ANÁLISE MORFOLÓGICA DO ESTÔMAGO DE Boulengerella cuvieri (TELEOSTEI: CTENOLUCIIDAE), BICUDA



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Transcrição:

ANÁLISE MORFOLÓGICA DO ESTÔMAGO DE Boulengerella cuvieri (TELEOSTEI: CTENOLUCIIDAE), BICUDA JANISLEI GRACIELE MARTINS PEREIRA¹, MENDELSON GUERREIRO DE LIMA 1, SANDRA MARTA BELLAVER¹, CRISTIANO DE OLIVEIRA SCHUINGUES¹ E GERLANE DE MEDEIROS COSTA 1 Recebido em 21.11.2011 e aceito em 25.05.2012 1 Departamento de Ciências Biológicas. Universidade do Estado de Mato Grosso. Campus de Alta Floresta. Av. Perimetral Rogério Silva s/n. Jd. Flamboyant. Alta Floresta-MT, CEP 78580-000. janislley_gracielly@hotmail.com, mendelson@unemat.br, Cristiano-af21@hotmail.com, gerlanemcosta@hotmail.com RESUMO: A importância dos estudos morfológicos do aparelho digestório de peixes se mostra necessária para o desenvolvimento de uma piscicultura competitiva. O objetivo deste trabalho foi descrever a morfologia do estômago de B. cuvieri. Os exemplares foram capturados no Rio Teles Pires, município de Carlinda-MT ( 9 50 53.44 S 55 42 10.65 O), sendo as análises morfológicas realizadas no Laboratório de Anatomia Animal e Triagem de Vertebrados do PPBio Nuram. O estômago estava localizado na cavidade celomática, caudalmente ao esôfago e lobo hepático cranial, ventral a bexiga natatória, dorsolateral aos lobos hepáticos direito e esquerdo e, intestino anterior, estando dorsalmente ao intestino médio e cranialmente ao intestino posterior. Apresentou o tipo cecal em formato de Y, com regiões macroscopicamente distintas, que são: cárdica, cecal e pilórica. A mucosa interna era constituída por pregas longitudinais profundas e secundárias rasas, com morfologia semelhante à de outros teleósteos. Termos para indexação: peixe, caracterização, anatomia MORPHOLOGICAL ANALYSIS OF THE STOMACH OF Boulengerella cuvieri (TELEOSTEI: CTENOLUCIIDAE), BICUDA ABSTRACT: The importance of morphological studies of the digestive system of fish is necessary for the development of a competitive farming. The objective of this study was to describe the morphology of the stomach of B. cuvieri. The specimens were captured in the Teles Pires River, Carlinda-MT city (9 50'53.44''S 55 42'10 65''O), and morphological analysis perfomed in the Laboratory of the Animal Anatomy and Sorting of Vertebrate of the PPBio NURAM. The stomach was located in the celomic cavity, caudally to the esophagus and the cranial hepatic lobe. Ventral to the swim bladder, dorsolateral to the right and left hepatic lobes, and foregut. Dorsal to the gut medium and cranial to the hindgut. They were presented: the cecal type, in Y format, with regions macroscopically distinct from the esophagus: cardic, cecal and pyloric. The internal mucosal was composed by longitudinal folds deep and shallow secondary. Index terms: fish, characterization, anatomy INTRODUÇÃO A família Ctenoluciidae é constituída por dois gêneros, Ctenolucius e Boulengerella. O Ctenolucius não ocorre no Brasil, estando restrito à vertente do Pacífico, riachos, rios e ambientes lênticos de baixa altitude, Panamá, noroeste da Colômbia, vertente do Caribe da Colômbia e noroeste da Venezuela. O gênero Boulengerella no Brasil nas bacias Amazônica e Tocantins, nos estados do Pará e Amapá (Vari, 1995). Os peixes dessa família são popularmente conhecidos por Bicudas (Melo

94 PEREIRA, J.G.M. et al. et al., 2005), atingindo cerca de 1m de comprimento pesando até 7 kg (PNDA, 2008). São peixes pelágicos e bons nadadores, com espécies que preferem águas rasas, correntosas e outras, margens dos rios e lagoas marginais (Santos et al.,1984). A espécie Boulengerella cuvieri apresenta corpo cilíndrico e fusiforme coberto por escamas ctenóides estriadas e ásperas, rostro longo e pontudo, coloração cinza, com inúmeras manchas escuras irregulares concentradas nos flancos, uma faixa escura ao longo da linha lateral que se prolonga até o opérculo, O período reprodutivo desta espécie ocorre durante a época das chuvas, quando se dá a enchente dos rios (Santos et al., 2004). São predadoras, aparentemente se alimentando exclusivamente de peixes adultos. São exploradas pela pesca de subsistência, comercial e esportiva, sendo também exportados como peixes de aquário (Vari, 1995; PNDA, 2008). O tubo digestório de peixes teleósteos pode apresentar variações na estrutura, forma e tamanho (Castro, 2002 apud Maciel, 2006). Algumas espécies possuem o estômago morfologicamente diferenciado, enquanto em outras esse órgão é de difícil diferenciação do intestino, existindo ainda peixes agástricos (Nikolsky, 1963). Para alguns autores o sistema digestório é dividido em intestino cefálico, que compreende a cavidade bucofaringeana; intestino anterior, constituído por esôfago e o estômago; intestino médio que forma o intestino propriamente dito, e intestino posterior, constituindo o último segmento do tubo intestinal, também denominado valva ileorretal (Chaves & Vazzoler, 1984; Rodrigues & Menin, 2008; Rodrigues et al., 2008). O estômago é usualmente dividido em três regiões: Cárdica (entrada), fúndica (saco) e pilórica (saída). As regiões de cárdia e piloro possuem esfíncteres que controlam a entrada e a saída dos alimentos no estômago, porém, em alguns peixes o esfíncter cárdico pode estar ausente. Com uma mucosa interna constituída por células glandulares endócrinas e exócrinas, as quais produzem muco e suco gástrico (Rotta, 2003). O objetivo deste trabalho foi descrever a morfologia do estômago de Boulengerella cuvieri, contribuindo com informações que sirvam de base para pesquisas futuras e auxiliem no manejo, produção e manutenção de estoques pesqueiros e em criadouros. MATERIAL E MÉTODOS Foram utilizados 6 exemplares de B. cuvieri, coletados no Rio Teles Pires, Linha 13, coordenadas geográficas 9 50 53.44 S 55 42 10.65 O, município de Carlinda, Mato Grosso. Os animais foram coletados com auxílio de molinete com isca viva, colocados em recipientes plásticos contendo solução de benzocaína a 50 ppm em solução aquosa (1g de benzocaína em 20L de água), anestesiados, sacrificados e fixados em formaldeído a 10%, transferidos para o Laboratório de Anatomia Animal de Triagem de Vertebrados do PPBio Nuram, Projeto de Pesquisa da Biodiversidade/Núcleo da Amazônia Meridional localizado na Universidade do Estado do Mato Grosso UNEMAT Campus I Alta Floresta MT Brasil. Para as análises morfológicas foi realizada abertura da cavidade celomática com incisão ventral, expondo os órgãos que foram fotografados in situ e separadamente. RESULTADOS E DISCUSSÃO Para descrição do estômago foi usada a denominação usual para estômago de vertebrados maiores. O estômago da B. cuvieri localizava-se na porção cranial da cavidade peritoneal, caudal ao esôfago, ventral a bexiga natatória, dorsolateralmente ao lobo hepático direito e cecos pilóricos e lobo hepático esquerdo. O órgão apresentou formato de Y do tipo cecal, com porção fúndica alongada e curvatura maior, bem apical (Figura 1). Estômago com forma similar foi descrito em Acestrorhynchus lacustris e Acestrorhynchus britskii (Amaral, 1990) e Salminus brasiliensis (Rodrigues & Menin, 2008). Este tipo de estômago difere do estômago de uma espécie onívora, que usualmente apresenta-se em formato de U, como Leporinus fasciatus (Silva, 2010). O estômago do tipo cecal permite a ingestão de presas inteiras, mesmo as de maior porte, ocorrendo distensibilidade das paredes estomacais, em especial nas regiões cárdica e cecal, conforme verificado por Suyehiro (1942), Zihler (1982), Moraes & Barbola (1997). A ausência deste órgão ocorre em diversas famílias, e é usada como critério para

Análise morfológica do estômago de Boulengerella cuvieri (Teleostei: Ctenoluciidae), Bicuda 95 divisão dos Teleósteos em dois grupos: Teleósteos com estômago ou gástricos e Teleósteos sem estômago ou agástricos (Kapoor et al., 1975 apud Neto, 2000). Espécies como Hippocampus reidi, não possui estômago anatômico macroscópico nem microscópico, sendo considerada uma espécie agástrica, onde a passagem do alimento ocorre direto do esôfago para o intestino (Neto, 2000). As nossas análises demonstraram que B. cuvieri é uma espécie gástrica, apresentando estômago bem definido. Foram observadas três regiões bem definidas no estômago de B. cuvieri, a região cárdica com forma cônica logo após o esfíncter esofágico, a fúndica ou cecal com formato saculiforme, constituindo a maior e mais alongada porção do estômago. A região pilórica, com forma tubular, compreendeu a porção final do estômago (Figura 2). Estas características foram observadas em Leporinus macrocephalus (Rodrigues et al., 2008). A região cárdica apresentou paredes espessas, com mucosa interna constituída por pregas longitudinais primárias. A região fúndica, apresentava paredes delgadas e mucosa interna revestida por pregas longitudinais primárias e secundárias. A região pilórica se mostrou tubular, com diâmetro bem Figura 1. Vista ventral da cavidade celomática de B. cuvieri: estômago (círculo) com formato em Y, apresentando uma região bem apical na região fundica (RF), caudal ao esôfago (seta fina) e a porção hepática cranial (PC), ventral a bexiga natatória (BN) limitando-se a direita, com porção lateral direita do fígado (seta larga) e os cecos pilóricos (Cp). Barra 2 cm. Figura 2. Vista dorsal do estômago de B. cuvieri: esôfago (E), esfíncter esofágico (círculo), região cárdica (RC), região fúndica (RF), ápice do estômago na curvatura maior (seta), região pilórica (RP) e cecos pilóricos (CP). Barra 2 cm.

96 PEREIRA, J.G.M. et al. menor que as demais regiões apresentando paredes espessas e mucosa interna constituída por pregas longitudinais (Figura 3). Resultados semelhantes foram encontrados por Bicca et al., (2006) para a espécie Acestrorhynchus pantaneiro, diferindo apenas no padrão de pregas na mucosa interna da região cecal e no comprimento e diâmetro da região pilórica. Estudando as espécies Prochilodus afinnis e Prochilodus marggravii, Menin & Mimura (1993) descreveram variações no sentido das dobras, as quais apresentaram-se longitudinais nas regiões cárdica e pilórica, e transversais na porção cecal. Foi possível observar nesta análise que a região fúndica de B. cuvieri é mais desenvolvida que a cárdica e a pilórica. Segundo Suyehiro (1942) o desenvolvimento da região cecal em predadores, nadadores ativos, pode estar relacionado com a capacidade destes em consumir grandes quantidades de alimento em um curto espaço de tempo. Para Rotta (2003) o estômago armazena temporariamente o alimento e desempenha funções mecânicas que auxiliam na trituração e início da digestão dos alimentos. Figura 3. A- Região cárdica: esfíncter esofágico (circulo) e pregas longitudinais (seta larga). Barra 1 cm. B- Região cecal: pregas longitudinais primárias (Pp), orifício de entrada da região pilórica (seta fina) e pregas secundárias (Ps). Barra 1 cm. C- Região pilórica: mucosa revestida por pregas longitudinais (seta). Barra 1 cm.

Análise morfológica do estômago de Boulengerella cuvieri (Teleostei: Ctenoluciidae), Bicuda 97 O tamanho do estômago pode ser usualmente relacionado com o intervalo entre as refeições e o tamanho das partículas do alimento ingerido. Os peixes que consomem grandes presas em intervalos esparsos possuem grandes estômagos e aqueles que se alimentam de partículas menores (ex. micrófagos) possuem frequentemente estômagos pequenos ou não os possuem (ex: Cyprinus carpio). Os peixes carnívoros geralmente se alimentam com menor frequência, porém, consomem uma refeição maior, necessitando de um estômago de maior volume e com musculatura bastante elástica para acomodar as presas ingeridas; peixes onívoros e herbívoros realizam muitas refeições diárias, porém, consomem pouco alimento por refeição e, por isso, geralmente apresentam estômago de menor volume. A forma do estômago também difere bastante, nos peixes carnívoros o estômago é muito elástico, possuindo pregas bem desenvolvidas, o que permite sua distensão, podendo aumentar de três a quatro vezes o seu tamanho. As características anatômicas observadas no estômago de B. cuvieri são similares as descritas em espécies carnívoras que engolem sua presa inteira, tendo sido observada sua capacidade de distensão para acomodação da presa, apresentando grande volume para tal. CONCLUSÃO O estômago de B. cuvieri apresentou morfologia semelhante ao de outros teleósteos. AGRADECIMENTO Ao apoio dado pelo Laboratório de Anatomia Animal de Triagem de Vertebrados do PPBio Nuram, Projeto de Pesquisa da Biodiversidade/Núcleo da Amazônia Meridional localizado na Universidade do Estado do Mato Grosso UNEMAT Campus I Alta Floresta MT Brasil, que cedeu suas dependências para que se realizasse este trabalho. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMARAL, A.A. Anatomia comparativa do aparelho digestivo de Acestrorhynchus britskii (Menezes, 1969) e Acestrorhynchus lacustris (Reinhardt, 1874) (Pisces, Characidae, Acestrorhynchinae) Revista Ceres, Viçosa, v.37, n. 212, p. 277-288, 1990. BICCA, D.F.; QUEROL, E.; BRACCINI, M.C. Aspectos morfológicos e histológicos do estômago de Acestrorhynchus pantaneiro (Menezes, 1992) (Teleostei, Acestrorhynchidae) na bacia do rio Uruguai médio. Biodiversidade Pampeana, Uruguaiana, v.4, p.5-10, 2006. CHAVES, P.T.C.; VAZZOLER, G. Aspectos biológicos de peixes amazônicos. III Anatomia microscópica do esôfago, estômago e cecos pilóricos de Semprochilodus insignis (Characiformes: Prochilodontidae). Acta Amazônica, Manaus, v.14, p.343-353, 1984. MACIEL, C.M.R. Ontogenia de larvas de Piracanjuba, Brycon orbignyanus Vallenciennes (1849) (Characiformes, Characidae, Bryconinae). 2006. 229f. Tese (Doutorado em Zootecnia) Universidade Federal de Viçosa-UFV, Minas Gerais. MELO, C.E.; LIMA, J.D.; MELO, T.L.V.; SILVA, V.P. Peixes do Rio das Mortes: identificação e ecologia das espécies mais comuns. Cáceres, Ed. UNEMAT, 2005. 145p. MENIN, E.; MIMURA, O.M. Anatomia do estômago de duas espécies de peixes de água doce, Prochilodus marggravii (Walbaum, 1792) e Prochilodus affins (Reinhardt, 1874) (Characiformes, Prochilodontidae), de hábito alimentar iliófago. Revista Ceres, Viçosa, v. 40, n. 229, p. 253-271, 1993. MORAES, M.F.P.G.; BARBOLA, I.F. Alimentação e relações morfológicas com o aparelho digestivo do curimbatá, Prochilodus lineatus (Valenciennes) (Osteichthyes, Prochilodontidae), de uma lagoa do Sul do Brasil. Revista Brasileira de Zoologia, Curitiba, v.14, n.1, p.169-180, 1997. NETO, A.R.R. Aspectos morfológicos do trato digestório do cavalo marinho Hippocampus reidi (Ginsburg, 1933) [Percomorpha, gasterosteiformes, syngnathidae]. 2000. 14f. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura e Bacharelado em Ciências Biológicas). Universidade de Santa Cecília - UNISANTA. Santos/ SP.

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