APLICAÇÃO DE CONCEITOS DA ARQUITETURA BIOCLIMÁTICA COMO EXEMPLO DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA NO CLIMA QUENTE E ÚMIDO

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1 APLICAÇÃO DE CONCEITOS DA ARQUITETURA BIOCLIMÁTICA COMO EXEMPLO DE EFICIÊNCIA ENERGÉTICA NO CLIMA QUENTE E ÚMIDO RESUMO Aldomar Pedrini, PhD PPGAU - UFRN Sileno Cirne Trindade, MSc Labcon - UFRN A arquitetura bioclimática teve, ao longo das últimas décadas, sua importância resgatada, sobretudo devido à inclusão da eficiência energética na agenda mundial. No Brasil, mesmo com a ampla divulgação das preocupações com a sustentabilidade das edificações, ainda são poucos os exemplos de edifícios projetados visando à economia de energia, principalmente nas regiões menos desenvolvidas do país. Este artigo apresenta um estudo de eficiência energética para um edifício escolar construído na cidade de Natal, nordeste do país, que incorporou ao seu projeto alguns conceitos bioclimáticos. O estudo demonstra através de simulações computacionais, que, por meio de simples decisões projetuais, como orientação adequada e sombreamento das aberturas, é possível reduzir o potencial de consumo energético de uma edificação, quando comparado a soluções projetuais normalmente encontradas na região. ABSTRACT The bioclimatic architecture had, over the past decades, its importance rescued, mainly due to the inclusion of energy efficiency on the global agenda. In Brazil, despite the widespread concerns about the sustainability of buildings, there are few examples of buildings designed aiming at energy savings, especially in less developed regions of the country. This article presents a study of energy efficiency for a school building in Natal, northeastern Brazil, which incorporated bioclimatic design concepts. The study demonstrates through computer simulations that using simple project decisions as appropriate orientation and shading of openings, it is possible to reduce the energy consumption of a building when compared to design solutions typically found in local buildings.

2 1 INTRODUÇÃO A eficiência energética ganhou importância nas últimas décadas do século XX, devido a fatores como a crise do petróleo, as preocupações com o clima global e o crescimento das ações voltadas à sustentabilidade, entre outros, fazendo com que o tema entrasse na agenda mundial. No Brasil, após o episódio da crise energética de 2001, a eficiência energética estabeleceu-se como meta no país, com a publicação de leis e regulamentos visando um menor impacto das construções sobre o consumo de energia, uma vez que 42% de toda energia consumida no país é oriunda das edificações (LAMBERTS et al, 1997). A arquitetura bioclimática, com isto, teve a sua importância resgatada, após muitos anos de predomínio das soluções de iluminação e condicionamento artificiais, impulsionadas pelo desenvolvimento dessas técnicas ao longo do século passado. Os conceitos de bioclimatologia além de buscarem o conforto térmico dos usuários, atuam diretamente na redução do consumo energético dos edifícios, por priorizarem as soluções passivas de ventilação e iluminação. Mesmo com a difusão das preocupações com a sustentabilidade das edificações no país, o uso de conceitos bioclimáticos e de eficiência energética ainda são pouco utilizados, principalmente nas regiões menos desenvolvidas do país. A arquitetura bioclimática encontra barreiras à sua aplicação, entre outros, pela falta de ferramentas de simulação acessíveis à grande maioria dos arquitetos, que garantam o sucesso das soluções passivas adotadas, ainda nas fases de concepção do projeto (TRINDADE, 2006). 2 OBJETIVO Este artigo tem como objetivo demonstrar, por meio de simulações termo-energéticas, que com a adoção de conceitos básicos da arquitetura bioclimática, como orientação adequada e sombreamento das aberturas, é possível reduzir o consumo energético de um edifício localizado no clima quente e úmido de Natal/RN, quando comparado a soluções projetuais sem as mesmas preocupações. 3 METODOLOGIA A metodologia adotada foi dividida em três fases principais: escolha de um edifício com características de arquitetura bioclimática, a formulação de duas variações deste prédio, baseadas em modelos hipotéticos sem estas características e, por fim, as simulações computacionais para gerar os dados de consumo energético com ar-condicionado. A partir da comparação dos

3 resultados das simulações foi possível medir a influência das soluções bioclimáticas no consumo dos três modelos. 3.1 O edifício estudado O estudo tomou como base um edifício escolar, localizado dentro do campus central da UFRN, em Natal/RN. O clima local é do tipo quente e úmido, caracterizado por baixa amplitude térmica e alta umidade do ar (ABNT, 2005). O edifício da Escola de Ciências e Tecnologia da UFRN foi escolhido por representar uma nova tipologia de edifício construída dentro do campus central. O edifício possui uma área de piso de 6.768,30 m² distribuídos em quatro pavimentos. O edifício caracteriza-se formalmente pela volumetria horizontal e a utilização de uma cobertura metálica com grandes beirais que protege as fachadas norte e sul, uma vez que sua implantação se dá no sentido leste-oeste, sem aberturas nas fachadas de maior insolação (Figura 1). A planta é marcada por uma circulação central que divide as duas alas principais, cujos ambientes possuem aberturas para ventilação cruzada. O sombreamento das fachadas é complementado por brises em frente às aberturas envidraçadas, que garantem bom nível de iluminação natural sem entrada de radiação direta nos ambientes, na maior parte dos horários. (a) (b) (c) (d) Figura 1 - Planta do pavimento tipo (a), corte transversal (b) e fotos do edifício (c e d) em obras.

4 3.2 Definição dos modelos A metodologia adotada no estudo baseou-se na comparação dos resultados de consumo energético anual com ar-condicionado entre modelos computacionais que representaram o edifício estudado com suas características reais, e mais duas situações onde foram eliminadas algumas soluções projetuais baseadas na arquitetura bioclimática. Estas soluções foram respectivamente a orientação e o sombreamento. Desta forma, o modelo 01 representa o edifício com suas características reais; o modelo 02 representa o edifício rotacionado, expondo as fachadas principais para leste e oeste; e o modelo 03 é o edifício com orientação original, porém sem os elementos de sombreamento, ou seja, beirais e brises. Estes modelos alternativos foram simulados para se encontrar o efeito que o sombreamento e a orientação acarretam no consumo energético do edifício. Com isto, pôde-se quantificar o ganho em termos de economia de energia que estas soluções de projeto puderam gerar. Apesar de hipotéticas, estas duas situações representam uma boa parcela de prédios encontrados na região de estudo, fazendo com que a comparação sugerida neste estudo sirva de parâmetro real para novas construções implantadas no local. 3.3 Modelagem computacional As simulações foram desempenhadas no programa EnergyPlus 4.0, através da plataforma gráfica DesignBuilder , que permitiu a modelagem do edifício nas três situações, com suas principais características construtivas, como mostra a Figura 2. Figura 2 - Modelos computacionais do edifício nos casos 01, 02 e 03, respectivamente. Para efeito de simulação, os modelos utilizaram as mesmas características de uso, com funcionamento geral das 07h00min às 22h30min durante os dias úteis, e totalmente desocupados em finais de semana. Padronizou-se como rotina de uso nos ambientes de longa permanência a ocupação como "sala de aula", com densidade de 0,71 pessoas por m² e os ambientes de curta permanência foram subdivididos em banheiros e circulações com densidades de ocupação

5 conforme a Tabela 1. Nesses casos, adotou-se uma rotina de uso dos sistemas de iluminação artificial com utilização apenas no período noturno (das 17h00min às 22h30min), sendo considerado o aproveitamento da luz natural no período diurno. Tabela 1 - Configurações de uso adotadas na simulação. Tipos de usos Sala de aula Banheiros Circulações Rotinas de ocupação 07h - 22h30min 07h - 22h30min 07h - 22h30min Densidade de ocupação 0,71 pessoas/m² 0,12 pessoas/m² 0,05 pessoas/m² Equipamentos 5,00 W/m² - - Condicionadores de ar Split (COP = 3,20) - - Iluminação 13,00 W/m² 10,00 W/m² 7,00 W/m² Rotina de iluminação 07h - 22h30min 07h - 22h30min 17h - 22h30min Densidade de potência instalada de iluminação 13,00 W/m² 10,00 W/m² 7,00 W/m² A potência dissipada pelos equipamentos no interior das salas de aula possui 5,00 W/m² e foi estipulada a partir de levantamentos in loco dos equipamentos utilizados nos edifícios da universidade. Adotaram-se na simulação, equipamentos de condicionamento de ar em todas as salas de aula, com aparelhos do tipo split com COP de 3,20. Para os sistemas de iluminação, adotaram-se o as densidades de potência de iluminação instalada de 13,00 W/m² nas salas de aula, 10,00 W/m² em banheiros e 7,00 W/m² nas circulações. 4 RESULTADOS Os parâmetros adotados nas simulações não correspondem fielmente aos sistemas e também às rotinas de uso da edificação real. Os valores foram hipotéticos e idênticos nas três situações simuladas, uma vez que o objetivo do estudo foi destacar a influência do sombreamento e da orientação para o consumo energético com ar-condicionado. Desta forma, os resultados não demonstram o consumo real do edifício, porém, servem como amostragem do montante de energia gasta com ar-condicionado nas três situações, em virtude das modificações elaboradas nos modelos. A Tabela 2 mostra o consumo total e o consumo de ar-condicionado por m² de cada modelo. Tabela 2 - Consumo anual (KWh/m²) dos modelos estudados Modelo 01 Modelo 02 Modelo 03 Consumo anual total (KWh/m²) 133,76 135,75 140,09 Consumo anual com ar-condicionado (KWh/m²) 75,72 77,70 82,04

6 Estes resultados demonstraram que houve um acréscimo no consumo total de energia da ordem de 4,73% do pior caso (modelo 03) em relação ao modelo 01 (edifício real) em virtude das modificações impostas na envoltória do edifício. Se forem comparados apenas os valores de consumo por uso final de ar-condicionado dos mesmos modelos, a diferença sobe para 8,35%, como mostram os valores do Gráfico 1. ²) /m h W (k a re á r o p l a u n a C A e d o m u s n o C Modelos Ar-condicionado Gráfico 1 - Consumo anual de ar-condicionado por área (KWh/m²) Os resultados confirmaram que as soluções de sombreamento e orientação adequados de edifícios no clima quente e úmido de Natal, refletem diretamente na diminuição do consumo de energia com ar-condicionado, sendo o sombreamento responsável pela maior parcela da economia gerada. Vale salientar que de acordo com informações da Superintendência de Infraestrutura da UFRN, responsável pela elaboração do projeto e fiscalização da obra, este edifício não teve o custo do m² superior à média dos prédios executados no campus central da UFRN, demonstrando que é possível se chegar a soluções de comprovada eficiência energética, sem acarretar maiores custos ao edifício.

7 5 REFERÊNCIAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR : desempenho térmico de edificações. Parte 3: zoneamento bioclimático brasileiro e diretrizes construtivas para habitações unifamiliares de interesse social. Rio de Janeiro, LAMBERTS, R.; DUTRA, L.; PEREIRA, F. O. R.. Eficiência Energética na Arquitetura. São Paulo: PW, TRINDADE, C. Sileno. Simulação computacional como ferramenta de auxílio ao projeto: aplicação em edifícios naturalmente ventilados no clima de Natal/RN Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo) Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, AGRADECIMENTOS Os autores gostariam de agradecer à Eletrobras e ao CNPq pelo apoio financeiro a este estudo.