Presidente de associação de moradores não quer ser político e mantém-se no cargo há 14 anos

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1 Fonte: O Globo Síndico de Copacabana percorre o bairro de bicicleta para descobrir problemas Presidente de associação de moradores não quer ser político e mantém-se no cargo há 14 anos Artur Xexéo axexeo@oglobo.com.br Na batalha. Magalhães no calçadão de Copacabana: "Eu era daqueles que escreviam para o vereador, cobrando solução para as coisas" Carlos Ivan O mundo de Horácio Magalhães se limita a pouco mais de sete quilômetros quadrados. Para ser mais preciso, a área deste mundo é de 7,84 quilômetros quadrados. Pode parecer pequeno, mas é um mundo em que não falta nada. Mais de 60 hotéis e uma dezena de pousadas recebem visitantes interessados nas suas atrações. Ali, nesta pequena área, fica uma das praias mais famosas do mundo. O comércio é movimentado. É uma região agitada, cortada por mais de 40 linhas de ônibus e abrigando três estações do metrô. Horácio é um dos 160 mil habitantes deste pedaço do Rio, e ainda está longe de fazer parte dos 27,5% deles (ou 44 mil pessoas) que já chegaram aos 60 anos de idade. É ali, no mundo de Horácio Magalhães, que também vive a maior população de idosos e aposentados da cidade. Todos, idosos ou não, se espalham por 101 quarteirões, seis avenidas, seis travessas, quatro ladeiras e três favelas. Horácio Magalhães, de 45 anos, mora e trabalha em Copacabana. Magalhães gosta tanto do bairro que, há 14 anos, é presidente da Sociedade Amigos de Copacabana. Ele tem Copacabana no sangue. Quase literalmente. - Meu bisavô é nome de rua. Ele era o Ministro Viveiros de Castro. Morava numa casa na Barata Ribeiro esquina com Nove de Fevereiro, que depois virou República do Peru. Meu pai jogou no Lá Vai Bola, lendário time de futebol de areia do bairro. Nasci e morei até os 23 anos na Sá Ferreira. Até hoje jogo vôlei nos fins de semana na rede em frente à rua. Agora, moro na Nossa Senhora de Copacabana esquina com Bolívar - relata, confundindo sua trajetória com um mapa do bairro. - Sou muito bairrista. Não gosto de sair de Copacabana para nada. Entrevista no quiosque

2 Entrevista no quiosque Para dar esta entrevista, por exemplo, Magalhães marcou um encontro no quiosque em frente à Bolívar. Estava à vontade no local, mesmo usando terno e gravata, exigência de um compromisso que teria a seguir no Juizado de Menores. Ele é advogado de causas cíveis, mas não sai de casa nem para escrever uma petição. E usa o quiosque como extensão de seu home-office. O comando da Sociedade foi uma opção natural: - Sempre fui um cara indignado e sempre quis canalizar a minha indignação de uma forma propositiva. O brasileiro é acomodado ou resignado. Mas eu, não. Eu era daqueles que escreviam para o vereador, para o deputado, para os órgãos públicos, cobrando solução para as coisas. A forma propositiva que Magalhães encontrou para canalizar sua indignação foi tornar-se uma espécie de síndico do bairro: - A Constituição garante o livre direito associativo. Foi por isso que nasceu a Sociedade Amigos de Copacabana. Ele frisa a palavra "amigos" para que ela não seja confundida com as tradicionais associações de moradores: - Na criação da sociedade, surgiu a ideia de abolir a palavra "morador". Na nossa primeira reunião, íamos discutir a segurança do ponto de vista do morador. Quando me dei conta, estávamos falando dos turistas, dos trabalhadores, dos quem vêm a Copacabana usufruir do comércio. Afinal, o trabalhador do quiosque nem sempre mora aqui. Nossa ideia é atender toda essa gente, e não apenas os moradores. É um conceito novo de associação de bairro. Daquele 10 de novembro de 1998, quando a Sociedade passou a existir formalmente, até agora, toda a diretoria já foi renovada. Só o presidente continua o mesmo. Horário Magalhães é reeleito a cada dois anos. E afasta qualquer insinuação de que tire proveito da posição para benefício próprio: - A gente não recebe dinheiro de qualquer espécie. Tudo certo, não há como enriquecer na presidência, mas a posição pode ser um bom começo para uma carreira política, por exemplo. - Sou meio desiludido da política. Os políticos são escravos do partido. Nas minhas andanças pelos gabinetes, já ouvi muito político dizer que não pode comprar essa ou aquela briga, porque faz parte da base do prefeito. Eu não sou contra nem a favor do prefeito. Eu sou a favor de Copacabana. A favor de Copacabana, Magalhães organiza reuniões mensais num auditório cedido pelo Hospital São Lucas. É ali que ele encontra sua base... opa, os associados de sua organização. São só 200, e ele admite

3 do prefeito. Eu não sou contra nem a favor do prefeito. Eu sou a favor de Copacabana. A favor de Copacabana, Magalhães organiza reuniões mensais num auditório cedido pelo Hospital São Lucas. É ali que ele encontra sua base... opa, os associados de sua organização. São só 200, e ele admite que muito poucos vão às reuniões. Mesmo assim, considera a Sociedade representativa: - A representatividade é mostrada na atuação da associação. A associação que se propõe a ser representativa tem que estar sintonizada com a comunidade que ela representa. Mas como saber que está sintonizado com o morador de Copacabana ou com os amigos do bairro se eles não vão à reuniões? - Vou dar um exemplo. Houve uma época em que o bairro teve muitos problemas com a feira livre que acontecia em volta da praça do Lido. Era desorganizada, muitas barracas não licenciadas, havia mesmo quem pleiteasse a retirada da feira daquele local. Convoquei uma reunião para discutir o assunto. A frequência foi pífia. O que eu entendi? Não era anseio dos moradores a retirada da feira. Sucesso de público com vôlei Fracasso de público não faz Magalhães desanimar. - Auditório cheio, a gente só tem quando a discussão é sobre os pontos de redes de vôlei na praia - divertese. Querendo ou não, Magalhães se envolve nas discussões sobre a cidade que chegam aos jornais, como a decisão recente da prefeitura de multar os moradores do Rio que jogam lixo nas ruas: - Acho correto. O brasileiro é porcalhão. Até ser recolhido pela Comlurb, o lixo é do cidadão. Isso tem que ser trabalhado, é uma questão cultural. Mas leva um tempo. Às vezes, é o próprio Magalhães quem leva o assunto aos jornais, como o protesto também recente contra a construção de novos hotéis em Copacabana, para dar vazão aos turistas que chegarão à cidade durante o que vem sendo chamado de "os grandes eventos": - Não tenho nada contra a construção de hotéis. Mas tem que estar no contexto do bairro. O empreendimento é bem-vindo desde que não prejudique a comunidade. A prefeitura autorizou a construção de um hotel de 18 andares num terreno da Rua Pompeu Loureiro - diz ele, mostrando, no seu smartphone, a foto que comprova as dimensões modestas do terreno. - Um hotel desse porte não cabe aí. Quando ficar pronto, vai trazer problemas para a própria prefeitura. O poder público sofre da Síndrome de Frankenstein, aquela em que o monstro mata seu criador. Ele cria o monstro e fica com o pepino na mão. Amante de Copacabana, ele não deixa de lamentar as perdas que o bairro sofreu nos últimos anos:

4 problemas para a própria prefeitura. O poder público sofre da Síndrome de Frankenstein, aquela em que o monstro mata seu criador. Ele cria o monstro e fica com o pepino na mão. Amante de Copacabana, ele não deixa de lamentar as perdas que o bairro sofreu nos últimos anos: - Perdemos muito na área cultural, com o fechamento de teatros e cinemas. Copacabana foi o berço da Bossa Nova. Mas a prefeitura teve que comemorar os 50 anos da Bossa Nova em Ipanema. Mas estamos esperançosos com o projeto do Museu da Imagem e do Som e com a reabertura do Teatro Tereza Rachel. Uma sociedade assexuada Magalhães também aparece sempre nos jornais reclamando dos megaeventos que são realizados na praia. - Não sou contra, mas temos que discutir a questão. Sou a favor de que se discuta que tipo de show será feito e a periodicidade dos eventos. Em 2007, foi um megashow por mês. É muito. Tivemos show até de comemoração do aniversário de 30 anos de uma marca de sabão em pó. E nada de show no Natal. Não são só os moradores que têm sua rotina prejudicada. Os guardas municipais, os garis também reclamam de ter que trabalhar nesse dia. O dia de Natal não é dia de fazer megaevento. Ele também ficou famoso por ser contra a parada gay que acontece anualmente na orla do bairro: - Nossa associação é assexuada, ecumênica e apartidária. A parada costumava a incomodar os moradores a partir de 6h da manhã, quando chegavam 13 trios elétricos para fazer teste de som. Mas já está tudo organizado. Criamos um horário para começar os testes de som e um horário para a parada terminar. É comum encontrar Magalhães andando de bicicleta pelo bairro. Isso não deve ser confundido com lazer. Ou, pelo menos, não apenas com lazer. Ele costuma aproveitar essas pedaladas para ir flagrando os problemas de Copacabana. Sua última obsessão são os postes da década de 30 que iluminavam a avenida Atlântica: - A antiga iluminação formava o que ficou conhecido como colar de pérolas. É uma das nossas tradições. Mas os postes estão abandonados, e o colar está cheio de falhas. O (Carlos Roberto) Osório saiu da Secretaria (de Conservação) me devendo essa. Apesar das dificuldades para a restauração, não é justo manter um patrimônio do bairro deteriorado. Recentemente, Horácio Magalhães denunciou nos jornais o sumiço dos pardais nos cruzamentos de Copacabana: - Um diretor meu me contou que parou num cruzamento e um taxista que vinha ao seu lado passou direto. Ele esperou o flash e não aconteceu nada. Peguei a bicicleta e percebi que os equipamentos tinham sido retirados. Nem precisa consultar a população. É claro que é importante reprimir a conduta de um motorista irresponsável.

5 Recentemente, Horácio Magalhães denunciou nos jornais o sumiço dos pardais nos cruzamentos de Copacabana: - Um diretor meu me contou que parou num cruzamento e um taxista que vinha ao seu lado passou direto. Ele esperou o flash e não aconteceu nada. Peguei a bicicleta e percebi que os equipamentos tinham sido retirados. Nem precisa consultar a população. É claro que é importante reprimir a conduta de um motorista irresponsável. A prefeitura abriu licitação para recolocar os equipamentos. Fonte: O Globo