Autoria: Marcos Cohen, Jorge Ferreira da Silva



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Transcrição:

Título: Avaliação das Estratégias Colaborativas na Gestão de Unidades de Conservação do Tipo Parque na Cidade do Rio de Janeiro: Oito Estudos de Caso e Modelagem Autoria: Marcos Cohen, Jorge Ferreira da Silva Resumo: Na cidade do Rio de Janeiro, os órgãos governamentais gestores das unidades de conservação ambiental do tipo parque enfrentam dificuldades na implementação das diretrizes do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) que visam à gestão participativa dessas unidades. Assim, foi realizada pesquisa objetivando entender como as estratégias colaborativas utilizadas pelos gestores dos parques vêm sendo implementadas. Foram realizados estudos de caso em 8 parques por meio de 71 entrevistas com gestores e atores sociais interessados, pesquisas documentais e observações diretas. Os resultados indicam que as iniciativas para estabelecer a gestão participativa por meio de Conselhos Consultivos são, em geral, lentas e ineficazes devido à falta de normas específicas, de capacitação dos envolvidos e de recursos financeiros. Foram identificadas diferentes parcerias entre órgãos gestores e outras organizações, porém com efetividades reduzidas. Conclui-se que a gestão participativa é um fator de sucesso importante, mas ainda pouco utilizado. Estratégias competitivas também têm um papel importante, o que é captado pelo modelo proposto, que traz como maior contribuição a medição do efeito do grau de colaboração sobre o resultado da gestão dos parques. I. Introdução I.1. Contextualização do Problema Segundo o Relatório Brundtland (Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1991), uma das principais causas da atual aceleração da extinção das espécies e de vários ecossistemas da Terra é o crescimento da população humana e de suas atividades econômicas, agro-pastoris e industriais. Com base no conceito de desenvolvimento sustentável, o relatório propõe diretrizes e medidas para conservar os ecossistemas do planeta, entre elas, a elaboração de Estratégias Nacionais de Conservação com a participação de agências governamentais, ONGs, instituições de interesse privado e a própria comunidade, a fim de se analisar todas as questões referentes aos recursos naturais e definir prioridades de ação. Além disso, o Relatório Brundtland (Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1991) propõe algumas medidas específicas, tais como: definição sobre quantas áreas protegidas são ainda necessárias; uma melhor administração das áreas protegidas já existentes; a criação de áreas de proteção não convencionais e a promoção ao ecoturismo. Sob a inspiração desse relatório e da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), realizada em 1992, no Rio de Janeiro, foi promulgada no ano de 2000 a Lei 9985 que criou o Sistema Nacional de Unidades de Conservação Ambiental (SNUC) e regulamentou a gestão dos diferentes tipos de unidades de conservação ambiental no país, a fim de melhor protegê-las. Unidade de conservação é definida como (Brasil, 2000, Capítulo I, Artigo 2º. Item I): Espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção. O desenvolvimento sustentável local, como definido pela Agenda 21 aprovada na Conferência de 1992, (Egler, 1999) tem se tornado tema de debate em vários segmentos da sociedade brasileira. Este debate gira em torno de dois eixos: rural e urbano. A dicotomia cidade campo tem apresentado contornos dramáticos nas últimas décadas, sobretudo a partir da revolução de 1964, em função do modelo industrializante e excludente, em termos sócioeconômicos, adotado pelos sucessivos governos federais (Acselrad, 2004). O principal indicador da tremenda mudança ocorrida nesse período é aquele que mostra o crescente 1

deslocamento das populações rurais para as cidades em busca de maiores oportunidades de trabalho e melhores condições de vida. Se na década de 60 a população rural brasileira representava 55,3% de toda a população, em 1996 ela representava apenas 21,6%. Nesse mesmo período, a população urbana mais que duplicou (Estatísticas do Século XX, 2003). O impacto dessa enorme migração populacional se deu em todas as áreas da sociedade brasileira, particularmente nos hábitos sociais e culturais, gerando conseqüências positivas, mas também negativas, como o crescimento desordenado das cidades e a crescente e contínua degradação do meio ambiente urbano e seu entorno (Maricato, 1997; Acselrad, 2004). Este último fato decorre da incapacidade das políticas públicas urbanas proverem trabalho e habitação suficientes para as massas migrantes, as quais acabam se deslocando para as únicas áreas restantes das cidades onde podem construir moradias informais: as encostas de morros e margens de rios e lagos, definidas por lei como áreas de preservação ambiental (Maricato, 1997; Acselrad, 2004). Em função da enorme pressão exercida pelo crescimento da malha urbana sobre as áreas naturais existentes nas médias e grandes cidades brasileiras, tem-se percebido que estas cidades estão cada vez mais preocupadas com a conservação de suas áreas naturais por meio da criação de diversos tipos de unidades de conservação ambiental, sob responsabilidade dos governos federal, estadual ou municipal Além disso, várias medidas têm sido tomadas para garantir a conservação de áreas naturais, tais como, leis de proteção e punição de infratores, monitoramento técnico das áreas, replantios de espécies originais, policiamento das áreas, educação ambiental das comunidades próximas, projetos de conservação ambiental e implantação de unidades de conservação ambiental (Souza, 2002; Horowitz, 2004; Oliva, 2004; Oliveira, 2004). Infelizmente, os resultados das ações governamentais no sentido de criar e gerenciar unidades de conservação ambiental nas cidades nem sempre são os esperados, variando do fracasso total a soluções parciais e insatisfatórias. Isto se deve, em grande parte, à falta de recursos financeiros e humanos por parte dos governos, em geral responsáveis pela administração dessas unidades de conservação, à complexidade dos projetos, à natureza interdisciplinar da questão, e, na opinião de muitos estudiosos da questão, à falta de participação efetiva dos diversos segmentos da sociedade em tais empreendimentos (Araújo, 2004; Horowitz, 2004; Silva, 2004). Tomando-se a cidade do Rio de Janeiro como foco deste estudo, constata-se a existência de grande quantidade e variedade de áreas naturais e unidades de conservação ambiental (PCRJ-SMAC, 1998), destacando-se entre elas os parques, que são unidades de conservação integral, isto é, seu objetivo básico é preservar a natureza, sendo admitido apenas o uso indireto dos seus recursos naturais, com exceção dos casos previstos na Lei do SNUC. Assim sendo, são terminantemente proibidos o extrativismo e as práticas agropastoris dentro dessas unidades (Brasil, 2000, Capítulo III, Artigo 7º, Parágrafo 1º). No município do Rio de Janeiro existem dezessete parques naturais municipais, três parques estaduais e um parque nacional (SMAC, 2006). Cada um desses parques é administrado pelo órgão gestor responsável dentro da respectiva esfera de governo, que delega parte das atribuições a um funcionário do órgão que exerce o cargo de gestor (ou administrador) do parque. Além de necessárias para a manutenção do equilíbrio do ecossistema urbano e da qualidade do ar, estas unidades de conservação são também promissoras geradoras de trabalho e renda para a população da cidade, por meio de empregos nos diversos serviços de apoio à gestão da unidade, às atividades turísticas e às atividades educacionais e de pesquisa ligadas ao meio ambiente. Constata-se, porém, que uma boa parte dessas unidades de conservação oficialmente constituídas (parques, áreas de proteção ambiental, etc.), carece de infraestrutura e recursos financeiros, humanos e gerenciais suficientes para garantir sua autosustentabilidade. (PCRJ-SMAC, 2004; TCMRJ, 2005). 2

A lei do SNUC identifica cinco grandes objetivos de uma unidade de conservação integral do tipo parque (Brasil, 2000, Capítulo III, Artigo 11º): 1. Preservar ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica.. 2. Possibilitar a realização de pesquisas científicas. 3. Desenvolver atividades de educação e interpretação ambiental. 4. Desenvolver atividades de recreação em contato com a natureza. 5. Desenvolver o turismo ecológico (ecoturismo). Estes objetivos, se cumpridos de forma efetiva, podem contribuir para a autosustentabilidade da unidade de conservação e o desenvolvimento sustentável das comunidades urbanas em seu entorno. Os dois primeiros objetivos referem-se à conservação ambiental. O terceiro objetivo refere-se tanto à conservação ambiental quanto ao desenvolvimento pessoal e social dos atores sociais que passam pelo processo de Educação Ambiental. O quarto objetivo, se alcançado, terá como conseqüência a melhoria da qualidade de vida dos freqüentadores da unidade. Finalmente, o turismo ecológico, ao mesmo tempo em que diverte, é uma opção de geração de receita para o parque e seus parceiros e de geração de renda para as comunidades em seu entorno, atingindo assim a dimensão financeira da sustentabilidade. Foram também identificadas várias diretrizes básicas do SNUC que incorporam a noção de gestão participativa e colaboração, mencionadas a seguir (Brasil, 2000, Capítulo II, artigo 5º), das quais foram selecionadas duas para aplicação a esta pesquisa: O SNUC será regido por diretrizes que: 1- assegurem a participação efetiva das populações locais na criação, implantação e gestão das unidades de conservação. 2- busquem o apoio e a cooperação de organizações não-governamentais, de organizações privadas e pessoas físicas para o desenvolvimento de estudos, pesquisas científicas, práticas de educação ambiental, atividades de lazer e de turismo ecológico, monitoramento, manutenção e outras atividades de gestão das unidades de conservação. Estas duas diretrizes colocam de maneira implícita a responsabilidade dos órgãos gestores das unidades de conservação pela elaboração de estratégias que garantam a participação da sociedade nessa gestão (aqui denominada gestão participativa), ou seja, de estratégias colaborativas, num conceito mais amplo. Na verdade, o SNUC cria dois instrumentos de gestão das unidades de conservação do tipo parque que embutem este tipo de estratégia: o Conselho Consultivo e o Plano de Manejo elaborado a partir de contribuições da sociedade. I.2. Definição do Problema Com base nessas duas diretrizes para a colaboração e nos objetivos propostos pelo SNUC e considerando ainda os problemas já mencionados da gestão de unidades de conservação do tipo parque em meio urbano, algumas questões emergem naturalmente. - Por que as unidades de conservação do tipo parque têm dificuldades em atingir as diretrizes e os objetivos propostos no SNUC? - Quais as estratégias colaborativas, ou não, usadas pelos órgãos responsáveis e pelos gestores dos parques para atingirem seus objetivos? - Quais as estratégias, colaborativas ou não, usadas pelos diversos grupos de atores sociais envolvidos para atingir seus objetivos? - Qual a configuração estratégica resultante da interação dos atores sociais com o gestor e entre si: Conflito, colaboração total, colaboração parcial, nenhuma, outras? - É possível identificar qual das configurações estratégicas resultantes é aquela que consegue atingir de maneira mais efetiva os objetivos de conservação de unidades de conservação do tipo parque propostos pelo SNUC? 3

- Que outros fatores são determinantes do sucesso ou fracasso da gestão de uma unidade de conservação urbana? Tendo estas questões em mente, foi realizada uma pesquisa exploratória, de caráter qualitativo, com o objetivo de entender como as estratégias colaborativas utilizadas pelos órgãos gestores das unidades de conservação do tipo parque vêm sendo implementadas e como afetam os resultados da gestão e o relacionamento com diferentes grupos de atores sociais envolvidos. Buscou-se, ao mesmo tempo, identificar os problemas vivenciados pelos gestores e os fatores intervenientes que facilitam ou dificultam sua atuação. Mais especificamente foram objetivos finais dessa pesquisa: 1. Entender como as estratégias colaborativas utilizadas pelos responsáveis pela gestão dos parques são implementadas, à luz das diretrizes do SNUC. 2. Entender como as estratégias, colaborativas ou não, utilizadas pelos responsáveis pela gestão dos parques afetam os objetivos de gestão propostos no SNUC. 3. Identificar, pela ótica dos responsáveis pela gestão dos parques e dos atores sociais, que fatores de sucesso atuam sobre os resultados da gestão do parque. 4. Identificar aspectos comuns a todas as unidades de conservação do tipo parque e seus órgãos gestores que possam representar as estratégias utilizadas, os fatores intervenientes e os resultados obtidos à luz do que propõe o SNUC. Este artigo apresenta os principais resultados e conclusões da pesquisa e, ao final, propõe um modelo conceitual que possibilita entender a questão da gestão sustentável de unidades de conservação ambiental do tipo parque a partir da aplicação de estratégias colaborativas e competitivas, que resultariam numa maior ou menor efetividade dessa gestão. II. Referencial Teórico II.1. Conflitos Ambientais Urbanos e Unidades de Conservação É fundamental ressaltar o caráter eminentemente conflituoso das questões ambientais, seja no meio urbano ou rural. Segundo De Mio (2004) os conflitos ambientais são causados pela degradação ambiental, pela opção de desenvolvimento adotada e pela marginalização de setores da sociedade. Para ela, dentro do novo modelo de desenvolvimento sustentável, os interesses que eram conflitantes e excludentes, agora precisam ser integrados, a fim de se resolver o conflito. Já Costa (2004) afirma que a prática ambiental urbana no Brasil tornou-se extremamente complexa devido à grande heterogeneidade de nossa sociedade. Isto é facilmente constatado nas grandes cidades onde os problemas oriundos da má distribuição de renda convivem com problemas causados pelo excesso de consumo das classes mais abastadas. Assim, pode-se observar nos grandes centros urbanos ocupações irregulares de áreas ambientalmente protegidas (encostas de morros, beiras de rios e lagoas e mangues), problemas na coleta de lixo e no tratamento do esgoto convivendo com aumento do volume de lixo e da poluição causada por carros, devido a altos padrões de consumo das classes de maior renda. As políticas públicas concebidas para tentar tratar desses problemas acabam afetando os diferentes e complexos interesses dos vários grupos de atores sociais. Neste contexto, Costa (2004, p 199) define o conflito ambiental urbano no Brasil: Identificamos como principal foco do conflito de interesses em torno das políticas ambientais urbanas a tensão entre o uso público e privado dos recursos econômicos, sociais, culturais, bióticos e abióticos da cidade e de seu entorno, que são por principio, públicos....a dimensão do urbano é antes um campo em construção e disputa que uma definição acabada. Costa denuncia a lógica da valorização do capital no espaço urbano, que acaba causando a exclusão de grande parte da população do acesso à moradia e que gera, conseqüentemente a ocupação ilegal das áreas ambientais protegidas (aí incluídas as unidades de conservação), os espaços urbanos que acabaram sobrando para os pobres. As estratégias colaborativas podem ser usadas como uma forma de reduzir o conflito ambiental urbano. 4

II.2. Estratégias Colaborativas e sua Aplicação ao Caso da Conservação Ambiental Para Presas (2001) a transição para o desenvolvimento sustentável requer uma nova forma de pensar, baseada, não mais no tradicional enfoque verticalizado, de cima para baixo, mas em um mecanismo de aprendizado coletivo, fruto do diálogo entre os atores sociais. Isto só acontecerá na medida em que estes se dêem conta de seu papel individual, das interdependências e da necessidade de parcerias. Assim, um amplo debate, de caráter democrático, e um processo decisório participativo envolvendo as partes interessadas seriam essenciais para a correta identificação das questões relevantes e para o estabelecimento de prioridades e a definição de planos de ação viáveis. Neste contexto, faz-se necessário definir o que é colaboração nas questões sócio-ambientais e também identificar os diferentes tipos de colaboração que estão sendo praticados nessa área. Gray (1985) define colaboração como a reunião de recursos tangíveis e/ou intangíveis por duas ou mais partes interessadas (stakeholders) a fim de resolver um conjunto de problemas que nenhum deles pode resolver sozinho. Com base em Healey (1997) pode-se afirmar que cada vez mais, as estratégias tradicionais de planejamento e desenvolvimento das sociedades, baseadas em critérios puramente econômicos e sem a consulta e participação no processo de planejamento e na tomada de decisão, não são mais plausíveis. Há necessidade da adoção de um enfoque sócioambiental, considerando os interesses das redes de atores sociais envolvidos. Destaca-se aqui o trabalho de Wondolleck (1994) e Wondolleck e Yaffee (1997) a respeito da dimensão colaborativa da gestão de ecossistemas e sobre o processo decisório na questão ambiental. Eles focam seus trabalhos na solução não conflituosa de disputas envolvendo áreas ameaçadas pela atuação das empresas, buscando identificar os fatores que facilitam e os que impedem a colaboração e coordenação entre as fronteiras geopolíticas que dividem ecossistemas. Especificamente em relação aos questionamentos sobre colaboração em questões ambientais, Wondolleck e Yaffee (1997) explicam que a colaboração pode levar a decisões mais eficientes e fáceis de serem implantadas. Ao mesmo tempo, as comunidades e órgãos de governos que colaboram entre si adquirem habilidades que poderão servir em futuras situações, e um processo de aprendizado coletivo. Para ela, construir pontes entre Governos, organizações privadas e os indivíduos constroem o entendimento mútuo, o apoio e a capacitação de todos os envolvidos. Wondolleck e Yaffeee (2000) alertam, porém para barreiras institucionais e estruturais presentes nas complexas situações projetos ou conflitos ambientais. As principais barreiras por eles identificadas são: falta de oportunidades e incentivos; objetivos antagônicos das partes;inflexibilidade de políticas e procedimentos das partes envolvidas e recursos limitados e falta de confiança mútua e normas e cultura organizacionais. Wondolleck e Yaffee (2000) propõem algumas ações para superar essas barreiras, tais como: eliminar as percepções erradas entre parceiros e incentivar o entendimento mútuo por meio de contatos freqüentes, inclusive informais; focar nos indivíduos e não as organizações, pois as parcerias são essencialmente feitas de pessoas, e incentivar a confiança e o respeito mútuos. Dentro deste tema, cabe mencionar o trabalho de Healey (1997), a qual cita que experiências de enfoques colaborativos locais com ampla base de apoio têm surgido na Europa, sobretudo na Escandinávia. Healey conclui que para atender à preocupação coletiva com qualidade ambiental das regiões urbanas, os governos precisam adotar um novo enfoque, que passa pelas seguintes ações: 1.descrever forças que podem gerar as mudanças locais; 2. oferecer idéias sobre formas e processos de governança unindo atores sociais e comunidades locais. Para Healey, as atitudes e valores se encaixam em contextos históricos e geográficos, fazendo com que as referências e sistemas de significado evoluam. Os indivíduos são assim moldados por sua situação social, mas também a moldam. Sua abordagem reconhece que o 5

trabalho ativo de construção social não ocorre em território neutro, pois relações de poder estão envolvidas neste processo. O enfoque institucionalista de Healey serviria então de base para o planejamento colaborativo, com foco nas teias e redes relacionais comunitárias, formando vínculos, que geram o capital intelectual e social. Nestas redes, as alianças informais são a base dos movimentos sociais urbanos e a mobilização conecta as pessoas e muda as percepções e o entendimento das questões. Neste contexto, para que a gestão de assuntos comuns de comunidades políticas seja viável Healey entende como necessário que se formem arenas formais, completadas pelas informais. Assim, os processos de governança gerariam teias relacionais que perpassariam ou conectariam teias de vida de domicílios e empresas. Healey lembra contundo, que as teias relacionais e redes sociais não são homogêneas e variam muito em termos de alcance espacial e relacional, sendo muitas vezes a origem de conflitos locais. Na prática, isto significa que os processos de planejamento colaborativos são multiculturais e devem contemplar conflitos. Neste sentido, o entendimento e o respeito pelas necessidades das partes envolvidas são fundamentais. Mas quem são em geral os participantes da rede de interações que se forma em torno da questão ambiental? Viola (1996) lista sete grandes setores: ONGs e grupos comunitários envolvidos na luta pelo meio ambiente; agências estatais; grupos e instituições científicas de pesquisa; administradores e gerentes envolvidos com a gestão ambiental dos processos produtivos; o mercado consumidor que exige produtos ecologicamente corretos; redes multisetoriais que estabelecem e certificam processos e produtos pela ótica da sustentabilidade e agências e tratados internacionais. Já Sachs (1993) identifica três grupos de atores sociais responsáveis pelo desenvolvimento sustentável: o Estado, as empresas e o chamado terceiro setor, formado pelas ONG s e movimentos comunitários. Para ele as formas de parceria e a distribuição de poder entre estes atores ainda estão sendo definidas, mas com certeza, nenhum deles pode dar conta de tal tarefa isoladamente, quer pela complexidade, quer pela longa maturação de ações desta natureza. Falta ao Estado a capacidade de entender as complexidades e necessidades locais assim como falta às empresas o foco social e de longo prazo. Deve-se deixar claro que neste trabalho o termo estratégias colaborativas será empregado de maneira mais ampla do que aquela definida por Barney (2002). Ele incorporará diversos tipos de arranjos colaborativos, temporários ou não, com muitos ou poucos participantes, oficiais ou informais, incluindo alguns tradicionais como alianças estratégicas ou redes, como por exemplo: Parcerias simples - aquelas focadas em um ou dois temas, envolvendo um pequeno número de parceiros e possuindo uns poucos objetivos específicos. (Wondolleck e Yaffee, 2000). Parcerias Múltiplas Aquelas envolvendo um grande número de parceiros, em geral em torno de projetos ambientais mais complexos. (Wondolleck e Yaffee, 2000). Coordenação entre agências (órgãos de governo) - são ações integradas entre órgãos do mesmo governo ou de governos diferentes para atingir objetivos comuns em questões ambientais. (Wondolleck e Yaffee, 2000). Gestão Participativa de unidades de conservação inclui a participação da comunidade do entorno de uma unidade de conservação por meio de um Conselho Consultivo (Brasil, 2000 ). III. Metodologia Com base em Creswell (2003) e Remenyi et al. (1998) procurou-se estabelecer a estratégia de pesquisa de acordo com os objetivos estabelecidos, optando-se por uma pesquisa exploratória (Remenyi at al, 1998), pois buscou-se obter um conhecimento inicial sobre um campo de estudo relativamente pouco estudado, no Brasil, o das estratégias colaborativas aplicadas à gestão de unidades de conservação. Isto levou à opção por uma abordagem eminentemente qualitativa (Creswell, 2003) e pela adoção da estratégia de múltiplos estudos 6

de caso devido a sua vantagem de responder adequadamente às perguntas como e por quê sobre o fenômeno estudado (Yin, 1994). Usando critérios propostos por Yin (1994), buscouse garantir a validade dos conceitos estudados pelo uso de múltiplas fontes de evidência (triangulação entre entrevistas de diferentes partes envolvidas, coleta de documentos oficiais dos governos e responsáveis pelos parques e de documentos gerados por outras entidades, consulta a páginas da Internet das partes envolvidas) e revisão de conclusões por alguns entrevistados-chave. A validade interna não foi uma prioridade por se tratar de uma pesquisa descritiva e exploratória e não causal. Já a validade externa (capacidade de generalização da pesquisa) foi garantida, ao menos parcialmente, pela abordagem de múltiplos estudos de caso. Procurou-se também garantir a confiabilidade da pesquisa utilizando um protocolo de estudo, como proposto por Yin (1994) e caso e criando-se uma base de dados com todas as entrevistas e documentos coletados. O universo da pesquisa constou dos vinte e um parques existentes na cidade do Rio de Janeiro na ocasião da pesquisa, sendo que três deles estavam criados, mas não implantados e dois estavam fechados para reformas. Para fins de seleção final, foram levados em consideração os critérios de tempo suficiente de funcionamento do parque (pelo menos, desde 2000), de estabilidade de sua gestão, de facilidade de acesso pelo pesquisador e de interesse em termos de relacionamento do parque com atores sociais do entorno. Assim, dos dezesseis parques restantes foram selecionados oito, representando as três esferas de governo: o único parque federal existente (Parque Nacional da Tijuca), o único estadual em funcionamento (Parque Estadual da Pedra Branca) e seis municipais (Parque Natural Municipal Chico Mendes, PNM de Marapendi, PNM da Prainha, PNM Bosque da Barra, PNM Bosque da Freguesia e PNM do Penhasco Dois Irmãos). Cabe ressaltar que, com uma área de 12.500 hectares, o Parque Estadual da Pedra Branca é considerado o maior parque urbano do Mundo. Já o Parque Nacional da Tijuca, com 3.953 hectares é o mais conhecido da cidade. Dos seis parques municipais, quase todos com menos de 100 hectares de área, cinco localizam-se na Baixada de Jacarepaguá que abrange os bairros da Barra da Tijuca, Recreio e Jacarepaguá. Durante a fase de coleta de dados, foram realizadas 78 (setenta e oito) entrevistas com os responsáveis dos órgãos gestores centrais, com os gestores dos parques e com representantes de diversos grupos de atores sociais interessados na gestão dos parques (ONGs, empresas, associações de moradores e classistas, instituições de ensino e pesquisa, associações políticas, entre outras). Dessas entrevistas, 71 (setenta e uma) foram aproveitadas. As entrevistas semi-estruturadas foram realizadas com base em listas de questões abertas préelaboradas, tendo sido os gestores dos parques entrevistados mais de uma vez em diferentes momentos. Também foram obtidos dados por meio de pesquisa bibliográfica e documental, além de diversas observações diretas nos parques estudados. A fase de coleta de dados durou de novembro de 2005 a dezembro de 2006, mas buscou levantar dados desde a data da criação da Lei do SNUC ( Julho de 2000). O tratamento dos dados foi eminentemente qualitativo, usando-se um software de Análise de Conteúdo (Atlas versão 4.2) como suporte à análise das entrevistas transcritas. A análise dos dados, com base em categorias pré-estabelecidas, resultou no preenchimento de diversas planilhas que ajudaram a chegar a conclusões sobre todos os casos quando comparados entre si. Alguns dos dados levantados, como fatores de sucesso identificados pelos entrevistados, foram tratados quantitativamente, gerando estatísticas de freqüência, porém a interpretação de seu significado foi essencialmente qualitativa. O método usado sofre das limitações inerentes à estratégia de estudo de caso, o qual se acaba se baseia em percepções subjetivas do pesquisador, que por mais treinado que seja, sempre corre o risco de distorcer os fatos relatados ou opiniões emitidas. Daí a importância do processo de triangulação para mitigar essa tendência natural. 7

IV. Resultados da Pesquisa A seguir serão apresentados os principais resultados da pesquisa. Na análise dos dados foram considerados dois níveis de comparação: - entre parques, independente do governo ao qual pertencem; - entre órgãos centrais que controlam estes parques: Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMAC), pela Prefeitura; Instituto Estadual de Florestas (IEF), pelo Governo do Estado; Coordenadoria Regional do IBAMA, pelo Governo Federal. A análise entre parques procurou encontrar semelhanças e diferenças em termos de estratégias colaborativas empregadas, configurações de relacionamento resultantes e resultados alcançados, em função das ações dos gestores e de seus respectivos órgãos centrais e das especificidades locais de cada parque. Já a análise entre órgãos controladores de diferentes esferas de governo buscou entender aquelas semelhanças e diferenças resultantes que possam ser explicadas exclusivamente pelas ações centralizadas no nível de cada governo. Os resultados da análise dos dados por parque foram agrupados de acordo com as duas diretrizes colaborativas selecionadas do Artigo 5º do SNUC (Brasil, 2000). Diretriz 1- Assegurar a participação efetiva das populações locais na criação, implantação e gestão das unidades de conservação. 1.1. Objetivo Implantar a gestão participativa nos parques Este item analisou o processo de formação e/ou de funcionamento de Conselhos Consultivos em cada parque como um instrumento de gestão que operacionaliza a estratégia colaborativa de gestão participativa dos parques. Os Conselhos Consultivos são órgãos deliberativos constituídos por representantes de órgãos públicos e de organizações da sociedade civil, de forma paritária, que auxiliam o gestor na gestão participativa do parque. Há uma série de normas para a formação e funcionamento desses Conselhos. Dos oito parques analisados apenas um (PNM Bosque da Freguesia) tinha seu Conselho Consultivo em pleno funcionamento durante a pesquisa, mas ainda assim, de forma provisória, e até irregular. Entre os demais, quatro parques estavam formando seus Conselhos e três ainda não haviam iniciado o processo. Dos parques em processo de implantação, sem dúvida nenhuma o Parque Nacional da Tijuca (PARNA) da Tijuca era aquele em estado mais adiantado, tanto que, após o encerramento da coleta de dados, o processo chegou ao final, tendo o Conselho sido empossado em 2007. Porém, o aspecto mais importante a ser mencionado é quanto à metodologia utilizada para a formação dos Conselhos. Aqui, o PARNA da Tijuca se destaca de forma exemplar ao adotar, em parceria com a ONG Terra Azul, tendo o IBASE como consultor, uma metodologia absolutamente participativa, tornando todo o processo não apenas democrático, mas, acima de tudo includente e motivante para os atores sociais que dele participaram. Já o processo do Parque Estadual da Pedra Branca pareceu extremamente centralizado, ainda que os responsáveis tenham tido o cuidado de normatizar o procedimento para criação do Conselho. O processo de formação do Conselho deste parque foi bastante afetado por conflitos políticos ocorridos dentro do Governo do Estado em função de conflitos entre os partidos políticos que o compunham. Mais atrasada neste processo está a maioria dos parques municipais, sem normas e procedimentos para implantação de Conselhos, sem recursos humanos em quantidade adequada para dar suporte a tantos processos de formação de conselhos correndo ao mesmo tempo. Além disso, a idéia do Conselho parece não ter sido ainda internalizada entre todos os gestores de parques, o que indica a necessidade de reciclagem dos mesmos sobre o tema. É necessário também ressaltar a importância da capacitação de todos os atores sociais para conhecerem a Lei do SNUC e entenderem seus deveres e direitos como membros do Conselho. Analisando pela ótica das três esferas de governo, percebe-se uma maior inclinação ao processo democrático no IBAMA (federal), possivelmente em função da atuação da Ministra do Meio Ambiente e de alguns políticos do PT que trabalham há anos, de forma 8

participativa, pelas causas ambiental e social. Esta atitude mais aberta à negociação e à participação popular não pareceu tão presente no IEF(estadual) e na SMAC (municipal). Diretriz 2 - Buscar o apoio e a cooperação de organizações não-governamentais, de organizações privadas e pessoas físicas para o desenvolvimento de estudos, pesquisas científicas, práticas de educação ambiental, atividades de lazer e de turismo ecológico, monitoramento, manutenção e outras atividades de gestão das unidades de conservação. 2.1. Objetivo Preservar ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica. O Plano de Manejo é o instrumento técnico principal de gestão de uma unidade de conservação, pois com base nos objetivos da mesma, estabelece o seu zoneamento, as normas de uso da área e o manejo dos recursos naturais (Brasil, 2000). À exceção do PARNA da Tijuca, nenhum parque possui Plano de Manejo. A situação é contornada com a elaboração de normas de uso do parque, promulgadas por decreto, que visam a estabelecer regras mínimas de uso, de forma provisória. Assim, os gestores têm como dialogar com os atores sociais com base em regras formais. A situação da maior parte dos parques municipais é preocupante quanto a este objetivo, como já havia identificado uma auditoria do Tribunal de Contas do Município em 2005. (TCM, 2005). A persistente falta de recursos financeiros e humanos, aliados à burocracia excessiva para licitar novos contratos ou renovar os existentes dificulta sobremaneira a eficaz gestão dos parques municipais. O sucesso de alguns programas ambientais na SMAC, como o Mutirão Reflorestamento e o Guardiões dos Rios, faz com que eles sejam freqüentemente acionados, oficial ou oficiosamente, para ajudarem os gestores a contornarem problemas causados pela falta de contratos de manutenção. Além disso, parcerias informais e, em geral, pontuais com empresas, ONGs e moradores ajudam os gestores em algumas de suas atividades, sempre de modo paliativo. No entanto, isto não ocorre de forma homogênea, pois depende de capacidade de iniciativa dos próprios gestores, de suas qualidades de comunicação com a comunidade, e do grau de familiaridade dos mesmos com os problemas de meio ambiente, já que alguns gestores do município não têm uma formação nessa área. A situação do Parque Estadual da Pedra Branca não é muito melhor neste aspecto. Ameaçado pelo crescimento urbano descontrolado em seu entorno, por questões fundiárias ainda não resolvidas, por caça ilegal, por balões que causam incêndio e por atividades econômicas ilegais no entorno e dentro dele, é talvez o parque mais ameaçado da cidade em termos do objetivo de conservação de sua fauna e flora. Medidas de fiscalização vêm sendo tomadas nos últimos anos e têm logrado reduzir o número de incêndios e controlar o crescimento dessas atividades ilegais, no entanto, são medidas ainda insuficientes para livrar o parque dos riscos maiores. Parece fundamental que seja dada uma ampla prioridade à gestão do Parque da Pedra Branca e que ações gerenciais estratégicas e sistemáticas incluam cada vez mais os grupos de atores sociais interessados a fim de discutir os grandes problemas que afligem o parque. Entende-se que o Conselho Consultivo e o Plano de Manejo participativo sejam instrumentos adequados para iniciar este processo. Neste sentido, parece que o exemplo do PARNA da Tijuca poderia ser usado pelo Governo do Estado como modelo de ação estratégica de caráter participativo. 2.2. Objetivo Possibilitar a realização de pesquisas científicas. Como esta atividade é quase toda centralizada nos órgãos centrais de gestão, não serão feitas considerações sobre parques individualmente. Os levantamentos realizados indicam que o IBAMA (Federal) e IEF (Estadual) lograram atingir um estado mais avançado em termos de planejamento e controle de pesquisas científicas dentro de seus parques. Existem normas claras para aprovação de solicitações de realização de pesquisa e os pesquisadores devem se comprometer a apresentar os resultados durante e depois de completada a pesquisa. Já na SMAC (Municipal) o processo é bem mais frouxo. A pesar de possuir um convênio com o Instituto Iguaçu, este se refere apenas a fornecimento de estagiários para o parque, em 9

geral alunos universitários de ciências naturais oriundos de universidades menos conhecidas, e cujas pesquisas são ainda bastante limitadas pelo grau de conhecimento que possuem. Seria necessário maior controle sobre todo o processo de pesquisa científica, desde a autorização até o controle, processamento, guarda e divulgação dos resultados e um maior contato com áreas de pós-graduação de instituições reconhecidamente competentes em pesquisas científica nas áreas de biologia e meio ambiente. 2.3. Objetivo Desenvolver atividades de educação e interpretação ambiental Foi possível identificar um ponto em comum entre todos os parques estuados e as três esferas de governo: o enfoque sistematizado e integrado em Educação Ambiental. Nas três esferas as ações são planejadas de forma centralizada e operacionalizadas de forma descentralizada por meio de centros ou núcleos especiais. São elaborados convênios com Secretarias de Educação dentro das respectivas esferas a fim de viabilizar a disseminação de informações entre as escolas, em geral de primeiro grau. Devem ser destacados os seguintes instrumentos: o Programa Água em Unidade de Conservação, uma parceria entre o IBAMA/PARNA da Tijuca e o Instituto Terra Azul, com forte preocupação educacional para estudantes e comunidades; o Programa Floresta em Movimento, do IEF junto à rede de escolas estaduais, aumentando a consciência das diversas comunidades sobre o Parque da Pedra Branca; e o Programa Mutirão Reflorestamento, associado ao Programa Educativo em Áreas de Reflorestamento (PEAR), que conseguem atingir o objetivo de sustentabilidade, ao unir num único programa a preocupação com a conservação ambiental (reflorestamento) a equidade social (educação ambiental e geração de renda em comunidades carentes) e a eficiência econômica (visibilidade que garante recursos, associada à venda de mudas produzidas dentro do projeto). Foi então possível constatar que a educação ambiental é, ao mesmo tempo, objetivo da gestão de unidades de conservação do tipo parque e uma estratégia colaborativa poderosa, já que sua operacionalização forçosamente passa pela busca de uma maior participação da comunidade na vida dos parques e na busca de parcerias que viabilizem as atividades. Ela vem sendo usada de forma adequada pelos órgãos centrais responsáveis pela gestão dos parques, porém a falta crônica de recursos pode ser um fator inibidor das ações em médio prazo. 2.4. Objetivos Desenvolver atividades de recreação em contato com a natureza e desenvolver o turismo ecológico (ecoturismo). Os dois objetivos foram analisados conjuntamente. Enquanto que no aspecto de proporcionar lazer aos seus freqüentadores os parques estudados conseguem alcançar graus satisfatórios de desempenho possuindo, em geral, equipamentos adequados e em bom estado e algumas atividades culturais ligadas ao meio ambiente, sobretudo para crianças, é sem duvida alguma, na área do ecoturismo que os parques do Rio de Janeiro apresentam um de seus priores desempenhos, quase sem exceção. Mesmo o PARNA da Tijuca, campeão de visitantes, é procurado principalmente por suas atrações de turismo de massa, como as visitas ao Corcovado e Pedra Bonita. A maioria dos parques é hoje em dia muito mais usada por moradores locais em seu lazer diário do que pelos turistas que visitam a cidade. Percebe-se o desperdício de um enorme potencial de geração de riqueza para a cidade. Parece faltar uma estratégia não só nos órgãos centrais responsáveis, mas principalmente em nível de governo, nas três esferas. O Rio de Janeiro é, sem dúvida, uma cidade de grandes belezas naturais e seus parques são os destinos certos para quem quer apreciá-las, sob a ótica ambientalista ou, mesmo praticando esportes ligados à natureza. Porém, constata-se a falta dedivulgação adequada e sistemática dos parques entre potenciais turistas com consciência ambiental. Pior ainda, alguns locais dentro de alguns dos parques são perigosos em função do contexto de violência que tomou conta da cidade. Assim, parece que somente com uma tomada de consciência por parte dos governos e uma ampla parceria, pode se utilizar o ecoturismo como 10

fonte de geração de renda para a população, receitas para os parques e instrumento de sua conservação. Durante as entrevistas foi solicitado a cada entrevistado que listasse os fatores de sucesso para a gestão de um parque em geral. As respostas foram agrupadas e tratadas a fim de gerar uma estatística de freqüência, sendo que um mesmo respondente pode ter indicado mais de um fator. Sessenta e quatro entrevistados apresentaram 105 fatores. Os fatores foram classificados posteriormente por natureza estratégica, isto é, se colaborativo ou competitivo. O resultado indica que 17,1% dos respondentes percebem a gestão participativa em geral (aí incluídas as menções ao Conselho Consultivo) como um fator de sucesso na gestão de parques. Foi a maior freqüência entre todos os fatores citados (colaborativos ou competitivos), o que evidencia haver uma sensibilidade geral entre os entrevistados da necessidade de se caminhar rumo a uma gestão mais envolvida com a sociedade em geral e as comunidades locais em particular. Cabe destacar a importância relativa nas respostas de dois fatores de natureza competitiva: estratégia mercadológica (14,3%) e eficiência gerencial (12,4%), deixando claro que para os entrevistados, somente a adoção de estratégias colaborativas não é suficiente para garantir o sucesso da gestão de um parque. Este ponto é fundamental, pois como ficou claro nos oito casos analisados, a falta de recursos e de processos gerenciais adequados é o que prevalece nos órgãos responsáveis pela gestão ambiental no Estado e na cidade do Rio de Janeiro. V. Conclusões V.1. Conclusões sobre os resultados obtidos. Quando se comparam as gestões dos parques no nível centralizado, conclui-se que a esfera federal, representada pela coordenadoria regional do IBAMA e responsável pelo PARNA da Tijuca é a que alcançou o maior grau de gestão participativa e de colaboração com empresas, ONGs e outros atores sociais visando a atingir os cinco objetivos propostos pelo SNUC para os parques. O modelo implantado no PARNA dqa Tijuca parece ser o modelo a ser seguido pelos demais governos / órgãos gestores em seus respectivos parques. O Instituto Estadual de Florestas (IEF), que representa a esfera estadual, está avançado na busca de parcerias que forneçam a verba necessária para a gestão de seus três parques na cidade e dos demais no estado. Esta verba não deveria ser tão escassa, por ser oriunda de royalties do petróleo e compensações ambientais das empresas, mas a competição com outros usuários e aspectos políticos têm dificultado a chegada do dinheiro às unidades de conservação. O IEF ainda hesita no processo de formação do Conselho Consultivo do PE da Pedra Branca. Com a entrada da nova gestão, de origem ambientalista, na Secretaria Estadual de Meio Ambiente, o panorama pode melhorar. Mesmo assim, o desafio do IEF é gigantesco, como o tamanho do PE da Pedra Branca, que tem área maior que todos os demais parques da cidade juntos. Finalmente, a esfera municipal, representada pela Secretaria Municipal do Meio Ambiente (SMAC), é entre as três a que está mais atrasada em termos de formação de Conselhos Consultivos e de busca de parceiros, para a gestão de seus parques. O fator complicador para a SMAC é que ela gerencia um grande número de parques e outras unidades de conservação em toda a cidade, e dispõe de poucos recursos financeiros e, sobretudo, de pessoal. Por outro lado, como muitos dos parques são pequenos e têm boa visibilidade junto à população, existe uma maior possibilidade de eles serem objeto de parcerias com empresas ou ONGs locais. Os conceitos de gestão em mosaico ou de parceria com OSCIPs, previsto na Lei do SNUC e no Decreto 4340 de 2002, poderiam ser bastante interessantes para a SMAC, principalmente porque permitiriam uma melhor distribuição de seus recursos humanos limitados. Um ponto comum às três esferas é que o jogo de interesses políticos afeta, sobremaneira, os órgãos responsáveis pela gestão das unidades de conservação, tanto na 11

questão da disputa pelas verbas dos Fundos Ambientais quanto pelas prioridades de ação, que mudam de governo para governo, causando um sério problema de descontinuidade administrativa. V.2. O modelo conceitual Como resultado da análise dos oito parques apresenta-se a seguir (Figura 1) um modelo conceitual que busca representar a realidade que se vivenciou durante a pesquisa, com uma proposta de medição dos resultados da gestão à luz de critérios, indicadores e padrões de desenvolvimento sustentável. Tomando um determinado parque como ponto focal do modelo, pode-se identificar que os atores sociais normalmente envolvidos em tais tipos de projetos formam uma complexa rede de interação e cooperação entre si e com outras redes de atores sociais, mas sujeita ao conflito. Estes atores interagem com o gestor do parque, que por sua vez recebe de seu órgão central recursos humanos, financeiros e técnicos, capacitação, orientações, normas, procedimentos, recursos e estratégias, sendo também por ele controlado. Em contrapartida, o gestor passa a seu órgão central as reivindicações e sugestões dos diversos atores sociais envolvidos com o parque e propostas de parcerias que precisem ser aprovadas centralizadamente. O gestor e o órgão central relacionam-se com os atores por meio de vários instrumentos de gestão (Plano de Manejo, Conselho Consultivo, etc.) e outras estratégias colaborativas, bem ou mal exercidas. No entanto, o gestor é o primeiro e principal ponto de contato dos atores sociais com a gestão do parque. Ele é o representante oficial do parque junto à comunidade local, ONGs, empresas e outras instituições. O resultado dessa interação é um continuum de configurações tais que numa extremidade pode-se imaginar, no pior dos casos, o conflito entre a gestão do parque e os atores sociais e, de outro, uma ampla rede de atores sociais integrados ao parque e ajudando o gestor de forma plenamente colaborativa. Entre estes pontos extremos, podem ocorrer ações isoladas de um ator (em geral, ONGs ou empresas) ou diferentes parcerias entre dois ou mais atores sociais, que são montadas para projetos específicos ou em caráter mais permanente. Pode-se também imaginar um ponto de indiferença dos atores em relação ao parque. Considerando a gestão do parque em relação aos cinco objetivos propostos pelo SNUC, pode-se imaginar que quanto maior a participação dos atores sociais e maior a colaboração entre eles e o gestor do parque, maiores as chances de sucesso da implementação de projetos e da gestão em geral. Neste sentido, o modelo contempla a possibilidade de se avaliar o desempenho da gestão de diversas unidades de conservação ambiental baseadas em maior ou menor grau de colaboração, tentando capturar diferenças significativas entre os desempenhos de diferentes configurações estratégicas emergentes, fruto das complexas relações que se estabelecem quando estão em jogo diferentes interesses e necessidades, muitas vezes conflitantes. A tese central sobre a qual repousa tal modelo é de que somente através de uma gestão baseada em estratégias colaborativas, estruturadas dentro de uma rede social entre gestor e atores sociais, aliadas a efetivas estratégias competitivas (que visam divulgar o parque e torná-lo eficiente em termos de gestão e captação de recursos), pode-se chegar a resultados eficazes e permanentes para a gestão de unidades de conservação ambientais urbanas do tipo parque, tendo como critério de avaliação o desenvolvimento sustentável e baseado em um conjunto de indicadores de sustentabilidade definidos de modo democrático entre gestão e colaboradores. No entanto, com base nos fatores de sucesso de caráter competitivo identificados junto aos gestores e atores sociais, o modelo também contempla como importante fator que afeta o desempenho da gestão a formulação e implementação de estratégias competitivas, já que um parque concorre com com outros parques e serviços governamentais por recursos financeiros, humanos, técnicos e até pelos visitantes. Um importante aspecto do modelo é que ele pressupõe que não basta apenas a ação isolada de órgãos governamentais, locais ou de âmbito federal, como é comum ocorrer no 12

Brasil. A participação consciente e ativa da comunidade, de organizações não governamentais, de empresários e de outras organizações é fundamental para criar as sinergias que viabilizem a gestão do parque. Órgãos afins de outras esferas de governo Convênios, Informações, Gestão compartilhada Fontes nacionais e internacionais definanciamento Legislação SNUC / 4340 / outras leis, pressões políticas, decisões executivas Poder executivo e legislativo Critérios e indicadores de Sustentabilidade e padrões de comparação Órgãos diretos de Planejamento e Controle Estratégias Competitivas Estratégias Colaborativas centralizadas Leis, Normas, restrições, estratégias, controles Relatórios, Repasse das demandas, Solicitações, Propostas Gestor do Parque Continuum de Configurações da Interação Colaboração, Desinteresse Resultado da Gestão do Parque Rede informal de colaboração entre gestores Estratégias Colaborativas descentralizadas Grupos de interesse de atores sociais (ONGs. Empresas, comunidades, etc.) Demandas / Idéias / Pressões/ / Apoio/ Ameaças/ oferta de parcerias Outros fatores ambientais (lato sensu) Conflito Critérios e indicadores de Sustentabilidade e padrões de comparação Redes reais ou virtuais de outros atores sociais Redes reais ou virtuais de outros atores sociais Figura 1 Modelagem da Pesquisa com proposta de medição dos resultados da gestão. Quanto à medição da efetividade da gestão do parque pelo critério da sustentabilidade contemplada no modelo, serão necessárias a identificação e seleção dos indicadores (quantitativos e qualitativos) a serem usados para se comprovar as hipóteses formuladas. Neste sentido, persiste uma questão em aberto: como medir a efetividade das ações que busquem o desenvolvimento sustentável? A grande variedade de metodologias esbarra em questões, tais como, diferentes unidades de medida e de escala, em função da visão multidimensional e interdisciplinar do conceito. Diversos autores estrangeiros e nacionais têm se dedicado a tentar identificar a melhor maneira de se medir o grau de sustentabilidade de ações conservacionistas ou do desenvolvimento de determinada região, sem que, no entanto se chegue a um consenso sobre qual a melhor forma de fazê-lo. Há, no entanto, concordância a respeito da necessidade de se considerar indicadores relacionados aos resultados econômicos, sociais e ambientais na avaliação (Egler, 1999). Segundo Bellen (2004), indicadores devem ser entendidos como sistemas de apoio à decisão, sendo fundamentais na avaliação do desenvolvimento sustentável. Como os métodos atualmente em uso são pouco conhecidos, o que dificulta sua correta aplicação, Bellen (2004) realizou estudo de três ferramentas de avaliação que procuram medir a sustentabilidade do desenvolvimento: Ecological Footprint Method; Dashboard of Sustainability, Barometer of Sustainability. Para Bellen (2004), as três ferramentas estudadas possuem campos de aplicação específicos e lidam com dimensões distintas do desenvolvimento, possuindo vantagens e desvantagens. 13

Desse modo, é necessário definir-se claramente o escopo e objetivo de qualquer projeto de desenvolvimento sustentável, bem como as atividades econômicas que aí se desenvolverão, a fim de claramente desenvolver o sistema de indicadores mais apropriados, o que no caso de unidades de conservação, significa incluir no seu Plano de Manejo. A tarefa de elaborar um conjunto específico de indicadores que meçam de forma adequada os diversos objetivos previstos no SNUC. Entende-se então, que ainda existe espaço para a geração de um conjunto de indicadores mais apropriado, não apenas a um determinado tipo de projeto, como à gestão de um parque. Os trabalhos de Wondolleck eyaffee (1997) e Healey (1997), citados anteriormente, indicam que tal conjunto de indicadores pode e deve emergir da discussão entre os atores sociais envolvidos. V.2.1 Proposições do Modelo Algumas proposições são apresentadas a seguir no intuito de estimular futuras pesquisas com base em tal modelagem. 1.Quanto às interações entre gestores e atores sociais. - Quanto maior o número de atores sociais envolvidos na gestão do parque menor será o risco de conflito entre eles e a gestão. - Quanto maior o número de atores sociais envolvidos na gestão do parque maior será a dificuldade de operacionalizar a gestão. - Quanto maior o número de atores sociais envolvidos na gestão do parque maior será a chance de captar todas as questões do entorno do parque. 2.Quanto às parcerias formadas - Quanto maior o número de parceiros envolvidos em dado projeto do parque, menor será o nível de conflito de interesses. - Quanto maior o número de parceiros envolvidos em dado projeto do parque, maiores serão os riscos de conflitos operacionais, gerados por diferentes visões de como agir e pela dificuldade de interação. 3. Quanto aos resultados - Se dois ou mais parques aplicarem estratégias competitivas de forma equivalente, os parques que apresentarem uma configuração resultante da interação com a rede de atores sociais caracterizada como de alto nível de colaboração devem apresentar desempenho melhor que os que apresentarem uma configuração caracterizada como de baixo nível de colaboração ou então como de conflito. - No caso dos parques, estratégias colaborativas eficientes podem compensar apenas parcialmente a falta de estratégias competitivas adequadas. - A aplicação de estratégias colaborativas adequadas é condição necessária ao sucesso da gestão do parque, mas não suficiente. V.3 Conclusões Finais Ao final da pesquisa, pôde-se concluir que a gestão de unidades de conservação do tipo parque na cidade do Rio de Janeiro é complexa e árdua tarefa, impondo um desafio de grandes proporções às três esferas de governo, cada uma com suas especificidades, mas todas sendo afetadas pelos mesmos problemas sócio-econômicos e ambientais da cidade. Em face das dificuldades enfrentadas por cada governo na gestão dos seus respectivos parques, a proposta de parcerias entre diferentes esferas de governo pode ser uma alternativa interessante a ser buscada, se for possível superar as disputas políticas comuns entre elas. Por outro lado, a preocupação com a conservação dos recursos naturais nas cidades, integrada ao desenvolvimento econômico com justiça social é cada vez valorizada em nossa sociedade. Nas grandes e médias cidades do Brasil, esta questão é mais premente devido à crise urbana que vivenciamos. Nesse novo contexto, é imprescindível que os governantes dos centros urbanos ampliem as ações no sentido de resolver seus problemas específicos e caminhar em direção ao seu desenvolvimento sustentável, o que se dará por meio de adequado 14

planejamento urbano que integre as necessidades básicas das populações, as atividades econômicas e a conservação do meio ambiente, aí incluídas o ar e as águas, por meio de saneamento básico, despoluição de praias, rios, lagos, reservatórios e lagoas e conservação de áreas verdes. Neste sentido, as unidades de conservação podem desempenhar importante papel, não apenas como pulmão verde dos centros urbanos, mas como fonte de renda, lazer e maior participação e conscientização da sociedade sobre os problemas ambientais. A educação ambiental é uma estratégia fundamental para gestão dos parques. É por meio dela que a sociedade toma conhecimento da questão ambiental e da existência do parque, de seus problemas e desafios. E ao conhecer o parque ela pode mais facilmente ser mobilizada a ajudar ou, a pelo menos, não agredi-lo. É também opinião do autor que falta no Brasil uma visão clara sobre desempenho das unidades de conservação ambiental e a melhor maneira de planejá-los, implementa-los e gerilos de forma sustentável, integrando os esforços de todos os atores sociais interessados. Neste sentido, é fundamental identificar os fatores de sucesso ou fracasso na gestão destas unidades, bem como os indicadores que podem medir o desempenho da gestão. O modelo conceitual proposto busca preencher as lacunas existentes na pesquisa sobre estratégias colaborativas aplicadas à gestão ambiental sustentável. A pesquisa indicou que um amplo processo democrático, que permita o debate e a inclusão dos diferentes segmentos da sociedade na gestão das unidades de conservação, pode ser a resposta para superar estes empecilhos. VI- Referências Bibliográficas ACSELRAD, Henri. As práticas espaciais e o campo dos conflitos ambientais. In: Acselrad, Henri. Conflitos Ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará : Fundação Heinrich Boll, 2004 ARAÚJO, M., A., R., COELHO, R., M., P., Por que as Unidades de Conservação são precariamente geridas no Brasil? IV Congresso Brasileiro de Unidades de Conservação, Vol 1, 2004, pp. 55-61. BELLEN, Hans Michael van. Indicadores de Sustentabilidade: uma análise comparativa. Anais do XXVIII EnANPAD. Curitiba. 2004. BRASIL. Lei nº 9.985, de 18 de Julho de 2000. Regulamenta o artigo 225, 1º, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza e dá outras providências. Ministério do Meio Ambiente, Brasília. Disponível em <http://www.mma.gov.br/port/sbf/dap/doc/snuc.pdf>. Acesso em 15 de abril de 2006. COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO. Nosso Futuro Comum. Rio de Janeiro. FGV. 2ª. edição. 1991. COSTA, Heloisa S.M., BRAGA, Tânia M. Entre a conciliação e o conflito: dilemas para o planejamento e a gestão urbana e ambiental. In: Acselrad, Henri. Conflitos Ambientais no Brasil. Rio de Janeiro: Relume Dumará : Fundação Heinrich Boll, 2004 CRESWELL, John W. Research Design: Qualitative, Quantitative and Mixed Methods approaches. 2nd, edition. Sage Thousand Oaks: 2003 DE MIO, G. P. ;FERREIRA FILHO, E.;CAMPOS, J. R.. Abordagens alternativas na resolução de conflitos ambientais. In: Benjamin, A. H..(Org.). Fauna, Políticas Públicas e Instrumentos Legais. 1 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, v. 1, p. 373-395 EGLER, Ione. Perspectivas brasileiras de desenvolvimento sustentável. Seminário de Desenvolvimento Sustentável e Poder Local-Anais. UNICAP/AUSJAL. Recife. Nov. 1999. p.43-47. GRAY, Barbara,. Conditions facilitating interorganizational collaboration. Human Relations 38, 1985, :p. 912 15

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