ENSINO POR INVESTIGAÇÃO: UMA PROPOSTA DE LEITURA E ESCRITA NO ENSINO DE BIOLOGIA

Transcrição

1 ENSINO POR INVESTIGAÇÃO: UMA PROPOSTA DE LEITURA E ESCRITA NO ENSINO DE BIOLOGIA Sandra Luiza Sousa Santos de Almeida (Professora da Escola Estadual Professora Ana Júlia de Carvalho Mousinho) Kaline Soares de Oliveira (Mestranda do Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática UFRN) Magnólia Fernandes Florêncio (Universidade Federal do Rio Grande do Norte) Resumo: O presente trabalho mostra o relato de experiência de um projeto desenvolvido com alunos do Ensino Médio de uma Escola pública de Natal, realizado no biênio 2012/2013. O projeto faz parte das atividades do Ensino Médio Inovador e visa incentivar os alunos a desenvolver habilidades de pesquisa e investigação, com ênfase na leitura e produção textual no processo de construção dos conceitos básicos de Biologia, utilizando como estratégia didática o ensino por investigação. O que se percebe ao final do trabalho, são alunos mais motivados com a disciplina, capazes de produzir e desenvolver projetos que tenham aplicabilidade no seu cotidiano, como também melhor sintonizados com a leitura científica e sua compreensão. Palavras-chave: Ensino por investigação. Ensino de Biologia. Leitura. Escrita. Introdução Tendo em vista a importância da utilização de metodologias de ensino que facilitem o processo de ensino-aprendizagem, uma possibilidade de estratégia didática é a realização de atividades investigativas para uma melhor compreensão dos conteúdos apresentados em sala de aula, além da aprendizagem de procedimentos e atitudes. O Ensino por investigação é uma estratégia de ensino que engloba atividades centradas no aluno, possibilitando o desenvolvimento da autonomia e da capacidade de tomar decisões, de avaliar e de resolver problemas (SÁ, MAUÉS e MUNFORD, 2008). Aprender a investigar envolve aprender a observar, planejar, levantar hipóteses, realizar 6758

2 medidas, interpretar dados, refletir e construir explicações de caráter teórico (SÁ, MAUÉS e MUNFORD, 2008). Segundo Azevedo (2010) utilizar atividades investigativas como ponto de partida para desenvolver a compreensão de conceitos é forma de levar o aluno a participar de seu processo de aprendizagem e sair de uma postura passiva. A mesma autora reforça que uma atividade de investigação faça sentido para o aluno, de modo que ele saiba o porquê de estar investigando o fenômeno apresentado. Um dos múltiplos desafios a ser enfrentado pela escola é o de fazer com que os alunos aprendam a ler corretamente, trabalhando a leitura com a finalidade de formar leitores competentes. Faz-se necessário que o professor reconheça na leitura esse sentido e possa refletir sobre a prioridade dessa prática nas diversas áreas do conhecimento. No que diz respeito à leitura científica é preciso entender que ler não é simplesmente decodificar, converter letras em sons. A aquisição de habilidades leitoras deve ser realizada com a intervenção do professor, que deverá colocar-se na situação de principal parceiro e motivador de seus alunos, garantindo que a heterogeneidade do grupo seja um instrumento da troca, da colaboração e, consequentemente, da própria aprendizagem. Nesse sentido Sedano (2013) reforça que a leitura contextualizada, com objetivos bem definidos e função social, é viabilizada a partir de cursos e respectivas propostas pedagógicas apoiadas no protagonismo do aluno como construtor do conhecimento. Assim, em aulas de Ciências que tem por objetivo a problematização e o ensino por investigação, o texto exerce a função de aproximar o aluno dos conceitos científicos. Diante desse contexto, por que não desenvolver a habilidade leitora através de aulas experimentais que instiguem a curiosidade, por meio da investigação? Entendendo que a construção do conhecimento se dá pela prática da leitura e escrita, utilizando-se preferencialmente de temas que são de interesse desses jovens, a proposta de desenvolver metodologias que incentivem o ensino por investigação pretende melhorar esse quesito na prática pedagógica dos estudantes. Apresentamos como objetivo geral do projeto a possibilidade de formar alunos capazes de desenvolver habilidades de pesquisa e investigação, com ênfase na leitura e 6759

3 produção textual, para que se percebam coparticipantes na construção de sua aprendizagem. Metodologia O projeto foi desenvolvido em uma escola da Rede Estadual de Ensino, durante o biênio 2012/2013, como proposta a ser trabalhada no Ensino Médio Inovador PROEMI. O grupo de trabalho era formado por alunos das três séries do Ensino Médio, caracterizando uma turma bastante heterogênea. Os encontros tinham duração de quatro horas semanais e ocorriam aos sábados. Para o desenvolvimento do projeto, dividimos sua realização em quatro momentos distintos: (1) Explicitação ao grupo de alunos sobre os objetivos e sobre o tipo de abordagem, o ensino-aprendizagem por investigação; (2) Definição dos grupos de trabalho e escolha dos temas a serem investigados; (3) Produção de material; (4) Socialização das metodologias aplicadas e resultados obtidos. 1. Explicitação ao grupo de alunos sobre os objetivos e sobre o tipo de abordagem, o Ensino-aprendizagem por investigação: Inicialmente foi feito um levantamento dos conhecimentos prévios do grupo de alunos sobre a compreensão do significado do termo Ensino por investigação. A partir das respostas obtidas, iniciamos a apresentação de material informativo sobre a temática. A ideia foi apresentar as etapas que caracterizam a metodologia do Ensino por investigação com base em Oliveros (2013), utilizando uma situação problema já definida pela professora coordenadora. A questão problematizadora proposta estava relacionada à quantidade de Vitamina C presente em alguns alimentos. Como definição do problema, trabalhamos com a possibilidade de definir o teor de vitamina C nos sucos de caixinhas. A partir daí, estabelecemos hipóteses e elaboramos experimentos controlados para construção de novos conhecimentos. 2. Definição dos grupos de trabalho e escolha dos temas a serem investigados 6760

4 Agora cientes das etapas que deveriam seguir, definimos os grupos de trabalho e os alunos definiram temas que gostariam que fossem investigados: Foram formados dois grupos assim distribuídos: O grupo 01 formado por alunos da primeira e segunda série do Ensino Médio e o grupo 02 formado por alunos da terceira série do Ensino Médio. O grupo 01 escolheu trabalhar com a temática sobre crescimento vegetal e elaborou a seguinte questão problematizadora: As mudas de uma mesma planta possuem o mesmo desenvolvimento sob diferentes comprimentos de onda luminosa? Após a definição da questão problematizadora, os alunos elaboraram as hipóteses explicativas e em seguida a metodologia para investigar o problema (Figuras 1 e 2). Figura 1. Montagem das mudas Foto: Aluna da primeira série Figura 2. Montagem das caixas com espectros luminosos diferentes. Foto: Aluna da primeira série do Ensino Médio O segundo grupo, formado por alunos da terceira série, escolheu pesquisar sobre o ciclo da água na natureza a partir da montagem de um terrário. A questão 6761

5 problematizadora desenvolvida pelo grupo foi: Como circula a água em um ambiente fechado? Para responder a pergunta a ser investigada, os alunos elaboram possíveis explicações e criaram um experimento para verificar as hipóteses. Os alunos construíram um terrário simulando um ambiente com os fatores bióticos e abióticos. 3. Produção de Material: A partir da escolha dos temas a serem trabalhados, os alunos foram orientados a buscar textos informativos, artigos já publicados, com a intenção de promover a busca por novas informações, bem como ampliar prévias sobre o tema. Tendo em vista que o projeto também visa à formação de leitores, essa etapa do trabalho tinha a intenção de fortalecer esse objetivo. 4. Socialização das metodologias aplicadas e resultados obtidos: Nesta etapa, todo o material produzido, incluindo as hipóteses levantadas, as metodologias de investigação e resultados obtidos foram apresentados para a comunidade escolar no Festival de Arte e Cultura - FESTAC, feira cultural que acontece na Escola e também na Mostra Cientifica da Universidade Federal CIENTEC. Resultados e discussão Dentre as características destacadas nas atividades propostas por meio do Ensino por investigação, podemos citar: o conhecimento prévio do aluno, o protagonismo do estudante no processo de Ensino-aprendizagem, a coletividade na construção do conhecimento, elaboração de experimentos e a mediação do professor, o que certamente contribui na formação, uma vez que, favorece uma prática de reflexão e discussão tornando-se cada vez mais importante esse tipo de procedimentos nas aulas de Biologia. O Ensino por investigação possibilita ao aluno a compreensão de conteúdos conceituais, habilidades atitudinais e procedimentais essenciais para a sua formação como pessoa consciente e participante do seu aprendizado. Nessa dinâmica, foram oportunizados momentos de apresentação de todo o desenvolvimento do projeto realizado pelos dois grupos. Observou-se a seriedade e comprometimento dos alunos envolvidos. Cada um demonstrava segurança e 6762

6 tranquilidade naquilo que expunha. Percebeu-se ainda a maneira com a qual os alunos propunham novos sentidos a conceitos antes discutidos por eles. Levando em conta o trabalho desenvolvido, percebeu-se que os objetivos realmente foram alcançados. Evidentemente que, ao final, todos os envolvidos precisam avaliar seu desempenho e como enfatizam Campos e Nigro (1999) os questionamentos permitem constante aprimoramento da prática, de modo a buscar sempre a maneira mais eficiente de ensinar e consequentemente tornar a aprendizagem com significados. A divulgação do projeto foi feita em dois fóruns de bastante relevância para o contexto estudantil. O primeiro realizado em setembro de 2013, no Festival de Arte e Cultura da Escola. Esse evento já acontece há mais de dez anos, e tem como objetivo apresentar o resultado dos trabalhos realizados pela comunidade escolar ao longo do ano. Em um segundo momento, o trabalho foi apresentado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte durante a CIENTEC, o que resultou em uma aprovação de bolsas de pesquisa para os alunos participantes do projeto, concedidas pela Fundação de Apoio às Pesquisas do Rio Grande do Norte FAPERN. Diante do exposto, temos clareza de que o desenvolvimento de uma aprendizagem investigativa torna as aulas de Biologia mais participativas e dinâmicas. Acrescente-se a isso a possibilidade de formarmos melhores leitores em um gênero textual muito específico, que são os textos científicos. Como destaca Sedano (2013) os conceitos previstos para as aulas de Ciências podem ser incorporados em práticas pedagógicas motivadoras e eficientes, e tais práticas podem ser acompanhadas de textos que proponham aos alunos a sistematização dos conteúdos trabalhados, conceitos tratados nos experimentos favorecendo a compreensão. O grupo, a partir das leituras desenvolvidas, pode produzir textos com uma linguagem mais simples, coerente com a sua faixa etária e totalmente alicerçada naqueles conhecimentos adquiridos durante a execução do trabalho. CONSIDERAÇÕES FINAIS A intenção final do trabalho era que os estudantes entendessem as etapas de uma atividade investigativa por meio do ensino por investigação, como também a formação de leitores competentes e, consequentemente, escritores críticos e participativos. 6763

7 Com isso, reforçando a importância da leitura como uma necessidade para participar plenamente da vida social, capazes de ler e escrever diferentes tipos de textos, nas várias disciplinas do currículo escolar e situações do cotidiano como, por exemplo, em procedimentos experimentais, rótulos de alimentos, bulas de medicamentos. Além da motivação pelo gosto da leitura, para que compreendam que estão envolvidos nos projetos de construção do (auto) conhecimento. REFERÊNCIAS AZEVEDO, M. C.P. S. de. Ensino por investigação: Problematizando as atividades em sala de aula. In: Ensino de Ciências: Unindo a pesquisa e a prática. São Paulo: Cengage Learning, CAMPOS, M. C. C. NIGRO, R. G. O ensino-aprendizagem como investigação. São Paulo: FTD, OLIVEROS, P. B. Ensino por investigação: Contribuições de um curso de formação continuada para a prática de professores de biologia e ciências naturais, f. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, SÁ, E. F.; MAUÉS, E. R. C.; MUNFORD, D. Ensino de Ciências com caráter investigativo I. In: CASTRO, Emília Caixeta de; MARTINS, Carmen Maria de Caro; MUNFORD, Danusa (orgs.) Ensino de Ciências por Investigação ENCI: Módulo I. Belo Horizonte: UFMG/FAE/CECIMIG, P.109. SEDANO, L. Ciências e leitura: um encontro possível. In: CARVALHO, A. M. P. de et al. Ensino de Ciências por investigação: Condições para a implementação em sala de aula. São Paulo: Cengage Learning,