Título: Uma breve abordagem sobre periodização e sua transformação no futebol. Do componente físico ao tático. Autor: Samuel Bertolini. A periodização no futebol teve um avanço significativo nos últimos anos, trazendo em seu eixo principal à tática, na qual seu modo de pensar não almeja uma condição física específica (medida em velocidade, força, resistência e etc), mas sim a capacidade em resolver os problemas do jogo individual e coletivo dentro de uma mesma ideia. Nesta perspectiva, já não basta estar muito bem fisicamente, é preciso estar preparado para enfrentar o jogo em toda sua complexidade, pensando que o desenvolvimento tático se dá através de uma capacidade de entendimento de seus princípios, subprincípios e sub subprincípios. Periodização origina da palavra período que é uma porção ou divisão do tempo em pequenos segmentos, mais fáceis de controlar. No esporte é a sucessão temporal de objetivos e conteúdos de treino. Dessa forma, faremos uma reflexão histórica de periodização e quais os caminhos percorridos até os dias atuais. Tudo começou há milhares de anos no Egito e na Grécia, o treinamento desportivo era usado para preparar atletas para os jogos olímpicos e guerra. Somente no final do século XIX com início dos jogos olímpicos da era moderna o treinamento passou a ser estrutura sistematizada para elevar o rendimento esportivo (Barbanti, 2004). Gomes (2002) descreve que o modelo tradicional, foi revelado ao mundo na década de 1950 pelo cientista russo Leev Pavlovtchi Matveev, considerado o pai da periodização do treinamento desportivo que fundamentou suas explicações na teoria da Síndrome Geral da Adaptação. Mais tarde em 1979 foi criado a Periodização de Blocos por Yuri Verkhoshanski, na qual seu modelo visara superar o modelo Clássico que se refere à especificidade da modalidade e ao treino de força. Verkhoshanski considerava o bloco (geralmente quatro semanas) como estrutura fundamental do treino e não mais o microciclo (geralmente uma semana) como preconizava Matveev. De acordo com Verkhoshanski os blocos não eram isolados, eram bases condicionantes gerados através de um stress significativo para o treinamento de outras capacidades além da técnica, chamadas de ERAT (efeito retardado de acumulação do treinamento) fornecendo um ganho para o bloco a seguir.
Bompa dividiu seu modelo da mesma forma que o modelo proposto por Matveev, com período preparatório, subdividido em fase geral e específica e período competitivo, subdividido em pré-competitiva e competitiva. No entanto, Bompa usa o termo macrociclo correspondente aos períodos de 4 a 6 semanas que tem como objetivo trabalhar as qualidades físicas básicas e específicas, ou seja, na forma estrutural do modelo de Periodização de Bompa, o macrociclo corresponde ao mesociclo do Modelo Clássico de Matveev (Sequeiros et al 2005). O treinamento físico segundo Bompa (2002) é desenvolvido primeiramente pelo treinamento físico geral, específico e por fim o aperfeiçoamento das capacidades biomotoras. No período de competição recomenda-se que antes das mesmas (competições almejadas) se faça a introdução de um período de recuperação, denominado pelo autor como macrociclo de polimento, com o objetivo de remover a fadiga e facilitar a supercompensação, através de um decréscimo das cargas de treinamento, durante no máximo duas semanas ou dois microciclos. Já no modelo de Cargas Seletivas proposto por Antônio Carlos Gomes, um avanço do Modelo de Matveev e Verkhoshanski e específico ao futebol, propõe uma periodização dupla com duração de 26 semanas para cada macrociclo, onde o volume de treino permanece quase o mesmo durante a temporada anual de competições, e alterna-se as capacidades de treino a cada mês durante o ciclo competitivo (resistência especial, flexibilidade, força, velocidade, técnica e tática). Neste sistema de cargas seletivas, o alvo principal de aperfeiçoamento está na capacidade de velocidade (Gomes 2002). Entretanto, todos os modelos proposto no decorrer de sua evolução apresentam algumas limitações para o futebol, trazendo consigo a parte física como a mais relevante em detrimento à tática, técnica e emocional. Além disso, as concepções de periodizações anteriores foram concebidas para esportes individuais e depois adaptadas aos esportes coletivos como handebol e voleibol pelo Prof. Verkhoshanski. Gomes propôs com seu modelo não só o físico, mas também o tático e o técnico, algo que depois começara um interesse maior em sua abordagem. Interesse esse que revolucionou o futebol, na qual autores como Vitor Frade, Júlio Garganta, Claude Bayer, Pablo Greco, João Batista Freire, Alcides Scaglia e entre outros, proporcionaram uma contribuição enorme ao futebol no que diz respeito aos aspectos pedagógicos, metodológicos, culturais, filosóficos e etc. Esse novo modelo tem superado o paradigma cartesiano pelo paradigma da complexidade. Nessa perspectiva o futebolista não deve ser analisado de forma
fragmentada (físico, técnico e tático) nem fora do contexto no qual se insere (equipe, clube, cultura e etc), mas sim explorado de maneira sistêmica. Frade (2002) apresenta princípios metodológicos próprios e que concebe o processo de treino como um processo de ensino aprendizagem. Trata-se de uma metodologia cujo propósito fundamental passa pela aquisição de uma forma de jogar e de modelar ideias e estruturas. É a forma de treinar que mais se ajusta ao fenômeno em questão, pois é aquela que lhe reconhecendo a essência organizativa, coletiva, intencionalizada e complexa, procura desenvolver e fazer evoluir uma forma de jogar tendo em conta tais aspectos. Para Frade a tática é algo que não é físico, nem técnico, nem psicológico, nem estratégico, porém sem isto não existe. É a partir dela que a periodização não existiria mais sob a quantificação do treino físico, mas sim a análise da qualidade dos comportamentos propostos e se os mesmos estão sendo realizados com eficiência e eficácia. Por exemplo: Se um treinador não tem clareza do modelo de jogo que deseja a sua equipe, independentemente dos exercícios que escolha, ele não está treinando sob a perspectiva da periodização tática. A periodização tática não divide a temporada em macro, meso e micro, se baseia na organização semanal do treino em morfociclo, ou seja, a periodização tática volta-se para o modelo de jogo, por isso tem a mesma estrutura durante toda a temporada. O morfociclo é pautado na especificidade, composto por 3 princípios metodológicos, são eles: princípio das propensões, princípio da progressão complexa e princípio da alternância horizontal em especificidade. São esses princípios que guiará os jogadores, equipe e comissão técnica ao modo de jogar que se deseja. Com isso as situações de jogo e de treinos não devem perder as características fundamentais do jogar que se deseja. Se o exercício apresenta diversas característica do modelo de jogo da equipe, mesmo que ela ocorra em um espaço de tempo reduzido, com o número reduzido de jogadores ele contempla uma grande fração do jogar da equipe. Portanto a periodização no desporto teve uma grande transformação no decorrer de sua história, desde a antiguidade, passando pelo modelo de preparação geral em modalidades individuais proposto por Matveev, seguindo por um modelo menos generalista com estímulos nas capacidades específicas para as modalidades que exigem força, potencia e velocidade proposto por Verkhoshanski, até chegar a um modelo mais específico para o futebol proposto por Gomes, e por fim destacar a
periodização tática por Frade e outros como algo revolucionário, que norteia as linhas de trabalho de uma equipe, clube e como um todo. Contudo se faz necessário conhecer os princípios, subprincípios e sub subprincípios da periodização tática, para que se jogue e aplique bem o futebol, a fim de que se crie seu próprio conhecimento vinculado a uma ideia sistêmica e complexa. Referências Bibliográficas: BARBANTI, V. J. Teoria e pratica do treinamento esportivo. 2ª ed. São Paulo: Edgard blücher, 2004. BAYER, C. O ensino dos desportos colectivos. Lisboa: Dinalivro, 1994. BOMPA, T.O. "Periodização. Teoria e metodologia do treinamento". Gualhuros: Phorte editora, 4a ed., 2002. FRADE, V. "A periodização táctica segundo Vítor Frade. Mais que um conceito, uma forma de estar e reflectir o futebol". Monografia de licenciatura, FCDEF-UP, Porto (2003). GARGANTA, J. Para uma teoria dos jogos desportivos coletivos. In GRAÇA, A., OLIVEIRA, J. (Org.) O ensino dos jogos desportivos. 3 ed. Faculdade de Ciências do Desporto e da Educação Física: Universidade do Porto, 1998. GOMES, Antônio C. Treinamento desportivo: estruturação e periodização. Porto Alegre: Artmed, 2002. LEITÃO, R. A. A. O jogo de futebol: investigação de sua estrutura, de seus modelos e da inteligência de jogo, do ponto de vista da complexidade. Tese de Doutorado. Faculdade de Educação Física da UNICAMP. 2009. MATVEEV, L. P. Fundamento do Treinamento Desportivo. 2 ed. Livros Horizonte, 2001. MATVEEV, L. P. Treino desportivo: metodologia e treinamento. Guarulhos: Phorte,1997. PARREIRA, C. A. "Evolução tática e estratégias de jogo". Brasília: Escola Brasileira de Futebol, 2005.
SCAGLIA, A. J. "O futebol e os jogos/brincadeiras de bola com os pés: todos semelhantes, todos diferentes. (tese de doutorado) Campinas: FEF-UNICAMP, 2003. SEQUEIROS, J. L. S.; OLIVEIRA, A.L.B.; CASTANHEDE, D.; DANTAS, E.H.M. Estudo sobre a Fundamentação do Modelo de Periodização de Tudor Bompa do Treinamento Desportivo. Fitness & Performance Journal, v. 4, n. 6, p. 341-347, 2005. VAZQUEZ FOLGUEIRA, S "1022 Ejercícios de ataque en fútbol" Barcelona: Paidotribo, 2002. Colección fútbol. VERKHOSHANSKI, Yuri V. Treinamento desportivo: teoria e metodologia. Porto Alegre: Artmed, 2001. WEINECK. Treinamento ideal. São Paulo: Ed. Manole, 1999. http://www.efdeportes.com/efd138/modelos-de-periodizacao.htm