM O DIREITO DE TRANSMITIR NOTÍCIAS AOS LEITORES SOBRE OS FATOS OCORRIDOS NA SOCIEDADE COM CRÍTICAS. CONTEÚDO QUE NÃO EXTRAPOLA A PRERROGATIVA DE LIBERDADE DE IMPRENSA. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. PROVIMENTO DOS RECURSOS. ( APELAÇÃO - Des(a). ANDRÉ GUSTAVO CORRÊA DE ANDRADE - Julgamento: 26/10/ SÉTIMA CÂMARA CÍVEL) Assim, concluo que a magistrada da primeira instância bem apreciou o conjunto probatório dos autos, não merecendo reparo o decisum alvejado. Isto posto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao recurso e majorar em 02% (dois por cento) os honorários fixados, a título de sucumbência recursal, em obediência ao disposto no art. 85, 11, do CPC/2015. Rio de Janeiro, 26 de julho de EDUARDO DE AZEVEDO PAIVA Desembargador Relator Apel. Cível Rel. Des. Eduardo de A. Paiva - ULD Página 7