PESQUISA-AÇÃO: UMA EXPERIÊNCIA NA FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA Autor: Maristela Alves Silva Projeto Observatório da Educação- UFSCar-SP maristelamarcos@hotmail.com Resumo: Este texto se reporta à pesquisa-ação de um professora da disciplina de Prática Pedagógica, do curso de licenciatura em matemática da Fundação Educacional de Fernandópolis(FEF). Trata-se da trajetória dos alunos submetidos a práticas de reflexãoação desde a sua formação inicial. Em contrapartida, a professora leva em consideração essa prática para também melhorar suas atividades. Destaca a relevância do trabalho em sua região e o objetivo da melhoria da formação inicial do professor de matemática. Palavras chave: pesquisação; matemática; formação inicial. As primeiras inquietações Licenciei-me em matemática pela UNESP/São José do Rio Preto em 1997. Já no ano seguinte, comecei a lecionar em séries do ensino fundamental e médio e naquele momento é que percebi as deficiências do meu curso e/ou minhas próprias. Embora o conteúdo específico tenha sido bem explorado e aproveitado, o conteúdo pedagógico apresentava certa defasagem. Concordando com o que diz Rocha, mestre pela Unicamp, em sua tese de mestrado: Ao concluir o curso pensava que sua formação estava completa, que nada mais lhe faltava. Mas, ao iniciar a profissão, as primeiras dificuldades foram aparecendo. Hoje, ao refletir sobre esse fato, acha natural ter percebido lacunas em sua formação, pois reconhece que nenhum curso daria conta de abarcar a realidade de todas as escolas. Em sua perspectiva, é na prática que se constitui o professor. Mesmo me esforçando, não conseguia fazer com que meus alunos assimilassem o conteúdo de forma satisfatória. Comecei, então, a procurar cursos que sanassem essa dificuldade. Em 2004, fiz uma especialização em psicopedagogia, pois precisava conhecer mais sobre problemas de aprendizagem para diferenciá-los. Nesse ano, descobri a importância de haver sempre uma interlocução entre a pedagogia e a matemática. E foi
notória a melhora do desempenho dos meus alunos. Por esse motivo, fui convidada a ministrar as aulas de práticas pedagógicas no curso de licenciatura em matemática da Fundação Educacional de Fernandópolis, que se iniciava em 2005. Com uma mudança de grade no curso de pedagogia, foi incluída uma disciplina de conteúdos e metodologia de matemática da qual fiquei responsável. Nas práticas pedagógicas, num primeiro formato, tentava passar minhas experiências para os alunos. Ministrava aulas de conteúdos matemáticos com ênfase inovadora, introduzindo o uso de jogos, materiais concretos e de manipulação, sempre apresentando algum material concreto nas aulas. Os alunos estavam muito satisfeitos com as aulas, pois eu sempre sugeria uma receita para trabalhar aquele determinado conteúdo. As aulas eram divertidas e produtivas, tinha a falsa concepção de que era isso que havia faltado para mim. No entanto, em uma das avaliações coletivas que faço no final de cada bimestre, um aluno levantou uma discussão, argumentando que nas bibliografias indicadas no curso não havia os procedimentos que eu recomendava. Nesse momento percebi que era eu que desenvolvia as metodologias e que isso não estava escrito em lugar nenhum. Então passei a planejar as aulas de maneira que os alunos participassem de todo o processo desde a elaboração, planejamento, aplicação e avaliação das aulas. Uma metodologia que possibilitasse que os futuros professores tivessem acesso à realidade e aprendessem, ainda na graduação, a planejar sua aula (ação), a se avaliar (reflexão) e replanejar (reação). Concordei, então, com Novoa que defende que os programas de formação devem desenvolver três famílias de competência saber relacionar e saber relacionar-se, saber organizar e saber organizar-se, saber analisar e saber analisar-se essenciais para que os docentes se situem no novo espaço público da educação.... objetos e sujeitos da formação. É no trabalho de reflexão individual e coletivo que eles encontrarão os meios necessários ao desenvolvimento profissional. (NOVOA, 2008, p.228). Proponho então que esse processo comece em sua formação inicial. Na disciplina de Prática Pedagógica, o objetivo é primeiramente articular pedagogia e matemática, formando assim um professor que tenha características inovadoras e críticas em relação ao seu próprio desenvolvimento profissional. Como isso acontecia?
X Encontro Nacional de Educação Matemática Essa disciplina tem um total de cento e vinte horas divididas em dois semestres de sessenta horas cada, com encontros semanais de três horas-aulas. Os alunos, em grupos, escolhem uma sala de aula que acompanharão em todo o semestre. As aulas são organizadas da seguinte forma: Preparação e organização da aula a ser aplicada. (1 momento) Grupo elaborando as aulas Aplicação na sala de aula na escola previamente escolhida. (2 momento) Aplicação da atividade
Retorno e avaliação para modificação do trabalho. (3 momento) Alunos avaliando e corrigindo a aula Na primeira aplicação sentimos a necessidade de estarmos cientes da proposta de trabalho do professor, assim a preparação da aula do círculo trigonométrico estaria de acordo com o material trabalhado pelo professor. Conseguimos trabalhar o assunto previsto de forma que os alunos pudessem compreender o tema. Fomos bem recebidos, tanto pelo professor da sala, como pelo diretor e funcionários gerais da unidade escolar, e também tivemos retorno em relação aos alunos. A nossa proposta de aula estava avançada em relação ao conhecimento da sala e necessitamos fazer algumas revisões e reforço no conhecimento dos alunos. Tendo em vista o contratempo, conseguimos realizar toda a nossa proposta de trabalho e despertar nos alunos a compreensão do tema. ( conclusão de uma avaliação de um grupo após a aplicação de uma aula). As aulas são quinzenais, sendo que nesse dia refletimos sobre a aula aplicada na semana anterior e preparamos a próxima visita, sempre levando em consideração as observações feitas na reflexão. Os grupos se reúnem, avaliam a aula que foi ministrada, levantando os pontos positivos e negativos, tentando justificá-los, aproveitando a discussão para preparar a próxima visita.
As visitas são feitas alternadas com as aulas. Nesse formato é possível pensar e analisar cada visita para não cometer os mesmos erros, preparando o futuro professor com uma rotina refletida, para melhoria da qualidade de ensino. Levamos em conta que o individuo não é só e deve interagir com seu meio. Essa interação que Ubiratan D ambrosio chama de ciclo vital:... REALIDADE informa INDIVÍDUO que processa e executa uma AÇÃO que modifica a REALIDADE que informa INDIVÍDUO.... Podemos imaginar que aula também passa por esse processo que chamaria de ciclo vital da aula. Ouso a acreditar que nessa disciplina, trabalhada com essa metodologia, os alunos (futuros professores) estarão mais preparados para enfrentarem suas próprias salas de aulas e ainda já terão experimentado uma prática de ação-reflexão-ação. Podemos afirmar que essa prática passa a fazer parte do cotidiano do professor, fazendo- o procurar alternativas de melhorias em seu trabalho diário. Fiorentini(2002) já alertava para a importância fundamental das disciplinas de Prática de Ensino e Estágio Supervisionado na formação do futuro professor. Mas esses estudos alertam que isso acontece quando essas disciplinas promovem, entre os estagiários, um espaço de compartilhamento de experiências e de discussão e reflexão sobre a prática docente, possibilitando, assim, a constituição e a re-significação dos saberes docentes e escolares, tendo como eixo de formação a pesquisa e/ou a reflexão sistemática sobre a prática (ROCHA,2005; CASTRO, 2002). O Objetivo dessa ação A proposta deste trabalho é estudar a contribuição dessa metodologia na formação inicial do professor de matemática, tornando-o, assim, um potencial professor-pesquisador desde o início de sua carreira, contribuindo positivamente para a construção de um profissional mais critico e reflexivo. A pesquisa-ação crítica deve gerar um processo de reflexão-ação coletiva, em que há uma imprevisibilidade nas estratégias a serem utilizadas. ( FRANCO, 2005) O grupo deve, como um todo, participar dos progressos é nessa perspectiva que essa experiência contribuiu também para minha formação. Uma experiência desse âmbito transformou minha realidade enquanto professora, inserindo em meu cotidiano uma prática de pesquisa, servindo como multiplicadora dessas características nos futuros professores. Essa metodologia passou a fazer parte, então da minha rotina e me tornou uma profissional mais
pensante, atuante e proprietário das minhas aulas. Propriedade no sentido ser ter mais clareza de que ação praticar diante de cada situação. Em contrapartida, todo o grupo pensa a ação e isso faz com que todos tenham responsabilidade diante do resultado. Os alunos montavam um portfólio das atividades desenvolvidas. Nesse documento havia as aulas aplicadas, as reflexões do grupo e as mudanças feitas em função da reflexão. Portfólios confeccionados pelos alunos Atividade construída pelos licenciandos na aplicação Em contrapartida, eu fazia também minhas reflexões, sempre anotava os fatos que interpretava como relevantes. Por exemplo, os tópicos de discussão que brotavam com a prática deles, serviam como uma bússola para eu procurar os textos que iriam ajudá-los como referência teórica para sanar os possíveis problemas. Sendo assim, eu também estava
participando do processo de formação enquanto formação continuada. Minhas aulas eram planejadas e refletidas a cada encontro, os tópicos e textos discutidos, os autores eram escolhidos no processo de construção do próprio curso. A relevância de formar professores reflexivos na região Já que em minha região há uma escassez de cursos de formação continuada de professores e a grande maioria das vagas é preenchida com professores formados por instituições privadas da própria região. Por isso políticas que são aplicadas nas licenciaturas das universidades públicas pouco atingem nossas escolas. Em contrapartida, o ensino é na maioria municipal e a formação continuada não acontece de maneira satisfatória. Então vejo que se o professor se tornar um profissional pesquisador, poderá produzir um conhecimento relevante para sua prática. Será reflexivo e crítico quanto a sua práxis diária e assim terá autonomia para gerar soluções para seus próprios problemas. Para tanto, sugiro uma pesquisa-ação participativa, pois essa vem ao encontro dos objetivos desse trabalho, sendo um processo social (realizada em contexto ), participativa (não é uma pesquisa realizada sobre outros ), prática e colaborativa (visa modificar as ações, é realizada com os outros ), emancipatória (visa a superação da alienação ), crítica (visa a superação do senso-comum ), recursiva (investigar a realidade para mudála, mudar a realidade para investigá-la). Esses objetivos se resumem em formar um professor-pesquisador em sua graduação e consequentemente me fazer pesquisadora enquanto tutora desses alunos. A pesquisa se limitou em observar e acompanhar os alunos de terceiro ano do curso de licenciatura em matemática da Fundação Educacional de Fernandópolis, não incluindo nos estudos as salas de aulas, nem os respectivos professores. Apenas a formação do licenciando e a minha são focadas nessa pesquisa. Gostaria, ainda, de ressaltar que entre a teoria e prática persiste uma relação dialética que leva o indivíduo a partir para a prática equipado com uma teoria a praticar de acordo com essa teoria até atingir os resultados.... Pesquisa é o que permite e interface interativa entre teoria e prática.... O novo papel do professor será o de gerenciar, de facilitar o processo de aprendizagem e, naturalmente, de interagir com o aluno na produção crítica de novos conhecimentos, e isso é essencialmente o que justifica a pesquisa. (D AMBROSIO; 1997, p. 79). Não devemos nos esquecer de que uns dos problemas que
afeta a educação matemática hoje é a maneira deficiente como se forma o professor. Então, quero com essa proposta justamente melhorar a formação do futuro professor de matemática. Para tanto, utilizamos das filmagens das aulas presenciais, análise de documentos produzidos no decorrer do processo, bem como entrevistas com os licenciandos e anotações minhas sobre as interferências nas aulas, construindo assim uma pergunta de pesquisa que seja pertinente à realidade local e possa ser utilizada como parâmetro de metodologia para outras instituições de ensino que visam formação de profissionais da educação com qualidade e responsabilidade. Referências: CASTRO, F. C. de. Aprendendo a ser professor(a) na prática: estudo de uma experiência em prática de ensino de Matemática e estágio supervisionado. 2002. Dissertação. (Mestrado em Educação). Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas. Campinas. Orientador: Dario Fiorentini. D AMBROSIO, Ubiratan. Educação Matemática: Da teoria à prática. 2.ed. Campinas, SP: Papirus,1997. FIORENTINI, D.; NACARATO, A. M; FERREIRA, A. C.; LOPES, C. E.; FREITAS, M. T. M.; MISKULIN, R. G. S. Formação de professores que ensinam matemática: um balanço de 25 anos da pesquisa brasileira. Educação em Revista, Belo Horizonte: UFMG, 2002. Dossiê: A pesquisa em Educação Matemática no Brasil. FRANCO, M. A. Santoro. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 31, n. 3, p. 483-502, set./dez. 2005. NÓVOA, A. Os professores e o novo espaço público da educação in O Ofício de ser professor História, perspectivas e desafios internacionais, Tardif, M. & Lessard, C. (org). Editora Vozes, 2008. ROCHA, Luciana Parente. (Re) constituição dos saberes de professores de matemática nos primeiros anos de docência / Luciana Parente Rocha. -- Campinas, SP: [s.n.], 2005. Orientador: Dario Fiorentini. Dissertação (mestrado) Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação.