PARECER MÉDICO LEGAL SOBRE A TORTURA E MORTE DE RAUL AMARO NIN FERREIRA NOS ANOS DE CHUMBO DR. NELSON MASSINI RIO DE JANEIRO



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Transcrição:

PARECER MÉDICO LEGAL SOBRE A TORTURA E MORTE DE RAUL AMARO NIN FERREIRA NOS ANOS DE CHUMBO DR. NELSON MASSINI RIO DE JANEIRO AGOSTO DE 2014

PARECER MÉDICO LEGAL SOBRE A TORTURA E MORTE DE RAUL AMARO NIN FERREIRA NOS ANOS DE CHUMBO. I INTRODUÇÃO PARECERISTA: NELSON MASSINI, médico, CRM-52 61656-0, Professor Titular de Medicina Legal da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ e Ex-Professor Associado da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro- UFRJ e Perito Legista Aposentado da Secretaria de Segurança Publica do Distrito Federal. SOLICITANTES: - Os senhores Rodrigo Nin Ferreira e Miguel Nin Ferreira, irmãos de Raul Amaro; - Os senhores Raul Carvalho Nin Ferreira e Felipe Carvalho Nin Ferreira, sobrinhos, e o pesquisador Marcelo Zelic, do Armazém Memória, coautores de Relatório apresentado à Comissão Nacional e Estadual da Verdade com os resultados de pesquisa realizada em arquivos públicos sobre o caso, que contém diversos documentos novos; - A Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro.

OBJETIVO: O presente trabalho visa proceder a uma análise dos documentos médicos e outros, relacionados à tortura e morte de Raul Amaro Nin Ferreira durante a Ditadura Militar, a fim de determinar as circunstâncias em que os fatos ocorreram. II HISTÓRICO Raul nasceu em dois de junho de 1944, estudou engenharia mecânica na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, se formando no final de 1967. Na universidade, iniciou seu envolvimento com política, tendo participado de diversas atividades do movimento estudantil. No fim de 1970, começou a trabalhar no Ministério da Indústria e do Comércio. No dia 31 de julho 1971, Raul Amaro saiu com um colega de trabalho do Ministério da Indústria e Comércio, Saididin Denne, e sua esposa, Yone da Silva Denne. Na ida para o restaurante, em Copacabana, eles passaram por uma blitz de soldados do exército. Foram parados, identificados, e seguiram viagem. Na saída do restaurante, quando passaram por Laranjeiras, cerca de uma e meia da madrugada do dia primeiro de Agosto, outra blitz do exército os parou. Os três foram levados presos. Com Yone havia um croqui com um mapa que levava para a casa de Raul de Santa Teresa. Havia, ainda, com Raul três croquis com mapas de ruas de São Paulo, que levavam à casa da irmã de Raul. De acordo com os documentos policias, durante a revista constataram uma contradição entre o endereço de residência de Raul Amaro, que dizia morar na casa dos pais na Gávea, enquanto que com Yone havia sido encontrado um mapa que levava para a casa de Raul de Santa Teresa. Com a equipe do DOPS, Raul foi levado para sua casa da Rua Santa Cristina. Seus pais seguiram as viaturas, mas não puderam entrar na casa. Seu apartamento foi revistado pelos agentes na presença de Raul. Os agentes disseram ter encontrado alguns materiais considerados subversivos, dentre os quais um mimeógrafo, transmissores de rádio e alguns panfletos, os quais o DOPS afirmaria pertencer às organizações MR-8 (Movimento Revolucionário 8 de Outubro) e MURD (Movimento Universitário de Resistência à Ditadura). Cerca de 20:00 horas, a equipe do agente Mario Borges (DOPS) saiu da casa, levando Raul algemado. Perguntado pela mãe de Raul para onde ele estava sendo levado, Mário Borges teria dito que isso era assunto de competência do Exército Nacional. Ainda existe uma incerteza sobre os fatos que ocorreram imediatamente após as 20:00 horas, já que Raul é apresentado ao DOPS apenas às 01:30 do dia 20 de agosto. Pode ser que Raul tenha sido levado diretamente ao DOPS e 1

fichado horas depois, mas também é possível que neste momento ele tenha sido levado para um local desconhecido, onde passou por seu primeiro interrogatório 1. Raul passou a madrugada no DOPS, sendo transferido no dia seguinte para o DOI- CODI, na sede do I Batalhão de Polícia do Exército, na Rua Barão de Mesquita na Tijuca. Neste dia à tarde, a mãe de Raul, Mariana Lanari, esteve no DOI-CODI e falou com o Coronel Homem de Carvalho, sendo informada que seu filho não se encontrava no local. É também deste dia o registro de seu segundo interrogatório, de acordo com documentos encontrados no Arquivo Nacional 2. No dia seguinte, portanto no dia em que Raul havia sido encaminhado ao DOI-CODI, Mariana Lanari retornou e tentou novamente falar com o coronel e entregar roupas ao filho. Desta vez, porém, não foi atendida e os objetos que levava não foram recebidos. A justificativa era que Raul não figurava na lista de presos. Porém, Raul não só estava lá, como já fora interrogado e fortemente torturado. Relatos da tortura foram feitos pelo soldado Marco Aurélio Magalhães, que testemunhou a passagem de Raul Amaro pelo DOI-CODI em processo movido pela família 3 e comprovados com a condenação da união em decisão definitiva de 1994. A tortura teria começado cerca de 18:00 horas da tarde e seguido até o dia seguinte de madrugada, quando um médico que trabalhava no DOI-CODI (não se sabe se Ricardo Fayad ou Amílcar Lobo), viu o estado de Raul e disse que ou ele era levado às pressas para o Hospital Central do Exército (HCE), ou morreria ali mesmo devido aos ferimentos. Com base nos documentos revelados a partir da divulgação do Relatório Raul Amaro, apresentado em dezembro de 2013, novos documentos sobre o período em que Raul esteve internado no HCE tornaram-se públicos e foram utilizados neste parecer. Foi a partir desses documentos que novas suspeitas sobre as circunstâncias e fatos envolvendo a morte de Raul Amaro surgiram. A sua entrada no HCE ocorreu no dia 4 de agosto de 1971. Foi registrada na caderneta nº 6400 da 13ª Enfermaria e foi assinada pelo major-médico Wilson Boia 4. Já no dia 11 de agosto, por ordem do comandante do I Exército, Sylvio Frota, no qual são 1 REGISTRO DO PRIMEIRO INTERROGATÓRIO -1971_08_01-DOI-Declaracao_do_Investigado (1), (2), (3) (Arquivo Nacional. Fundo Serviço Nacional de Informações. ACE 41431/71.) Relatório Raul Amaro Nin Ferreira p.63. 2 REGISTRO DO SEGUNDO INTERROGATÓRIO - 1971_08_02-DOI_IEx- Declaracao_do_Interrogado (Arquivo Nacional, Fundo Serviços Nacional d e Informações - SNI, ACE 41431/71) Relatório Raul Amaro Nin Ferreira p.61 3 AÇÃO DECLARATÓRIA NO 241.0087/99, 9a Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro, fls. 216) Relatório Raul Amaro Nin Ferreira p.61. 4 ENTRADA NO HOSPITAL CENTRAL DO EXÉRCITO - caderneta nº 6400 da 13º Enfermaria. - 1971_08_04-Hospital_Central_do_Exercito-Entrada (1), (2) Relatório Raul Amaro Nin Ferreira p.71 2

apresentados o Comissário Eduardo Rodrigues e o escrivão Jeovah Silva que vão a este hospital, a fim de interrogarem o preso Raul Amaro Nin Ferreira 5. Sobre o dia 11 de agosto, o Relato de Mariana Lanari sobre a visita ao Hospital Central do Exército afirma que Raul "( ) parecia melhorar, quando dois dias antes de piorar, vomitou biles por dois dias. Na quarta feira dia 11, Raul que não podia andar, conforme informação do enfermeiro, foi levado por ele, amparado, ao banheiro pela manhã e, ao voltar começou uma tosse suspeita. ( ) ao entrarem pela manhã na enfermaria, ouviram um ruído de dispnéa e foram logo ver o Raul que disse ao enfermeiro: - Tireme desse horror, Pedro! - Foi levantada a cama e colocado oxigênio. Não houve, portanto assistência alguma à noite. 6 ". No dia 12 de agosto, o general José Antonio Nogueira Belham encaminhou dois documentos ao Comissário Eduardo Rodrigues conforme entendimentos havidos. O primeiro é um relatório do interrogatório ocorrido no dia 11 de agosto contendo um resumo de todas as declarações dadas por Raul. Neste relatório destaca-se o seguinte trecho, que aponta para a morte de Raul durante o interrogatório: "O marginado se declara aliado do MR-8; em nosso entender pelo material encontrado em seu poder e pelos laços que mantém com Eduardo Lessa Peixoto de Azevedo, Raul Amaro é militante da Organização com vida legal. Não houve tempo para inquiri-lo sobre todo o material encontrado em seu poder. 7 " O segundo é um registro de interrogatório sem precisão de data, ocorrido entre os dias 3 e 10 de agosto, o que aponta para a possibilidade de outro interrogatório ter ocorrido no HCE 8. É também no dia 12 de agosto, às 14 horas, que a mãe de Raul recebe um telefonema do diretor do HCE, informando sobre a morte de seu filho. No seu relato sobre a visita ao Hospital Central do Exército ela escreve: "(...) Tanto no dia da morte quanto no dia da visita, o Diretor do HCE, General Ruben, mostrou-se preocupado em fazer sentir que ele não tinha responsabilidade alguma pela morte, que procurara fazer o melhor, que apenas cumpria ordens ao receber internados sem nome e sem indicações do que ocorrera e disse várias vezes que toda a documentação fôra requisitada pelo Comando do 1º Exército, desculpando-se por não ter o que mostrar porque apenas cumpria ordens, 5 OFÍCIO Nº 360/DOI - 1971_08_11-Ministerio_do_Exercito-Oficio_nº_360-DOI Relatório Raul Amaro Nin Ferreira p.75 6 Relatório Raul Amaro Nin Ferreira p.72 7 1971_08_11-SNI-ARJ- Relatorio_de_Analise-DOI (5) - Arquivo Nacional. Fundo Serviço Nacional de Informações - SNI, ACE 4143171 / 1971_08_11-SNI-ARJ- (5) - Relatório Raul Amaro Nin Ferreira p.76 8 1971_08_11-SNI-ARJ-Relatorio_de_Analise-DOI (1) / 1971_08_11-SNI-ARJ-Realatorio_de_Analise- DOI (6) / 1971_08_11-SNI-ARJ-Realatorio_de_Analise-DOI (7) 3

etc." 9. A certidão de óbito de Raul Amaro aponta que o horário de sua morte foi às 15:50 10. Alguns dos documentos analisados neste parecer são de caráter médico legal, mas foram produzidos com o principal objetivo de comprovar que a morte de Raul foi consequência dos maus tratos sofridos enquanto estava sob a guarda do exército brasileiro e do DOPS do Rio de Janeiro. Foram elaboradas e apresentadas no âmbito do processo de reparação movido por Mariana Lanari, com a finalidade de responsabilizar a União pela morte de Raul, comprovando que as marcas de violência apontam para a tortura de Raul Amaro antes de sua morte. Neste parecer procura-se elucidar de que forma aconteceram as violências sofridas por Raul Amaro desde o momento de sua prisão até a sua morte, a partir do conjunto de documentos produzidos sobre o caso até o momento. III DESCRIÇÃO Na elaboração deste parecer foram analisados e anexados os seguintes documentos. Alguns foram trabalhados de forma mais pormenorizada, porém todos fizeram parte da pesquisa e terão comentários sobre a sua pertinência: 1 - Laudo Necroscópico do Serviço Médico Legal do Hospital Central do Exercito, expedido em 12/08/1971 e elaborado pelos Peritos: Guilherme Achilles de Faria Mello Capitão Médico e Rubens Pedro Macuco Janini, médico legista civil e auxiliado pelo escrivão Antônio da Costa Pereira de Brito e presente também o Dr. Luiz Perres Mourelle, Major Médico e Chefe do Serviço Médico Legal. 2 Fichas de entrada de Raul Amaro Nin Ferreira elaboradas pelo Serviço Medicam Legal, em 4/8/1971, e assinada pelo Oficial Wilson Boia, Major Médico. 3 Parecer Médico Legal, assinado pelo ex-professor Celso Cezar Papaleo, Titular de Medicina Forense da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. 4 Resposta aos quesitos, elaboradas pelo Professor Celso Cezar Papaleo em 07 de agosto de 1981. 5 Depoimento sobre a morte de Raul Amaro Nin Ferreira, dado pelo médico e amigo da família Dr. Alexandre Kalache. 9 Relatório Raul Amaro Nin Ferreira p.73 10 Relatório Raul Amaro Nin Ferreira p.77 4

6 Laudo Pericial elaborado pelo perito do Juízo Dr. Heitor Gomes Leite, tendo como assistente técnico o Dr. Rubens Pedro Macuco Janine e da autora o Dr. Celso Cezar Papaleo e juntado ao processo 24 10087 da autora Mariana Lanari Ferreira. 7 Carta do Dr. Manoel J. Ferreira à Dom Eugênio Salles em 16 de agosto de 1971. 8 Ofício de apresentação n 360/DOI do General BDA Bento José Bandeira de Mello, Chefe do EM/I Ex. ao Diretor do Hospital do Exercito. (complementar) 9 - Relatório Sumário da Seção de Análise do DOI/I Ex. resultado do ultimo interrogatório de Raul Amaro Nin Ferreira. 10 Depoimentos de Marco Aurélio Magalhães na Ação Declaratória nº 241.0087/99, 9a Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro e no jornal Folha de São Paulo, caderno Política, p. 6, 19 de setembro de 1986. 11 Ficha Individual DOPS (Chapa nº 12936) 12 Declaração do Investigado - 01/08/1971 13 Declaração do Interrogado - 02/08/1971 14 Relatório Sumário da Seção de Análise do DOI / I Ex 15 Relato de Mariana Lanari sobre visita ao Hospital Central do Exército IV DISCUSSÃO Antes de iniciar a análise técnica de cada lesão descrita pelos médicos legistas no Laudo Medico Legal expedido pelo Serviço de Medicina Legal do Hospital Central do Exército, temos que fazer algumas considerações sobre a ação dos instrumentos contundentes bem como os tipos de lesões resultantes. Foi selecionado o instrumento contundente, porque todas as testemunhas afirmam e é do conhecimento publico os métodos de tortura utilizados pelas forças de repressão durante a ditadura militar de 1964 onde o instrumento principal era o contundente. COMENTÁRIO TEÓRICO O perito relata ao longo do item descrição do laudo a presença de diversas manchas identificadas por cor e que para a perfeita compreensão do documento tornasse necessária à explicação da etiologia de tais lesões. Essas lesões são chamadas de equimoses e surgem pela ação de instrumento contundente, isto é, aqueles que possuem uma superfície e atingem o corpo humano com força de pressão ou pressão mais deslizamento. 5

As manchas equimáticas surgem porque, com a ação contundente sobre os vasos sanguíneos, eles se rompem e o sangue extravasa para fora dos vasos e se infiltra na malha do tecido no ponto atingido. Essas manchas tem um espectro de cores, denominação essa dada por Legrand du Saulle, às sucessivas alterações cromáticas por que passa uma equimose, da periferia da lesão ao centro, durante o processo de evolução do surgimento a restauração a normalidade. Os diferentes matizes apresentam-se em intervalos variáveis de tempo, de conformidade com as dimensões e localização da equimose, bem como segundo a idade e o grau de robustez da vítima. De um modo geral e aproximativamente, porque cada organismo reage diferentemente, a cronologia média e as tonalidades são as seguintes: Com relação à tabela acima queremos salientar que existem tabelas com descrição de cores com palavras diferentes para se descrever a mesma coisa. As mudanças de cor devem-se as alterações químicas por que passa a hemoglobina, a qual, liberada dos glóbulos vermelhos e infiltrada nos tecidos, transforma-se, sucessivamente, a partir do terceiro dia, em hemossiderina, hematoidina e hematina, que conferem, respectivamente, as colorações azuladas, esverdeada, e amarelada à equimose. 6

Com isso, podemos dizer a data em que as lesões foram produzidas e se o individuo apresentar manchas de variadas matizes podemos afirmar com certeza um processo de tortura que foi aplicado em momentos diferentes num determinado período avaliado. As equimoses são lesões típicas de instrumento contundente, além delas temos outras como: eritema traumático; o hematoma; a bossa sanguínea; o edema traumático; as feridas contusas; fraturas e luxações; as roturas viscerais. A classificação dos objetos ao nosso redor e que podem ser utilizados para violência e cuja ação se caracteriza como ação contundente é muito ampla porque, para ser enquadrado como tal, basta que o objeto tenha uma superfície e seja sólido. Qualquer sólido, por conseguinte, embora não constitua, especificamente, instrumento contundente, pode ser considerado como tal, desde que, impulsionado contra o corpo, nele haja causado uma contusão ou ferida contusa. Objetos existem, todavia, que por melhor se prestarem a esse uso, ou por estarem mais à mão, ou, ainda, por serem facilmente manejáveis, com maior frequência causam esses tipos de lesões. São, além dos órgãos naturais de defesa e de ataque (mãos, pés ou patas, cabeça, dentes, garras, chifres, etc.) os objetos com exclusiva finalidade agressiva (açoite, cassetete, palmatória, soqueira, etc.) e os que ocasionalmente suprem essa finalidade (pedra, um pedaço de madeira, uma barra de ferro, utensílios vários de uso domésticos ou profissionais, etc.). O calvário de Raul Amaro Nin teve inicio na madrugada do dia 1 de Agosto de 1971 e durou até o dia 11 de agosto de 1971 ou 12 de agosto de 1971 quando ocorreu sua morte no interior do Hospital Central do Exército, portanto aproximadamente 11 dias, período esse menor do que a cura de uma lesão equimótica que se dá depois do décimo segundo dia. Podemos então concluir com absoluta certeza que as lesões encontradas no cadáver de Raul Amaro, e descritas pelos legistas por cores, guardam uma relação fiel com o momento em que foram produzidas e também a sua localização e frequência com a aplicação de sofrimento físico, o que representa ter havido tortura. A seguir será feita a analise do conteúdo de cada documento que serviu de base para a elaboração do presente parecer, seguindo-se a ordem enumerada no capitulo descrição. 1 - Do Laudo Médico Legal emitido pelo Serviço de Medicina Legal do Hospital Central do Exercito, podemos extrair e discutir os seguintes eventos positivos encontrados no exame do cadáver de Raul Amaro: Do exame externo: 7

1 - No lábio inferior em sua metade esquerda pequena mancha azulada. ANÁLISE TÉCNICA: lesão acima descrita é citada como de cor azulada, portanto, com 4 a 6 dias de evolução, e por ação de instrumento contundente, e tendo sido produzida entre os dias 6 e 8 de Agosto. 2 - Manchas irregularmente ovalares, de tonalidades azuis esverdeadas, esparsas pela região esternal, região mamária esquerda, região peitoral direita e hipocôndrio direito. ANÁLISE TÉCNCA: Presença de múltiplas equimoses de cor azul esverdeada em regiões do tórax, indicando que quando morreu essa lesão tinha de 6 a 7 dias de evolução, portanto teriam sido provocadas entre os dias 4 e 6 de Agosto. 3 - Manchas azuis esverdeadas e algumas azuladas de forma irregularmente ovalares nas regiões epigástrica, umbilical, flanco esquerdo, flanco direito, região ínguino-abdominal esquerda e na região ínguino-abdominal direita. ANALISE TÉCNICA: O médico legista descreve múltiplas lesões no abdômen, provocadas em momentos diferentes, sendo algumas esverdeadas, portanto com 6 a 7 dias de evolução e outras azuladas com 4 a 6 dias de evolução, portanto podemos dizer que a lesões azuis- esverdeadas foram provocadas entre os dias 4 e 6 de Agosto e as azuladas entre os dias 6 e 8 de Agosto havendo nesse caso uma superposição de lesões. 4 - Ferida punctória com as características das que são feitas por agulhas de injeção, localizada na fossa ilíaca esquerda. ANÁLISE TÉCNICA: A paracentese abdominal ou punção peritoneal realiza-se para verificar a causa de ascite (acúmulo de líquido, nos espaços, entre os tecidos e órgãos do abdômen), determinada pelo exame físico ou radiografia, ou na avaliação de pacientes vítimas de trauma abdominal, analisando-se a composição química de uma amostra de líquido. Também se faz para verificar sangramento interno. A punção tem um fim de diagnostico e terapia. 5 - Manchas ovalares pequenas de tonalidade azul-esverdeada, localizada no terço médio da face posterior do antebraço esquerdo. ANÁLISE TECNICA: Essas equimoses provocadas no antebraço são denominadas de lesões de defesa, pois surgem num ato reflexo da vitima ao colocar o antebraço como anteparo de agressão. Veja a ilustração. O Professor Zacharias define assim essas lesões; lesão que resulta do gesto ou atitude de quem procura resguardar-se dos golpes desferidos contra sua pessoa. Pela descrição da cor azul-esverdeada ela ocorreu entre o 6º e 7º dias anteriores a sua morte, portanto nos dias 4 e 6 de Agosto. 8

6 - Mancha ovalar azul -esverdeada no dorso da mão esquerda a um nível da segunda articulação metacarpo-falangeana do quinto metacarpeano. ANALISE TÉCNICA: Trata-se também de lesão de defesa, sendo que no dorso das mãos e justamente com a anterior na face posterior dos antebraços, vem em resultado ao gesto instintivo de aparar o golpe dirigido contra o rosto ou o peito; aí são também comuns as feridas de qualquer tipo, além das equimoses. As lesões teriam sido provocadas entre o 6º e 7º dias anteriores a sua morte, portanto nos dias 4 e 6 de Agosto. 7 - Infiltrado hemorrágico sub-ungueal, vermelho escuro no quinto quirodáctilo esquerdo. ANÁLISE TÉCNICA: Essa lesão pode ser de origem traumática por instrumento contundente e não podemos descartar o uso de instrumento de tortura por eletricidade. 8 - A um nível da prega do cotovelo esquerdo, duas feridas punctórias com as características das que são feitas digo feridas por agulhas de injeção rodeadas de manchas azuladas. ANÁLISE TÉCNICA: Trata se de lesões produzidas por agulhas de injeção durante o tratamento e rodeado por manchas azuladas devido à hemorragia provocada durante sua aplicação. 9 - Na região deltoidiana esquerda percebe-se feridas punctórias com as características das que são produzidas por agulha de injeção. 9

ANÁLISE TÉCNICA: Trata-se de lesões por agulha de injeção feita durante o tratamento. 10 - Feridas punctórias com as características das que são produzidas por agulha de injeção localizadas na região deltoideana direita e na dobra do cotovelo direito. ANÁLISE TÉCNICA: Conforme já referido anteriormente trata-se de lesões de injeções durante o tratamento. 11 - Ferida cirúrgica transversal suturada com dois pontos com fio de algodão preto no bordo externo do punho direito. ANÁLISE TÉCNICA: Trata-se de flebotomia feita para o tratamento hospitalar. 12 - Manchas irregularmente ovaladas de tonalidade azul-esverdeada esparsa pela face posterior dos terços médio inferior do antebraço direito; ao nível do bordo interno do punho direito, no dorso da mão ao nível dos segundo, terceiro e quinto metacarpiano e da primeira falange dos terceiro e quarto quirodáctilos direitos. ANÁLISE TÉCNICA: São manchas inespecíficas que se distribuem por todo o antebraço e mão direita, podendo ser resultado de defesa, algemas, aplicação de outros tipos de tortura e que foram produzidas entre o 6º e 7º dias anteriores a sua morte, portanto entre os dias 4 e 6 de Agosto. 13 - Extensa mancha vermelha azulada que abrange as faces anterior e externa do terço superior da coxa esquerda. ANÁLISE TÉCNICA: Trata-se de uma equimose recente produzida entre um e dois dias antes da morte, resultado de ação contunde, ocorrida entre o dia 10 e 11 de agosto, portanto durante sua internação hospitalar. 14 - Mancha vermelha azulada irregular na face externa do terço médio da coxa esquerda. ANÁLISE TÉCNICA: Trata-se também de equimose recente produzida por ação de instrumento contundente, sendo que pela tonalidade vermelha azulada encontra-se no primeiro ou segundo dia de sua evolução, portanto, as lesões foram produzidas entre os dias 10 e 11 de agosto durante a internação no Hospital Central do Exército. 10

15 - Manchas azuladas na face anterior e externa do terço inferiores da coxa esquerda. ANÁLISE TÉCNICA: Trata-se de equimoses produzidas entre o quarto e o sexto dias anteriores a sua morte, portanto entre os dias 6 e 8 de agosto. 16 - Manchas violáceas -azuladas pela face posterior da coxa esquerda. ANÁLISE TÉCNICA: Trata-se de equimoses produzidas entre o terceiro e quarto dias anteriores a sua morte, portanto lesões recentes e produzidas durante a internação no Hospital Central do Exército entre os dias 8 e 9 de Agosto. 17 - Mancha azulada na face externa do joelho e face externa do terço superior da perna esquerda. ANÁLISE TÉCNICA: Trata-se de equimoses produzidas entre quatro e seis dias anteriores a sua morte, portanto entre os dias 6 e 8 de Agosto. 18 - Mancha de tonalidade azulada na face anterior dos terços médio da perna esquerda. ANÁLISE TÉCNICA: Trata-se de equimoses produzidas entre o quarto e sexto dia anteriores a sua morte, portanto entre os dias 6 e 8 de Agosto. 19 - Mancha de tonalidade azul esverdeada no terço inferior da perna esquerda. ANÁLISE TÉCNICA: Trata-se de equimose produzida entre o sexto e sétimo dia de sua morte, portanto nos dias 4 e 6 de Agosto. 20 - Mancha vermelha azulada pela face posterior da perna esquerda. ANÁLISE TÉCNICA: Equimose recente, produzidas no primeiro ou segundo dia de sua morte, portanto entre o dia 10 e 11 de agosto durante a internação o Hospital Central do Exército. 21 - Dorso do pé esquerdo percebe-se ferida punctoria com as características das que são feitas por agulha de injeção rodeada de mancha azulada em trajeto venoso. ANÁLISE TÉCNICA: Lesão por agulha de injeção feita durante o tratamento. 22 - Manchas azuladas e esparsas pela face externa dos terços superior, médio, inferior da coxa, na face ántero-interna dos terços médio e inferior da coxa direita e do joelho direito. ANÁLISE TÉCNICA: Equimoses produzidas a entre o quarto e sexto dia anteriores a sua morte, portanto entre os dias 6 e 8 de Agosto. 23 - Face externa do terço superior da perna direita mancha ovalada de tonalidade azul esverdeada na face anterior do terço médio da perna direita. ANÁLISE TÉCNICA: Equimose produzida no entre o sexto e sétimo dia anterior a sua morte, portanto entre os dias 4 e 6 de Agosto. 11

24 - Manchas azuladas pela face posterior da coxa, joelho e terços superior e médio da perna direita. ANÁLISE TÉCNICA: Equimose produzida no entre quatro e seis dias anteriores a sua morte, portanto entre os dias 6 e 8 de agosto. 25 - Ferida cirúrgica suturada com dois pontos de algodão preto, localizada na face ántero-interna do tornozelo direito, com as características das que são feitas na prática de flebotomia. ANÁLISE TÉCNICA: Flebotomia durante o tratamento hospitalar. 26 - O dorso do cadáver mostra pequenas manchas vermelho azuladas na parte externa da região lombar direita. ANÁLISE TÉCNICA: Equimoses recentes produzidas no primeiro e segundo dia anteriores a sua morte, portanto nos dias 10 e 11 de agosto durante a internação no Hospital Central do Exército. Do exame interno: Cavidade craniana: - 1 - A face profunda do couro cabeludo apresenta áreas de infiltração hemorrágica em sua parte média; ANÁLISE TÉCNICA: Infiltrado devido às lesões por ação de instrumento contundente na cabeça. 2 - Os músculos temporais têm cor parda avermelhada. ANÁLISE TÉCNICA: Infiltrado hemorrágico de tortura recente entre um e dois dias antes da morte, portanto dentro do Hospital Central do Exército. 3- O encéfalo mostra pequeno achatamento das circunvoluções com discreto apagamento dos sulcos e aos cortes mostra aumento de brilho das superfícies; ANALISE TÉCNICA: Evidencias de edema cerebral que tem ralação com trauma crânio devido à ação contundente sobre a cabeça. 4- Os ventrículos encefálicos tem líquido claro. ANÁLISE TÉCNICA: Edema cerebral. 5- Bulbo, cerebelo e protuberância com aumento de brilho aos cortes; ANÁLISE TÉCNICA: Edema cerebral. Cavidade tóraco abdominal. 6- Nota-se fratura das nona e décima costelas direitas sem infiltração hemorrágica; 12

ANÁLISE TÉCNICA: Fratura sem infiltração hemorrágico podendo ser de manobra de ressuscitação. 7- As cavidades pleurais contém discreta quantidade de líquido amarelado. ANÁLISE TÉCNICA: edema de pulmão. 8 - Os pulmões têm pleura lisa e brilhante, não revelam lesões, mostram petéquias subpleurais; ANÁLISE TÉCNICA: Edema de pulmão e sinais de sofrimento respiratório. 9 - As pleuras estão pesadas, com superfície de corte vermelho brilhante dando pela expressão saída a grande quantidade de líquido rosado arejado; ANÁLISE TÉCNICA: Edema de pulmão. 10 - A abertura dos ramos das artérias pulmonares não mostra êmbolos; ANÁLISE TÉCNICA: Negativa para embolia pulmonar. 11 - O saco pericárdico está integro; contém líquido amarelo citrino em quantidade normal. ANÁLISE TÉCNICA: indicativo de infarto do miocárdio. 12 - O pericárdio é brilhante; ANÁLISE TÉCNICA: sem anormalidades. 13 - O coração tem tamanho normal e a secção dos vasos da base dá saída, a sangue líquido e coagulado; 13

ANÁLISE TÉCNICA: sem anormalidades. 14 - Os cortes do coração revelam no miocárdio septo interventricular área de infiltrado hemorrágico vermelho esmaecido; ANÁLISE TÉCNICA: infarto do miocárdio. 15 - O endocárdio tem aspecto normal, as emergências da aorta e artéria pulmonar vão mostrar placas amarelas na íntima da aorta; ANÁLISE TÉCNICA: arteriosclerose. 16 - A abertura das auricoletas vem revelar a presença de trombos aderidos e pediculados no interior das mesmas coronárias tem placas de tonalidade amarela na superfície interna ANÁLISE TÉCNICA: indicativa de infarto do miocárdio. 17 - O fígado tem tamanho normal com duas pequenas zonas azul esverdeada no bordo anterior com parênquima íntegro a este nível, cortes do fígado não mostram alterações do parênquima; ANÁLISE TÉCNICA: lesão traumática do fígado por ação contundente. 18 - Percebe-se pequena infiltração hemorrágica no mesentério de tonalidade avermelhada, ANÁLISE TÉCNICA: ação traumática recente por instrumento contundente. 19 - No músculo ilíaco direito nota-se pequeno infiltrado hemorrágico, os órgãos do pescoço não mostram lesões violentas e percebe-se na luz da traqueia líquido claro arejado; ANÁLISE TÉCNICA: lesão traumática por ação contundente. O exame histopatológico de 19/08/1971 tem o seguinte resultado: 20 - Fígado esteatose hepática aguda com necrose e hemorragia centro-lobular. ANÁLISE TÉCNICA: lesão traumática por ação contundente. 21 - Encéfalo aumento dos sulcos perivasculares e pericelulares. ANÁLISE TÉCNICA: edema cerebral. 22 - Edema. Pulmão presença de material branco amorfo eosinófilo nos espaços alveolares e inúmeros macrófagos repletos de pigmento acastanhado (células cardíacas). ANÁLISE TÉCNICA: edema cerebral. 14

23 - Um dos cortes extensa área de hemorragia intraalveolar e edema com discreta exsudação leucocitária. ANÁLISE TÉCNICA: infarto agudo do miocárdio. 24 - Os septos alveolares apresentam grau variável de necrose. : - edema: infarto pulmonar recente. ANÁLISE TÉCNICA: edema pulmonar. 25 - Rim: apresenta na cortical pequena deformação de forma triangular com base na periferia onde há necrose maciça das estruturas tubulares e glomerulares com infiltração hemorrágica e leucocitária do interterstício. ANÁLISE TÉCNICA: lesão traumática. 26 - Infarto recente Um dos cortes do miocárdio revela extensa área onde há infiltração hemorrágica intersticial e as fibras miocárdicas tem contornos pouco precisos, sem citoplasma é homogêneo, eosinófilo, sem estriação longitudinal e os núcleos estão ausentes ou cariólise. ANÁLISE TÉCNICA: infarto do miocárdio. 27 - Infarto do miocárdio. ANÁLISE TÉCNICA: Apesar de algumas dúvidas não terem sido esclarecidas pelo laudo, pelos dados apresentados é possível se aceitar como causa da morte o infarto agudo do miocárdio. Respostas dos peritos aos quesitos da forma seguinte: 28 - Ao primeiro e ao segundo, Infarto do Miocárdio edema pulmonar Enfarto Pulmonar Edema Encefálico Estase Hepática aguda (Doença); ANÁLISE TÉCNICA: O primeiro quesito; Houve morte. E o segundo Qual o meio que ocasionou nesta resposta houve a indicação de infarto do miocárdio, o qual não é possível à contestação com os elementos anatomopatológicos indicados no laudo. 29 - Ao terceiro não ao quarto, como doença, sim; ANÁLISE TÉCNICA: O terceiro quesito pergunta se foi ocasionada por veneno, substancia anestésica ou asfixia. E o médico diz NÃO, tendo sido omitido desse quesito a palavra tortura. E ao quarto quesito que pergunta se a lesão observada por sua natureza e sede, foi causa eficiente da morte responde que sim e afirma como doença numa clara manipulação das respostas tendo em vista que tudo o que foi descrito indica a utilização de violência. 30 - Aos quinto, sexto, sétimo e oitavo, prejudicado. 15

ANÁLISE TÉCNICA: O quinto quesito diz se a constituição ou estado mórbido concorreram para tornar a lesão irremediavelmente mortal. O sexto: se a morte resultou das condições personalíssimas do ofendido. O sétimo: se a morte sobreveio não porque o golpe fosse mortal, mas por ter o ofendido deixado de observar o regime médico e higiênico reclamado pelo seu estado. O oitavo: se a morte foi ocasionada por imprudência, negligência ou imperícia na arte ou profissão do acusado. A todos esses quesitos a resposta foi prejudicado. 2 Fichas de entrada de Raul Amaro Nin Ferreira elaboradas pelo Serviço Medicam Legal, em 4/8/1971, e assinada pelo Oficial Wilson Boia, Major Médico. 1 - Mancha rosada no pavilhão auricular esquerdo. ANÁLISE TÉCNICA: Equimose recente produzida no dia anterior ou no próprio dia da internação entre três e quatro de Agosto. 2 - Manchas róseo-violáceas irregulares na região peitoral esquerda, epigástrica, flancos, região umbilical, braço, antebraço, terceiro, quarto e quinto quirodáctilos direitos. ANÁLISE TÉCNICA: Múltiplas equimoses produzidas entre um e dois dias da data da internação, portanto entre os dias 2 e 3 de agosto. 3 - Pequena tumefação no dorso da mão direita. ANÁLISE TÉCNICA: Edema traumático recente produzido entre os dias 2 e 3 de agosto. 4 - Áreas de manhas róseas violáceas esparsas nas coxas, dorso da mão direita. ANÁLISE TECNICA: Equimoses recentes produzidas entre o primeiro e segundo dia anteriores a internação, ou seja, entre os dias 2 e 3 de agosto. 5 - Áreas de manchas róseas violáceas esparsas nas coxas, joelhos, perna direita e regiões lombares. ANÁLISE TÉCNICA: Equimoses recentes produzidas por instrumento contundente que revelam terem sido produzidas um ou dois dias antes da internação, portanto entre os dias 2 e 3 de agosto. 6 - Movimentos dos quirodáctilos e punhos normais. ANÁLISE TÉCNICA: Sinal de movimento normal apesar de lesão contundente assinalada anteriormente. 7 - Movimentos do membro inferior direito com limitação pela dor. ANÁLISE TÉCNICA: Dor indicando trauma recente. 16

3 Parecer Médico Legal, assinado pelo ex-professor Celso Cezar Papaleo, Titular de Medicina Forense da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Trata-se de documento médico legal solicitado pelo advogado Sérgio Bermudes. Nele o professor Papaleo questiona o auto de necropsia, que, em sua opinião, contém informações relevantes sobre as lesões de Raul Amaro, mas silencia sobre aspectos importantes do trabalho pericial: Dão explicação à morte investigada, mas não se pronunciam satisfatoriamente. Houve enfarte comprova-se em vários órgãos, além de edema cerebral. Qual sua etiopatogenia, sua causalidade? Onde os dados clínicos que encaminhariam análise de hipóteses interpretativas, indispensáveis à discussão que possibilitasse total esclarecimento? Ainda uma indagação, que deveriam ter formulado e respondido, para melhor caracterizarem rigor pericial, nunca dispensável, mas, pelo contrário, da maior respeitabilidade: não podem traumatismos físicos e traumas emocionais desencadear tais situações orgânicas? Que houve com RAUL AMARO NIN FERREIRA em seus últimos dias ou derradeiras horas de vida? Por que a respeito emudeceu o hospital? Permanece de pé severa interrogação, que os peritos deveriam ter diligenciado em responder. Cabe, por consequência, admitir, em termos de contestação, que o auto de necrópsia não proporciona plena e rigorosa explicação médico-legal do caso que descreve, pois, em parte relevante, apenas registra fatos, sem, apesar da sua insofismável importância, lhes conferir mesmo elementar explicação pericial.. 4 Resposta aos quesitos, elaboradas pelo Professor Celso Cezar Papaleo em 07 de agosto de 1981. O professor Papaleo, no âmbito do processo de reparação movido por Mariana Lanari, também confirma a existência de marcas de violência que apontam para a tortura de Raul Amaro antes de sua morte. Certamente as profusas e numerosas equimoses, devidamente descritas, atestavam no cadáver a ocorrência, quando vivo o autopsiado, de agressões sérias praticadas com instrumentos contundentes. O número, a extensão e a disseminação das lesões todas elas comprovam que o autopsiado, quando vivo, sofreu violências particularmente graves. A diversidade cromática dessas equimoses constituía, com certeza, elemento de prova de sua produção em vida. 5 Depoimento sobre a morte de Raul Amaro Nin Ferreira, dado pelo médico e amigo da família Dr. Alexandre Kalache. O médico Alexandre Kalache, a pedido da família de Raul Amaro, foi uma das primeiras pessoas a ter acesso ao corpo, ainda na mesa onde havia sido realizada a autópsia no Hospital Central do Exército. Os comentários em seu depoimento questionam a morte por infarto do miocárdio de um adulto, principalmente considerando a inexistência de antecedentes pessoais. Afirma também que as equimoses e hematomas observados não poderiam ser explicados por um quadro de insuficiência coronariana aguda. Em sua opinião tais equimoses e hematomas estariam ligadas à morte de Raul, não por infarto do miocárdio, mas pelo desprendimento de um êmbolo que poderia ter levado a um processo trombo-embolítico profundo de localização nos membros inferiores. O desprendimento de um êmbolo assim formado poderia levar a 17

um episódio de embolia pulmonar desde que tal êmbolo fosse levado para corrente circulatória até os vasos pulmonares; embolia pulmonar é um processo agudo e frequentemente fatal. Trata-se de um depoimento que atesta que a morte de Raul Amaro é ligada aos maus-tratos sofridos no seu período de prisão, não podendo ser explicadas tão somente pela hipótese de infarto. 6 Laudo Pericial elaborado pelo perito do Juízo Dr. Heitor Gomes Leite, tendo como assistente técnico o Dr. Rubens Pedro Macuco Janine e da autora Mariana Lanari Ferreira juntado ao processo 24 10087 da autora. Trata-se de laudo pericial elaborado pelo Dr. Heitor Gomes Leite no âmbito do Processo 2410087, movido pela mãe de Raul, Mariana Lanari Ferreira, em face da União Federal. 7 Carta do Dr. Manoel J. Ferreira à Dom Eugênio Salles em 16 de agosto de 1971. O médico Dr. Manoel J. Ferreira, tio-avô de Raul Amaro, presente em parte da necropsia, enviou uma carta a Dom Eugênio Salles em 16 de agosto de 1971 na qual também confirma a existência de indícios de tortura, além de questionar a causa da morte de Raul. Afirma Completando o exame cadavérico foram constatadas extensas áreas de equimose, abrangendo a quase totalidade das faces internas e externas de ambas as coxas especialmente à esquerda em que a vasta equimose se apresentava como a de um hematoma. As pernas eram também abundantemente marcadas por múltiplas equimoses que pela sua extensão e múltiplas localizações não me deixaram a menor duvida de que tinham sido consequência de sevícias e pancadas propositadamente produzidas.. Ao questionar a causa mortis escreve que: não tenho duvida em concluir que a causa mortis foi decorrente de um edema agudo do pulmão, cuja causa determinante não tenho meios de concluir, e que o corpo foi submetido a violências cuja relação com o edema agudo não me é lícito estabelecer porque também não tive acesso à papeleta de tratamento e diagnóstico cujos elementos talvez pudessem prestar algum esclarecimento.. 8 Ofício de apresentação n 360/DOI do General BDA Bento José Bandeira de Mello, Chefe do EM/I Ex. ao Diretor do Hospital do Exercito. O documento tem data de 11 de agosto de 1971. Por ordem do comandante do I Exército, Sylvio Frota, o ofício é encaminhado ao diretor do HCE, no qual se apresenta o Comissário Eduardo Rodrigues e o escrivão Jeovah Silva que vão a este hospital, a fim de interrogarem o preso Raul Amaro Nin Ferreira. A utilização da violência pelos dois na condição de interrogadores de Raul justifica os hematomas e equimoses mais recentes observados no Laudo Médico Legal emitido pelo Serviço de Medicina Legal do Hospital Central do Exercito. 9- Relatório Sumário da Seção de Análise do DOI/I Ex. resultado do ultimo interrogatório de Raul Amaro Nin Ferreira. 18

A partir deste documento datado de 11 de agosto de 1971 confirma-se que o interrogatório do próprio dia 11 de fato aconteceu. A utilização da violência pelos interrogadores não só explica as lesões mais recentes no Laudo Médico Legal emitido pelo Serviço de Medicina Legal do Hospital Central do Exercito, mas a presença do texto Não houve tempo para inquiri-lo sobre todo o material encontrado em seu poder." Aponta para a piora na saúde de Raul que resultou na sua morte, entre os dias 11 e 12 de agosto de 1971. 10 Depoimentos de Marco Aurélio Magalhães na Ação Declaratória nº 241.0087/99, 9a Vara da Justiça Federal do Rio de Janeiro e no jornal Folha de São Paulo, caderno Política, p. 6, 19 de setembro de 1986. Raul Amaro foi visto no I Batalhão da PE, onde funcionava o DOI-CODI, pelo exsoldado Marco Aurélio Magalhães, no dia em que foi transferido ao hospital. Assistiu desde a sua condução para a cela até a sua agonia, de madrugada, e a sua remoção de ambulância para o HCE. No seu depoimento jornal Folha de São Paulo, afirma que O Raul apanhou basicamente de coturno. Levou muito chute, muita pancada., e que já não tinha mais condições de andar e estava enrolado numa manta. Chegou um oficial médico que eu já tentei desesperadamente puxar pela minha memória para me lembrar se foi o Lobo (Amílcar) ou o Fayad, mas não me recordo, e disse que ele tinha de ser levado para o HCE porque estava nas últimas, estava morrendo. São as lesões desse interrogatório sob tortura que podemos evidenciar na análise da Ficha de entrada de Raul Amaro Nin Ferreira elaboradas pelo Serviço Medico Legal, em 4/8/1971. 11 Ficha Individual DOPS (Chapa nº 12936) Documento da entrada de Raul Amaro no DOPS após prisão. 12 Declaração do Investigado, 01/08/1971 Registro do primeiro interrogatório de Raul Amaro. 13 Declaração interrogado 02/08 Registro do segundo interrogatório de Raul Amaro. 14 Relatório Sumário da Seção de Análise do DOI / I Ex Documento encaminhado pelo general José Antonio Nogueira Belham apresentando dois documentos: um relatório do interrogatório ocorrido no dia 11 de agosto e um registro de interrogatório sem precisão de data, provavelmente ocorrido entre os dias 3 e 10 de agosto. 15 Relatório - Mariana Lanari Ferreira Relatório sobre a visita ao Hospital Central do Exército ocorrida no dia 12 de agosto escrito pela mãe de Raul Amaro. 19

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V CONCLUSÕES 1 As lesões corporais encontradas no corpo de Raul Amaro Nin Ferreira são lesões, que classificadas pela coloração de acordo com espectro esquemático de Legrand Du Salle, se concentram em três momentos diferentes: A Entre o dia 2 de Agosto a partir das 18 horas até as primeiras horas do dia 4 de Agosto (DOI-CODI). B Entre os dias 6 e 8 de Agosto. Com a vítima internada no Hospital Central do Exército. C Entre os dias 10 e 11 de Agosto com o paciente internado no Hospital Central do Exército, tendo como consequência a morte de Raul Amaro Nin Ferreira. 2 Existe uma diferença de quantidade e tipos de lesões descritas entre o exame feito na admissão no Hospital Central do Exército e as descritas no exame cadavérico que são em maior número do que as que constam do exame admissional. 3 Podemos afirmar que parte das lesões foi produzida em datas relacionadas ao período de internação no Hospital Central do Exército. 4 - As lesões foram produzidas por instrumento contundente. 5 Por suas características como tipo, frequência e localização, são classificadas como oriundas de um processo de sofrimento físico (TORTURA). 6 Houve clara omissão nas conclusões do laudo cadavérico em relação à tortura e a não vinculação do trauma sofrido com o infarto do miocárdio. Nelson Massini PARECERISTA Médico - CRM-52 61656-0 Felipe Carvalho Nin Ferreira Colaborador Pedro Antonio Sarno Bomfim Colaborador 21