O BLOG COMO RECURSO DE APRENDIZAGEM MATEMÁTICA NA EJA Fernanda de Araujo Monteiro Colégio Estadual General Dutra fmonteiro5@yahoo.com.br Príscila de Oliveira Neves Colégio Estadual General Dutra priscila1092@uol.com.br Rogério Maurício Fernandes Pessanha Colégio Estadual General Dutra roger-p@bol.com.br Resumo: Vivemos hoje numa cultura sem fronteiras; o espaço e o tempo adquirem novas dimensões global, local e institucional que se interconectam. As mudanças em curso na sociedade em função das novas tecnologias digitais facilitam o acesso à informação e redimensionam o papel da escola como formadora de cidadãos autônomos. Atuando como professores na Educação de Jovens e Adultos (EJA) em uma escola pública, notamos a necessidade de implantação de um projeto que objetivasse estreitar as relações entre nossos educandos e as novas mídias, através da utilização dos recursos tecnológicos no processo de ensino-aprendizagem de Matemática. Portanto, propomos um trabalho que visa desenvolver nos jovens e adultos o caráter investigativo na busca pelo conhecimento, desbancando a recepção passiva na construção do saber matemático. As atividades desenvolvidas estão apoiadas na perspectiva do Blog como comunidade de aprendizagem, instrumento de conexão entre professor, aluno e mundo digital. E, os resultados parciais, mostram os educandos motivados continuamente em aprender, desenvolvendo suas habilidades de forma prazerosa. Palavras-chave: EJA; Novas Tecnologias; Blog; Aprendizagem Matemática. 1. INTRODUÇÃO O avanço do conhecimento científico e tecnológico contribuiu para uma série de drásticas mudanças de caráter estrutural que marcaram, definitivamente, o final do século XX. Essas mudanças em curso na sociedade em função das novas tecnologias digitais, facilitam o acesso à informação e a comunicação entre as pessoas. As novas tecnologias e linguagens implicam uma profunda transformação também nos processos sociais, culturais e educacionais; demandando da escola não só a incorporação dos mesmos, mas uma mudança interna nas formas de ação educativa. De modo particular, na Educação de Jovens e Adultos (EJA), visto que a maioria dos 1
educandos desta modalidade de ensino encontra-se inserida no mercado de trabalho, onde as ferramentas digitais já foram incorporadas. Bovo (2001) defende a utilização dos artefatos tecnológicos na EJA, justamente porque se o computador e mundo digital fizerem parte do cotidiano tanto do trabalho como da sala de aula, poderão atuar como instrumentos facilitadores e motivadores da aprendizagem. A referida proposta vem de encontro às práticas pedagógicas normalmente adotadas hoje em sala de aula, onde os meios utilizados não favorecem a interatividade e o professor continua sendo aquele que transmite o conteúdo de forma tradicional. Assim, este estudo objetiva mostrar como é possível aos alunos dos cursos de EJA conceber a web e suas múltiplas ferramentas como uma alternativa eficiente para aprofundarem seus conhecimentos e realizar conexões entre saberes matemáticos, favorecendo uma leitura de mundo. Nesse sentido, o projeto também tem por finalidade: favorecer a aprendizagem cooperativa, evidenciada por argumentações e compartilhamento de informações; incentivar a explicitação do próprio pensamento, persistindo na tentativa da construção de concepções próprias referentes aos saberes matemáticos; utilizar as ferramentas da web para conectar suas experiências de sala de aula ao mundo. 2. A EJA E AS NOVAS TECNOLOGIAS Segundo Haddad e Pierro (2000), a Educação de Jovens e Adultos em nosso país se dá desde a época do Brasil Colonial e estava diretamente relacionada à capacitação de índios e negros para contribuírem com o desenvolvimento da economia colonial. Desde esta época até os dias atuais, várias políticas educacionais foram estabelecidas para a EJA e todas diretamente relacionadas ao preparo para o trabalho, ou seja, no aprimoramento dos educandos para satisfazerem as necessidades do sistema produtivo. O que defendemos nesse estudo é que a formação do jovem e do adulto, que não tiveram a oportunidade na idade regular, deve ultrapassar a formação para o mercado de trabalho e sim estar centrada em competências necessárias para que este indivíduo possa se inserir na sociedade do conhecimento. 2
O desafio é colocar todo potencial tecnológico a serviço do aperfeiçoamento do processo educacional, em particular no desenvolvimento das habilidades referentes à comunicação matemática, já que as práticas baseadas no conhecimento de regras, memorização e centradas no modelo clássico da transmissão impedem a aquisição das competências referentes a esta área de conhecimento. Jovens e adultos não podem permanecer excluídos de um contexto de formação que contém inovações tecnológicas. O contexto que os alunos da EJA estão inseridos impõe novas exigências de conhecimento em busca de assegurar que eles desfrutem de seus direitos e exerçam com dignidade seus deveres. Sancho (1998) afirma que possibilitar o acesso a conhecimentos advindos da cultura digital é favorecer a autonomia para o exercício da cidadania do indivíduo em seu cotidiano. 3. A WEB COMO RECURSO DE APRENDIZAGEM MATEMÁTICA Hoje se discute as práticas pedagógicas para que estas possam enfrentar os desafios provenientes desta revolução nas tecnologias de comunicação e informação. Os ambientes de aprendizagem do futuro serão necessariamente abertos, flexíveis e interativos. A utilização das ferramentas da Web vem favorecer a interatividade tão necessária para desbancar a recepção passiva, visto que os recursos oferecidos possibilitam a participação e intervenção. Na mídia digital, o interagente ao invés de receber a informação, tem a experiência da participação na elaboração do conteúdo apresentado e na construção do conhecimento. O ambiente virtual como este espaço de interação, compartilhamento e publicação de informações é caracterizado na segunda geração de serviços online, que identificamos como Web 2.0. Este termo, refere-se não apenas a uma combinação de técnicas, mas também a um conjunto de novas estratégias e processos de comunicação mediados pelo computador. A Web 1.0 era embasada em uma filosofia em que o acesso ao ciberespaço não era livre aos usuários. Já na versão 2.0, a filosofia é outra; um novo paradigma de comunicação, em que o consumidor pode ser também produtor de informação. 3
Qualquer proposta pedagógica fundamentada na Web 2.0, desenvolve-se em quatro grandes eixos: ensinar, aprender, usar recursos e discutir em comunidade. Assim, segue identificada a ferramenta básica que está sendo utilizada nesta proposta, o Blog. 3.1. BLOG O Oxford English Dictionary define Blog como uma página da Web que é atualizada freqüentemente, composta por observações pessoais que podem ser extraídas de diversas fontes. Gomes (2005) define, assim: Blog é uma página da web que pressupõe ser atualizada com grande frequência através da colocação de mensagens que se designam posts constituídas por imagens e/ou textos normalmente de pequenas dimensões (muitas vezes incluindo links para sites de interesse e/ou comentários e pensamentos pessoais do autor) e apresentadas de forma cronológica. Os Blogs podem dar suporte à Educação de várias formas, como: um espaço de reflexão e discussão que favorece a construção do conhecimento de forma autônoma e colaborativa; uma ferramenta para estimular e registrar pesquisas, que podem ser enriquecidas com links, fotos, ilustrações; uma memória coletiva para grupos. A utilização de Blogs na educação matemática, em especial na EJA, nos leva a concluir de forma natural, que faz aumentar consideravelmente o interesse dos alunos por um determinado conteúdo e seu aprendizado, que para muitos alunos, é encarado como algo maçante, desinteressante. Muitas vezes, isso ocorre não por culpa do aluno, mas sim pela forma como a disciplina é apresentada. Ao sair do modelo tradicional de ensino, a motivação do aluno aumenta, movida pela curiosidade que a novidade tecnológica proporciona. Dessa forma, o êxito no aprendizado atinge níveis bem mais elevados. Pesquisa realizada em 2004 por Elmine Wijnia (WIJNIA, 2004), mostra que a utilização de Blogs no ensino da matemática, além de outros benefícios, aumenta o interesse pela disciplina, bem como melhora a interação entre os próprios alunos e entre os alunos e o professor. 4. TEORIAS PEDAGÓGICAS 4
Várias teorias dão suporte para a construção de ambientes de aprendizagem. Cada uma delas vê o educando de uma maneira, com diferentes maneiras de aprender, e algumas buscam contribuir para que ele se desenvolva de forma autônoma. A seguir, apresentamos de forma breve, as principais teorias pedagógicas que fundamentam a utilização da Web como recurso de aprendizagem matemática na EJA. 4.1. CONSTRUTIVISMO A Teoria Construtivista, uma das mais importantes da educação nos dias de hoje, surgiu a partir dos estudos do biólogo suíço Jean Piaget (1896-1980). No Construtivismo, acredita-se que no processo educacional, os fatores motivacionais são internos e o professor é quem estrutura o ambiente, favorecendo situações que possibilitem a aprendizagem e estimulando o aluno a se desenvolver em seu ritmo próprio; assumindo assim o papel de provocador de novas experiências. O aluno é sujeito ativo desse processo, por meio do estímulo à dúvida, da experimentação e do desenvolvimento do raciocínio. Quando o sujeito não consegue resolver os desafios propostos, passam por conflitos cognitivos que os levam à busca de reformulações das hipóteses, ampliando cada vez mais seus sistemas de compreensão, numa busca pelo equilíbrio de suas estruturas cognitivas. Os ambientes educativos que promovem uma aprendizagem construtivista estimulam a participação interativa e colaborativa dos alunos. Nesta perspectiva, um modelo de aprendizagem apoiada por computador deve privilegiar o coletivo e o social; além de utilizar os recursos disponíveis como mediadores e promotores do processo de ensino-aprendizagem. Diante do que foi apresentado, pode-se concluir que o a utilização das ferramentas da Web como mediadoras, permitindo uma exploração diversificada, na qual a iniciativa seja de responsabilidade do educando, está apoiada na abordagem construtivista. O caráter de cooperação é obtido através das relações comunicativas, que facilitam as trocas de saberes entre os educandos e entre eles e o professor. 4.2. SÓCIO-INTERACIONISMO 5
A teoria pedagógica sócio-interacionista concebe a aprendizagem como um processo que se realiza através da interação com o outro. Segundo Vygotsky (1978), o cérebro humano está sempre aberto às interações e influências culturais e por isso não há limites para o adulto aprender. Os Blogs por exemplo, são fundamentados nas teorias de Vygotsky, já que influenciam as formas de relacionamento entre as pessoas, atuando em seu nível de desenvolvimento psicológico. As tecnologias digitais favorecem uma mudança nas relações interpessoais e fazem com que seus usuários se habituem com interações rápidas através dos meios de comunicação. A interação social é a chave para o desenvolvimento da linguagem, e a linguagem, aprendida no contexto da interação social, é o motor do desenvolvimento cognitivo Vygotsky (1978). Numa perspectiva Construtivista e Sócio-interacionista, a utilização do Blog como recurso de aprendizagem matemática deve favorecer a expressão do aluno através da interação e da partilha do conhecimento e o professor deve atuar como facilitador do processo e da experimentação. Assim, professores e educandos atuam em discussões e reflexões num plano social. Nota-se que Jean Piaget e Vygotsyky são alguns dos pesquisadores em educação que valorizam o despertar do interesse, o desenvolver da mente, o estímulo à criatividade e o desenvolvimento do raciocínio. E diante dessas idéias, que fundamentam a utilização das novas tecnologias no processo educacional, que será estruturada a proposta pedagógica apresentada a seguir. 5. DESCRIÇÃO E METODOLOGIA DO TRABALHO O projeto proposto considera uma experiência pedagógica, onde as ferramentas virtuais contribuem para uma aprendizagem matemática prazerosa, significativa e, sobretudo, autônoma. Ele está sendo desenvolvido fora do horário das aulas, com a participação de um grupo de 16 alunos dos ensinos fundamental e médio da EJA de uma escola pública da cidade de Campos dos Goytacazes-RJ, orientados pelos pesquisadores. 6
O projeto é composto por oito atividades que contemplam os conceitos geométricos essências na educação básica. A escolha deste enfoque deve-se ao fato de que estes conceitos geralmente não são enfatizados na EJA. É válido destacar que as atividades 1, 2, 3 e 4 foram desenvolvidas com os alunos em 2009 e as demais, postadas no Blog, estão sendo desenvolvidas este ano. - Atividade 1 A primeira etapa do trabalho foi realizada no Laboratório de Informática. Os alunos assistiram ao vídeo: http://www.youtube.com/watch?v=st4yzq6gn4k&feature=related, que fundamentou uma discussão sobre globalização, tecnologia e educação. - Atividade 2 Em seguida, os pesquisadores criaram o Blog denominado Geometriando: criando, experimentando e compreendendo a geometria, disponível em http://geometriando.blogspot.com. Para a apresentação aos alunos, foi inserida uma postagem de boas-vindas e outra revelando o objetivo do trabalho, além de alguns links relacionados à Geometria. O mesmo foi concebido como suporte para os conteúdos extras e demais informações sobre a matéria. Foi esclarecido que o Blog também seria utilizado como: - Fonte de informações: avisos, datas, gabarito de exercícios; - Espaço de discussões sobre um determinado tema trabalhado em grupo; Finalizando esta etapa, os grupos postaram suas expectativas sobre o trabalho. É válido destacar que o manual de utilização do Blog foi criado para que algumas dúvidas referentes à ferramenta fossem sanadas. - Atividade 3 Esta atividade foi iniciada com um debate sobre o significado da palavra Geometria, a aprendizagem dos conceitos geométricos e a sua aplicabilidade em situações do cotidiano realizado a partir do Post Definição. Os grupos registraram suas concepções utilizando o link próprio para publicar comentários. 7
Nesta oportunidade os alunos tiveram acesso aos posts: Um pouco de História. - Atividade 4 A proposta da atividade foi lançada com uma discussão a partir do significado da palavra medir. No cotidiano de nossas vidas estamos com grande freqüência realizando medições. Mas o que é medir? Aos alunos foram oferecidos dois quadriláteros construídos no papel cartão e foi pedido que eles descobrissem qual das figuras possuía maior área. Para medir o primeiro quadrilátero foi utilizado como unidade, quadradinhos com 2 cm de lado e para medir o outro quadrilátero, a unidade foram quadradinhos com 3 cm de lado. Foi visto que não é possível compará-los, por não termos usado uma medida padrão para os dois quadrados. Assim, concluímos que medir é comparar duas grandezas de mesma natureza tomando uma como padrão. Após esta conclusão, foi necessária uma abordagem histórica deste assunto. Esta atividade está disponível no post Medida, onde se encontram disponíveis os sites que nortearam a pesquisa sobre as primeiras unidades de medida utilizadas pela humanidade, a necessidade de unificação dos padrões de medida e a importância da Revolução Francesa neste contexto. www.marinha.pt/extra/revista/ra_abr1999/pag12.html; www.ipem.sp.gov.br/5mt/historia.asp?vpro=imperio; www.unilavras.edu.br/cursos/graduacao/matematica/artigos/origem-sistemametrico.pdf. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Apesar do estudo encontrar-se em andamento, podemos fazer algumas constatações. Os alunos da EJA são receptivos quanto às novas formas de aprendizagem matemática, aceitam com interesse os recursos midiáticos utilizados, interagindo entre si, com o professor e com o conteúdo, colaborativamente. Assim, a implementação do Blog está sendo avaliada de forma positiva pelos educandos que participam da experiência. Os 8
resultados já obtidos apontam no sentido da viabilidade da inclusão das novas tecnologias no ensino de matemática na EJA. A proposta apresentada mostra que é possível reinventar, aceitar desafios, enfrentar o imprevisível e redefinir caminhos a fim de fazer a diferença na aprendizagem dos alunos que vivem neste mundo em rede. Segundo Paulo Freire (1976), a aprendizagem do aluno da EJA precisa ser ampla de modo que o indivíduo possa ler o mundo e, ao lê-lo transformá-lo. 7. REFERÊNCIAS BOVO, Vanilda Galvão. O uso do computador na Educação de Jovens e Adultos, 2001. Disponível em http://biblioteca.planejamento.gov.br/biblioteca-tematica-1/textos/educacaocultura/texto%20103%202013%20o%20uso%20do%20computador%20na%2 0EDUCACaO%20DE%20JOVENS%20E%20ADULTOS.pdf. Acesso em 28/02/2010. FREIRE, Paulo. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976 GOMES, Maria João. Blogs: um recurso e uma estratégia educativa. In: Atas do VII Simpósio Internacional de Informática Educativa, SIIE, 2005. HADDAD, Sérgio; Di PIERRO, Maria Clara. Escolarização de Jovens e Adultos. Revista Brasileira de Educação, maiago,n. 14, ANPED, 2000. (pp. 108130). SANCHO, Juana M (org.). Para uma tecnologia educacional. Porto Alegre: Artmed, 1998. (pp.7296). VYGOTSKY, Lev Seminovitch. Pensamento e Linguagem. Tradução de Vera Lúcia Leitão Magyar. São Paulo, 1978. WIJNIA, Elmine. Blog in the Classroom, 2004. Disponível em http://elmine.wijnia.com/weblog/archives/001511.html. Acesso em 28/02/2010. 9