MESA 4 - INTEGRIDADE ECOLÓGICA DEBATE

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1 MESA 4 - INTEGRIDADE ECOLÓGICA DEBATE Palestrantes: MOHAN MUNASINGHE - Prêmio Nobel da Paz 1998 MARINA SILVA Senadora ANDRÉ BANIWA Vice-Prefeito de São Gabriel da Cachoeira - AM WASHINGTON NOVAES Jornalista OLINTA CARDOSO Ex-diretora de Comunicação Institucional da Vale Mediador: - Jornalista

2 OLINTA CARDOSO Eu trago uma visão da comunicação empresarial um pouco diferente, mas com enormes desafios tanto com os meios de comunicação. E uma discussão como essa nos dá oportunidade de pensar e ouvir de cada um, um componente comum que é a necessidade de repensarmos todos nós a consciência social econômica e ambiental. Cada um na sua ótica colocou isso com muita clareza. E é fantástico que a gente viu que um grupo de jovens, que foi mostrado, o Oásis aqui, com muitos engenheiros e arquitetos têm feito a diferença. E na área de comunicação, já que esse é um seminário que traz a comunicação como perspectiva da sustentabilidade, a academia tem que se rever como um todo nessa questão da sustentabilidade, mas trazendo um componente como a senadora falou que tem vários vetores, dentro da sustentabilidade, tem um componente que é fundamental à sustentabilidade, que é a perspectiva relacional, o relacionamento entre todos os segmentos, todos os stakeholders, é que vai garantir ou não um entendimento e uma consciência para a sustentabilidade. E esse entendimento ele se torna cada vez mais difícil, uma vez que não tem uma informação ou uma vez que a gente não tem significados e significação para as coisas. Como foi colocado também. E como é papel da comunicação tratar e lidar com a criação de significados, fica aí um desafio enorme para gente pensar como estamos lidando com isso. Dentro das empresas, é necessário rever os aspectos, os processos, as ferramentas, tudo de comunicação. Mas revendo, colocando a comunicação a serviço da estratégia da empresa, mas a serviço da humanidade. Não só por meio de uma ótica, mas da ótica do outro também. E como diz Guimarães Rosa: uma coisa é lidar com o plano das ideias, outra coisa é lidar com um país de gente nascendo, crescendo, casando, querendo ter filhos. Esse é o desafio, é esse o cotidiano que a gente lida no dia a dia. E para isso, eu acho que nós precisamos pedir muito a Deus sabedoria para entender o que está acontecendo, porque todos falam, mas não chegam com um significado claro do que está acontecendo. E a partir desse entendimento, buscar atitudes coerentes com a consciência que deve ser tomada por todos. E nos processos de comunicação, é necessário a gente fazer uma revisão como um todo. E a comunicação sozinha, a ciência da comunicação sozinha não da conta de entender esses processos. É fundamental, seja a comunicação de mídia, a comunicação empresarial, a busca pelo diálogo precisa buscar outros componentes das ciências sociais para entender a realidade que está posta, os desafios que estão postos para todos nós, para buscar essa consciência, porque só a consciência individual com objetivos coletivos é que vai fazer a diferença para gente cuidar, preservar e tratar melhor esse mundo que nós vivemos. Como é que a gente coloca com as ferramentas que a mídia disponibiliza hoje, a informação que remeta a uma nova atitude que tenha significado? MARINA SILVA Eu acho que a mídia é uma potência, e como toda potência, a gente tem que qualificar essa potência. O problema é que às vezes ela se coloca no lugar da onipotência. E aí acontece isso que o André acabou de mencionar: a ideia de potência pressupõe sempre uma base de apoio, para que 2

3 eu possa alavancar alguma coisa há de ter um apoio, senão eu não consigo alavancar nada. E qual é o principal apoio? Em primeiro lugar, existe um dado de realidade, e a gente não pode fugir desse dado de realidade, que as coisas são muito mais complexas do que, muitas vezes a nossa capacidade de entender o assunto. E em segundo lugar, há que ter um compromisso de natureza ética, eu diria assim, e eu nem vou dizer política porque se não parece que fica contaminado pelo interesse político imediato, mas de natureza ética. Muitas vezes os assuntos são tratados de uma forma a banalizar coisas que são muito importantes e muito complexas. Eu vou aqui citar o caso da questão dos transgênicos. A gente dizia que um país como o Brasil tem uma grande vantagem diferencial em relação a países como a Índia, o México, os Estados Unidos, a Argentina, os grandes produtores. Por que? No caso do Brasil era possível ter um regime de coexistência. Quem produz transgênico, é um direito, que é produzir transgênico. Mas há que se ter um regramento para quem quer produzir convencional tenha silo separado, transporte separado, tenha regramentos que não levem à contaminação da produção. Como é que isso era traduzido na mídia? Quem dizia esses senões, estávamos sendo contra a ciência, contra o desenvolvimento que se estava querendo ir para o tempo da pedra. Uma coisa tão importante como essa, não podia ser comunicado dessa forma. Por mais que você saiba que existem os interesses, há um lugar que é o lugar da ética. Agora nós já estamos com problemas. A soja transgênica por exemplo, é trinta por cento menos resistente do que a soja convencional para a realidade de seca. E os produtores agora do Rio Grande do Sul resolveram entrar na justiça para não pagar os Royalties da Monsanto. Naquela época nós dizíamos tudo isso. E o que era dito? Vocês são ideológicos, contra o capitalismo, a comercialização, das patentes. É claro que a gente tem pessoas que salvam a pátria, que tentam fazer uma comunicação séria, citei aqui duas pessoas, mas eu acho que essa grande potência que tem a mídia, não pode ter deixado de ser ancorado em uma forte realidade ética, se tiver e em um forte compromisso, senão, vai para uma onipotência que acaba subtraindo a presença do fato, a presença de uma realidade que precisa ser transformada, com base não na especulação, mas sobretudo da verdade. MOHAN MUNASINGHE Tentarei ser breve. Vocês se lembram do slide que mostrei para vocês sobre o comportamento atual do mundo, das elites globais...4 trilhões de dólares para resolver os problemas dos bancos e grandes empresas, 100 bilhões para pobreza, quase nada para mudanças climáticas...e a mídia é parte deste mundo. A mídia é, até um certo ponto, controlada pelas elites governamentais. Então o segundo desenho que mostrei a vocês, com o gato, dizia "nunca, nunca pense fora da caixa", então as estruturas de poder existentes não permitem inovação, a palavra é inovação. Não podemos esperar que a mídia fuja disso. Mas a mídia junto com a sociedade civil, com as empresas e com outros que são progressistas, podem fazer isso. E neste auditório, nesta mesa há outros como nós, há pessoas que estão, eu espero, pensando de forma inovadora. Foi por isso que eu disse que a mídia pode ser a cola, a ponte que unirá todas essas forças progressivas para seguirem em diante, não sozinhas, mas trabalhando em parceria. A mudança da estrutura de poder atual é um processo longo e lento. Vai levar bastante tempo, mas felizmente eu acho que o tempo opera a nosso favor, já que o clima e todos estes problemas estão mostrando que continuar com os negócios na maneira de sempre não dará certo. Os governos, as grandes 3

4 empresas e assim por diante não são capazes de encontrar as soluções, e nós precisamos encontrar as novas soluções. Eu particularmente aposto nos jovens. Eu esperaria que a mídia trabalhasse especialmente com os jovens para que esta mudança ocorra. Chega pela Internet do Peru, o senhor José pergunta o seguinte: o aquecimento global afeta economicamente mais a população do campo ou da cidade? Por que? Os mais afetados estão devidamente instruídos sobre esse tema? WASHINGTON NOVAES Eu acho que depende. Depende de cada lugar, depende de cada país, depende de cada estado. No sudeste da Ásia, por exemplo, as pessoas mais afetadas são as que estão à beira mar. Em outros lugares é diferente, são regiões que estão sendo desertificadas, regiões que sofrem grandes secas, mas as populações das cidades também sofrem com os chamados eventos extremos como têm sofrido recentemente no Brasil. E emendando ainda na história da mídia, por exemplo, então a gente pode lembrar o seguinte: aquela história de Santa Catarina, aquelas inundações, deslizamentos, mortes, aquilo aconteceu assim de repente, não tinha nada antes, que indicasse isso? Onde é que a comunicação esteve nos 20 anos anteriores, em que as encostas foram desmatadas e foram ocupadas e os topos de morro foram ocupados? Onde é que estava a comunicação quando o solo das cidades foi todo impermeabilizado impedindo a infiltração de água? Onde é que estava quando os rios foram confinados em canais mínimos? Aí acontece o que um dia, eu creio que foi em Blumenau, caíram 860 milímetros de água em poucas horas. 860 milímetros, vocês sabem, são 860 litros de água por metro quadrado de solo. Onde é que podia ir tanta água? No solo não podia se infiltrar, no rio não cabia porque ele não aguenta nem o fluxo dele que está assoreado então provoca uma inundação gigantesca e nos morros o deslizamento, a morte das pessoas, o desabrigo, o desalojamento. Mas isso não aconteceu da noite para o dia. Durante 20 anos a mídia podia ter tratado desse assunto e ter dito às pessoas não façam isso. Não desmate as encostas, não ocupem o morro, cobrar do poder público não faça isso na cidade, não faça isso nos rios. E é isso que ela tem que fazer, tratar sistematicamente e preventivamente. MOHAN MUNASINGHE Se é da cidade ou do campo, rica ou pobre, dependerá das condições locais e natureza da ameaça. Se é um acréscimo, ou prejuízos na produção agrícola, tempestades, o que for, mas há uma ciência de Avaliação de Riscos muito bem desenvolvida. Ela tem funcionado há mais de 30 anos, eu já trabalhei nesta área. Não tem nada a ver com mudanças climáticas porque há nos deparamos com outros riscos, vulcões, tempestades e assim por diante. Use este conhecimento. Não precisamos reinventar a roda. Utilize a avaliação de risco e poderemos aplicá-la às mudanças climáticas e descobrir exatamente onde estão os problemas, e como solucioná-los. É por isso que digo que podemos fazer isso com o conhecimento existente. Não precisamos reinventar novas coisas. Obrigado. 4

5 Rosa Fonseca pergunta para Olinta. Qual o papel da iniciativa privada, em especial das empresas instaladas na Amazônia, no desenvolvimento regional sustentável e como os departamentos de comunicação atuam nessas localidades? OLINTA CARDOSO O papel das empresas é estratégico e fundamental, como o papel do governo, como o papel da sociedade civil, como o papel de todos. E como atuar é a busca de uma solução conjunta. Primeira condição para os departamentos, as áreas de comunicação e as empresas atuarem é conhecer muito bem os territórios onde elas atuam. Conhecer as características, conhecer as identidades, conhecer a vocação, e ter o seu impacto positivo e negativo só a partir daí em conjunto é possível buscar um compromisso para o desenvolvimento sustentável. Pergunta para a Marina Silva. Vem da Patrícia do Instituto Harmonia na Terra. O que posso fazer por um cidadã, com relação a inconstitucionalidade da aprovação do Código Florestal de Santa Catarina? E o que o Governo Federal está fazendo nesse caso? MARINA SILVA O Ministério Público já entrou com uma ação de inconstitucionalidade. E eu espero que a justiça de fato considere inconstitucional, porque não tem alternativa. É inconstitucional. E a sociedade também pode entrar com ações, uma ação civil pública pode ser feita também pelo cidadão. E eu acho que uma das formas também é dando um recado para quem sancionou a lei, para quem aprovou a lei, de que a população de Santa Catarina está muito atenta para esse tipo de decisão arbitrária como foi tomada, ainda que pareça democrática, porque foi aprovada pela Assembleia, infelizmente por nenhum voto contra, as pessoas, a maioria, sofreram as consequências e não querem que a gente possa agravar mais a situação lá de Santa Catarina. Às vezes a gente usa o termo errado. Santa Catarina aprovou. Não foi Santa Catarina, foi o governador de Santa Catarina e os Deputados Estaduais de Santa Catarina. A população, com certeza, está atônita. O que o Governo Federal pode fazer, no meu entendimento, é mobilizar toda a sua capacidade, e precisa fazer isso, para não permitir que a iniciativa seja aprovada no Congresso. Porque há um movimento agora que o Congresso aprove uma mudança dizendo que cada Estado será autônomo para fazer seu próprio Código Florestal. Nós vamos fazer uma vigília na quarta-feira que vem, no Congresso, a Comissão de Meio Ambiente, a Comissão de Direitos Humanos, e a Comissão de Mudanças Climáticas, envolvendo inclusive a Christiane Torloni e o Vitor Fasano que colheram um milhão e cento e onze mil assinaturas, contra o desmatamento da Amazônia, em um sinal de protesto contra as ações de retrocesso. Agora, no meu entendimento, há sinais muito contraditórios, infelizmente da parte do Governo Federal, acho que todo aquele avanço que a gente vinha levando em uma certa direção, de afirmar as políticas ambientais, não em oposição ao desenvolvimento, há toda uma tentativa de desqualificar a legislação ambiental brasileira, que eu 5

6 acho que esse momento agora é o momento de mudar o sinal, não permitir que aconteça essa mudança dessa forma no Código Florestal Brasileiro, porque a primeira tentativa de fazer uma lei só Estadual, é essa altamente permissiva e nefasta para a proteção dos ecossistemas. Eu sou uma Senadora, fui Ministra do Meio Ambiente, sei que tivemos alguns avanços, mas agora eu estou muito temerosa, porque nós estamos vivendo a iminência de muitos retrocessos, são várias medidas provisórias o tempo todo, tentando mudar a legislação ambiental. Eu acho que é um bom momento da sociedade aqui, que está nos acompanhando inclusive, manifestar a sua posição em relação ao que quer que o governo faça em relação a essa mudança e o próprio Congresso como fizemos lá no passado quando tentaram mudar a reserva legal de 80% para 50%. Não foi mudada na época do presidente Fernando Henrique Cardoso, porque houve uma grande manifestação da sociedade contrária. Acho que é o momento da sociedade dar o mesmo recado. Escolhi a pergunta do Julio César Pacheco, aluno do Mackenzie de jornalismo, que é dirigida a todos os palestrantes a quem peço que tentem resumidamente responder. Falar de mudanças nos dias de hoje, e não falar do presidente Barack Obama seria uma falha diz ele. Seria ele o fator que precisávamos para as tão necessárias mudanças climáticas? Mudanças talvez no rumo das estratégias de enfrentamento? Até que ponto o presidente Obama pode mudar isso. Seria um incentivo aos outros países? OLINTA CARDOSO A sociedade sempre precisa de um símbolo e o presidente dos Estados Unidos hoje representa essa força e alguns valores que estavam esquecidos e acima de tudo uma esperança muito grande. Mas eu acho que a gente não pode delegar só a ele o que está acontecendo no mundo. A pressa que se tem pressupõe que outras lideranças se posicionem com clareza em todos os lugares. E se a gente está aqui em uma discussão de comunicação e sustentabilidade, aqui dentro a gente viu uma liderança se apresentando jovem e volto a falar do Oásis como ele tem muitos outros e como a Senadora acabou de falar: precisa a sociedade se manifestar porque está claro que precisa mudar. Mas o andamento e os processos continuam indo, a sociedade sabendo o rumo que está tomando, o risco que tem, mas não age. Se a gente delegar ao presidente dos Estados Unidos a solução para tudo o que está acontecendo, mais uma vez a gente vai perder o bonde da História e as coisas não vão acontecer. WASHINGTON NOVAES Ele mandou uma mensagem à ONU sobre a direção que os Estados Unidos pretendem tomar em matéria de mudanças climáticas e não mencionou nenhum número. Até aqui ele vinha falando em reduzir tanto sobre 1990, fazer isso, fazer aquilo, tal, e nesse comunicado nada e um porta-voz da ONU manifestou a sua decepção com o comunicado que ele fez. E não é só ele. A Europa também está recuando nas intenções que manifestou, nesse momento difícil há um recuo quase geral. Agora a grande questão é a seguinte: nós precisamos de instituições e regras que façam essas 6

7 mudanças em um plano universal, principalmente em relação ao clima. Não adianta fazer só em um país ou só naquele país. Terá alguns benefícios, mas não resolverá e nós não temos nem essa regra, o protocolo de Kyoto está terminando sem sequer ter sido cumprido todo, e nem há instituições. O melhor que nós temos são as Assembleias das ONU, as Convenções da ONU, mas que exigem consenso para a tomada de decisão e esse consenso é praticamente impossível diante da divergência de visões e de interesses. MARINA SILVA Bem, falar de mudança e com certeza o Barack Obama é um símbolo de que a mudança é possível. E com certeza não é uma mudança qualquer, pelo que ele representa dentro da política americana, da cultura americana, enfim, daquela estrutura como funciona a sociedade americana. É fruto de um esforço histórico, significativo, que a gente pode simbolicamente identificar na pessoa de Martin Luther King, até chegar em Obama. Eu acho que superar dificuldades da nossa história pretérita para nós que estamos no presente é um desafio muito grande, mas talvez seja mais fácil do que superarmos a nós mesmos. E o presidente Obama vai precisar superar a sua própria geração. MOHAN MUNASINGHE Creio que devemos todos admirar o Barack Obama pelos obstáculos que ele superou e o que ele representa, mas acredito que ha um principio maior a reger a resposta para esta pergunta, e é que na vida não ha soluções mágicas, não ha uma única solução para os problemas complexos que o mundo esta enfrentando. E acreditar que uma única pessoa possa resolver este problema, eu acho que e uma crença ingênua. Todos trabalhando juntos. Obrigado. Ficou claro para mim. O meu aprendizado desse debate foi: agrava-se a pressa em favor das mudanças, a mídia não é a única ferramenta da mudança, ela pode muito, mas não pode tudo, e todos nós nos nossos quadrados tem uma dança no Brasil que chama cada um no seu quadrado e o refrão diz cada um no seu quadrado e você falou da importância de a gente sair, então, cada um fora do seu quadrado. Um grande abraço. Tudo de bom. 7