ASPECTOS TRIDIMENSIONAIS DA SENTENÇA EM LIBRAS

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Página 145 de 658 ASPECTOS TRIDIMENSIONAIS DA SENTENÇA EM LIBRAS Adriana Stella Cardoso Lessa-de-Oliveira * (UESB) RESUMO Demonstramos, neste trabalho, que o aspecto tridimensional das línguas de sinais está presente não apenas na articulação dos sinais, mas também na articulação de frases. Verificamos que, assim como ocorre com as línguas orais (ou oroauditivas), a modalidade escrita de línguas de sinais (ou gestovisuais), ainda inexistente, deverá apresentar estrutura própria. Nessa modalidade não há possibilidade de serem representados processos miméticos comuns à modalidade falada de línguas de sinais, tais como simultaneidade ou aglutinação de raiz verbal e argumentos, variação ocasional na articulação do sinal entre outros. PALAVRAS-CHAVE: Escrita SEL; Frase; Libras; Tridimensionalidade. INTRODUÇÃO O presente estudo investiga um aspecto específico da libra, a tridimensionalidade, o qual diferencia a modalidade falada da modalidade escrita, principalmente quando esta se utiliza de sistemas lineares, como a escrita SEL (Sistema de Escrita de Libras). 32 Esta investigação objetiva demonstrar que, assim como ocorre com as línguas oroauditivas, as línguas gestovisuais apresentam características específicas da modalidade falada que não podem ou não precisam ser representadas na modalidade escrita. A análise, aqui feita, de características articulatórias e sintáticas de amostras de libras falada evidencia o aspecto tridimensional dessa língua não só em nível de composição de sinais, mas também no nível sintático. * Professora Adjunta do Departamento de Estudos Linguísticos e Literários da UESB. 32 Sistema de escrita para línguas de sinais, desenvolvido por Lessa-de-Oliveira, em projeto de pesquisa, financiado pelo CNPq (Processo: 483450/2009-0) e pela FAPESB (Termo de Outorga: PPP 0080/2010), realizado na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, entre 2009 e 2012. Ver Lessa-de- Oliveira (2012).

Página 146 de 658 Assim, considerando que um sistema de escrita eficiente precisa atender ao critério da automatização do processamento no ato da leitura e da escrita, este estudo assume que tal sistema precisa ser necessariamente linear, tanto na representação do sinal quanto na representação de sentenças e do texto. Dessa forma, utilizando a escrita SEL, demonstramos a possibilidade de representar os sinais da libras de forma linear e a necessidade de elaborar a modalidade escrita da libras também numa dimensão linear, apesar de a modalidade falada dessa língua apresentar elementos tridimensionais. Em conclusão, este estudo verifica que a modalidade escrita da libras deve apresentar estrutura própria, assim como ocorre com as línguas oroauditivas, sendo a estrutura linear a mais adequada para atender à automatização do processamento. MATERIAL E MÉTODOS Realizamos este estudo através de amostras de libras na modalidade falada, recolhidas de fábulas narradas por surdos falantes dessa língua, gravadas em vídeo. Apresentamos os dados através de figuras, que são imagens retiradas dos vídeos onde estão gravadas as fábulas, e transcritos em escrita SEL. A transcrição no que chamamos de escrita direta, isto é, escrita da própria língua (a libras) assegura a possibilidade de reconstituição do dado, da forma como ele foi articulado. Além da escrita direta, utilizamos também glosas e interpretação, para facilitar a compreensão dos dados em português. Nas notações de dados neste trabalho, (me) indica mão esquerda e (md) mão direita; palavras ligadas por um traço subscrito correspondem a movimentos realizados pela mesma mão em um sinal; a linha contínua sobrescrita marca o sinal ou mão (de base) que permanece durante a realização de outros sinais; a linha tracejada sobrescrita marca os sinais que foram produzidos conjuntamente com o sinal mantido pela mão de base; e Loc. (Localizador) 33 representa um elemento dêitico utilizado nas línguas de sinais para indicar referentes reais ou imaginários. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os recursos da tridimensionalidade são tão fortemente empregados em línguas de sinais que, mais que os argumentos, também adjuntos e mais de uma raiz verbal podem se aglutinar no 33 Ver Prado e Lessa-de-Oliveira (2012).

Página 147 de 658 mesmo sinal. Vejamos um exemplo disso. No momento inicial da narrativa da fábula A lebre e a tartaruga, SI1 (surdo falante de libras) fixa dois pontos no espaço, estabelecendo que o ponto a sua esquerda representa a lebre e o ponto a sua direita representa a tartaruga. Em trecho adiante, com a mão direita configurada em zê, 34 apontando para frente, braço estendido, e a mão esquerda também configurada em zê apontando para frente, mas posicionada atrás da direita, SI1 aproxima a mão esquerda da direita até quase alcançá-la, com expressão facial de muito esforço, mas, antes de ser ultrapassada, a mão direita avança um pouco à frente da outra; SI1 indica o ponto no espaço marcado para tartaruga e faz o sinal VENCER com a mão direita. Nossa transcrição em glosa deste enunciado em libras são as sentenças (1) e (2) abaixo. ----------------------------------------------------- (1) LEBRE(me)_APROXIMAR_QUASE_ALCANÇAR TARTARUGA(md). A lebre, que se aproximava da tartaruga, quase a alcançou. (2) TARTARUGA(md) VENCER(md). A tartaruga venceu. Em (1), um único sinal aglutinou: os verbos aproximar e alcançar; os argumentos externo e interno desses verbos, que são os mesmos, respectivamente a lebre e a tartaruga, (representados pelas mãos esquerda e direita); e ainda o adjunto quase. 35 A identificação dos argumentos externo e interno estabelece-se quando o interlocutor marca no espaço físico pontos (Localizadores) que serão utilizados durante toda a narrativa para se referir à lebre e à tartaruga, através de olhares, giros de corpo, apontação ou utilização diretamente das mãos, sem perder de vista a referência do lado esquerdo à lebre e o do lado direito à tartaruga. Quanto às duas raízes verbais, que têm sinais muito semelhantes em libras, as identificamos pela forma como o movimento foi realizado por SI1. Primeiro ele avança a mão direita (Figura [a], abaixo), depois aproxima a esquerda da direita (Figuras [b] e [c]), com as pontas dos dedos equiparando-se por um instante (Figura [d]), acabando por avançar a mão direita pouco à frente da outra (Figura [e]), na hora em que a realização deste sinal se encerra. 34 Os nomes das configurações de mão mencionados neste trabalho seguem a tabela de Lessa-de- Oliveira (2012). 35 Explica Chomsky (1986) que o componente sintagmático da estrutura de línguas naturais pode ser visto como uma espécie de projeção das propriedades lexicais. Os argumentos são selecionados a partir das propriedades lexicais do núcleo.

Página 148 de 658 [d] [a] [b] [c] [e] Figuras: Movimentos realizados por SI1 na execução do exemplo (1) De acordo com Lira e Felipe (2008), no verbo aproximar a mão principal, configurada em zê, em movimento retilíneo, se aproxima da mão de base, também configurada em zê, sem se equiparar com esta, diferentemente do verbo alcançar, que, além de apresentar um movimento semicircular em vez de retilíneo, equipara as duas mãos ao final. Ou seja, o que SI1 realiza é a mistura das duas raízes. E a aglutinação do adjunto quase pode ser verificada no fato de os dedos ficarem equiparados, só por um instante (Figura [d]), e na associação disto a uma expressão facial de esforço e a um contorno especial nesse movimento em que os dedos tremem ligeiramente quando se equiparam. Em línguas oroauditivas, observa-se que a fala se articula num contínuo, em que não se percebe acusticamente nem a divisão entre os fonemas nem entre as palavras, mas distinguimos essas unidades no processamento. Já na escrita existe a necessidade de segmentação clara dessas unidades. Em língua de sinais, também observamos um contínuo na articulação da fala, mas nessas línguas esse fenômeno se torna mais complexo devido aos processos miméticos. Da mesma forma que não é possível decodificar a sequência oroauditiva contínua em (3b) não conseguiríamos decodificar um tipo de escrita de língua de sinais que procurasse reproduzir o contínuo da modalidade falada na escrita, como tentamos fazer em (3a). (3) a. b. Alebrequeseaproximavadatartarugaquaseaalcançoumasatartaguravence u. Dessa forma, a escrita de frases em línguas de sinais precisará apresentar-se com unidades lexicais claramente segmentadas, escritas por grafia padronizada e organizadas de forma linear. Será necessária também a presença de alguns elementos conectivos e outros anafóricos, que possam construir a referência a partir apenas dos elementos presentes no enunciado escrito. Tudo isso se definirá a partir do uso de

Página 149 de 658 uma escrita pelos falantes de libras, mas podemos supor que a escrita das frases pode ser como o exemplo a seguir. (4) LEBRE APROXIMAR QUASE ALCANÇAR TARTARUGA MAS TARTARUGA VENCER A lebre, que se aproximava da tartaruga, quase a alcançou, mas a tartaruga venceu. CONCLUSÕES Portanto, verificamos neste estudo que a tridimensionalidade não é uma característica restrita à constituição dos sinais; esta ocorre também no nível das frases, o que resulta em processos de simultaneidade e incorporação de argumentos à raiz verbal e na utilização de processos miméticos que produzem variação na composição do sinal e da estrutura sintática. Essas variações, que são peculiares à modalidade falada de línguas de sinais, não são compatíveis com a modalidade escrita. REFERÊNCIAS Chomsky, noam. Knowledge of language: its nature, origin and use. New york: praeger, 1986. LESSA-DE-OLIVEIRA, ADRIANA. LIBRAS ESCRITA: O DESAFIO DE REPRESENTAR UMA LÍNGUA TRIDIMENSIONAL POR UM SISTEMA DE ESCRITA LINEAR, REVEL - LÍNGUAS DE SINAIS: CENÁRIO DE PRÁTICAS E FUNDAMENTOS TEÓRICOS SOBRE A LINGUAGEM, V. 10, N. 19, 2012. Prado, lizandra; lessa-de-oliveira, adriana. Dêixis em elementos constitutivos da modalidade falada de línguas de sinais, revel -

Página 150 de 658 línguas de sinais: cenário de práticas e fundamentos teóricos sobre a linguagem, v. 10, n. 19, 2012. Lira, guilherme; felipe, tanya. Dicionário da língua brasileira de sinais. Versão 2.1. Rio de janeiro: ines, 2008. (disponível em: www.acessobrasil.org.br)