Ecocardiografia durante o esforço em tapete rolante numa doente com estenose mitral [17]

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1 Ecocardiografia durante o esforço em tapete rolante numa doente com estenose mitral [17] An a Rita Al m e i d a, Ca r l o s Co t r i m, Rita Mi r a n d a, So f i a Al m e i d a, Lu í s Lo p e s, Ma r i a J. Lo u r e i r o, Otília Si m õ e s, Pedro Cordeiro, Paula Fazendas, Isabel João, Manuel Carrageta Serviço de Cardiologia do Hospital Garcia de Orta, Almada. Portugal Rev Port Cardiol 2009; 28 (2): RESUMO A ecocardiografia de sobrecarga com avaliação de parâmetros Döppler durante o esforço em tapete rolante tem sido utilizada desde há anos no nosso Serviço. Sendo utilizada maioritariamente na avaliação de doentes com doença das artérias coronárias, tem sido utilizada de modo crescente em doentes com patologia valvular. Descrevemos o caso de uma doente de 49 anos com estenose mitral moderada, em que a ecocardiografia de esforço foi decisiva para uma correcta orientação terapêutica. ABSTRACT Echocardiography during treadmill exercise testing in a patient with mitral stenosis Treadmill exercise echocardiography with Doppler during effort has been used for several years in our department. This form of echocardiography is used mainly in evaluation of patients with coronary heart disease and it is being increasingly used in valvular heart disease. We report the case of a 49-year-old woman with moderate mitral stenosis, in which stress echocardiography was important in making correct clinical decisions. Palavras-Chave Ecocardiografia de esforço; Estenose mitral; Hipertensão pulmonar Key words Exercise stress echocardiography; Mitral stenosis; Pulmonary hypertension INTRODUÇÃO ecocardiografia de esforço em tapete A rolante com aquisição de imagens também durante o esforço (1,2) é a forma preferencial de ecocardiografia de sobrecarga realizada no nosso Serviço. A avaliação de vários parâmetros Döppler durante o esforço em cicloergómetro tem sido efectuada por vários autores (3,4,5,6) em doentes com patologia valvular mitral. A realização de esforço em cicloergómetro em decúbito permite a avaliação de parâmetros Döppler durante toda a prova, no entanto, o consumo de oxigénio é menor INTRODUCTION Treadmill exercise echocardiography with image acquisition during effort (1,2) is the prefer red form of stress echo in our department. Several authors (3-6) have assessed various Doppler parameters in patients with mitral valve disease during exercise on a bicycle ergometer. Bicycle exercise in decubitus enables these parameters to be measured throughout the test but oxygen consumption is at least 10% lower (7) than in treadmill testing. In most centers, unlike ours (1), echo cardiography is used in treadmill exercise testing Recebido para publicação: Março de 2008 Aceite para publicação: Setembro de 2008 Received for publication: March 2008 Accepted for publication: September

2 Rev Port Cardiol Vol. 28 Fevereiro 09 / February em pelo menos cerca de 10% (7) relativamente à prova realizada em tapete rolante. A ecocardiografia de esforço em tapete rolante é habitualmente, ao contrário do que acontece no nosso centro (1), ecocardiografia pós esforço imediato (8,9,10), sendo os parâmetros geralmente adquiridos entre 40 a 90 segundos após o esforço máximo. Desta forma, os parâmetros avaliados não traduzem os valores máximos atingidos no pico de esforço. O tratamento dos doentes com estenose mitral depende de inúmeros factores entre os quais devemos salientar aspectos clínicos, anatómicos e funcionais que podem em grande parte ser avaliados com ecocardiografia. Por vezes, e na prática clínica, ocorrem discre pâncias significativas entre os sintomas e a hemodinâmica em repouso. Deste modo, devem ser seguidas as recomendações e efectuar ecocardiografia de esforço. CASO CLÍNICO Descrevemos o caso de uma doente de 49 anos com o diagnóstico de estenose mitral desde os 40 anos e seguida na consulta de Patologia Valvular desde há três anos. A doente tinha altura de 1,6 m, peso de 80 Kg e apresentava, nos últimos 6 meses, queixas de cansaço marcado e dispneia para pequenos esforços. No electrocardiograma a doente estava em ritmo sinusal. O ecocardiograma em repouso revelou dilatação ligeira da aurícula esquerda e estenose mitral moderada (área de 1,3 cm 2 ), quando avaliada pelo tempo de semipressão (Figura 1). O gradiente médio transmitral, em repouso e em decúbito lateral esquerdo, era de 11 mmhg (Figura 2). As cavidades cardíacas direitas eram normais e não se detectou gradiente entre o ventrículo direito e a aurícula direita, não tendo sido possível calcular por esse motivo a pressão sistólica da artéria pulmonar. Na presença de uma discrepância entre a clínica e os resultados do ecocardiograma, que revelou uma estenose mitral moderada, ausência de dilatação das cavidades direitas e aparente ausência de hipertensão pulmonar, foi decidido efectuar ecocardiograma de esforço. immediately after exercise (8-10), with the parameters being evaluated 40 to 90 seconds after peak effort, and thus they do not reflect the values attained at peak effort. Management of patients with mitral stenosis depends on many factors, particularly clinical, anatomical and functional features, most of which can be assessed by echocardiography. In clinical practice, there are often signi ficant discrepancies between symptoms and hemodynamic findings at rest, and so the guidelines recommend exercise echocardiography. CASE REPORT We report the case of a 49-year-old woman diagnosed with mitral stenosis at the age of 40 and monitored as an outpatient for the last three years. The patient, who was 1.60 m tall and weighed 80 kg, complained of severe fatigue and dyspnea on minimal exertion over the previous six months. The electrocardiogram showed sinus rhythm. The resting echocardiogram revealed mild left atrial dilatation and moderate mitral stenosis, with an area of 1.3 cm 2 assessed by the pressure half-time method (Figure 1). The mean transmitral gradient, at rest in left lateral decubitus, was 11 mmhg (Figure 2). Figura 1. Área valvular mitral funcional de 1,3 cm 2 Figure 1. Functional mitral valve area of 1.3 cm 2

3 Ana Rita Almeida et al. Rev Port Cardiol 2009; 28:195-9 Figura 2. Gradiente médio transmitral em repouso Figure 2. Mean transmitral gradient at rest No ecocardiograma de esforço, que foi efectuado em tapete rolante, utilizámos o protocolo de Bruce modificado. A prova de esforço durou 5 minutos e 15 segundos, tendo o gradiente médio transmitral medido no pico de esforço sido de 32 mmhg (Figura 3). The right cardiac chambers were normal and no gradient was detected between the right ventricle and the right atrium, and so it was not possible to calculate pulmonary artery systolic pressure. In view of the discrepancy between the patient s symptoms and the echocardiographic findings, which showed moderate mitral stenosis, no right chamber dilatation and apparent absence of pulmonary hypertension, it was decided to perform exercise echocardiography. This was performed on a treadmill using the modified Bruce protocol. The test lasted 5 minutes and 15 seconds, and the mean transmitral gradient measured at peak effort was 32 mmhg (Figure 3). In addition, a gradient of 75 mmhg was detected between the right ventricle and right atrium at peak effort (Figure 4), reflecting severe pulmonary hypertension during exertion. In light of these findings, the patient was referred to the cardiology department of another hospital for percutaneous mitral valvuloplasty. Figura 3. Gradiente médio transmitral medido no pico de esforço Figure 3. Mean transmitral gradient at peak effort Para além disso, foi também possível medir gradiente entre o ventrículo direito e a aurícula direita no pico de esforço de 75 mmhg (Figura 4), traduzindo a presença de hipertensão pulmonar Figura 4. Gradiente entre o ventrículo direito e a aurícula direita avaliado no pico de esforço Figure 4. Gradient between the right ventricle and right atrium at peak effort 197

4 Rev Port Cardiol Vol. 28 Fevereiro 09 / February 09 grave durante o esforço. Em função dos resultados do ecocardiograma de esforço a doente foi referenciada para o serviço de cardiologia de outro hospital para a realização de valvuloplastia mitral percutânea. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES Nos doentes com estenose mitral existe por vezes uma grande discrepância entre os sintomas dos doentes, desencadeados pelo esforço, e os achados hemodinâmicos avaliados em repouso (12). Na nossa doente, com estenose mitral moderada, a acentuada limitação da capacidade funcional associada ao acentuado excesso ponderal, obrigar-nos-ia a admitir a possibilidade de ser este último factor o responsável por tal limitação. Seguindo as recomendações estabelecidas (11,13), efec tuámos ecocardiograma de esforço que reve lou hipertensão pulmonar grave com o esforço. O facto de a doente ter excesso ponderal poderia explicar esta ocorrência (14), no entanto, o significativo aumento do gradiente médio através da válvula mitral, provocado pelo pequeno nível de esforço efectuado, obrigou-nos a admitir ser a estenose da válvula mitral a principal responsável pelo desenvolvimento de hipertensão pulmonar grave. Salientamos o facto de que um gradiente médio através da válvula mitral próximo de 30 mmhg, como o que é atingido pela nossa doente no final do esforço, estar muito provavelmente associado a congestão pulmonar (15). Assim, e agindo em conformidade com as recomendações estabelecidas (11,13), propusemos a realização de valvuloplastia mitral percutânea. O caso que apresentamos ilustra a utilidade da aplicação da ecocardiografia de esforço no estudo de doentes com estenose mitral em que existe significativa discrepância entre os achados hemodinâmicos avaliados em repouso e os sintomas dos doentes. DISCUSSION AND CONCLUSIONS In patients with mitral stenosis there is often a considerable discrepancy between symptoms triggered by exertion and hemodynamic findings assessed at rest (12). In our patient, with moderate mitral stenosis, her significant overweight led us to consider the possibility that this was responsible for her severely limited functional capacity. Following the established guidelines (11,13), we performed exercise echocardiography, which revealed severe pulmonary hypertension on exertion. The fact that the patient was overweight could explain this (14), but the significantly increased mean transmitral gradient with a low level of exertion led us to conclude that mitral valve stenosis was the main factor in the development of severe pulmonary hypertension. It should be noted that a mean gradient across the mitral valve of over 30 mmhg, as was the case in our patient at peak effort, is probably associated with pulmonary congestion (15). In accordance with the guidelines (11,13), we therefore referred the patient for percutaneous mitral valvuloplasty. The case presented demonstrates the usefulness of exercise echocardiography in evaluating patients with mitral stenosis in whom there is a significant discrepancy between hemodynamic parameters assessed at rest and the patient s symptoms. Pedido de separatas para: Address for reprints: 198 Carlos Cotrim Serviço de Cardiologia Hospital Garcia de Orta Avenida Torrado da Silva Almada - Portugal carlosadcotrim@hotmail.com Tlm:

5 Ana Rita Almeida et al. Rev Port Cardiol 2009; 28:195-9 BIBLIOGRAFIA / REFERENCES 1.Cotrim C, Carrageta M. Ecocardiografia de Sobrecarga Esforço. Rev Port Cardiol 2000 ;19 (3) : Cotrim C, Martins S, Soares RM, Ferreira M, Branco L, Salomão S, Antunes AM. Advantage of image acquisition during effort in exercise echocardiography. Echocardiography: A Jrnl of CV Ultrasound & Allied Tech. 1998;Vol.15,Nº6Part2 S52Abstracts. 3. Dahan M, Paillole C, Martin D et al. Determinants of stroke volume response to exercise in patients with mitral stenosis: a Doppler echocardiographic study. J Am Coll Cardiol 1993;21: Sagar KB, Wann LS, Paulson WJH et al. Role of exercise Doppler echocardiography in isolated mitral stenosis. Chest 1987;82: Rassi A, Crawford MH, Richards KL et al. Differing mechanisms of exercise flow augmentation at mitral and aortic valves. Circulation 1988;77: Aviles RJ, Nishimura RA, Pellika PA, Andreen KM, Holmes DR. Utility of stress Doppler echocardiography in patients undergoing percutaneous mitral balloon valvotomy. J Am Soc Echocardiography 2001;14: Hansen JE. Exercise instruments, schemes and protocols for evaluating the dyspneic patient. Am Rev Respir Dis 1984; 129(Suppl)S25-S Schwammenthal E, Vered Z, Rabinowitz B, et al. Stress echocardiography beyond coronary artery disease. Eur Heart J 1997;18 (Suppl D): D130-D Marwick TH. Application of stress echocardiography to the evaluation of non-coronary heart disease. Eur J Echocardiography 2000;1: Bonow R, Carabello B, Chatterjee K, de Leon A, et al. ACC/ AHA guidelines for the management of patients with valvular heart disease: a report of the American College of Cardiology/ American Heart Association: Task Force on Practice Guidelines. J Am Coll Cardiol 2006;48:e Wu W, Azis G, Sadaniantz A. The use of stress echocardiography in the assessment of mitral valvular disease. Echocardiography 2004;21: Pellikka P, Nagueh S, Ethendy A, et al. American Society of Echocardiography Recommendations for Performance, Interpretation, and Application of Stress Echocardiography. JASE 2007;20: Vachiery JL, Pavelescu A. Exercise echocardiography in pulmonary hypertension. Eur Heart J 2007: 9: H48-H Cheitlin M. Stress echocardiography in mitral stenosis: When is it useful? J Am Coll Cardiol 2004;43: Peteiro J, Fabregas R, Monserrat L, Alvarez N, Castro-Beiras A. Comparison of treadmill exercise echocardiography before and after exercise in the evaluation of patients with known or suspected coronary artery disease. J Am Soc Echocardiogr 1999;12: