1 ESTUDO OBSERVACIONAL CITO-HISTOPATOLÓGICO E DE PREVALÊNCIA DAS NEOPLASIAS EM CÃES E GATOS: 565 ANÁLISES (2014-2015) Fabio Navarro BALTAZAR 1 ; Alex Lafarti DE SENA 2 ; Aline Vaccaro TAKO 3 ; Carla Alice BERL 4 ; 1- Médico veterinário coordenador científico, Departamento de Infectologia, Hospital Veterinário Pet Care, São Paulo, SP. fabionavarro@petcare.com.br 2- Médico veterinário, Departamento de Oncologia, Hospital Veterinário Pet Care, São Paulo, SP. 3- Médica veterinária, Departamento de Anestesiologia, Hospital Veterinário Pet Care, São Paulo, SP. 4- Médica veterinária, Diretoria Clínica, Hospital Veterinário Pet Care, São Paulo, SP. Resumo O câncer ainda representa uma das principais causas de óbito em animais de companhia, e conhecimentos acerca de sua epidemiologia e biologia são necessários para direcionamento diagnóstico e terapêutico. O objetivo deste estudo foi descrever a prevalência neoplásica em cães e gatos, por meio da análise de 565 resultados histopatológicos obtidos entre 2014 e 2015, além de comparar tal metodologia à sensibilidade citopatológica. Obtivemos maior ocorrência de neoplasias malignas em cães, além de maior prevalência nas fêmeas com idade média de 10 anos. Os neoplasmas cutâneos foram os mais frequentes, nos quais foi possível 71% de sensibilidade no exame citopatológico. Os tumores mamários caninos apresentaram-se malignos em 46,15% dos casos, comparativamente a 60% na espécie felina. As neoplasias esplênicas malignas representaram 39,28%, e o sistema osteoarticular apresentou 100% de malignidade nas amostras analisadas. Palavras-chave: Neoplasmas, citologia, histopatologia. Keywords: Neoplasms, cytology, histopathology. Introdução Concomitantemente ao avanço da medicina veterinária no que diz respeito às tecnologias disponíveis para emprego na saúde animal, nas últimas décadas, a oncologia médico-veterinária vem ganhando destaque, especialmente em relação ao conhecimento epidemiológico e biológico das neoplasias que acometem cães e gatos, fato este intimamente relacionado ao aumento da incidência de câncer nestas espécies, possivelmente justificado pelo aumento da sobrevida dos animais como resultado de diversos fatores como dietas balanceadas, vacinação como profilaxia para doenças infecciosas, e métodos diagnósticos e terapêuticos altamente eficientes (BUTLER et al, 2012). ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0057
2 Conhecimentos acerca da epidemiologia dos neoplasmas são fundamentais, visto que já se mostra um consenso na oncologia médico-veterinária a predisposição de determinados grupos raciais a tipos específicos de câncer, como os sarcomas histiocíticos nos cães da raça Bernese, carcinomas dos sacos anais nos animais da raça Cocker Spaniel, hemangiossarcomas nos indivíduos pertencentes a raça Pastor Alemão, mastocitomas e melanomas nos Golden Retriever e braquicefálicos (BOERKAMP, 2014). O presente trabalho teve por objetivo descrever comparativamente as análises histopatológicas dos neoplasmas de cães e gatos atendidos entre 2014 e 2015, bem como a sensibilidade do exame citológico quando disponível, caracterizando assim a prevalência neoplásica nos diferentes sistemas entre as espécies canina e felina. Material e Métodos Foram extraídas informações relacionadas ao perfil (idade, sexo, raça, peso), além de resultados histopatológicos e citopatológicos (quando presentes), de todos os animais atendidos no Departamento de Clínica Médica do Hospital Veterinário Pet Care (unidade Morumbi) e submetidos a tais exames, entre 2014 e 2015. A coleta de material para análise citológica foi procedida por meio de punção com agulha fina (agulha 25x7 mm), e o exame histopatológico realizado com tecido coletado por biópsias incisionais e excisionais. Posteriormente, os resultados foram compilados de acordo com o sistema anatômico do qual foi originado (tegumentar, digestório, urinário, reprodutivo, osteoarticular, respiratório, anexos oculares), e alguns órgãos e estruturas descritos separadamente. Resultados e Discussão O estudo histopatológico compreendeu 565 análises, das quais 535 foram realizadas de indivíduos da espécie canina, e 30 da espécie felina, reunindo 352 neoplasias (340 caninas e 12 felinas), originadas de 304 animais (285 cães e 19 gatos). Dos cães, 206 foram obtidas de fêmeas (60,58%) e 134 de machos (39,41%), dentre malignos e benignos. A idade média do diagnóstico foi de 10 anos. Tais resultados corroboram De Nardi e colaboradores (2002), os quais encontraram prevalência neoplásica de 69,66% no sexo feminino e maior número de animais acometidos apresentando 10 anos. O estudo da totalidade neoplásica canina também demonstrou que os malignos sobrepujaram os benignos, com 184 (54,11%) ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0058
3 e 156 (45,88%), respectivamente, distribuídos em 38 raças: SRD (16,74%), Labrador (14,34%), Dachshund (6,69%), Poodle (16,69%), Golden Retriever (15,74%), Pastor Alemão (4,78%), Cocker Spaniel (14,78%), Boxer (4,30%), Schnauzer (3,34%), Rottweiller (2,87%), Beagle (2,39%), West Highland White Terrier (2,39%), Maltês (2,39%), Yorkshire Terrier (1,91%), Bulldog Inglês (1,91%), Sharpei (1,91%), Lhasa Apso (1,91%), Pit Bull (1,43%), Shih Tzu (1,43%), Pug (0,95%), Pinsher (0,95%), Pastor de Shetland (0,95%), Bulldog Francês (0,95%), Rhodesian Ridgeback (0,95%), Border Collie (0,95%), e as demais raças (Terrier Brasileiro, Bichón Frisé, Scottish Terrier, Akita, Springer Spaniel, Viszla, Mastiff, Pequinês, Bassethound, Bernese, Dobermann, Dogue Alemão e Husky Siberiano) com um indivíduo de cada (0,47%). Já em relação aos felinos, dos 30 exames histopatológicos realizados, 12 deles revelaram neoplasias (40%), de modo que o padrão de distribuição sexual se mostrou semelhante ao canino: 75% fêmeas e 25% machos. Apesar disso, o resultado em questão pode se mostrar subjetivo, uma vez que o número de felinos encontrado neste estudo se apresentou baixo. A idade média para o diagnóstico foi de 11 anos, e as neoplasias malignas foram encontradas com maior frequência (83,33%) comparativamente às benignas (16,67%). Tais felinos pertenceram às raças SRD (66,66%) e Persa (33,33%). Levando-se em conta ambas as espécies (352 neoplasias), a forma cutânea representou 57,10% (201 neoplasias), divididas em 105 malignas (52,23%) e 96 benignas (47,76%), pertencentes à apenas 2 felinos (1%) e 199 cães (99%). Dentre as malignas, destacaram-se os mastocitomas (48,57%), carcinomas (21,9%), fibrossarcomas (7,61%) e melanomas (4,76%). Dos benignos, foram encontrados com maior frequência os lipomas (28,12%), adenomas (16,66%), hemangiomas (14,58%) e epiteliomas (13,54%). Em 94 casos cutâneos, a citopatologia precedeu o exame histopatológico, tendo apresentado índice de concordância de 71,26%. Especialmente para os mastocitomas, a elucidação citológica previamente à confirmação histopatológica foi possível em 96,6% dos casos. Apesar disso, tais métodos diagnósticos são considerados complementares entre si, uma vez que a citologia pode fornecer informações preciosas e complementares ao exame histopatológico (CHALITA et al, 2002). As neoplasias do trato gastrointestinal corresponderam a 39 casos (11,07%) do total descrito (352), em 3 felinos e 36 cães, e maior prevalência para os seguintes ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0059
4 tecidos: gengival (38,46%), representados pelos épulis (53,33%); mucosa oral (20,51%), com destaque para os melanomas (50%); fígado (20,51%), com maior frequência de carcinomas (25%) e metástases de hemangiossarcoma e leiomiossarcoma (12,5% cada); e intestino delgado (12,82%), com maiores ocorrências para tumores gastrointestinais estromais (40%) e linfomas (40%). Interessantemente, dos 28 exames histopatológicos realizados de baço (3,12% do total), apenas 11 (39,28%) caracterizaram quadros neoplásicos, como hemangiossarcoma, sarcoma fibrohistiocítico, leiomiossarcoma, carcinoma metastático e leiomioma. Estes resultados nos remetem a maior frequência de malignidade, quando da ocorrência de doença neoplásica. Apesar disso, a prevalência de neoplasmas neste órgão se mostrou baixa, o que ressalta a importância da sugestão diagnóstica, por meio de citopatologia, histopatologia ou acompanhamento ultrassonográfico periódico, previamente à exérese do órgão em questão. Todas as análises do sistema urinário (5) não revelaram câncer, no período estudado. Em contrapartida, aquelas do trato respiratório (1,70% do total) demonstraram 100% de malignidade, uma vez que foram representadas por adenocarcinomas pulmonares e linfomas linfoplasmocíticos de cavidade nasal, resultados semelhantes aos descritos na literatura. (FOSSUM, 2005). Os neoplasmas do sistema reprodutivo (20,73% do total) distribuíram-se da seguinte forma: testículos (7 leydigomas, 4 seminomas, e 1 resultado com ambas as formas); vagina (1 fibroma, 1pólipo fibroepitelial e 1 sarcoma indiferenciado); útero (1 leiomioma); e glândula mamária (57), com 46,15% de prevalência de malignidade em cães e 60% nos felinos. A frequência de malignidade dos tumores malignos mamários, segundo a literatura, varia entre 35 e 50% para os cães, e aproximadamente 90% para os felinos. Mediante esta afirmativa, os resultados relacionados aos felinos encontrados neste trabalho podem estar subestimados pelo pequeno números de indivíduos encontrados (FOSSUM, 2005). As análises dos anexos oculares (2,55% do total) revelaram 55,55% de malignidade, estes representados exclusivamente pelos melanomas. O sistema osteoarticular evidenciou 3 neoplasias (0,85% do total), todas malignas (2 osteossarcomas e 1 condrossaroma), e as análises histopatológicas restantes, não relacionadas a órgãos ou sistemas, foram representadas por: 6 amostras de linfonodo, com 50% de malignidade (linfomas); 3 amostras de tireoide, com 100% de ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0060
5 malignidade (carcinomas); e 1 amostra de omento, tendo-se revelado hemangiossarcoma. Conclusão Os achados deste estudo se assemelham majoritariamente aos descritos por outros autores, como maior ocorrência neoplásica em animais da espécie canina, fêmeas e com idade aproximada de 10 anos, além da maior prevalência dos neoplasmas cutâneos sobre todos os tipos tumorais analisados. Concluímos também a menor prevalência de neoplasias malignas mamárias em cadelas, e a situação contrária na espécie felina, assim como a alta frequência de neoplasmas malignos em sistema respiratório, anexos oculares e sistema osteoarticular. Tais resultados atualizam os dados epidemiológicos e estatísticos relacionados à oncologia médico-veterinária. Referências bibliográficas BUTLER, L.M.; BONNETT, B.N.; PAGE, R.L. Epidemiology and the Evidence-Based Medicina Approach. In: WITHROW, S.J.; MACEWEN, E.G. Small Animal Clinical Oncology. Missouri: Elsevier Saunders, 2012, p. 68-82. BOERKAMP, K.M.; TESKE, E.; BOON, L.R.; GRINWIS, G.C.M.; BOSSCHE, L.V.D.; RUTTERMAN, G.R. Estimated incidence rate and distribution of tumours in 4.653 cases of archival submissions derived from the Dutch golden retriever population. BMC Veterinary Research, Londres, v. 10, n. 34, p. 1-10, 2014. DE NARDI, A,B.; RODASKI, S.; SOUSA, R.S.; COSTA, T.A.; MACEDO, T.R.; RODIGHERI, S.M.; RIOS, A.; PIEKARZ, C.H. Prevalence of neoplasias and kind of treatments in dogs seen at Veterinary Hospital of University of Paraná. Archives of Veterinary Science, Paraná, v. 7, n. 2, p. 15-26, 2002. CHALITA, M.C.C.; MATERA, J.M.; ALVES, M.T.S.; FILHO, A.L. Tumores em pele e partes moles de cães Estudo clínico e cito-histológico. Continuous Education Journal CRMV-SP. São Paulo, v. 5, n. 2, p. 171-180, 2002. FOSSUM, T.W. Cirurgias do Sistema Reprodutivo e Genital. In: Cirurgia de Pequenos Animais. São Paulo: Roca, 2005, p. 610-672. ANAIS 37ºANCLIVEPA p.0061