FUNDAMENTOS E PRÁTICAS DA AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL 1 FUNDAMENTALS AND EVALUATION PRACTICES IN THE CHILDHOOD EDUCATION



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FUNDAMENTOS E PRÁTICAS DA AVALIAÇÃO NA EDUCAÇÃO INFANTIL 1 FUNDAMENTALS AND EVALUATION PRACTICES IN THE CHILDHOOD EDUCATION ANTECEDENTES Y EVALUACIÓN PRÁCTICA EN EDUCACIÓN INFANTIL Amélia de Jesus Marchão 2 O livro Fundamentos e Práticas da Avaliação na Educação Infantil organizado por Célia Maria Guimarães, Maria João Cardona e Daniele Ramos de Oliveira, editado em 2014 pela Editora Mediação, reúne um conjunto de contributos de extrema qualidade e pertinência sobre a educação infantil (EI) e, em particular, sobre uma das questões que mais preocupa profissionais, investigadores e formadores de educadores/professores. Neste particular, a obra apresenta e discute, sob a voz de um conjunto alargado de autores/autoras, a necessidade de promover a avaliação no [e do] contexto da educação de infância (EI) e salienta as dificuldades e ambiguidades que tal processo avaliativo encerra. A leitura do livro, logo desde o(s) prefácio(s), transporta-nos numa viagem entre os contextos de EI de Portugal e do Brasil, cujo mapeamento se apresenta assim estruturado: Parte I - Políticas educativas e de formação de crianças de e zero a seis anos em Portugal e no Brasil; Parte II - Estudos sobre a avaliação na educação infantil; Parte III - Concepções educativas e práticas de avaliação; Parte IV - Fundamentos e práticas da avaliação na educação infantil; Parte V - A avaliação no desenvolvimento da qualidade educativa; Parte VI - Avaliando as aprendizagens das crianças; Parte VII - Avaliando na creche e na pré-escola: alguns exemplos; Parte VIII - O papel da documentação pedagógica na avaliação: portfólios; Parte IX - Entre a educação pré-escolar e a escola mudam as práticas de avaliação. 1 Resenha livre da obra GUIMARÃES, C. M.; CARDONA, M. J.; OLIVEIRA, D. R. (Org.). Fundamentos e Práticas da Avaliação na Educação Infantil. Porto Alegre: Mediação, 2014. 2 Professora da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Portalegre, Portalegre, Portugal. E-mail: ameliamarchao@esep.pt. 294

Quando percorremos o livro, em leitura/análise, percebemos a riqueza das perspetivas expostas e que colocam no centro da discussão a necessidade de entender a avaliação como um elemento de currículo da EI que não pode ser esquecido pelos profissionais, que pode promover-se através de um conjunto diversificado de instrumentos e que objetiva, no âmbito de uma pedagogia envolvente e participada (profissionais, crianças, famílias), respostas adequadas e de qualidade dos contextos educativos em favor da emergência da criança como um sujeito com direitos, desde logo com direito a práticas educativas de qualidade que favoreçam o seu desenvolvimento e aprendizagem. Simultaneamente afirma-se a necessidade da avaliação num sentido holístico e dialogante que cruze e interligue a avaliação da criança com a avaliação dos profissionais, das suas práticas e dos contextos educativos, tornando-a num dos principais indicadores para (re)construir a intencionalidade educativa e para demonstrar com transparência o trabalho desenvolvido na EI junto da escola (etapa que a sucede), da família e da comunidade. Pela riqueza científica, teorizante, mas também prática dos contributos que integram cada uma das partes do livro, importa explorar as perspetivas e conceções apresentadas, acentuando que a estrutura definida se apresenta lógica, coerente e integradora, embora, em nosso entender, o leitor, em função dos seus objetivos/interesses, possa proceder a uma leitura isolada de uma ou de outra parte. A Parte I contextualiza a EI em Portugal e no Brasil. Os dois textos que a incluem ilustram os caminhos percorridos na EI sob uma perspetiva evolutiva em que as marcas da política educativa e os desafios sociais determinam o modo de a encarar e estruturar como uma preocupação social, educativa ou pedagógica e/ou de inclusão. Os autores demonstram a necessidade de encarar e refletir a EI num quadro sistémico, destacando a necessidade de articulação de diferentes variáveis em prole de um nível de qualidade de respostas mais elevado mas, em simultâneo e pelo modo como a EI tem vindo a desenvolverse (e como, em particular, a avaliação em muitos casos tem vindo a ser praticada), se dever considerar o perigo de uma crescente padronização das respostas educativas que conduzam à academização da formação dos profissionais e, por consequência, à antecipação da escola e à acentuação de uma pedagogia transmissiva, reprodutora e até discriminatória face aos direitos das crianças e das famílias no acesso e no direito a respostas adequadas e de qualidade. Consideramos os textos anteriores enquadradores e pontos de partida para uma discussão mais particular que se inicia na Parte II sobre a avaliação na EI. O primeiro texto analisa, em resultado de uma investigação naturalista, práticas pedagógicas sob 295

diferentes modelos curriculares, destacando as conceções e modos de integrar a avaliação em três jardins de infância portugueses, considerando a crescente preocupação que desde 1997 tem vindo a exercer-se sobre o modo como a criança aprende e se desenvolve e na relação com a avaliação perspetivada como alternativa e formativa alternativa e construtiva ao serviço da criança e dos educadores e integrada no processo educacional, mais centrada neste e não apenas nos seus resultados. O segundo texto, após enquadrar a EI como primeira etapa do sistema educativo brasileiro, faz uma resenha de estudos de investigação sobre a avaliação no período temporal 1996-2011, que analisa em duas categorias: avaliação na EI e avaliação da EI. Os primeiros tendem a consagrar a criança como sujeito, o trabalho pedagógico e os seus efeitos e conceptualizam-se em torno de diferentes conceções de avaliação e da elaboração de diferentes instrumentos de avaliação; e constatam o estado do conhecimento sobre a avaliação que se considera ainda reduzido (mas em que vale a pena insistir) e que aponta para uma subordinação das conceções e das práticas de avaliação na EI ao Ensino Fundamental sem a expressão efetiva da criança. Os segundos focam a qualidade em termos amplos e procuram responder se a primeira etapa educativa responde às suas finalidades, objetivos e diretrizes, focalizando-se na avaliação institucional. Na Parte III abordam-se conceções educativas e discutem-se práticas de avaliação, ao mesmo tempo que se identificam as preocupações dos profissionais. No primeiro texto coloca-se a avaliação entre uma assunção empírica e espontaneísta que perdurou em Portugal até aos anos 90 e a emergência de uma conceção holística da avaliação que considera a criança e o seu projeto educacional; a afirmação dos entendimentos construtivistas e de documentação da aprendizagem da criança; e o reconhecimento social da educação pré-escolar que tem vindo a crescer. Neste quadro as autoras plasmam as perspetivas de um grupo de educadoras sobre a avaliação e o modo como a praticam: as profissionais revelam diversidade de entendimentos e expõem algumas ambiguidades e contradições; partilham a ideia de que a avaliação é uma dimensão da profissionalidade e é sua responsabilidade; que é uma componente essencial da ação educativa e é holística; e que requer conhecimentos, planeamento e monitorização, sendo parte integrante e indissociável da ação educativa e concetualizada numa visão construtivista da aprendizagem, caraterizando-se pela aproximação à avaliação autêntica e alternativa. No segundo texto a discussão das conceções e das práticas da avaliação contextualiza-se no ambiente do Brasil e as autoras destacam a avaliação no quadro da legislação e das políticas nacionais (avaliação na e da EI) e revelam as práticas nas instituições de EI na fase pré-escolar sob um olhar crítico e que 296

entende a avaliação como um processo de apropriação ao invés de a olhar como um resultado no desenvolvimento infantil e do modo como é comunicada. Destaca-se a observação e o seu registo enquanto meios de avaliação do acompanhamento do desenvolvimento e aprendizagem da criança, tendencialmente mais circunstanciado ao desenvolvimento cognitivo ou psicomotor e menos ao desenvolvimento afetivo. As autoras inquietam-se sobre o estado prático da avaliação e equacionam se a mesma contribui para o bom e pleno desenvolvimento da criança e se o modo como é comunicada aos pais favorece o percurso de desenvolvimento e aprendizagem da criança. Na Parte IV evidenciam-se os fundamentos da avaliação na EI. O primeiro dos textos discute, face ao modelo de organização da EI e face à dificuldade em transpor para a prática a diversidade de perspetivas de avaliação, a necessidade de questionar sistematicamente a relação entre objetivos educativos e avaliação tendo como pano de fundo a complexidade que, no caso da EI, advém do facto de a avaliação se centrar nas crianças e nas relações com o contexto, nos processos e nos efeitos e por dever incidir numa diversidade de domínios (adequação da ação, ambiente educativo, processo educativo e desenvolvimento e aprendizagem da criança). O segundo texto enfoca a discussão no significado da avaliação em torno dos dilemas e das possibilidades na EI e reflete sobre os desafios que decorrem da avaliação em prole da melhoria das práticas educativas e dos cuidados em contextos institucionais e da implementação de práticas de avaliação que valorizem o trabalho pedagógico e que atribuam o estatuto de protagonista à criança, ao invés da realização de uma avaliação subordinada ao Ensino Fundamental. Na Parte V explora-se a avaliação no desenvolvimento da qualidade educativa e o primeiro texto explana o desenvolvimento do projeto Desenvolvendo a Qualidade em Parcerias implementado em Portugal que objetiva a avaliação e melhoria da qualidade da aprendizagem na EI, através de um percurso interativo entre formaçãoinvestigação e da aplicação do referencial de avaliação da qualidade e da pedagogia em participação As potencialidades e resultados do projeto determinam que o mesmo possa ser operacionalizado em diferentes contextos, desde que devidamente adaptado, e fomentam a participação, o questionamento e a reflexão consciente do que se faz e do que é necessário fazer para melhorar a qualidade das respostas educativas. O segundo texto foca o debate da qualidade do projeto formativo para as crianças como estratégia de melhorar a qualidade do sistema educacional brasileiro e levanta preocupações centrais sobre a qualidade das respostas educativas e as práticas de avaliação de espectro colonialista, que tendem a disseminar 297

mecanismos de avaliação centrados na classificação das crianças assentes em padrões generalizados do que a criança deve ser em cada faixa etária. A Parte VI centra a avaliação na aprendizagem das crianças e apresenta no primeiro texto o Sistema de Acompanhamento das Crianças, proposta de avaliação inspirada na aprendizagem experiencial, que se apresenta como um modo contínuo e sistemático de avaliação completado por mecanismos de monitorização das experiências realizadas pelas crianças no contexto educativo. O ciclo observação-avaliação-ação baseado em indicadores descritivos das atitudes e domínios fundamentais da ação educativa foca o pensamento dos profissionais nos fatores que contribuem para o bem-estar, implicação, aprendizagem e desenvolvimento da criança e permite integrar e desenvolver estratégias de intervenção e de organização do ambiente educativo mais responsivas ao grupo e a cada criança. No texto seguinte considera-se que a avaliação do desenvolvimento da criança exige partir de conceções de educação em permanente movimento e exige uma formação adequada dos profissionais para praticarem a avaliação mediadora que, no contexto da EI, tem como finalidade promover oportunidades de aprendizagem adequadas aos interesses e necessidades das crianças e baseia-se numa identidade docente de cariz reflexiva. Na Parte VII apresentam-se exemplos de práticas da avaliação em jardim de infância e em creche, respetivamente em Portugal e no Brasil. No primeiro caso explicita-se que as educadoras portuguesas carecem de formação inicial e contínua sobre avaliação e revelam sobre o processo diferentes tipos de preocupação que resultam de diferentes conceções e entendimentos sobre a avaliação, embora a entendam como um elemento essencial e de controlo do processo educativo. O texto seguinte critica declaradamente o sistema de avaliação ASQ-3 (no Brasil ASQ-BR) utilizado com fins de avaliação em creches e outras instituições infantis por motivos do seu entendimento linear do desenvolvimento da criança (retrocesso político, científico e prático da EI) e apresenta modos alternativos de avaliação (avaliação formativa, reflexiva) considerando as dificuldades que os mesmos colocam aos profissionais mas destacando as suas potencialidades na avaliação na EI. Os dois textos que incluem a Parte VIII destacam o papel da documentação pedagógica na avaliação e identificam o portfólio como um conceito e não apenas como um instrumento de avaliação, inclusivo do olhar e da voz das crianças, e expressão do seu percurso. Expressam os desafios que esta estratégia de avaliação coloca à ação educativa, aos profissionais, às crianças e às famílias. O segundo texto dá-nos o olhar e opinião das 298

crianças sobre o portifólio, o que lhes possibilita a (auto)avaliação sobre progressos e/ou sobre o que ainda não sabem ou não conseguem fazer. Por fim, a Parte IX apresenta dois textos que consideram a avaliação como suporte da aprendizagem, sendo que no primeiro se destaca a avaliação como andaime para a aprendizagem e se conclui que os problemas e os desafios da avaliação não são muito diferentes na EI e no 1.º ciclo. O segundo texto faz uma resenha legal, política e operacional sobre a avaliação na e da EI no Brasil, apresenta questões centrais do debate sobre a avaliação (na e da EI) e sugere linhas de reflexão para a avaliação na EI coerentes com as conceções mais avançadas da criança, da infância e das finalidades educativas. Em epítome: ao realizar esta resenha corremos o risco de não expor a riqueza e a pertinência do conteúdo que se vai revelando ao longo das páginas deste livro. Por isso, se recomenda a sua leitura em favor de um conhecimento mais consistente sobre a avaliação na e da educação de infância. Recebido em outubro de 2014. Aceito em dezembro de 2014. 299