ANÁLISE DO DISCURSO: PERCURSOS E INTERSEÇÕES COM O ENSINO *
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- Agustina Caldeira Marreiro
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1 ANÁLISE DO DISCURSO: PERCURSOS E INTERSEÇÕES COM O ENSINO * Em entrevista, gentilmente concedida à Revista Icarahy, a Profª. Drª Maria Aparecida Lino Pauliukonis, especialista na área da Semiolinguística um entre os campos da Análise do Discurso francesa aborda, em linhas gerais, a trajetória da AD, salientando a dialética existente entre esse consolidado ramo científico das Ciências da Linguagem e as outras correntes linguíticas contemporâneas, como a Linguística Textual e a Pragmática. Tece alguns comentários sobre o aporte da AD para o ensino, de modo especial, o de língua materna, foco de suas pesquisas. Na ocasião, aproveita para apresentar e descrever a atuação do Círculo Interdisciplinar de Análise do Discurso (CIAD-RIO), em cujas propostas também se encontram a produção e a publicação de estudos acadêmicos acerca de aspectos relativos ao texto e ao discurso. MARIA APARECIDA LINO PAULIUKONIS Professora Associada de Língua Portuguesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Atua na Graduação e na Pós-Graduação, na linha de pesquisa Discurso e ensino de língua e coordena o Grupo de pesquisa CIAD-RIO (Círculo Interdisciplinar de Análise do Discurso). Desenvolve projeto com pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), da Universidade Federal Fluminense (UFF), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e do CAD (Universidade de Paris XIII). Entre as diversas publicações em livros e revistas, destaca-se sua co-autora na obra Ensino de gramática: descrição e uso, publicado pela Contexto. * Entrevista realizada por: Adriano Oliveira Santos Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagem pela Universidade Federal Fluminense (UFF); Andrea L. Belfort Duarte - Doutoranda do Programa de Pós-Graduação Estudos de Linguagem pela Universidade Federal Fluminense (UFF); Priscilla da Silva Santos Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Linguística pela Universidade de Brasília (UNB).
2 REVISTA ICARAHY- Como a Análise do Discurso (AD) se constitui na relação com a Linguística e as Ciências Sociais? APARECIDA PAULIUKONIS A Análise do Discurso constitui hoje um dos ramos das Ciências da Linguagem que enfatiza a integração do conhecimento, por meio do estudo do significado social da linguagem, por meio da análise dos diferentes tipos de atos de comunicação, presentes em qualquer sociedade. Acrescente-se que se trata de um área do conhecimento que consolidou pesquisa sistemática, com metodologia própria e que permite uma visão crítica das interações humanas, em todos os tipos de discursos. Existem várias opções teóricas em Análise do Discurso.Uma delas, a Semiolinguística, (Charaudeau, 1992), consiste em estudar o discurso como um processo interativo em uma determinada situação, resultante de um contrato, imposto por um grupo social, e de um projeto de comunicação de uma instância subjetiva comunicante sobre uma interpretante, ambas presas a esse contrato, sempre realizado em uma dada situação sociointerativa. A Análise do Discurso tem nas interações seu principal objeto de estudo. REVISTA ICARAHY Por que só recentemente a Pragmática se aliou às Ciências Humanas? APARECIDA PAULIUKONIS Essa indagação deverá ser respondida com uma volta à Grécia antiga, onde se sabe que já havia preocupações com o estudo da eficácia do texto em uma situação. Cabia à Retórica resolver essa preocupação com a força persuasiva do discurso. Toda a história da reflexão sobre a linguagem na linguística europeia funda-se nessa dissociação entre o lógico e o retórico; enquanto o primeiro cuidava da proposição lógica, o segundo, (preocupação de sofistas e retóricos) abandonava a noção de verdade e tentava apreender a linguagem como discurso portador de efeitos de sentido. De uma certa forma, a Análise do Discurso alia-se a essas preocupações da Retórica e da Pragmática. Já a argumentação, também vista desde os lógicos, passou a ser estudada ora como integrada à Língua (Teoria da Argumentação na Língua) proposta por Oswald Ducrot ora vista como um componente retórico da linguagem, ligada aos efeitos de sentido do contexto, e, nesse sentido, mais próxima dos interesses da Análise do Discurso.
3 Foi Charles Morris (1938) que dividiu o campo do conhecimento em três áreas: a Sintaxe que trata da relação do signo com outros signos, a Semântica, do signo com seu referente e a Pragmática, da relação do signo com os usuários da língua. Após Morris, o que ficou retido na tradição foi a ideia de que a Pragmática seria uma disciplina anexa à Linguística, preocupada com o que os usuários fazem com seus enunciados; a Semântica cuidaria do conteúdo do enunciado, de suas condições de verdade, enquanto a Sintaxe ficaria restrita ao arranjo sintagmático da frase. Nesse sentido, a Pragmática se dissociaria da Semântica e, nesse caso, é como se separasse o dizer do dito, ou o uso do seu sentido primeiro, original. Teoricamente isso é possível, mas hoje essas dicotomias estão sendo revistas. REVISTA ICARAHY - Há uma relação entre os estudos da AD com os da Linguística Textual? Em que medida e como isso acontece? APARECIDA PAULIUKONIS A Linguística do Texto surgiu no final dos anos 60 e se apresentou com conceitos próprios: não apenas como uma teoria da frase estendida ao texto, mas como translinguística. Assim, ao lado de uma linguística da língua, pretendia explicar a coesão e a coerência dos textos, e estes passaram a ser vistos como uma ocorrência comunicacional. Ela constituiu um quadro dentro do qual podem se associar trabalhos sobre macrossintaxe, anáfora diretas e indiretas, referenciação, estudo de conectores, elipse, tempos e aspectos verbal, sequências textuais, etc. Nesse sentido, pode-se dizer que ela se apresenta como uma disciplina auxiliar da Análise do Discurso, e esta, sim, é de maior amplitude, pois pretende ser a que toma o discurso como objeto de estudo. REVISTA ICARAHY Como trabalhar essa relação em sala de aula de ensino fundamental e médio? APARECIDA PAULIUKONIS São muitas as contribuições da Linguística textual e da Análise do Discurso ao ensino de língua. Elas podem oferecer subsídios indispensáveis para a realização de um trabalho com o texto mais consciente por parte do alunado, sobretudo no que se refere à construção da textualidade e à produção de sentido pelos textos. É possível verificar que a escolha lexical pode ser consciente e que está diretamente ligada à macroestrutura textual, aos gêneros
4 textuais e às intenções dos autores. Também os leitores têm um papel importante na decifração do sentido dos textos, quando melhor dominarem a técnica de sua composição. É possível, inclusive, uma revitalização do ensino da gramática que passa a ser vista por um viés discursivo e não mais como um fim em si mesma. REVISTA ICARAHY - Como a AD pode contribuir para a formação de um leitor crítico analítico? APARECIDA PAULIUKONIS Uma das funções da Escola é formar leitores críticos, que interpretem o que estão lendo e saibam produzir textos coesos e coerentes. Rezam os PCNs: Formar um leitor competente, supõe formar alguém que compreenda o que lê; que possa aprender a ler também o que não está escrito, identificando elementos implícitos; que estabeleça relações entre o texto que lê e outros textos já lidos; que saiba que vários sentidos podem ser atribuídos a um texto; que consiga justificar e validar sua leitura a partir da localização de elementos discursivos que permitam fazê-lo. De uma certa forma, são esses os objetivos da Análise do Discurso: tornar o leitor consciente do discurso e de suas potencialidades e ainda da complexidade do sentido dos textos. REVISTA ICARAHY - Em que medida a AD colabora para a formação do professor? APARECIDA PAULIUKONIS O mesmo se pode aplicar ao professor. Ele tem de possuir além de uma base sólida da Gramática da língua, competências discursivas que vão lhe permitir ver o texto, não apenas como um produto pronto e acabado, mas como discurso. Isso, de alguma forma, está presente também nos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais), quando afirmam: Uma prática constante de leitura na escola deve admitir leituras. Pois outra concepção que deve ser superada é o mito da interpretação única, fruto do pressuposto de que o significado está no texto. O significado, no entanto, constrói-se pelo esforço de interpretação do leitor, a partir não só do que está escrito, mas do conhecimento que ele traz para o texto. É necessário que o professor tente compreender o que há por trás dos diferentes sentidos atribuídos pelos alunos aos textos; às vezes é porque o autor intencionalmente jogou com as palavras para provocar interpretações múltiplas; às vezes é porque o texto é difícil ou confuso; às vezes é porque o leitor tem pouco conhecimento sobre o assunto tratado e, a despeito do seu esforço, compreende
5 mal. Há textos nos quais as diferentes interpretações fazem sentido e são necessárias: é o caso dos bons textos literários. Há outros que não: são textos instrucionais, enunciados de atividades e problemas matemáticos, por exemplo, que só cumprem sua função se houver compreensão do que deve ser feito. Percebe-se que são claramente os ensinamentos da Linguística Textual que respaldam as postulações dos PCNs. REVISTA ICARAHY - Gostaríamos que comentasse sobre os trabalhos que vêm sendo desenvolvidos pelo Círculo Interdisciplinar de Análise do Discurso Rio (CIAD- Rio). APARECIDA PAULIUKONIS O CIAD/Rio (Círculo Interdisciplinar de Análise do Discurso) constitui grupo de pesquisa, com Projeto Integrado, sediado na Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 3º andar, bloco H, sala 310. Congrega, atualmente, professores doutores, mestres e alunos dos programas de Pós-Graduação de três universidades públicas cariocas: UFRJ, UFF e UERJ. Como entidade, inicia seus trabalhos em 1993, participando do convênio de cooperação científica através do Acordo CAPES COFECUB, nº 152/92, entre universidades brasileiras (UFMG, UFRJ, UNICAMP e UFPE) e o CAD (Centre d Analyse du Discours), da Universidade de Paris XIII tendo como diretor o Professor Patrick Charaudeau. O Acordo estendeu-se até o final de 2000 e se encerrou com expressiva produtividade: Três Encontros Franco-Brasileiros de Análise do Discurso, realizados no Rio de Janeiro, na Faculdade de Letras da UFRJ, organizados pelo Grupo CIAD, além de 02 Seminários Internacionais de Análise do Discurso, organizados pelo NAD, Núcleo de Análise do Discurso da Fale UFMG. Os encontros propiciaram análises e publicações conjuntas dos pesquisadores. Dentre as publicações conjuntas, citam-se, além dos Anais de cada Encontro, com os trabalhos apresentados, obras coletivas, como: Discurso, coesão, argumentação, Org. de Leonor Werneck dos Santos, Rio de Janeiro, Editora Oficina do Autor e O Discurso da Mídia, organização de Agostinho Dias Carneiro, RJ, Oficina do Autor, 1996 A partir de 2001, em sua nova fase, o CIAD/Rio constituiu novo Projeto Integrado, com pesquisadores das principais universidades do Rio, em torno do estudo das Operações discursivas na enunciação: a construção de imaginários sociais traduzidas em produções da mídia impressa, em textos literários, no discurso pedagógico e no discurso da tradução.
6 Após apresentações em Congressos, no segundo semestre de 2002, os trabalhos de pesquisa foram reunidos para publicação em um livro intitulado Texto e Discurso: Mídia, Literatura e ensino, publicado em fevereiro de 2003, pela Editora Lucerna, RJ. O livro teve como organizadoras as professores Maria Aparecida Lino Pauliukonis (UFRJ) e Sigrid Gavazzi (UFF). Durante os anos de 2003 e 2004, o Grupo concentrou estudos e pesquisas na temática: Práticas Lingüísticas e Operações discursivas, segundo orientação dos PCNs, incrementando pesquisas pelos membros do Grupo, que culminaram na publicação do livro: Da língua ao discurso: reflexões para o ensino, em 2005, também pela Editora Lucerna RJ. Nesta proposta atual, os artigos reunidos analisam textos e propõem atividades pedagógicas que focalizam o ensino gramatical a partir de uma visão discursiva. Além da publicação recente desses dois livros, o Grupo tem participado de congressos nacionais e internacionais, objetivando divulgar suas pesquisas. Em outubro de 2005 foi Organizado o I Simpósio Internacional de Análise do Discurso na Faculdade de Letras da UFRJ, com a temática : Estratégias de leitura: a formação do leitor crítico; contou com a participação de todos os membros do CIAD, em mesas redondas, palestras e ministrando minicursos, para mais de trezentos participantes, alunos da Graduação e da Pós. Os trabalhos apresentados no Congresso foram publicados em 2006, sob o título: Estratégias de leitura: texto e ensino. Em setembro de 2010, realizou-se o II Fórum Internacional de AD, também com recorde de participantes, cuja temática contemplou o texto, o discurso e a enunciação, cujos anais estão sendo preparados para serem colocados na página do Grupo: www. ufrj.ciadrio.com.br, ainda este ano.
EMENTA OBJETIVO GERAL
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