PODER JUDICIÁRIO Justiça Federal de Primeira Instância

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1 SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO 31ª Vara Federal do Rio de Janeiro ORDINÁRIA/PROPRIEDADE INDUSTRIAL PROCESSO Nº ( ) AUTOR: CALCADOS BIBI LTDA RÉU: JORGE LUIZ WEBER e INPI-INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL JUIZ FEDERAL: MARCELO LEONARDO TAVARES SENTENÇA A EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E PROPRIEDADE INDUSTRIAL. POSIÇÃO PROCESSUAL DO INPI COMO RÉU. DESENHO INDUSTRIAL. MNULIDADE DE REGISTRO. PROCEDÊNCIA. 1. Nos casos em que se pretende anular ato praticado pelo INPI, sua correta posição jurídica na relação processual é de réu. No presente caso, o INPI teve oportunidade de apreciar os pressupostos de registro durante o processo administrativo de nulidade. 2. Falta de novidade e de originalidade no Desenho Industrial. 3. Nulidade do registro. 4. Pedido julgado procedente. RELATÓRIO 1. CALÇADOS BIBI LTDA propôs a presente ação, em trâmite no rito ordinário, em face de JORGE LUIZ WEBER e do INSTITUTO NACIONAL DE PROPRIEDADE INDUSTRIAL - INPI, pleiteando o reconhecimento da nulidade do ato administrativo do INPI que concedeu o registro de desenho industrial DI , de titularidade do 1º réu, intitulado CONFIGURAÇÃO APLICADA EM SOLADO. Alega que a forma plástica do objeto do registro já estaria absorvida pelo estado da técnica, quando de seu depósito, não apresentando, assim, os requisitos de novidade e originalidade. Relata ter apresentado pedido administrativo

2 de nulidade do registro perante o INPI, o qual teve seu provimento negado. Foi requerida tutela antecipada na inicial. 2. Procuração às fls. 23 e documentos às fls Custas integralmente pagas à fl À fl. 234, o juízo afirmou que apreciaria o requerimento de antecipação dos efeitos da tutela após a vinda das contestações. 4. Contestação da autarquia, às fls , sustentando, preliminarmente, a sua intervenção no feito na qualidade de assistente. No mérito, pugna pela improcedência do pedido, por entender, após reexame do desenho industrial objeto da ação, que os documentos trazidos pela autora não se prestariam como anterioridades impeditivas do registro, conforme parecer técnico de sua Diretoria de Patentes. 5. Contestação do 1º corréu, às fls , pugnando pela improcedência do pedido autoral, sob o argumento de que o DI em questão preencheria todos os requisitos legais para sua concessão. Sem preliminares. Juntou documentos às fls Réplica às fls A parte autora requereu a produção de prova pericial e juntou documentos às fls À fl. 395, foi deferida prova pericial. 8. A parte autora apresentou quesitos e indicou assistente técnico às fls ; o 1º réu, às fls ; e o INPI, às fls Laudo pericial às fls , concluindo pela nulidade do DI Oportunizada a vista do laudo, vieram aos autos manifestação da parte autora (fls ), da parte ré (fls ) e do INPI (fls ). 11. Esclarecimentos prestados pelo perito às fls Eis o que importa relatar. Passo a decidir. FUNDAMENTAÇÃO

3 Preliminar Da Posição Processual do INPI 13. A autarquia, nos casos em que conhecer administrativamente dos pressupostos de registro de DI e mantiver judicialmente o fundamento da concessão deve ser ré, tendo em vista a responsabilidade pelo ato administrativo praticado. Região: 14. Outro não é o entendimento do egrégio TRF, da 2ª PROCESSUAL CIVIL - PROPRIEDADE INDUSTRIAL - AÇÃO DE NULIDADE PATENTE - INPI - LITISCONSORTE PASSIVO NECESSÁRIO - PLURALIDADE DE RÉUS COM DOMICÍLIOS DIFERENTES - FACULDADE LEGAL DE ESCOLHA DO FORO -ART. 94, 4, DO CPC. - O Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI é o responsável pelo registro de marcas e patentes no país. Conseqüentemente, deve figurar como réu e não como mero assistente nas ações judiciais de nulidade de registro. Entendimento do art. 175 do Código de Propriedade Industrial (Lei nº 9.279/96). - Havendo pluralidade de réus e domicílios diferentes, é facultado ao Autor a escolha do foro, conforme disposto no 4 do art.94 do CPC. - Como o INPI possui sede nesta cidade afigura-se competente a Justiça Federal do Rio de Janeiro para analisar e julgar o feito. - Agravo desprovido.

4 (AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO , rel. Juiz Convocado Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, pub. DJ 17/11/2005, p. 150) 15. No presente caso, o INPI, antes da propositura da ação, teve oportunidade de apreciar o mérito da concessão no processo administrativo de nulidade, mantendo o ato administrativo do registro. 16. Logo, deve ocupar o polo passivo da relação processual como parte. Mérito 17. A autora sustenta que o DI não é dotado de novidade e de originalidade. Apresenta como anterioridades impeditivas da novidade a patente norte-americana US , de 2000, a patente inglesa UK , de e a PI , de A Lei 9.279/96 define o desenho industrial e seus pressupostos de registro de pedido nos arts. 95/97: Art. 95. Considera-se desenho industrial a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial. Art. 96. O desenho industrial é considerado novo quando não compreendido no estado da técnica....

5 Art. 97. O desenho industrial é considerado original quando dele resulta uma configuração visual distintiva em relação a outros objetos anteriores. 19. Logo, para a regularidade ou não de um registro de desenho industrial concedido pelo INPI, devem ser avaliados seus pressupostos, quais sejam: função ornamental; possibilidade de fabricação industrial; novidade; originalidade. Quanto ao primeiro requisito, interessante notar que o que diferencia o desenho industrial do modelo de utilidade é que naquele a nova forma é meramente ornamental, enquanto no segundo a forma é utilitária. O segundo requisito traduz uma habilidade técnica industrial já disponível para a fabricação da nova forma. O desenho industrial é considerado novo se não está compreendido no estado da técnica, isto é, se ainda não se tornou acessível ao conhecimento público na data do depósito do pedido, no Brasil ou no exterior, por uso ou qualquer outro meio, ressalvado o disposto no 3º do art. 96, da LPI. A originalidade, por sua vez, resulta de uma configuração visual distintiva em relação a outros objetos anteriores (artigo 97, da LPI). 20. Na lição de Gabriel de Blasi, quanto à novidade: Considera-se um desenho industrial novo quando este não está compreendido no estado da técnica. No que se refere a desenhos industriais, o estado da técnica constitui tudo aquilo tornado acessível ao público antes da data de depósito do pedido de registro no Brasil ou no exterior. (in A Propriedade Industrial, ed. Forense, 2005). Cerqueira: 21. Já a originalidade, apoia-se na lição de João da Gama Os desenhos e modelos são protegidos com criações intelectuais e o direito que a lei assegura

6 aos seus autores origina-se do fato da criação, tendo o mesmo fundamento que o direito dos inventores e dos autores de obras literárias ou artísticas. Daí a necessidade de ser o desenho ou modelo, original, pois seria injusto conferir-se a qualquer pessoa um direito exclusivo sobre coisas que não resultam de seu trabalho e pertencem ao domínio público ou ao patrimônio comum das artes e das indústrias. Não se requer, porém, que o desenho ou modelo seja inteiramente novo ou original, bastando que se distinga dos objetos comuns e de outros desenhos ou modelos conhecidos.[...] Tudo está na maneira pessoal de tratar o assunto, imprimindo o autor à sua criação um cunho novo, uma individualidade própria, que a distinga de outros semelhantes (in Tratado da Propriedade Industrial, vol. I). (grifo nosso) 22. A definição de estado da técnica encontra-se em parágrafo do art. 96 da Lei 9279/96: 1º O estado da técnica é constituído por tudo aquilo tornado acessível ao público antes da data de depósito do pedido, no Brasil ou no exterior, por uso ou qualquer outro meio, ressalvado o disposto no 3º deste artigo e no art O que diferencia, portanto, a novidade da originalidade, pela nossa lei, é que, no primeiro caso, há definição legal do que seja novidade. Já originalidade, nas palavras de José Carlos Tinoco Soares, é aquilo que não é reproduzido, copiado ou imitado, aquilo que é fruto de concepção do autor e de sua própria inspiração (idem).

7 24. Conforme a lição de José Carlos Tinoco Soares (in Tratado da Propriedade Industrial Patentes e seus sucedâneos, editora Jurídica Brasileira, 1998), a LPI eliminou a proteção específica do modelo industrial (MI) e do desenho industrial (DI), para englobá-los sob o termo de DESENHOS INDUSTRIAIS. 25. A questão posta a julgamento no presente caso é a existência ou não de novidade e de originalidade, ou seja, se a configuração aplicada ao solado no DI no preenche esses dois pressupostos para registro. 26. A descrição do desenho industrial protegido é a seguinte (fl ): A configuração aplicada em solado (30) inclui uma face superior em plano anatômico, borda de acabamento (20) na periferia e uma sola (31). A sola (31) apresenta pelo menos uma depressão (10) na região do calcanhar, dita depressão (10) com base arredondada e unida por paredes planas até o nível da sola (31). Em duas paredes laterais paralelas da depressão (10), um recorte retangular (11) abriga uma estrutura retangular (12) posicionada justaposta à parede de recorte retangular (11), dita estrutura retangular (12) que apresenta uma canaleta central (não apresentada nos desenhos por simplificação). Na depressão (10) é inserida uma peça cilíndrica (13) com um eixo central (14) cujas

8 extremidades do eixo central (14) são encaixadas na canaleta central da estrutura retangular. (...) REIVINDICAÇÃO 1. CONFIGURAÇÃO APLICADA EM SOLADO caracterizada por ser substancialmente conforme as figuras em anexo. 27. É importante destacar que o objeto da proteção no DI é a forma plástica nova e original e não aspectos referentes à invenção ou a melhorias funcionais em objeto, protegidos por patente de invenção ou de modelo de utilidade. 28. Observada a descrição do solado protegido, não consigo identificar qual seria a contribuição plástica relevante no solado. As figuras de fls. 41/43 apresentam um solado liso a ser aplicado preferencialmente a tênis, muito simples. 29. Mais uma vez: não se esta aqui considerando a questão do rodízio aplicado em tênis, mas sim o que seri a forma estética criativa de um solado de tênis que utilize o dispositivo. (fl. 245): 30. Como o próprio INPI confessa em sua contestação (...) Ora, como já temos conhecimento, calçados com rodízios já são fartamente conhecidos do estado da técnica, inclusive tal aplicação já é do domínio público. (...)

9 31. O que ressai do pedido de registro é o foco colocado sobre o rodízio em si, que já se encontra no estado da técnica, a não na forma original de um solado. A descrição feita no pedido é essencialmente funcional, o que não interessa ao fim do que se pretende:registro de desenho industrial. 32. Fica claro que o desenho do solado em si, mesmo com o rodízio, não traz qualquer contribuição estética criativa (falta de originalidade), além de conter essencialmente traços estéticos de solados já encontrados no estado da técnica (falta de novidade). 33. A empresa ré, na defesa da novidade e da originalidade de seu pedido de registro, não consegue esclarecer no que consistiria a contribuição plástica de seu produto (fls ). Confunde originalidade com atividade inventiva e, na comparação com as invocadas anterioridades, pretende destacar questões funcionais, que não importam ao tipo de proteção de DI. 34. No mesmo sentido, a conclusão do laudo pericial de fls , com o esclarecimento prestado à fls , com destaque (fls. 477/478): Conforme comentado no segundo quesito deste rol, pode-se concluir que de acordo com a documentação apresentada como anterioridade (US 6,406,038 US 6,450,038 GB EP ), dando como exemplo o documento 6,406038, que apresenta um tênis em cujo solado, no calcanhar, é disposta uma reentrância quadrangular provida de uma disposição estrutural para encaixe de uma peça cilíndrica transversalmente disposta (...) que

10 conforme pode-se constatar, na descrição técnica deste registro de desenho industrial, o DI , seu detalhamento se ater principalmente aos detalhes construtivos da disposição do sistema de rolamento, ou seja, características construtivas funcionais e internas do dispositivo de rolamento, cujo princípio já é do domínio do estado da técnica, conforme anterioridades aqui citadas. Portanto, em decorrência de tais contradições ao disposto em lei, em minha opinião, vejo como passível de Nulidade o presente registro de desenho industrial. 35. Logo, o pedido formulado deve ser acolhido. 36. Presente o direito subjetivo da demandante reconhecido em decisão exauriente de Primeira Instância e o perigo na demora consubstanciado no risco de a autora suportar constrição em ação proposta pelo réu na Justiça Estadual, defiro antecipação dos efeitos da tutela para suspender o registro DI Cabe ao INPI dar cumprimento no prazo de vinte dias DISPOSITIVO 37. Isto posto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO formulado, para declarar a nulidade do registro de desenho industrial DI , concedido pelo INPI em favor de Jorge Luiz Weber. 38. Os réus devem ressarcir a autora pelo adiantamento das despesas processuais. Condeno os demandados em honorários advocatícios de sucumbência no percentual de 15% sobre o valor atribuído à causa pro rata em favor da autora.

11 39. Transitada em julgado, cabe ao INPI publicar o teor da decisão, para ciência de terceiros, nos termos do art. 57, parágrafo 2º, da LPI. 40. Publique-se. Registre-se. Intimem-se, inclusive o INPI para dar cumprimento à antecipação dos efeitos da tutela. Oficie-se ao Juízo de Direito da Comarca da Parobé/RS, em referência ao feito 157/ , com cópia desta sentença. Rio de Janeiro, 1 de dezembro de Assinado Eletronicamente MARCELO LEONARDO TAVARES Juiz Federal