Does Ad Hoc Coronary Intervention Reduce Radiation Exposure? Analysis of 568 Patients

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Intervenção Coronariana Ad Hoc Reduz a Exposição Radiológica? - Análise em 568 Pacientes Does Ad Hoc Coronary Intervention Reduce Radiation Exposure? Analysis of 568 Patients Márcio A. M. Truffa, Gustavo M.P. Alves, Fernando Bernardi, Antonio Esteves Filho, Expedito Ribeiro, Micheli Z. Galon, André Spadaro, Luiz J. Kajita, Raul Arrieta, Pedro A. Lemos Instituto do Coração Hospital das Clínicas Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), São Paulo, SP Brasil Resumo Fundamento: Uma série de vantagens e desvantagens tem sido descrita para a intervenção coronária percutânea ad hoc, como a realizada ao mesmo tempo que o cateterismo diagnóstico, porém pouco se sabe sobre a exposição radiológica desse procedimento, comparado com a intervenção estadiada, ou seja, em dois momentos. Objetivo: Comparar a dose de radiação utilizada na angioplastia ad hoc com a angioplastia estadiada. Métodos: O produto de dose por área e o Kerma total foram mensurados, somando-se ambas as fases de diagnóstico e terapêutica. Além disso, foram computados o tempo total de fluoroscopia e o número de filmagens. Resultados: Um total de 568 pacientes consecutivos foram tratados com intervenção coronária percutânea ad hoc (n = 320) ou estadiada (n = 248). À admissão, o grupo do ad hoc apresentava menos hipertensão (74,1% vs. 81,9%; p = 0,035), dislipidemia (57,8% vs. 67,7%; p = 0,02) e doença triarterial (38,8% vs. 50,4%; p = 0,015). O grupo ad hoc foi exposto a doses significativamente menores de radiação, mesmo após ajuste para as diferenças basais entre os grupos. O grupo ad hoc foi exposto a uma dose de produto de dose por área total de 119,7 ± 70,7 Gycm 2 enquanto que os pacientes estadiados foram expostos a uma dose de 139,2 ± 75,3 Gycm 2 (p < 0,001). Conclusão: A intervenção coronária percutânea ad hoc reduziu a exposição radiológica, em comparação com procedimentos diagnósticos e terapêuticos realizados em tempos separados. () Palavras-chave: Angioplastia Coronária com Balão; Cateterismo Cardíaco; Angiografia Coronária; Fluoroscopia; Monitoramento da Radiação. Abstract Background: Advantages and disadvantages of ad hoc percutaneous coronary intervention have been described. However little is known about the radiation exposure of that procedure as compared with the staged intervention. Objective: To compare the radiation dose of the ad hoc percutaneous coronary intervention with that of the staged procedure. Methods: The dose-area product and total Kerma were measured, and the doses of the diagnostic and therapeutic procedures were added. In addition, total fluoroscopic time and number of acquisitions were evaluated. Results: A total of 568 consecutive patients were treated with ad hoc percutaneous coronary intervention (n = 320) or staged percutaneous coronary intervention (n = 248). On admission, the ad hoc group had less hypertension (74.1% vs 81.9%; p = 0.035), dyslipidemia (57.8% vs. 67.7%; p = 0.02) and three-vessel disease (38.8% vs. 50.4%; p = 0.015). The ad hoc group was exposed to significantly lower radiation doses, even after baseline characteristic adjustment between both groups. The ad hoc group was exposed to a total dose-area product of 119.7 ± 70.7 Gycm 2, while the staged group, to 139.2 ± 75.3 Gycm 2 (p < 0.001). Conclusion: Ad hoc percutaneous coronary intervention reduced radiation exposure as compared with diagnostic and therapeutic procedures performed at two separate times. () Keywords: Angioplasty, Balloon, Coronary; Cardiac, Catheterization; Coronary Angiography; Fluoroscopy; Radiation Monitoring. Full texts in English - http://www.arquivosonline.com.br Correspondência: Márcio Augusto Meirelles Truffa Rua das Orquídeas, 96, Jardim Novo Mundo. CEP 13211-600, Jundiaí, SP Brasil E-mail: marciotruffa@yahoo.com.br Artigo recebido em 27/03/15; revisado em 14/04/15; aceito em 24/06/15. DOI: 10.5935/abc.20150110 487

Introdução Procedimentos cardiológicos intervencionistas, como a angiografia coronariana e a intervenção coronária percutânea (ICP), são de suma importância para diagnóstico e tratamento, com um aumento exponencial de seu uso e sem alternativa, até o momento, no que se refere ao emprego da radiação para realização deles 1. A International Commission on Radiological Protection (ICRP) determina os riscos da exposição radiológica em procedimentos guiados por fluoroscopia. Esses riscos estão relacionados a lesões de pele (efeitos determinísticos) e ao aumento da incidência de neoplasia (efeitos estocásticos) 2,3. Ocorre, atualmente, um aumento da utilização de exames médicos radiológicos que, associado com a elevação da expectativa de vida mundial, corrobora um risco considerável de câncer 4. Uma série de vantagens e desvantagens tem sido descrita para a ICP ad hoc, como a realizada no mesmo tempo que o cateterismo diagnóstico, porém pouco se sabe sobre a exposição radiológica desse procedimento, comparado à intervenção estadiada, ou seja, num segundo momento, após o paciente já ter sido submetido ao cateterismo diagnóstico. Doses de radiação às quais os pacientes são expostos durante uma angiografia coronariana e procedimentos intervencionistas, como a angioplastia coronária percutânea, já foram reportadas, com doses maiores documentadas na angioplastia, principalmente em procedimentos complexos 5-7. No entanto, não há estudo demonstrando se há diferença na dose de radiação quando se comparam angioplastias ad hoc a estadiadas. Objetivamos, neste estudo, comparar a dose de radiação nos pacientes submetidos a dois esquemas de ICP diferentes: ad hoc e estadiada. Métodos População do estudo O presente estudo incluiu pacientes consecutivos de um único centro submetidos à ICP ad hoc (Grupo 1) e estadiada (Grupo 2), realizadas entre 1º de julho de 2012 e 31 de dezembro de 2012. Os exames foram realizados em uma instituição acadêmica, o Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, na qual os procedimentos de ICP são realizados por médicos assistentes acompanhados por médicos em treinamento em cardiologia intervencionista. Os dados demográficos e relacionados aos procedimentos foram obtidos por consulta dos prontuários eletrônicos do Incor. As informações foram avaliadas de forma prospectiva histórica. Foram incluídas variáveis clínicas relacionadas ao paciente (como sexo, idade, fatores de risco, quadro clínico que motivou a solicitação do cateterismo, antecedentes cardíacos e anatomia coronariana) e relacionadas ao procedimento (número de lesões tratadas, número de stents implantados e território coronariano abordado). Em ambos os grupos, havia pacientes considerados estáveis e instáveis, do ponto de vista clínico. Medidas de exposição radiológica A dose de radiação à qual os pacientes foram expostos foi expressa em Kerma (nome do inglês kinetic energy released per unit mass), que se refere ao feixe de radiação entregue ao ambiente em determinado ponto; e em produto de dose por área (DAP, sigla do inglês dose area product), que equivale ao produto da dose pela área abrangida do intensificador. Kerma foi quantificado em Gy e DAP, em Gycm 2. Utilizamos DAP por essa medida apresentar forte relação com a dose efetiva transmitida ao paciente 6. Tais medidas são integradas no sistema de raio X e estão disponíveis ao término do procedimento. Além disso, o tempo de fluoroscopia e o número de filmagens foram computados e comparados. No grupo de angioplastia estadiada, as medidas de radiação da angiografia coronariana diagnóstica foram somadas com as da angioplastia. Os procedimentos foram realizados no laboratório de hemodinâmica do Incor, que é constituído por cinco salas, sendo quatro delas equipadas com equipamento Philips Allura Xper FD10 e uma com equipamento Philips Allura Xper FD20. O campo de filmagem foi de quadro diagonal de 15 a 25 cm. O modo de filmagem e o número de frames foram variados: entre 15 e 30 frames/segundo. Análise estatística Para análise estatística, foi utilizado o software Statistical Package for the Social Science (SPSS). As variáveis contínuas foram expressas em média e desvio padrão, e as categóricas, em porcentagem. A comparação entre os grupos foi feita com o teste não paramétrico U de Mann-Whitney para variáveis contínuas e com o teste qui quadrado ou exato de Fisher para variáveis categóricas. Ao final, foi feita análise de regressão múltipla para a variável dependente DAP total utilizando modelos lineares generalizados (MLG) para variável dependente que não seguiu distribuição normal; para isso, utilizou-se a distribuição Gamma, com função link logarítmica e método de seleção backward. As variáveis preditoras incluídas no modelo inicial foram as seguintes: tipo do procedimento (ad hoc: 1/ estadiados: 0); idade (anos); sexo (masculino: 1/ feminino: 0); hipertensão arterial sistêmica (sim: 1/ não: 0); diabetes melito (sim: 1/ não: 0); dislipidemia (sim: 1/ não: 0); tabagismo (sim: 1/ não: 0); infarto agudo do miocárdio prévio (sim: 1/ não: 0); ICP prévia (sim: 1/ não: 0); revascularização do miocárdio prévia (sim: 1/ não: 0); insuficiência cardíaca congestiva prévia (sim: 1/ não: 0); característica angiográfica (uniarterial, biarterial: 0/ triarterial: 1), uso de stent farmacológico (sim: 1/ não: 0); angioplastia de tronco de coronária esquerda (sim: 1/ não: 0); angioplastia de descendente anterior (sim: 1/ não: 0); angioplastia de coronária direita (sim: 1/ não: 0); angioplastia de circunflexa (sim: 1/ não: 0); angioplastia de ponte de safena (sim: 1/ não: 0); quantidade de lesões (1: 0/ 2 e 3: 1); quantidade de stents (0, 1: 0/ 2 a 5: 1); e comprimento total de stent (cm). O nível de significância considerado foi de α = 0,05. 488

Resultado Foi incluído um total de 568 pacientes, sendo 320 procedimentos ad hoc (Grupo 1) e 248 estadiados (Grupo 2). As características clínicas e angiográficas dos grupos estão expostas em média e porcentagem na Tabela 1. Não houve diferença entre os dois grupos em relação aos fatores de risco para DA C, excetuando dislipidemia e hipertensão arterial, mais presentes no Grupo 2. Os pacientes do Grupo 1 apresentaram características angiográficas uni e biarterial mais frequentemente quando comparados aos do Grupo 2, ao passo que este apresentou maior predomínio do padrão triarterial. O Grupo 2 teve um número maior de lesões tratadas (1,22 ± 0,49 vs. 1,36 ± 0,54; p < 0,001), sendo necessário o emprego de um maior número (1,32 ± 0,83 vs. 1,65 ± 0,97; p < 0,001) e maior comprimento (26 ± 18,4 vs. 33,48 ± 22,8; p < 0,001) de stents do que no Grupo 1 (Tabela 1). O resultado da comparação das características radiológicas entre os dois grupos está exposto em média ± desvio padrão na Tabela 2 e ilustrado na Figura 1. Os pacientes submetidos à angioplastia por meio de estratégia ad hoc, quando comparados aos submetidos à estratégia estadiada, receberam menor quantidade de radiação expressa em Kerma (Grupo 1: 3,4 ± 12,6 Gy; Grupo 2: 9,3 ± 60,8 Gy; p < 0,001) e DAP (Grupo 1: 119,7 ± 70,7 Gycm 2 ; Grupo 2: 139,2 ± 75,3 Gycm 2 ; p < 0,001), menor tempo de fluoroscopia (Grupo 1: 16,5 ± 10,1 minutos; Grupo 2: 22,4 ± 14 minutos; Tabela 1 Características clínicas e angiográficas dos pacientes e do procedimento Total = 568 Ad hoc (n = 320) Estadiados (n = 248) Valor de p Idade (anos) 63,3 ± 12,00 63,9 ± 11,43 0,567* Sexo masculino (%) 70,3 68,5 0,718 Características paciente (%) HAS 74,1 81,9 0,035 DM 37,5 41,9 0,324 DLP 57,8 67,7 0,020 Tabagismo 39,4 43,1 0,412 IAM prévio 30,0 30,6 0,941 ICP prévia 30,0 26,2 0,368 RVM prévia 17,8 19,8 0,630 ICC prévia 25,3 27,8 0,564 Características angiográficas (%) 0,015 Uniarteriais 30,3 22,2 Biarteriais 30,9 27,4 Triarteriais 38,8 50,4 Características procedimento (%) SF a 20,5 32,7 0,001 TCE b 1,6 3,2 0,308 DA b 48,7 46,0 0,568 CD b 32,1 29,4 0,560 CX b 23,6 40,7 < 0,001 PVS b 6,9 4,0 0,196 Outros vasos b 0,6 2,0 0,249 Lesões (quantidade) b 1,22 ± 0,49 1,36 ± 0,54 < 0,001* Stents utilizados (quantidade) b 1,32 ± 0,83 1,65 ± 0,97 < 0,001* Comprimento total de stent (cm) b 26,01 ± 18,41 33,48 ± 22,82 < 0,001* * Teste não paramétrico U de Mann-Whitney; teste qui quadrado de Yates para tabelas 2 x 2; teste qui quadrado de Pearson; a: faltou informação de três pacientes do grupo ad hoc; b: faltou informação de dois pacientes do grupo ad hoc; teste exato de Fisher. Resultados apresentados como média (desvio padrão) ou porcentagem. HAS: Hipertensão arterial sistêmica; DM: Diabetes melito; DLP: Dislipidemia; IAM: Infarto agudo do miocárdio; ICP: Intervenção coronária percutânea; RVM: Revascularização do miocárdio; ICC: Insuficiência cardíaca congestiva; SF: Stent farmacológico; TCE: Tronco de coronária esquerda; DA: Descendente anterior; CD: Coronária direita; CX: Circunflexa; PVS: Ponte de veia safena. 489

Tabela 2 Características radiológicas dos procedimentos Ad hoc (n = 320) Estadiados (n = 248) Valor de p Kerma total (Gy) 3,4 ± 12,6 9,3 ± 60,8 < 0,001 * DAP total (Gycm 2 ) 119,7 ± 70,7 139,2 ± 75,3 < 0,001 * Fluoroscopia total (minuto) 16,5 ± 10,1 22,4 ± 14,0 < 0,001 * Filmagens total (quantidade) 26,3 ± 9,6 31,6 ± 10,8 < 0,001 * Kerma por lesão (Gy) 3,1 ± 12,7 8,6 ± 60,7 0,082 DAP por lesão (Gycm 2 ) 106,3 ± 67,3 112,1 ± 68,9 0,145 Fluoroscopia por lesão (minuto) 14,3 ± 9 17,7 ± 11,2 < 0,01 Filmagens por lesão (quantidade) 23,2 ± 9,6 25,2 ± 10,2 < 0,01 * Teste não paramétrico U de Mann-Whitney. DAP: Produto de dose por área. 160 140 120 100 80 60 AD-HOC ESTADIADO 40 20 0 DAP (Gycm 2 ) Fluoroscopia (minuto) Figura 1 Características radiológicas dos procedimentos (p < 0,01). DAP: Produto de dose por área. p < 0,001), e de número de filmagens (Grupo 1: 26,3 ± 9,6; Grupo 2: 31,6 ± 10,9; p < 0,001). A comparação dos pacientes que trataram apenas uma lesão está demonstrada na Tabela 3. Os que tiveram apenas uma lesão tratada foram expostos a menores doses de radiação, e os que tiveram duas ou mais lesões tratadas tiveram uma tendência a menores doses. A análise de regressão múltipla para exposição radiológica está demonstrada na Tabela 4. Os preditores relacionados ao aumento de exposição radiológica foram quantidade de stents utilizados (dois ou mais) e padrão coronariano triarterial. Discussão O principal achado deste estudo realizado em um único centro em pacientes consecutivos foi que os pacientes submetidos à angioplastia por meio de estratégia ad hoc, quando comparados aos submetidos à estratégia estadiada, receberam menor quantidade de radiação (expressa em Kerma e DAP), menor tempo de fluoroscopia e de número de filmagens. Utilizaram-se doses maiores que as usadas em estudos prévios 6,8. Observando apenas doses utilizadas em angioplastias, em um dos estudos, a média de DAP 490

Tabela 3 Características radiológicas dos procedimentos, com estratificação pelo número de lesões Ad hoc Estadiados Valor de p Uma lesão (n = 260) (n = 165) Kerma total (Gy) 3,5 ± 14,0 11,8 ± 74,2 0,006* DAP total (Gycm 2 ) 115,3 ± 69,5 130,7 ± 74,1 0,007* Fluoroscopia total (minuto) 15,3 ± 9,3 20,1 ± 12,1 < 0,001* Filmagens total (quantidade) 25,1 ± 9,5 29,0 ± 10,0 < 0,001* Duas ou mais lesões (n = 58) (n = 83) Kerma total (Gy) 2,9 ± 1,3 4,3 ± 8,9 0,103* DAP total (Gycm 2 ) 141,6 ± 72,5 156,1 ± 75,1 0,203* Fluoroscopia Total (minuto) 22,1 ± 11,9 26,8 ±1 6,4 0,121* FIlmagens total (quantidade) 31,8 ± 8,0 36,6 ± 10,8 0,008* * Teste não paramétrico U de Mann-Whitney. DAP: Produto de dose por área. Tabela 4 Variáveis associadas ao produto de dose por área total (Modelo Linear Generalizado, com distribuição Gamma e função link logarítmica), n = 566 Variável Coeficiente EP coef Valor de p Quantidade de stents (2-5) 0,301 0,049 < 0,001 Característica angiográfica (triarterial) 0,175 0,048 < 0,001 Constante 4,646 0,035 < 0,001 Ep coef: Erro padrão do coeficiente estimado foi de 55 Gycm 2 e, em outro, de 86,2 Gycm 2, enquanto que, neste estudo, foi de 119,7 Gycm 2. Além da maior complexidade das lesões tratadas, com grande número de pacientes triarteriais em ambos os grupos, tal achado pode estar relacionado ao fato de os exames terem sido realizados em uma instituição acadêmica, envolvendo médicos em treinamento em cardiologia intervencionista, como já documentado em estudos prévios 9,10. Em relação às características angiográficas, observou se um maior número de pacientes triarteriais no grupo dos pacientes estadiados. No entanto, dos 320 pacientes do Grupo 1, 58 trataram duas ou mais lesões (18,1%), enquanto que, no Grupo 2, dos 248 pacientes, 83 trataram duas ou mais lesões (33,5%) e, comparando os dois subgrupos, observamos clara tendência a menor dose de radiação no grupo ad hoc. Isso demonstra que, apesar do grupo estadiado possuir anatomia mais complexa, tal fato não se refletiu no aumento da dose de radiação. Em relação às características do procedimento, observamos mais angioplastias de artéria circunflexa (ACX), maior quantidade de lesões tratadas e de stents utilizados no Grupo 2. Estudo prévio de 1.827 pacientes submetidos à angioplastia demonstrou que a complexidade da lesão tratada, a angioplastia de ACX e o número de lesões tratadas correlacionaram-se com o aumento da dose de radiação 11. Outro estudo envolvendo 20.669 procedimentos demonstrou que o tratamento de duas ou mais lesões correlacionou-se ao aumento de exposição radiológica 12. Portanto, o maior número de angioplastias de ACX e de lesões abordadas no grupo estadiado podem ter corroborado para uma maior necessidade de radiação observada nesse grupo. No entanto, quando avaliamos a dose de radiação utilizada por lesão tratada, mantivemos a vantagem do grupo ad hoc, no que se referiu a menor dose, expressa em tempo de fluoroscopia e quantidade de filmagens, com clara tendência a menores valores de Kerma e DAP por lesão tratada nesse grupo. Ao avaliar o subgrupo de pacientes que trataram apenas uma lesão, ou seja, 260 pacientes do Grupo 1 e 165 do Grupo 2, nota-se diferença significativa na dose de radiação expressa por Kerma total (p = 0,006), DAP total (p = 0,007), fluoroscopia total (p < 0,001) e quantidade de filmagens total (p < 0,001) a favor do grupo ad hoc. Delewi e cols. ainda relatam que o aumento de exposição radiológica em pacientes submetidos à angioplastia e à cineangiocoronariografia esteve relacionado a: índice de massa corporal, histórico de revascularização do miocárdio, número de lesões tratadas e lesões de oclusões crônicas 12. Em nosso estudo, as variáveis relacionadas ao aumento de exposição radiológica foram quantidade de stents utilizados e padrão coronariano triarterial. Podemos, então, inferir que, em pacientes que serão submetidos a procedimento estadiado, com muitas lesões a serem tratadas, com lesões complexas, especialmente se obesos e com revascularização prévia, alta dose de radiação pode ser necessária, devendo 491

ser realizado um planejamento prévio ao procedimento, com o intuito de minimizar a exposição radiológica para o médico e o paciente. Além disso, devemos levar em consideração o procedimento ad hoc em nossos casos, principalmente quando essas outras variáveis relacionadas ao aumento da dose de radiação estiverem presentes. Limitações do estudo Trata-se de uma análise em um único centro com característica prospectiva, porém histórica, com coleta de dados de prontuários. Conclusão A angioplastia coronária percutânea ad hoc foi associada a significativa redução de exposição radiológica ao paciente, quando comparada à angioplastia estadiada, mesmo após ajuste para as diferenças basais entre os grupos, apresentando menor dose de produto de dose por área e Kerma, menor tempo de fluoroscopia e de número de filmagens. Nossos achados sugerem que menores doses de radiação podem ser vistas como um potencial benefício da angioplastia ad hoc. Contribuição dos autores Concepção e desenho da pesquisa: Truffa MAM, Alves GMP, Bernardi F. Obtenção de dados: Truffa MAM, Alves GMP, Bernardi F. Análise e interpretação dos dados: Truffa MAM. Análise estatística: Truffa MAM. Obtenção de financiamento: Truffa MAM. Redação do manuscrito: Truffa MAM. Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante:truffa MAM, Alves GMP, Bernardi F, Esteves Filho A, Ribeiro E, Galon MZ, Spadaro A, Kajita LJ, Arrieta R, Lemos PA. Potencial Conflito de Interesse Declaro não haver conflito de interesses pertinentes. Fontes de Financiamento O presente estudo não teve fontes de financiamento externas. Vinculação Acadêmica Não há vinculação deste estudo a programas de pós graduação. Referências 1. Chambers CE, Fetterly KA, Holzer R, Lin PJ, Blankenship JC, Balter S, et al. Radiation safety program for the cardiac catheterization laboratory. Catheter Cardiovasc Interv. 2011;77(4):546-56. 2. Valentin J. Avoidance of radiation injuries from medical interventional procedures. Ann ICRP. 2000;30(2):7-67. 3. Balter S, Hopewell JW, Miller DL, Wagner LK, Zelefsky MJ. Fluoroscopically guided interventional procedures: a review of radiation effects on patients skin and hair. Radiology. 2010;254(2):326-41. 4. Molyvda-Athanasopoulou E, Karlatira M, Gotzamani-Psarrakou A, Koulouris C, Siountas A. Radiation exposure to patients and radiologists during interventional procedures. Radiat Prot Dosimetry. 2011;147(1-2):86-9. 5. Cusma JT, Bell MR, Wondrow MA, Taubel JP, Holmes DR Jr. Real-time measurement of radiation exposure to patients during diagnostic coronary angiography and percutaneous interventional procedures. J Am Coll Cardiol. 1999;33(2):427-35. 6. Delichas MG, Psarrakos K, Molyvda-Athanassopoulou E, Giannoglou G, Hatziioannou K, Papanastassiou E. Radiation doses to patients undergoing coronary angiography and percutaneous transluminal coronary angioplasty. Radiat Prot Dosimetry. 2003;103(2):149-54. 8. Mesbahi A, Aslanabadi N. A study on patients radiation doses from interventional cardiac procedures in Tabriz, Iran. Radiat Prot Dosimetry. 2008;132(4):375-80. 9. Lo TS, Zaman AG, Stables R, Fraser D, Oldryod KG, Hildick-Smith D, et al. Comparison of operator radiation exposure with optimized radiation protection devices during coronary angiograms and ad hoc percutaneous coronary interventions by radial and femoral routes. Eur Heart J. 2008;29(17):2180. 10. Lo TS, Ratib K, Chong AY, Bhatia G, Gunning M, Nolan J. Impact of access site selection and operator expertise on radiation exposure; a controlled prospective study. Am Heart J. 2012;164(4):455-461. 11. Fetterly KA, Lennon RJ, Bell MR, Holmes DR Jr, Rihal CS. Clinical determinants of radiation dose in percutaneous coronary interventional procedures: influence of patient size, procedure complexity, and performing physician. JACC Cardiovasc Interv. 2011;4(3):336-43. 12. Delewi R, Hoebers LP, Ramunddal T, Henriques JP, Angerås O, Stewart J, et al. Clinical and procedural characteristics associated with higher radiation exposure during percutaneous coronary interventions and coronary angiography. Circ Cardiovasc Interv. 2013;6(5):501-6. 7. Bakalyar DM, Castellani MD, Safian RD. Radiation exposure to patients undergoing diagnostic and interventional cardiac catheterization procedures. Cathet Cardiovasc Diagn. 1997;42(2):121-5. 492