Número do 1.0145.13.036938-5/001 Númeração 0369385- Relator: Relator do Acordão: Data do Julgamento: Data da Publicação: Des.(a) Márcia De Paoli Balbino Des.(a) Márcia De Paoli Balbino 24/04/2014 09/05/2014 EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E CIVIL- APELAÇÃO- AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER- VALOR DEPOSITADO EM CONTA BANCÁRIA EM FAVOR DE PESSOA FALECIDA- LEVANTAMENTO PELO INVENTARIAMENTE- INEXIGÊNCIA DE ALVARÁ JUDICIAL- ESCRITURA PÚBLICA DE INVENTÁRIO E PARTILHA DE BENS- NECESSIDADE E SUFICIÊNCIA- DOCUMENTO NÃO APRESENTADO- LIBERAÇÃO DO VALOR- IMPOSSIBILIDADE- RECURSO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. -Após a Lei 11.441/97, que alterou o CPC para permitir que o inventário e respectiva partilha sejam feitos na via extrajudicial, em Cartório de Notas, não é necessária a exigência de alvará judicial para o levantamento de valor depositado em instituição financeira em favor do de cujus, embora seja exigida a escritura pública de inventário e partilha do saldo para tanto. -No caso, ausente a prova da apresentação da escritura pública de inventário e partilha, não era mesmo de ser deferido o pedido do inventariante, de levantamento do valor. -Recurso conhecido e provido em parte. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0145.13.036938-5/001 - COMARCA DE JUIZ DE FORA - APELANTE(S): ESPOLIO DE HIRAM LOPES RODRIGUES ESPÓLIO DE, REPDO P/ INVTE HIRAM LOPES RODRIGUES JÚNIOR - APELADO(A)(S): BANCO DO BRASIL S/A A C Ó R D Ã O 1
Vistos etc., acorda, em Turma, a 17ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em PROVER EM PARTE A APELAÇÃO. DESA. MÁRCIA DE PAOLI BALBINO RELATORA. DESA. MÁRCIA DE PAOLI BALBINO (RELATORA) V O T O Espólio de Hiram Lopes Rodrigues, por meio de seu inventariante, ajuizou ação de obrigação de fazer contra Banco do Brasil S/A. Alegou que o inventariante, regulamente nomeado na forma da Lei 11.441/2007 - que alterou o CPC -, tentou receber a importância depositada junto à ré em nome do falecido, de R$19.236,70, e que foi exigido um alvará judicial para tanto. Relatou que a atitude da ré viola a Lei 11.441/2007. Informou que o valor depositado servirá para custear as despesas do inventário e pagamento de dívidas do falecido, anteriores ao óbito, inclusive de IPTU. Pediu a concessão de liminar para que a ré seja compelida a entregar, de imediato, o valor depositado em nome do falecido Hiram. Ao final, requereu a confirmação da liminar. Juntou documentos. A ré contestou (f. 16/19), arguindo a preliminar de falta de interesse de agir, ao argumento de que não prestou serviço com defeito nem vício, apenas fez a exigência legalmente prevista. No mérito, pugnou pela improcedência do pedido inicial, sob o argumento de que o levantamento do dinheiro depositado em conta bancária, em favor do falecido, somente pode ser feito por meio de alvará judicial pedido perante o Juiz de Direito, independentemente de o inventário ter sido feito na via extrajudicial ou na via judicial. O autor apresentou réplica, impugnando os termos de defesa da ré (f. 23/25). 2
Não foram produzidas provas outras, além das documentais apresentadas pelas partes no curso da lide. Na sentença (f. 26/30), o MM. Juiz rejeitou a preliminar de falta de interesse de agir, arguida em contestação, e, após reconhecer que o alvará judicial ainda é devido em casos que tais, julgou improcedente o pedido inicial. Constou do dispositivo da sentença (f. 30): "Isto posto, a presente é, pois, para julgar improcedentes os pedidos; fica extinta a fase processual nos termos do art. 269, I do CPC. Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e em honorários de advogado da ré, os quais fixo em R$1.200,00, nos termos do art. 20 4º do CPC, valor este que deverá ser corrigido monetariamente a partir da publicação desta, segundo a tabela do TJMG, com a incidência de juros legais, após o trânsito em julgado. [...]" O autor apelou (f. 31/39), pretendendo a reforma da sentença. Para tanto, insistiu na tese de que a atual legislação não exige a expedição de alvará judicial para levantamento de valores depositados em nome do de cujus. Alternativamente, pediu a redução dos honorários advocatícios sucumbenciais. A ré contrarrazoou (f. 42/45), pugnando pelo não provimento do apelo do autor, sob o argumento da legalidade de sua exigência. É o relatório. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE: Conheço do recurso porque próprio, tempestivo e por ter 3
contado com preparo regular (f. 40). PRELIMINAR: MÉRITO: Não foram argüidas preliminares no presente recurso. O Espólio autor apelou da sentença pela qual foi julgado improcedente seu pedido de condenação da ré a liberar o valor depositado em nome do falecido Hiram Lopes Rodrigues, sem exigência de alvará judicial. O argumento do apelante é o de que o inventário foi feito extrajudicialmente, na forma Lei 11.441/2007, que alterou o CPC, razão pela qual entende ser desnecessário o alvará judicial. O Espólio autor/apelante ajuizou ação de obrigação de fazer contra a instituição financeira ré/apelada, pretendendo a liberação de valor depositado em favor do de cujus, sem a exigência de alvará judicial. Pois bem. No caso, tenho que realmente a exigência de alvará judicial para levantamento de valor depositado em nome de pessoa falecida não é exigido, tal como afirma o Espólio apelante. Contudo, o pedido inicial era mesmo de ser julgado improcedente, por motivo outro, que passo a expor. O documento de f. 12 comprova a existência de valor depositado em nome de Hiram Lopes Rodrigues junto a instituição financeira ré/apelada. A certidão de f. 10 confirma o óbito de Hiram Lopes Rodrigues. A escritura pública declaratória de f. 11 demonstra que os 4
herdeiros de Hiram Lopes Rodrigues nomearam inventariante nos termos previstos na Lei 11.441/2007, que alterou o CPC, elegendo o RCPN e Serviço Notarial de Torreões, no município e comarca de Juiz de Fora/MG, para lavrar a escritura pública de inventário e partilha de bens deixados pelo falecido Hiram. Os artigos 982, 983 e 1.031 do CPC foram alterados pela Lei 11.441/2007 e pela Lei 11.925/2008, passando a dispor o seguinte: "Art. 982. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário. 1º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. 2º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei." "Art. 983. O processo de inventário e partilha deve ser aberto dentro de 60 (sessenta) dias a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subseqüentes, podendo o juiz prorrogar tais prazos, de ofício ou a requerimento de parte." "Art. 1.031. A partilha amigável, celebrada entre partes capazes, nos termos do art. 2.015 da Lei 10.406, de 10.01.2002 - Código Civil, será homologada de plano pelo juiz, mediante a prova da quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, com observância dos arts. 1.032 a 1.035 desta Lei." 1o O disposto neste artigo aplica-se, também, ao pedido de adjudicação, quando houver herdeiro único. 2o Transitada em julgado a sentença de homologação de partilha ou 5
adjudicação, o respectivo formal, bem como os alvarás referentes aos bens por ele abrangidos, só serão expedidos e entregues às partes após a comprovação, verificada pela Fazenda Pública, do pagamento de todos os tributos." A partir da alteração do CPC, portanto, os herdeiros do falecido passaram a ter a faculdade de realizar o inventário na via extrajudicial. Sobre o tema lecionam Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero, na obra Código de Processo Civil Comentado Artigo por Artigo, São Paulo;RT, 2008, p. 876: "Atendidos os requisitos legais (arts. 982, CPC e 2.15 CC), pode-se realizar o inventário extrajudicial mediante partilha amigável. Todas as partes devem ser capazes e concordes. O inventário extrajudicial. O inventário extrajudicial realiza-se por escritura pública, a qual consistirá em título hábil para o registro civil, para o registro imobiliário, para a transferência de bens e direitos, bem como para a promoção de todos os atos necessários à materialização e notícia das transferências de bens e levantamento de valores (art. 3º da Resolução 35 de 2007 do CN)." (grifei) Através da Resolução 35, de 24.04.2007, o CNJ disciplinou a aplicação da Lei 11.441/07 pelos serviços notariais e de registro. "A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições constitucionais e regimentais, e tendo em vista o disposto no art. 19, I, do Regimento Interno deste Conselho, e CONSIDERANDO que a aplicação da Lei nº 11.441/2007 tem gerado muitas divergências; CONSIDERANDO que a finalidade da referida lei foi tornar mais ágeis e menos onerosos os atos a que se refere e, ao mesmo tempo, 6
descongestionar o Poder Judiciário; CONSIDERANDO a necessidade de adoção de medidas uniformes quanto à aplicação da Lei nº 11.441/2007 em todo o território nacional, com vistas a prevenir e evitar conflitos; CONSIDERANDO as sugestões apresentadas pelos Corregedores-Gerais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal em reunião promovida pela Corregedoria Nacional de Justiça; CONSIDERANDO que, sobre o tema, foram ouvidos o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação dos Notários e Registradores do Brasil; RESOLVE: Seção I - DISPOSIÇÕES DE CARÁTER GERAL Art. 1º Para a lavratura dos atos notariais de que trata a Lei 11.441/07, é livre a escolha do tabelião de notas, não se aplicando as regras de competência do Código de Processo Civil. Art. 2 É facultada aos interessados a opção pela via judicial ou extrajudicial; podendo ser solicitada, a qualquer momento, a suspensão, pelo prazo de 30 dias, ou a desistência da via judicial, para promoção da via extrajudicial. Art. 3º As escrituras públicas de inventário e partilha, separação e divórcio consensuais não dependem de homologação judicial e são títulos hábeis para o registro civil e o registro imobiliário, para a transferência de bens e direitos, bem como para promoção de todos os atos necessários à materialização das transferências de bens e levantamento de valores (DETRAN, Junta Comercial, Registro Civil de Pessoas Jurídicas, instituições financeiras, companhias telefônicas, etc.) [...]" 7
"Seção II - DISPOSIÇÕES REFERENTES AO INVENTÁRIO E À PARTILHA Art 11. É obrigatória a nomeação de interessado, na escritura pública de inventário e partilha, para representar o espólio, com poderes de inventariante, no cumprimento de obrigações ativas ou passivas pendentes, sem necessidade de seguir a ordem prevista no art. 990 do CPC. Art. 12. Admitem-se inventário e partilha extrajudiciais com viúvo(a) ou herdeiro(s) capazes, inclusive por emancipação, representado(s) por procuração formalizada por instrumento público com poderes especiais. Art. 13. A escritura pública pode ser retificada desde que haja o consentimento de todos os interessados. Os erros materiais poderão ser corrigidos, de ofício ou mediante requerimento de qualquer das partes, ou de seu procurador, por averbação à margem do ato notarial ou, não havendo espaço, por escrituração própria lançada no livro das escrituras públicas e anotação remissiva. Art. 14. Para as verbas previstas na Lei 6.858/60, é também admissível a escritura pública de inventário e partilha. Art. 15. O recolhimento dos tributos incidentes deve anteceder a lavratura da escritura. Art. 16. É possível a promoção de inventário extrajudicial por cessionário de direitos hereditários, mesmo na hipótese de cessão de parte do acervo, desde que todos os herdeiros estejam presentes e concordes. Art. 17. Os cônjuges dos herdeiros deverão comparecer ao ato de lavratura da escritura pública de inventário e partilha quando houver renúncia ou algum tipo de partilha que importe em transmissão, exceto se o casamento se der sob o regime da separação absoluta. 8
Art. 18. O(A) companheiro(a) que tenha direito à sucessão é parte, observada a necessidade de ação judicial se o autor da herança não deixar outro sucessor ou não houver consenso de todos os herdeiros, inclusive quanto ao reconhecimento da união estável. Art. 19. A meação de companheiro(a) pode ser reconhecida na escritura pública, desde que todos os herdeiros e interessados na herança, absolutamente capazes, estejam de acordo. Art. 20. As partes e respectivos cônjuges devem estar, na escritura, nomeados e qualificados (nacionalidade; profissão; idade; estado civil; regime de bens; data do casamento; pacto antenupcial e seu registro imobiliário, se houver; número do documento de identidade; número de inscrição no CPF/MF; domicílio e residência). Art. 21. A escritura pública de inventário e partilha conterá a qualificação completa do autor da herança; o regime de bens do casamento; pacto antenupcial e seu registro imobiliário, se houver; dia e lugar em que faleceu o autor da herança; data da expedição da certidão de óbito; livro, folha, número do termo e unidade de serviço em que consta o registro do óbito; e a menção ou declaração dos herdeiros de que o autor da herança não deixou testamento e outros herdeiros, sob as penas da lei. Art. 22. Na lavratura da escritura deverão ser apresentados os seguintes documentos: a) certidão de óbito do autor da herança; b) documento de identidade oficial e CPF das partes e do autor da herança; c) certidão comprobatória do vínculo de parentesco dos herdeiros; d) certidão de casamento do cônjuge sobrevivente e dos herdeiros casados e pacto antenupcial, se houver; e) certidão de propriedade de bens imóveis e direitos a eles relativos; f) documentos necessários à comprovação da titularidade dos bens móveis e direitos, se houver; g) certidão negativa de tributos; e h) Certificado de Cadastro de Imóvel Rural - CCIR, se houver imóvel rural a ser partilhado. Art. 23. Os documentos apresentados no ato da lavratura da escritura 9
devem ser originais ou em cópias autenticadas, salvo os de identidade das partes, que sempre serão originais. Art. 24. A escritura pública deverá fazer menção aos documentos apresentados. Art. 25. É admissível a sobrepartilha por escritura pública, ainda que referente a inventário e partilha judiciais já findos, mesmo que o herdeiro, hoje maior e capaz, fosse menor ou incapaz ao tempo do óbito ou do processo judicial. Art. 26. Havendo um só herdeiro, maior e capaz, com direito à totalidade da herança, não haverá partilha, lavrando-se a escritura de inventário e adjudicação dos bens. Art. 27. A existência de credores do espólio não impedirá a realização do inventário e partilha, ou adjudicação, por escritura pública. Art. 28. É admissível inventário negativo por escritura pública. Art. 29. É vedada a lavratura de escritura pública de inventário e partilha referente a bens localizados no exterior. Art. 30. Aplica-se a Lei n.º 11.441/07 aos casos de óbitos ocorridos antes de sua vigência. Art. 31. A escritura pública de inventário e partilha pode ser lavrada a qualquer tempo, cabendo ao tabelião fiscalizar o recolhimento de eventual multa, conforme previsão em legislação tributária estadual e distrital específicas. Art. 32. O tabelião poderá se negar a lavrar a escritura de inventário ou partilha se houver fundados indícios de fraude ou em caso de dúvidas sobre a declaração de vontade de algum dos herdeiros, fundamentando a recusa por escrito." (grifei) Pelo que consta das normas supra transcritas, o inventário 10
extrajudicial por escritura pública tem como intuito desburocratizar e desafogar o Judiciário, tornando assim menos oneroso e mais rápido o procedimento, sendo título hábil para o registro imobiliário e levantamento de valores. No caso, não há prova de que o Espólio apelante tenha apresentado à apelada a escritura pública de inventário e partilha, no momento em que pleiteou o levantamento dos valores depositados em nome do falecido Hiram, exibindo somente a declaração de nomeação de inventariante e de eleição da via extrajudicial para a lavratura da escritura de inventário e partilha. Assim, embora realmente não seja necessário o alvará judicial para tanto, a escritura pública de inventário e partilha era documento essencial para liberação dos valores. Basta, portanto, que o inventariante apresente traslado da escritura pública de inventário e partilha para que a instituição financeira ré libere o saldo depositado em nome do de cujus, desde que na escritura o referido saldo também tenha sido objeto da partilha e que tenham sido recolhidos os tributos, tal como previsto no art. 1.031 do CCB e art. 15 da Resolução 35/2007 do CNJ. No caso, contudo, não consta que foi lavrada a escritura pública de inventário e partilha ou de adjudicação do saldo depositado junto à apelada, para o que se exige prévio recolhimento de ITCD junto à Secretaria da Fazenda Pública Estadual. Logo, ausente a prova da exibição da escritura pública de inventário e partilha, o levantamento do valor depositado não era mesmo de ser deferido pela apelada. em parte. Ipso facto, tenho que as razões recursais merecem ser acolhidas DISPOSITIVO: 11
Isso posto, dou parcial provimento à apelação, apenas para reconhecer a desnecessidade do alvará judicial, mantendo, contudo, incólume o dispositivo da sentença, posto que não exibida a escritura pública de inventário e partilha quando do pedido de levantamento do valor depositado em nome do de cujus. apelante. Diante da sucumbência mínima da ré, custas recursais, pelo DES. LEITE PRAÇA (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. EVANDRO LOPES DA COSTA TEIXEIRA - De acordo com o(a) Relator(a). SÚMULA: "APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA" 12