Coordenadoria da Infância e da Juventude



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Transcrição:

Coordenadoria da Infância e da Juventude (Parecer CIJ Nº 03/11) EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR COORDENADOR DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE ADOLESCENTE EM CONFLITO COM A LEI PRIVADO DE LIBERDADE NECESSIDADE DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL POR OCASIÃO DA SOLTURA COMPETÊNCIA PARA ACOLHIMENTO E EXPEDIÇÃO DE GUIA PROVIDÊNCIAS PARA A GARANTIA DO DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA EM INTERVENÇÃO PRECOCE ARTICULAÇÕES NECESSÁRIAS EM ÂMBITO ESTADUAL E MUNICIPAL - DIRETRIZES Trata-se de ofício encaminhado pelo Departamento de Execuções da Infância e da Juventude DEIJ solicitando manifestação desta Coordenadoria a respeito de conflito de competência entre aquele Departamento e a Vara da Infância e da Juventude do Foro Regional de Itaquera a respeito da emissão de guia de acolhimento de adolescente em cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto que, pela falta de respaldo familiar, deva ser acolhido. Vossa Excelência encaminhou-me referido ofício para parecer. Antes de adentrar o mérito da questão parecem oportunas duas ponderações. Primeiro, que a Coordenadoria da Infância e da Juventude tem atribuição para dar suporte aos magistrados, aos servidores e às equipes interprofissionais visando a melhoria da prestação jurisdicional, nos termos do art. 2º, inc. II, da Resolução 94 do Conselho Nacional de Justiça. Assim, este parecer, pautado pela discussão interna entre os magistrados especializados em infância e juventude e que compõem esta Coordenadoria, visa meramente orientar os demais juízes do Estado, não se prestando a solucionar divergências concretas de entendimento entre magistrados sobre competência para atividade eminentemente jurisdicional. Segundo, que a questão suscitada parece ter uma abrangência mais ampla que da capital. Assim, embora o DEIJ tenha invocado o Assento Regimental 165/90, que trata da distribuição de competência entre as varas especiais da infância e da juventude e as demais, este parecer procurará dar a abrangência geral que a questão suscitará ao Estado. Com efeito, em toda e qualquer comarca onde tramite processo de apuração de ato infracional supostamente cometido por adolescente que esteja internado provisoriamente ou um processo de execução de medida socioeducativa de internação pode ocorrer a situação trazida à discussão: no momento da liberação do adolescente depara-se com a falta de suporte familiar, colocando-se a necessidade de seu acolhimento. Se o caso ocorrer na capital, há a diferenciação de competência; se no interior, sendo diversa a cidade de residência do adolescente em relação àquela onde cometido o ato infracional ou onde esteja internado, o problema está posto do mesmo modo. Ora, nos termos do art. 147, 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente, nos casos de ato infracional, será competente a autoridade do lugar da ação ou omissão, observadas as regras de conexão, continência e prevenção. No que tange à execução, o Estatuto também é claro ao dispor que a execução das medidas poderá ser delegada à autoridade competente da residência dos pais ou responsável, ou do local onde sediar-se a entidade que abrigar a criança ou adolescente. (art. 147, 2º). Deste modo, a execução das medidas socioeducativas em meio aberto será processada sempre no juízo do local de residência dos pais e responsáveis pelo adolescente. No entanto, se privado de liberdade, a execução das medidas será de competência do juízo onde estabelecida a unidade de internação. Assim, tanto o juízo de conhecimento como de execução, uma vez decidida a liberação do adolescente, determinará seu encaminhamento aos pais ou responsáveis. Se estes residirem em outra comarca, a competência para processamento de qualquer providência de proteção será de outro juízo. Na eventualidade de não contar o(a) adolescente com suporte familiar, seu acolhimento familiar ou institucional pode ser necessário, não se justificando a manutenção da privação de liberdade por tal situação social. Coloca-se, aqui, a questão suscitada. Embora de família disfuncional, o acolhimento deve necessariamente ser feito no local de residência dos pais ou responsáveis.

Com efeito, o art. 88, inc. I, do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece como diretriz da política de atendimento a municipalização, visando, justamente, que seja possível uma ação articulada e em rede, tal como preceituado pelo art. 86 da mesma lei, para que se garanta a proteção integral e prioritária estatuída nos arts. 3º e 100, parágrafo único, inc. II, da lei infantojuvenil. Assim, a criança ou o(a) adolescente deve ser acolhido(a) em entidade de seu município para cumprimento dos princípios estatuídos na lei, de preservação dos vínculos familiares (art. 92, inc. I), participação na vida da comunidade local na qual inserida (art. 92, inc. VII), mas, sobretudo, para a promoção da responsabilidade parental (art. 100, parágrafo único, inc. IX). Tanto é assim que o art. 94, 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente impõe a observância para o acolhimento familiar ou institucional das regras previstas para entidades de internação de adolescentes em conflito com a lei, dentre as quais a do art. 124, inc. VI, que determina dever o adolescente permanecer em entidade situada na mesma localidade de seu domicílio ou na mais próxima. A própria PNAS- Política nacional de assistência social prevê a territorialização do atendimento como um elemento essencial de proteção. Por tal razão, equivocado seria supor que, estando o adolescente privado de liberdade em uma comarca, deva ser acolhido, por ocasião de sua soltura, nesta mesma localidade. É sabido que o número de crianças e adolescentes acolhidos é imensamente maior do que aqueles privados de liberdade, de modo que a exigência de cumprimento da regra prevista no art. 124, inc. VI, do Estatuto da Criança e do Adolescente deve ser feita com muito mais rigor para os serviços de acolhimento do que para as unidades de internação, cuja área de abrangência territorial será necessariamente maior. Se assim é, o juiz responsável pelo processo de apuração do ato infracional ou pelo de execução de medida socioeducativa poderá ser distinto daquele competente para a ação de acolhimento. Ora, a regra básica de competência, segundo o Estatuto, é definida pelo domicílio dos pais ou responsáveis (art. 147, inc. I) e é esta a regra que deve prevalecer em relação às ações de acolhimento, em respeito ao direito fundamental ao processamento e sentenciamento pelo juízo competente (art. 5º, LIII, da Constituição Federal). Isto se torna tanto mais evidente quando se tem presente que a ação de acolhimento tem caráter necessariamente contencioso, segundo o art. 101, 2º, do Estatuto, em respeito, aliás, ao direito fundamental ao contraditório e ampla defesa (art. 5º, LV, da CF). Ora, a guia de acolhimento é decorrência desta ação, uma vez determinado o acolhimento pela autoridade judiciária competente (art. 101, 3º, do Eca), seja em liminar ou em decisão final. Deste modo, torna-se clara uma diferenciação por matéria da competência do juiz da infância e da juventude, seja para apuração de atos infracionais, seja para a execução de medida socioeducativa, em relação àquele competente para processamento de infrações administrativas e aplicação de medidas protetivas, sendo inaceitável se pensar que o juiz da infância e da juventude teria uma competência difusa, independentemente da matéria a julgar. Isto é tanto mais evidente quando se tem presente que não tem o juiz competente pela apuração do ato infracional ou execução da medida socioeducativa poder para determinar o acolhimento, pois o art. 112, inc. VII, do Estatuto da Criança e do Adolescente, prevê a possibilidade de aplicação das medidas de proteção previstas no art. 101, inc. I a VI, e as de acolhimento estão previstas nos incisos VII e VIII. Feita esta diferenciação, parece-me oportuno avançar nas soluções passíveis de serem tomadas em semelhantes casos, até mesmo porque o acolhimento é medida excepcional, nos termos do art. 101, 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente e tanto o juiz competente para apuração do ato infracional como de execução de medida socioeducativa têm o dever de assegurar a proteção integral de todos os direitos de adolescentes que estejam sob seu julgamento (art. 3º do Estatuto), evitando a medida excepcional. Com efeito, é princípio que rege a aplicação de medidas de proteção a intervenção precoce (art. 100, parágrafo único, inc. VI, do Estatuto da Criança e do Adolescente), vale dizer, a intervenção das autoridades competentes deve ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida, evitando-se a incidência mais gravosa e limitadora de direitos do que seria de se esperar. No processo de apuração de ato infracional, a realização de estudo interdisciplinar é ditada pelo art. 186 do Estatuto. Identificando-se situação que enseje suporte familiar, deve a equipe interprofissional sugerir e o juiz competente, desde logo, tomar as providências cabíveis, oficiando-se tanto ao CREAS da cidade de residência do adolescente, como ao promotor de justiça da referida comarca para a tomada das providências cabíveis para asseguramento de direitos sociais ao adolescente. Igual procedimento deve ser adotado pelo juiz da execução de medida socioeducativa, que deve estar atento à estrutura e funcionalidade da família no curso da execução, e não apenas ao final, quando da liberação do adolescente. Tais providências,

tomadas precocemente, podem evitar o acolhimento do adolescente, seja em razão de um maior suporte familiar, seja pela mobilização da família extensa do adolescente (art. 25, parágrafo único, do Estatuto da Criança e do Adolescente), que pode ser sensibilizada e mobilizada a assumir sua guarda. Para tanto, far-se-á necessária a articulação e atuação em rede preconizada pelo art. 86 do Estatuto, que aplica-se igualmente ao Sistema de Justiça. Os profissionais que atuam na vara competente pela apuração do ato infracional ou execução de medida socioeducativa (juiz, promotor de justiça, equipe, cartório) devem dialogar com seus pares da vara competente pelas medidas de proteção. Mas não só. Trata-se de atribuição que deve ser exigida também da Fundação Casa, que necessariamente deve estar articulada com o CREAS do município de residência do adolescente. Com efeito, o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE) prevê como um de seus princípios a incompletude institucional, entendendo como tal a necessidade de articulação com as demais políticas para o atendimento integral do adolescente. Para tanto, ao prever como diretriz pedagógica do atendimento socioeducativo não apenas a participação do adolescente, mas também da família tanto da experiência socioeducativa, como da própria elaboração do plano individual de atendimento, pressupõe que os aspectos e dinâmicas familiares evidenciados na avaliação e planejamento de atividades estejam contemplados por uma rede de serviços de atendimento. De outro lado, a Resolução 109, de 11 de novembro de 2009, do Conselho Nacional de Assistência Social, prevê como serviço de proteção social especial de média complexidade o atendimento especializado a famílias e indivíduos (PAEFI), tendo como usuários, dentre outros, famílias e indivíduos que vivenciam violações de direitos por ocorrência de... afastamento do convívio familiar devido à aplicação de medida socioeducativa ou medida de proteção. Dentre os objetivos deste serviço está a contribuição para o fortalecimento da família no desempenho de sua função protetiva, devendo elaborar um plano de atendimento familiar e se articular com os serviços de outras políticas públicas setoriais e com os demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos. Assim, é fundamental que a Fundação Casa esteja em permanente contato com o CREAS- PAEFI do município de residência do adolescente desde a elaboração do plano individual de atendimento e durante todo o período de permanência do adolescente em entidade de privação de liberdade. Na execução da medida socioeducativa, havendo parecer por parte da Fundação Casa para a extinção da medida ou para a progressão a regime em meio aberto, o CREAS já deve ter sido informado pela própria Fundação Casa, inclusive para representação ao Ministério Público para ajuizamento da ação de acolhimento, se necessário. Tanto o juiz competente pela apuração do ato infracional (no caso de internação provisória), quanto o de execução de medida socioeducativa de internação e também o juízo competente pelas medidas de proteção devem tomar as providências cabíveis para que esta articulação entre CREAS e Fundação Casa ocorra efetivamente e, se necessário, oficiarem ao Ministério Público para a tomada de ações cabíveis. Deste modo, a verificação da necessidade de acolhimento por ocasião da soltura ou liberação do adolescente por parte do juiz competente pela apuração do ato infracional ou execução da medida socioeducativa deveria estar antecipada por um conjunto de ações tomadas por diversos atores do Sistema de Garantia de Direitos. A comunicação oficial ao promotor oficiante na vara competente para aplicação de medidas de proteção não deveria causar atabalhoamento de serviço nem surpresa, havendo o efetivo envolvimento dos atores responsáveis pela proteção social deste adolescente e sua família, assim como a articulação entre as diversas atores do Sistema de Justiça. Caso isto não ocorra, então a autoridade judiciária competente pela apuração do ato infracional ou execução da medida socioeducativa deve extrair as cópias necessárias especialmente dos estudos interdisciplinares da equipe interprofissional ou da Fundação Casa e, mediante prévio aviso, encaminhá-las, juntamente com o adolescente, ao promotor de justiça oficiante na vara competente para aplicação da medida de proteção. O promotor de justiça com atribuição para o caso analisaria a pertinência ou não do acolhimento ou a tomada de outra providência que o caso pudesse demandar, velando pelo respeito aos princípios da mínima intervenção (art. 100, parágrafo único, inc. VII, do Estatuto da Criança e do Adolescente). Poder-se-ia sustentar que, excepcionalmente, o juiz competente pela apuração do ato infracional ou execução da medida socioeducativa determine em caráter de urgência o acolhimento, encaminhando as peças imediatamente ao promotor de justiça oficiante na vara competente para ajuizamento da ação de acolhimento. Sob tal argumento, se o Conselho Tutelar pode em

hipóteses excepcionais, determinar este acolhimento (art. 101, 2º, do Eca), assim como em situações ainda mais excepcionais o próprio dirigente da entidade de acolhimento (art. 93 do Eca), nada impediria que aquele juiz, embora incompetente, determine o acolhimento. Todavia, entendo que, sendo cumprida a lei, com estudos tanto pela equipe interprofissional como pela Fundação Casa, e existindo a devida articulação, emergência não haveria razão para tal providência, até porque falta a hipótese legal autorizadora. Entendo difícil a superação da limitação legal à aplicação da medida de acolhimento como medida de proteção passível de aplicação pelo juiz do infracional ou da execução. Por isso, parece mais simples exigir a elaboração de um plano individual de atendimento adequado por parte da Fundação Casa. Todavia, se, a despeito das limitações legais, e sujeitando-se os juízes e promotores ao questionamento sobre a competência e validade do ato, houver a determinação de acolhimento pelo juiz competente pela apuração do ato infracional ou execução da medida socioeducativa, entendo que tal determinação será precária e, no primeiro dia útil seguinte, deverá o acolhimento ser comunicado ao promotor de justiça oficiante na vara competente para aplicação de medida de proteção. A este incumbirá o ajuizamento da ação de acolhimento, no foro do domicílio dos pais e responsáveis e, convalidado o acolhimento pelo juiz competente, então este determinará a expedição da guia de acolhimento, com as peças necessárias a serem encaminhadas ao serviço de acolhimento. Resumindo, parece-me ser o caso de tomada das seguintes providências preparatórias à garantia do direito à convivência familiar e comunitária de adolescentes em conflito com a lei, tanto pelo juízo competente para apuração do ato infracional como pelo juízo de execução de medida socioeducativa privativa de liberdade (internação e semiliberdade): 1. Sempre que adolescente supostamente autor de ato infracional for cientificado e apresentado em juízo, verificando-se que não está acompanhado de pai ou responsável, deve ser realizado estudo interdisciplinar, nos termos do art. 186 do ECA, avaliando-se especificamente as necessidades de suporte familiar, dentre outros aspectos. Constatada a falta de suporte, a equipe interprofissional do juízo deve sugerir e o juiz deve determinar a comunicação ao CREAS da cidade ou região na capital - de residência do adolescente para inserção da família no PAEFI, buscando-se o fortalecimento dos laços familiares ou a sensibilização e mobilização da família extensa para responsabilizar-se pelo adolescente, especialmente em caso de soltura; 2. Se imposta medida socioeducativa ao adolescente autor de ato infracional, constatada a fragilidade dos laços familiares, deve o magistrado impor cumulativamente ao adolescente, ainda que a medida socioeducativa seja privativa de liberdade, a medida de proteção de inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança ou adolescente (art. 101, inc. IV, c.c. art. 112, inc. VII, ambos do ECA), oficiando-se ao CREAS do município de residência dos pais e responsáveis para atendimento pelo PAEFI. Cumulativamente, deve oficiar ao Conselho Tutelar do município de residência dos pais e responsáveis para que procedam a aplicação a estes da medida de encaminhamento a programa oficial ou comunitário de proteção à família (art. 129, inc. I, do ECA), incluindo-os no PAEFI, sob pena de cometimento da infração administrativa prevista no art. 249 do ECA. Caso não se tenha comunicado o promotor de justiça oficiante naquela comarca, deve-se também, por cautela, expedir-se ofício com as cópias necessárias para a tomada de providências cabíveis; 3. Por ocasião da elaboração do plano individual de atendimento pela entidade de atendimento socioeducativo, especialmente pela Fundação Casa, deve ser avaliada a funcionalidade protetiva da família e sua capacidade de responsabilizarse pelo adolescente por ocasião de sua soltura. A própria Fundação Casa deve articular-se com o CREAS do município de residência dos pais e responsáveis para sua inclusão no PAEFI, comunicando o promotor de justiça daquele município se houver omissão por parte da Prefeitura local. 4. O juiz competente pelo processo de execução da medida socioeducativa deve avaliar o plano individual de atendimento, verificando a estrutura e funcionalidade protetiva da família e as providências tomadas pela Fundação Casa para garantia do direito à convivência familiar e comunitária do adolescente. 5. O PAEFI deve elaborar plano de atendimento familiar visando superação das fragilidades constatadas ou a sensibilização e mobilização da família extensa para assumir a função protetiva do(a) adolescente. 6. O Conselho Tutelar do município de residência dos pais e responsáveis devem acompanhar o atendimento recebido pela família, representando ao MP em caso de inexistência, insuficiência, inadequação do serviço ou representar à autoridade judiciária dessa mesma comarca, caso os pais não adiram aos atendimentos, em razão de cometimento da infração administrativa prevista no art. 249 do ECA, processando-os segundo o rito do art. 194 da mesma lei; 7. Avaliado pela Fundação Casa, de forma articulada com o CREAS PAEFI, a inviabilidade de retorno do adolescente ao convívio familiar e a necessidade de seu acolhimento por ocasião de sua soltura seja pela extinção da medida socioeducativa de internação ou semiliberdade seja pela progressão à liberdade assistida ambos os serviços devem comunicar o promotor de justiça oficiante na comarca de residência dos pais ou responsáveis sobre a necessidade de acolhimento do adolescente e sua iminente soltura, encaminhando-se cópias dos estudos realizados. 8. Determinada a extinção da medida socioeducativa de internação ou semiliberdade ou a progressão para liberdade assistida pelo juiz da execução e, constatando a inexistência de suporte familiar e a recomendação de acolhimento familiar ou institucional do adolescente, deve a autoridade judiciária verificar as providências que já foram tomadas pela promotoria de justiça

oficiante no juízo competente. Havendo determinação judicial de acolhimento, o adolescente deve ser encaminhado pelo juízo da execução ao seu responsável institucional, nos termos do art. 101, inc. I, do ECA. 9. Caso estas providências não tenham sido tomadas, uma vez determinada a soltura do adolescente, deve o juiz do processo de apuração do ato infracional ou da execução de medida socioeducativa privativa de liberdade encaminhar as peças necessárias, bem como o adolescente, ao promotor de justiça oficiante na comarca ou região da capital de residência dos pais ou responsáveis para ajuizamento da ação de acolhimento, velando pela prévia comunicação a tais profissionais, para que a ação seja efetiva. 10. O juízo do local de residência da família, uma vez determinado o acolhimento, deve expedir a guia de acolhimento e avaliar o plano individual de atendimento específico à garantia do direito à convivência familiar e comunitária, que será elaborado pelo serviço de acolhimento. 11. A entidade de execução de medida socioeducativa em meio aberto deve elaborar o plano individual de atendimento atinente à medida socioeducativa em questão de forma articulada com o plano elaborado pelo serviço de acolhimento. Considerando a complexidade da questão, parece oportuno indicar algumas providências que esta Coordenadoria da Infância e da Juventude já vêm tomando e que dialogam com as necessidades apresentadas na provocação apresentada pelo DEIJ. Com efeito, a Coordenadoria já provocou a SEADS Secretaria de Estado da Assistência e Desenvolvimento Social para a elaboração de um modelo ou de parâmetros de plano de atendimento familiar pelo CREAS-PAEFI, contando com participação, no grupo de trabalho, de profissionais do TJSP. Em razão da participação da Coordenadoria na elaboração do plano estadual de promoção, defesa e garantia do direito de crianças e adolescentes à convivência familiar e comunitária e na discussão sobre a estruturação dos CREAS, sempre junto à SEADS, a Coordenadoria já havia trazido à tona a necessidade de articulação dos CREAS com a Fundação Casa, seja para atendimento dos casos em apreço, seja, mais ainda, para a preparação da inserção do adolescente em meio aberto, pelo próprio serviço de execução de medida socioeducativa de liberdade assistida ou prestação de serviços à comunidade. Outras providências parecem necessárias. Entendo, com efeito, que a Coordenadoria deve participar mais ativamente da discussão sobre o alcance que vem sendo dado ao plano individual de atendimento pelas entidades de atendimento socioeducativo, bem como repensar a atuação da justiça na aprovação das medidas previstas. Uma ação mais próxima à Fundação Casa e à SEADS parece fundamental neste contexto. Mais ainda, verifica-se que a então Fundação Estadual do Bem Estar do Menor FEBEM-SP elaborou, em 2005, portanto anteriormente ao SINASE, um plano estadual de aplicação das medidas socioeducativas. Desde então, não apenas houve a edição do SINASE, como uma enorme municipalização do atendimento socioeducativo em meio aberto, além da transferência de responsabilidade pela supervisão das medidas em meio aberto para a SEADS e as DRADS, desde a edição da PNAS e a estruturação do SUAS Sistema único de assistência social. Salvo melhor juízo, não se reelaborou um plano estadual de atendimento socioeducativo, ou ao menos a Coordenadoria não tem sido chamada para sua implementação. Assim, seria de todo conveniente uma melhor articulação com a Fundação Casa e SEADS para aprimoramento deste planejamento, fomentando que, em âmbito local, também ocorra a elaboração dos planos municipais de atendimento socioeducativo, como preconizado pelo SINASE, com envolvimento das varas da infância e da juventude do Estado. À vista disto, tomo a liberdade de sugerir a Vossa Excelência, caso este parecer seja aprovado, que: 1. Seja registrado e autuado este expediente na classe adolescentes em conflito com a lei, subclasse convivência familiar e comunitária ; 2. seja este parecer publicado no Diário Oficial e encaminhado, por correio eletrônico, a todos os magistrados e equipes interprofissionais do Estado; 3. seja este parecer enviado ao Centro de Apoio Operacional do Ministério Público, ao Núcleo da Infância e da Juventude da Defensoria Pública e à Comissão da Criança e do Adolescente da OAB-SP; 4. seja este parecer encaminhado por ofício à SEADS e à Fundação Casa, solicitando sua divulgação às Secretarias Municipais de Assistência Social e às entidades de atendimento socioeducativo, tanto em meio aberto como fechado, no Estado; 5. a realização de reunião com a SEADS e Fundação Casa para avaliar como está sendo feito a articulação entre assistência social e atendimento socioeducativo, a estrutura dos planos individuais de atendimento socioeducativo em relação ao modo como contemplam a família e sua articulação com o plano de atendimento familiar a ser elaborado pelo PAEFI, bem como para se repensar a atuação da Justiça na avaliação deste plano e sua articulação institucional entre os vários juízes competentes para garantia de direitos de adolescentes em conflito com a lei. Tal reunião também deveria avançar na discussão sobre o plano estadual de atendimento socioeducativo e a inserção da Coordenadoria da Infância e da Juventude do TJSP neste campo.

SUB CENSURA. São Paulo, 4 de janeiro de 2011. Eduardo Rezende Melo Juiz da Coordenadoria da Infância e da Juventude Renata Bittencourt Couto da Costa Juíza da Coordenadoria da Infância e da Juventude DECISÃO: Aprovo o parecer. São Paulo, 6 de janeiro de 2011. (a) Desembargador ANTONIO CARLOS MALHEIROS, COORDENADOR DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO