MANIFESTAÇÕES ATÍPICAS DA DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO DR. CLÓVIS DE CARVALHO GUEDES



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Transcrição:

MANIFESTAÇÕES ATÍPICAS DA DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO DR. CLÓVIS DE CARVALHO GUEDES

ABSTRACT A hérnia hiatal, a hipotonia do esfíncter inferior do esôfago, ou até mesmo a inversão do sentido do peristaltismo do estômago, são condições que propiciam a chegada de conteúdo gástrico ao esôfago e às vias aéreas causando uma gama se sintomas que não se limitam ao trato digestório e podem se estender à cabeça, ao pescoço e às vias aéreas inferiores. O contacto da secreção ácida com o terço inferior do esôfago é capaz de desencadear reflexo vagal que pode produzir bronco-espasmo e laringoespasmo. A chegada de ácido gástrico ao rino-faringe contribui para o surgimento de inflamações naso-sinusais. O contacto de secreção ácida com a laringe pode levar ao surgimento de alterações histológicas neste órgão com manifestações clínicas variadas, como: pigarro, tosse improdutiva persistente e disfonia. PALAVRAS CHAVE : REFLUXO ; DISPEPSIA ; TOSSE IMPRODUTIVA ; PIGARRO ; DISFONIA.

MANIFESTAÇÕES ATÍPICAS DA DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO DR. CLÓVIS DE CARVALHO GUEDES * CRM-GO: 1838 Otorrinolaringologista pela SBORL/CCF, AMB e CFM Homeopata pela AMHB, AMB e CFM Nutrólogo pela ABRAN, AMB e CFM Full Membership of the International Colleges for the Advancement of Nutrition

MANIFESTAÇÕES ATÍPICAS DA DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO INTRODUÇÃO Há mais de 50 anos a doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) foi identificada, conhecida, diagnosticada e tratada pelos gastroenterologistas. Ao longo de muitas décadas acreditou-se que esta entidade nosológica limitava-se à via digestiva alta, contudo, sabe-se hoje que ela pode cursar com sintomas relacionados: a) Às vias respiratórias ; b) À cabeça ; c) Ao pescoço. Neste artigo objetivamos apresentar de forma sucinta os sinais e sintomas que podem nos levar a suspeita de manifestações atípicas da DRGE, os procedimentos diagnósticos disponíveis em nosso meio, o tratamento atual e suas possíveis iatrogenias. Muitas vezes, pacientes portadores de DRGE não apresentam os sintomas típicos da doença (pirose e regurgitação), destarte, procuram outros especialistas que levantam uma série de hipóteses diagnósticas equivocadas, submetendo o paciente a uma série de exames subsidiários que resultam inconclusivos e postergam o diagnóstico. As queixas que geralmente levam o portador de DRGE aos consultórios de diversas especialidades raramente lembram a doença, uma vez que, em até 70% dos casos, não há sintomas digestivos associados. Em 1968 Cherry e Margulies descreveram pela primeira vez a associação de DRGE com sintomas laríngeos em três pacientes que apresentavam esofagite de refluxo e granuloma de contato das pregas vocais. No final da década de 1980, graças à difusão do uso de fibras ópticas na prática clínica, permitindo uma visualização minuciosa da faringe e da laringe, começaram a surgir relatos de grande número de pacientes com uma forma atípica de DRGE. Como toda doença de conhecimento recente, a trajetória para a compreensão dos mecanismos envolvidos em sua gênese e manutenção tem sido árdua e por vezes confusa. Por muito tempo se pensou que os pacientes com suspeita de refluxo alto, atingindo a faringe, laringe traqueia e brônquios teriam que apresentar, necessariamente, esofagite de refluxo, hérnia hiatal, pirose, regurgitação ou outras alterações gastroenterológicas compatíveis com o diagnóstico de DRGE, como se conhecia até então. Eram utilizados os exames subsidiários e interpretações estabelecidas e consagradas para a DRGE, mas não se confirmava o diagnóstico dos doentes com patologias traqueobrônquicas e/ou otorrinolaringológicas com suspeita de refluxo. No entanto, provas terapêuticas se mostravam positivas neste universo de pacientes.

Estudos de pesquisadores como Oson e Koufman evidenciaram que a DRGE, embora tenha um único mecanismo, apresenta-se com duas manifestações clínicas distintas, a saber: a) Forma clássica, que cursa com esofagite e é denominada DRGE; b) Forma atípica, que pode cursar apenas com sintomas altos, sendo denominada refluxo laringofaríngeo (RLF). A explicação para a ocorrência de sintomas altos, sem sintomas digestivos, se deve à anatomia e à fisiologia do trato digestivo e respiratório. O esôfago é dotado de mecanismos de proteção mecânicos e químicos, inexistentes na mucosa da faringe e do trato respiratório. Mecânicos: epitélio e cobertura de muco. Químicos: bicarbonato de sódio produzido no próprio esôfago e pelas glândulas salivares, prostaglandinas, mucinas, fator de crescimento epidérmico e outros polipeptídeos capazes de proteger e/ou regenerar a mucosa digestiva. Estes mecanismos tornam a mucosa do esôfago resistente às pequenas quantidades de pepsina ativada e ácidos que refluem fisiologicamente. A saliva desempenha, também, papel importante no equilíbrio químico da mucosa digestiva, uma vez que funciona como: diluente, neutralizadora de ácidos e estimuladora do metabolismo do epitélio digestivo através da produção de polipeptídeos, tendo seu volume e concentração dessas substâncias orgânicas e inorgânicas aumentados significativamente na doença dispéptica e na esofagite de refluxo. Ressalte-se que a mucosa respiratória, por sua vez, além de ser um epitélio menos adaptado a agressões, não possui uma barreia protetora de muco e certamente não se beneficia das ações protetoras da saliva, como a mucosa digestiva. Desta forma, se pequenas quantidades de refluxo tidas como fisiológicas para o esôfago distal chegarem à laringe, à faringe ou à árvore brônquica, inevitavelmente causarão alterações locais. Isso explica como um número tão grande de pacientes com sintomas e sinais sugestivos da DRGE na laringe e na faringe têm endoscopias digestivas altas e ph-metrias esofágicas dentro dos parâmetros da normalidade. Queixas comuns de pacientes adultos que consultam o otorrinolaringologista: a) disfonia persistente b) tosse seca peristente c) pigarro (clareamento da faringe) d) globus faríngeo e) rinorréia posterior

Muitas vezes esses sintomas podem estar relacionados ao refluxo gastroesofágico. Os mecanismos que causam esses sintomas ainda não estão completamente esclarecidos, mas aparentemente estão relacionados ao processo inflamatório local causado pela agressão química. No entanto, vários outros fatores podem estar associados à sua ocorrência, tais como: a) tabagismo b) abuso vocal c) ingestão alcoólica d) exposição a químicos ou alérgenos e) idade f) atividade profissional Todos esses fatores devem ser considerados na interpretação dos achados clínicos, sendo que grande parte deles, além de atuarem como agressores primários, também contribuem para aumentar a secreção gástrica e relaxar o esfíncter inferior do esôfago, facilitando e/ou incrementando o refluxo. Os achados laríngeos, nos casos de laringite por refluxo, variam de acordo com a gravidade de cada caso, podendo ir desde hiperemia e edemas leves do terço posterior da laringe até quadros mais graves com úlceras de contato, granulações laríngeas, leucoplasias, paquidermia interaritenóidea, estenose sub-glótica e degeneração neoplásica do epitélio. Na atualidade, admite-se que um grande número de lesões benignas das pregas vocais também pode estar associado ao Refluxo Laringofaríngeo, já que a inflamação resulta em padrões fonatórios abusivos que podem causar lesões secundárias, tais como: a) nódulos b) pólipos c) edema de Reinke O pigarro é o sintoma mais comum apresentado pelos pacientes com Refluxo Laringofaríngeo e se deve ao edema das regiões retro-cricoídea e inter-aritenóidea e também à estase salivar nestas regiões e nos seios piriformes. O edema retrocricoídeo causa a sensação de globus faríngeo que é o segundo sintoma mais comum nestes pacientes. É importante que se ressalte que o ato de pigarrear aumenta a inflamação local perpetuando o processo e podendo levar a formação de úlceras ou granulações causadas pelo contato na região dos processos vocais (granulomas de contato). A disfonia também ocorre com grande frequência e costuma ser mais acentuada pela manhã, devido ao edema das pregas vocais que se desenvolve durante a noite quando há

episódios de refluxo agravados pelo decúbito. Nos casos mais leves, nos quais ainda não há lesão estrutural das pregas vocais, a disfonia tende a melhorar no decorrer do dia, podendo recidivar após as refeições, por abuso vocal ou por atividades físicas de grande esforço. A disfonia de caráter constante é indicativa de lesão orgânica e deve ser pesquisada imediatamente, pois a agressão química crônica pode levar à degeneração neoplásica do epitélio. A tosse seca que ocorre na DRGE é de caráter crônico, podendo ocorrer a qualquer hora do dia, mas principalmente à noite ao deitar. Aparentemente, não só a aspiração do conteúdo refluído gera a tosse, mas o próprio estímulo químico no esôfago distal é capaz de deflagrar o reflexo da tosse por estímulo do nervo pneumo-gástrico. Além disso, a própria tosse aumenta a pressão intra-abdominal, facilitando o refluxo adicional e perenizando o processo. Úlceras de contato Estas úlceras de contato deveriam ser denominadas de paquidermia de contato. Este epitélio hiperplásico com aspecto escavado não apresenta ulceração.

Laringomalacia A laringomalacia é a causa mais comum de estridor laríngeo em crianças. O estridor inspiratório geralmente se inicia dias ou semanas após o nascimento. À laringoscopia direta, pode-se observar o colabamento parcial das estruturas supraglóticas já no início da inspiração. A epiglote se enrola e as cartilagens cuneiformes são sugadas para a glote. Durante a inspiração máxima somente uma pequena abertura supraglótica persiste. Durante a expiração não há obstrução. Laringomalacia Estas três imagens demonstram a dinâmica da laringomalacia. A expiração não encontra impedimento já que as estruturas supraglóticas são sopradas para cima e para fora. Durante a inspiração, porém, as pregas ariepiglóticas e as cartilagens cuneiformes são sugadas para dentro da laringe. As pregas ariepligóticas podem ser curtas em alguns casos. A laringomalacia é corrigida com o passar do tempo e o crescimento e raramente é severa o suficiente para exigir o tratamento cirúrgico.

Nódulos vocais Estes nódulos vocais foram fotografados com um telescópio de 30º. Os nódulos vocais se formam da borda e abaixo da superfície do centro da prega vocal membranosa. O estudo histológico dos nódulos vocais revela um epitélio espessado, edema da submucosa, degeneração microcística e hialinização do espaço de Reinke. Nódulos vocais Se o nódulo vocal for maior de um lado, deve-se suspeitar de um cisto intracordal. Neste caso havia uma degeneração microcística no nódulo da prega vocal esquerda, mas não havia cisto.

Edema de Reinke O espaço de Reinke é um espaço virtual entre a superfície da mucosa da prega vocal e o músculo tireoaritenóideo medial e o ligamento vocal. O espaço se estende da ponta do processo vocal até a comissura anterior e contém tecido areolar frouxo. Este espaço permite o livre movimento e vibração da mucosa vocal durante a fonação. O edema do espaço de Reinke deste paciente é maior à esquerda. Os vasos dilatados são facilmente identificados. Laringite crônica: refluxo gastroesofágico Esta laringe crônica foi provocada por um refluxo gastroesofágico e aspirações frequentes.

Granuloma subglórico e estenose subglótica O tecido de granulação redondo próximo a esta estenose subglótica madura adquirida deve ser removido e reavaliado para evitar a sua recorrência antes do tratamento definitivo da estenose subglótica. Um dos sintomas de Refluxo Laringofaríngeo mais angustiantes para o paciente e extremamente preocupante para o médico é o laringoespasmo, que ocorre, primeiramente, em casos de concentração aumentada de interleucina -2 na mucosa inflamada e, secundàriamente, pela liberação de interleucina -6 liquórica, que supostamente provocaria hiper-reatividade da laringe e especificamente das pregas vocais. Há estudos que demonstram que mesmo o refluxo no esôfago proximal já é capaz de deflagrar o reflexo laríngeo de espasmo por estímulo dos nervos laríngeos recorrentes. Pacientes com sintoma de laringoespasmo são considerados graves, justificando tratamento agressivo. O RLF pode acometer a mucosa faríngea, chegando a causar processo inflamatório da mucosa da rinofaringe gerando os seguintes sintomas: a) secreção nasal posterior b) cacosmia c) obstrução nasal Por alterar o ph bucal direta ou indiretamente ( através de dumping do bicarbonato salivar no esôfago durante os episódios de refluxo), pacientes com DRGE podem apresentar alteração da flora oral, que pode estar associada com a gênese de: a) halitose ; b) gengivites ; c) periodontites ; d) erosões dentárias.

Na população pediátrica, alterações da rinofaringe ocorrem com maior frequência, podendo gerar adenoidites e sinusites de repetição e, por contiguidade da tuba auditiva, otites médias agudas de repetição ou otite média crônica secretora. As infecções respiratórias de repetição, além de outras complicações respiratórias, acabam prejudicando o crescimento e o desenvolvimento das crianças acometidas por essa doença. A crença na associação do refluxo com otites médias de repetição é tão forte que muitos especialistas chegam a tratar crianças com medicação anti-refluxo antes de indicar qualquer tratamento cirúrgico (como adenoidectomia, miringotomia com inserção de tubo de ventilação, adeno-amigdalectomia). Hoje já se observa um aumento do número de médicos que indicam tratamento antirefluxo para crianças com atraso de crescimento. Espasmo laríngeo À esquerda observa-se uma laringe normal durante a respiração e à direita durante um espasmo laríngeo temporário. Estudos em pediatria, como os de Giannoni e colaboradores, em 1998, e Bouchard e colaboradores, em 1999, demonstraram uma associação de 61% a 64% de RLF com laringomalácia, sendo que esses foram os casos mais graves em suas observações. Fica evidente que as manifestações clínicas do RLF podem ser bastante distintas daquelas do RGE clássico, devendo o profissional estar alerta para a possibilidade de haver refluxo em pacientes com sintomas como pigarro, disfonia, tosse seca, sensação de globus faríngeo, pneumonias de repetição, broncoespasmos de repetição, laringoespasmos de repetição, otites médias de repetição notadamente em crianças, adenoidites de repetição, falha de crescimento em crianças. Nestas situações, deverá o médico proceder ou solicitar os exames específicos que possibilitem o diagnóstico tão precocemente quanto possível. DIAGNÓSTICO A suspeita diagnóstica de RLF se inicia com uma história clínica sugestiva, que deve considerar os sintomas: disfonia, tosse seca, pigarro, globus faríngeo, rinorréia posterior e os

demais sintomas retro-citados, podendo ou não cursar com sintomas digestivos concomitantes. Características das manifestações clínicas da DRGE Manifestações RGE RLF Pirose Sim Não Epigastralgia Sim Não Má digestão Sim Não Disfonia Não Sim Pigarro Não Sim Tosse seca Não Sim Esofagite endoscópica Sim Não Hipotonia do EEI Sim Não Dismotilidade esofágica Sim Não Hipotonia do EES Não Às vezes ph-metria esôfago distal positiva Sim Não ph-metria esôfago proximal positiva Não Às vezes Melhora com bloqueadores H2 Sim Não Melhora com pró-cinéticos Sim Às vezes Melhora com bloqueadores de bomba H Sim Não Como um dos grandes causadores da DRGE é o mau hábito alimentar é imperioso obter informações detalhadas sobre : a) padrão alimentar do paciente; b) tipos de alimentos ingeridos ; c) horários das refeições e intervalo entre elas ; d) hábitos após as refeições ( como deitar imediatamente após comer, usar roupas apertadas na cintura, fazer atividade física etc. ) Uma história sugestiva de refluxo laringofaríngeo será corroborada por um exame clínico, que muitas vezes é característico. Um exame otorrinolaringológico completo e uma análise da rinofaringe e da laringe com equipamento de fibra óptica na maioria dos casos fornecem dados suficientes para selar o diagnóstico. Sempre que possível deve-se acoplar a fibra óptica a uma micro-câmara para visualização em monitor de vídeo e gravar as imagens obtidas com as finalidades de: comparação futura para acompanhamento da evolução do caso, avaliação da resposta à terapêutica instituída, bem como feedback para o paciente. Este exame é denominado vídeonasofibrolaringoscopia, mas também pode se realizado com fibras rígidas.

A vídeonasofibrolaringoscopia deve ser feita com o paciente acordado (sem sedação), podendo ser usado anestésico tópico para minimizar o desconforto causado pela introdução da fibra óptica flexível. Atualmente dispomos de fibras flexíveis com diâmetros que variam de 3,2 a 4 mm,o que torna o exame exeqüível qualquer que seja a idade do paciente. A importância da videonasofibrolaringoscopia ser realizada rotineiramente sob anestesia tópica reside na possibilidade de avaliar o paciente na respiração, na fonação e na deglutição e também de mostrar a ele as alterações encontradas. Isso é de fundamental importância para aceitação do tratamento que será proposto, pois, inicialmente, é difícil para o paciente aceitar que um sintoma faríngeo, laríngeo ou respiratório possa estar relacionado com seu aparelho digestivo, com seus hábitos alimentares e com seu estilo de vida inadequados. Os achados nasofibrolaringoscópicos típicos são: a) Edema principalmente no terço posterior da laringe, nas regiões retrocricoídea e interaritenoídea, mas também pode se estender por toda a parede posterior da faringe até a laringe, que passam a exibir um aspecto grosseiramente granuloso. Há casos em que há edema das pregas vocais, o edema de Reinke. Este tem como causa primária o tabagismo crônico mas pode também estar intimamente relacionado com o RLF. Também encontramos, em alguns casos, edema da mucosa do ventrículo de Morgagni, que quando intenso pode causar a obliteração do mesmo. b) Hiperemia é freqüente nos casos agudos de refluxo, nas regiões descritas anteriormente, mas menos encontrado nos casos crônicos. O local principal de ocorrência de hiperemia é a região das aritenóides até o processo vocal. Pode também ocorrer hiperemia difusa em ambas as pregas vocais ou em apenas uma. Esse quadro inflamatório unilateral, a monocordite, foi considerado durante muitas décadas como patognomônico de tuberculose laríngea, mas hoje sabemos que muitas outras condições inflamatórias cursam com monocordite, sendo o refluxo laringofaríngeo uma das prevalentes. c) Secreção e/ou estase salivar O processo inflamatório causa aumento de secreção mucosa local, que se torna espessa. Essa secreção de coloração esbranquiçada costuma acumular-se na região retrocricoídea, nos seios piriformes e na valécula glossoepiglótica. Na rinofaringe, a secreção espessa passa a aderir a parede posterior formando uma linha esbranquiçada, muito característica, na região onde o palato mole toca a parede posterior da faringe para formar o esfíncter velofaríngeo que impede a regurgitação nasal de alimentos durante o complexo mecanismo da deglutição. O exame nasofibrolaringoscópico possibilita ainda diagnosticar uma série de outras lesões associadas ao RLF, como processos infecciosos, lesões benignas ou malignas, lesões ulceradas ou exofíticas etc. Permite também a visualização dos primeiros anéis traqueais que possibilita o diagnóstico de estenose subglótica que pode cursar com o RLF.

ph metria - No início da década de 1980, surgiram os primeiros relatos do uso da phmetria esofágica de 24 horas para diagnosticar refluxo em pacientes com disfonia e outras queixas otorrinolaringológicas associadas. Em 1987, Wiener e colaboradores estudaram 14 pacientes com disfonia associada ao refluxo e constatou que 67% deles tinham ph- metria alterada. Descobriram neste estudo que a maioria dos episódios de refluxo ocorria durante o dia e na posição ortostática. Em anos recentes, a ph-metria esofágica ambulatorial de 24 horas com dois canais, um canal 5 cm acima do esfíncter esofagiano inferior (EEI) e outro proximal, no esôfago proximal ou ao nível do crico-faríngeo, tem sido utilizada com maior frequência para auxiliar no diagnóstico ou para acompanhamento terapêutico de pacientes com RLF. Apesar do entusiasmo inicial que esse método despertou, estudos recentes e revisão minuciosa da literatura feita por Araújo mostram que este exame tem baixa sensibilidade. Nos casos de RLF, a sensibilidade da ph-metria esofágica ambulatorial de 24 horas de duplo canal varia de 30 até, no máximo 75%. Isso significa que se o exame fosse realizado para diagnosticar todos os casos suspeitos de RLF, no mínimo 1 caso em cada 4 com a doença teria resultado dentro dos padrões da normalidade. Provavelmente isso se deva ao fato de o exame ainda não ter uma padronização estabelecida para sua realização ou para a interpretação dos resultados nos casos de refluxo alto. Em muitos centros, este exame ainda é interpretado usando os parâmetros de Meester para refluxo gastresofágico clássico, podendo ocorrer análise equivocada ou errônea dos resultados. Devido às dificuldades técnicas na realização e na interpretação deste exame e por ser um método invasivo que causa um relativo desconforto aos pacientes, ele deveria ser indicado apenas naqueles casos nos quais haja dúvida diagnóstica ou resistência terapêutica para averiguar se a medicação anti-refluxo está sendo eficaz. Na experiência de muitos profissionais a associação de uma nasofibrolaringoscopia à ph-metria esofágica de 24 horas de duplo canal aumenta a sensibilidade do segundo exame por associar os dados clínicos das alterações laringofaríngeas. MANOMETRIA ESOFÁGICA A manometria esofágica é um exame invasivo que mede as pressões intra-esofágicas do esfíncter esofagiano inferior ( EEI ) e do músculo crico-faríngeo, que constitui o esfíncter esofagiano superior ( EES ). Em casos de RLF, os resultados manométricos também se mostram distintos daqueles encontrados nos pacientes co DRGE clássica. No RLF não há comprovação de dismotilidade esofágica ou hipotonia do EEI. Há relatos de diminuição do tônus do EES. Esses dados podem ser de importância para a

escolha dos fármacos, porém pouco acrescentam para o diagnóstico do RLF, razão pela qual esse exame deverá ter sua indicação reservada aos casos refratários ao tratamento clínico ou nos quais haja indicação de tratamento cirúrgico ( fundoplicatura). EXAMES RADIOGRÁFICOS CONTRASTADOS Os exames radiográficos contrastados do esôfago e do estômago, na atualidade, tem pouca valia prática no diagnóstico do RLF, pois já estão disponíveis métodos menos invasivos, sem irradiação ionizante, e sem os riscos de reações alérgicas aos meios de contraste e que permitem a visualização da região acometida, como os retro citados. ENDOSCOPIA DIGESTIVA ALTA A endoscopia digestiva alta contribui muito pouco, ou nada, para o diagnóstico dos casos isolados de RLF, por não haver esofagite ou hérnia hiatal. Manobras específicas realizadas pelos endoscopistas na tentativa de visualizar refluxo, em paciente sedado e com estomago vazio têm se mostrado infrutíferas. A endoscopia digestiva alta tem como mérito a possibilidade de diferenciar os casos de RLF isolado dos casos em que estão associados RLF e DRGE. A EDA deve ser solicitada em todos os pacientes com suspeita de DRGE para afastar lesões graves do esôfago e para conhecer o estado pré-tratamento da mucosa digestiva, uma vez que os fármacos utilizados no tratamento tem efeitos potenciais importantes a longo prazo nessa mucosa. IMPEDANCIOMETRIA ESOFÁGICA DE LONGA DURAÇÃO Chegou trazendo importante contribuição para o diagnóstico do Refluxo Laringo- Faríngeo e da Doença do Refluxo Gastro-Esofágico. Esse exame também usa um cateter mensor, porém disponibiliza múltiplos canais em toda a extensão do esôfago e é capaz de avaliar a presença tanto de refluxo ácido como de refluxo alcalino. Além disso, a impedanciometria esofágica de longa duração oferece informações sobre o estado do material refluído ( líquido, gasoso ou misto ). Infelizmente o alto custo do procedimento e a pouca disponibilidade desse exame não o tornam amplamente disponível na prática clínica, sendo portanto inacessível à maioria de nossa população. Quando há fortes indícios de RLF, identificados por meio dos dados clínicos e da vídeo laringoscopia, mas haja duvidadas por estarem associados a outros fatores irritantes da mucosa, muitos autores têm preconizado fazer uma prova terapêutica na qual a secreção gástrica é bloqueada por um período de 12 a 16 semanas (na maioria dos casos

usamos IBP ), sendo o paciente reavaliado após esse período. Muitas vezes, a importante melhora clínica obtida com o tratamento anti-refluxo termina por selar definitivamente o diagnóstico de RLF. TRATAMENTO DO RLF O tratamento do RLF deverá considerar e /ou contemplar : a) Tempo de evolução ; b) Severidade dos sinais e sintomas ; c) Idade do paciente; d) Atividade profissional principal do paciente ; e) Hábitos de vida e vícios associados ; f) Hábitos alimentares ; g) Aceitação do paciente ao tratamento proposto. As diferenças entre a forma clássica de refluxo e a forma com manifestações otorrinolaringológicas e respiratórias deixam bastante evidente que o tratamento dessas duas formas também deve ser distinto. O mais importante tratamento para a DRGE é, sem dúvida, a conscientização do paciente sobre a sua doença e os mecanismos envolvidos em sua etiopatogenia. Nos casos de refluxo clássico, fica mais fácil a compreensão, pois o paciente sente dor epigástrica, pirose, má digestão e refluxo de alimentos ou gosto amargo na garganta. Infelizmente o mesmo não ocorre com todos os casos de RLF, o que requer um esforço adicional do médico para explicar os mecanismos da doença e convencer o paciente a aderir ao tratamento proposto. A compreensão do paciente é essencial para que ele aceite as orientações de dieta, mudanças de hábitos alimentares e mudanças de hábitos de vida, essenciais para o controle da doença, seja qual for a sua manifestação clínica. TRATAMENTO FARMACOLÓGICO A terapêutica farmacológica irá depender da gravidade e da intensidade dos sintomas. O uso de antiácidos tem alguma valia no tratamento do RLF, notadamente naqueles casos mais leves com sintomas ocasionais e achados inflamatórios muito sutis da laringe. Nesse pacientes, a simples orientação dietética associada ao uso de pastilhas anti-ácidas após as refeições e antes de dormir são suficientes para o controle da doença. A razão pela escolha de pastilhas ao invés da forma líquida é que as pastilhas permanecem mais tempo na boca,

na orofaringe e na hipofaringe, suavizando os sintomas locais e auxiliando na restituição do ph e da flora da cavidade orofaríngea, além de funcionarem como sialagogas. BLOQUEADORES H2 Os bloqueadores H2, proporcionam apenas um bloqueio parcial da secreção gástrica e por isso não são eficazes no tratamento do RLF que requer total ou quase total supressão da secreção gástrica para seu controle. É mister se que se ressalte incansavelmente a falta de resistência do epitélio respiratório às agressões químicas tanto ácidas como alcalinas. Assim, o tempo de tratamento do RLF também difere do tempo de tratamento das formas puramente digestivas da doença. O epitélio laringofaríngeo após ser exposto à agressão química crônica necessita de um período de 12 a 16 semanas para alcançar o restitutio ad íntegrum. INIBIDORES DE BOMBA PROTÔNICA Os inibidores de bomba de prótons ( IBP ), são, na atualidade, os fármacos de escolha para o tratamento do RLF, devendo ser utilizados em dose plena de supressão ácida e em duas tomadas diárias para manter as vias respiratórias livres de ácido e de pepsina ativa durante as 24 horas do dia e por todo o período de tratamento. Diversos estudos comprovam que o RLF ocorre com grande frequência durante o dia e em posição ortostática, além do refluxo noturno descrito no RGE clássico. Por isso se faz necessária uma dose matinal do fármaco para suprimir os refluxos diurnos e uma dose noturna para proteger a mucosa respiratória de episódios de refluxo em posição de decúbito. Essa medicação precisa ser mantida por um período mínimo de 12 semanas pela razões expostas anteriormente. Autores como Koufman e Wiener chegam a manter o tratamento por 6 meses a 1 ano. Muitos pacientes que conseguem equilibrar sua ingesta alimentar têm sua doença controlada em até seis meses de tratamento farmacológico. Recomenda-se que após o controle da doença seja feita a suspensão gradativa das doses de IBP, ( desmame medicamentoso ) sempre insistindo na importância de um controle alimentar e de hábitos para manter a doença sob controle. FÁRMACOS PRÓ-CINÉTICOS Em casos de RLF em sua forma isolada, tem pouca ou nenhuma utilidade, pois não há, nesses casos, comprovação de dismotilidade esofágica ou hipotonia do esfíncter esofagiano

inferior (EEI). Pacientes com associação de RLF e sintomas digestivos manifestos podem se beneficiar do uso criterioso de drogas pró-cinéticas. Quando o paciente apresenta lesão pré-neoplásica associada ao refluxo, estenose subglótica, laringoespasmos graves ou quando o paciente é um comunicador ou profissional da voz, é imperioso que se inicie tratamento agressivo imediato com IBP nas doses supracitadas e que se faça acompanhamento rigoroso da evolução. FALHA TERAPÊUTICA A falha terapêutica pode ser precoce, em casos de resistência primária ao IBP utilizado, ou tardia naqueles pacientes que têm boa resposta inicial ao tratamento medicamentoso, mas após algumas semanas voltam a ter sintomas e/ou piora dos sinais. Nesse grupo de pacientes pode estar ocorrendo uma resistência secundária ao fármaco empregado. Em casos de falha terapêutica deve-se tentar mudar o IBP ou aumentar a sua dose. Se mesmo assim não houver resposta satisfatória, outras possibilidades diagnósticas devem ser cogitadas. Não podemos nos esquecer que existe o refluxo não ácido, constituído por sais biliares, que é muito mais agressivo à mucosa laringofaríngea do que o ácido e que é de difícil diagnóstico e controle. Não dispomos de medicação eficaz para esse tipo de refluxo que é alcalino e altamente danoso ao epitélio respiratório. Os IBPs atuam indiretamente no refluxo não- ácido por reduzirem a acidez que ativa os sais biliares. Drogas pró-cinéticas, ao melhorarem o esvaziamento gástrico podem auxiliar no tratamento desses indivíduos, mas muitas vezes o único recurso eficaz para esse tipo de refluxo é a fundoplicatura. A cirurgia de fundoplicatura do estômago visa aumentar a resistência do EEI.Pode ser feita via aberta clássica ou via laparoscópica, sendo esta, atualmente,a mais utilizada. Esta cirurgia não é isenta de complicações, mas passa a ser o tratamento de escolha para pacientes com manifestações clínica mais graves como laringoespasmos e estenose subglótica e também pode ser indicada para pacientes que apresentam boa resposta terapêutica mas não conseguem ficar assintomáticos sem medicação. Deve-se ter muito cuidado na indicação de fundoplicatura do estômago, pois os índices de sucesso na resolução dos problemas do RLF são muito baixos. Supomos que grande parte dos insucessos se deve a indicação inadequada em casos nos quais não havia certeza absoluta do diagnóstico de RLF. RECIDIVAS

A DRGE bem como o RLF apresentam grande tendência à recidiva, sendo essencial a incorporação de hábitos de vida saudáveis para seu controle sem tratamento medicamentoso. POSSIVEIS IATROGENIAS NO TRATAMENTO DO RGE E DO RLF O uso prolongado de IBP resulta inevitavelmente em uma condição de acloridria que como sabemos não é fisiológica. O pepsinogênio para se transformar em pepsina ativada necessita de ph abaixo de 2 ou mais precisamente entre 0,9 e 2,0. Se por um lado a redução dos níveis de pepsina ativada tem efeitos benéficos na regeneração do epitélio respiratório danificado pelo refluxo, por outro lado o desdobramento das proteínas em peptídeos que é o principal processo digestivo que ocorre no estômago resultará prejudicado em condições de acloridria com inevitáveis consequências para o metabolismo dos protídeos e para a homeostase. A acloridria é responsável por outras potenciais complicações, dentre as quais poderíamos citar : hipergastrinemia, gastrite atrófica, hiperplasia de células enterocromafínicas e carcinóide gástrico. Outra consequência da acloridria é a redução ou abolição da liberação do fator intrínseco pelas células oxínticas que pode levar a deficiência de absorção de vitamina B12, ocasionando anemia perniciosa e manifestações neuríticas tanto periféricas como centrais. A gastrite atrófica é um conhecido fator precursor do carcinoma gástrico. O uso prolongado de IBP pode, de forma indireta, ocasionar uma deficiência de ferro, uma vez que sua absorção depende de meio ácido. Há, na literatura, relatos de anemia após o uso prolongado de IBP. Há também relatos de infecção pelo clostridium difficile em pacientes com acloridria. O ph gástrico de jejum em indivíduos saudáveis é de cerca de 2,1 em homens e 2,7 em mulheres ao passo que em pacientes com hipocloridria ou acloridria, como ocorre no uso de IBP em dose plena, estes valores podem chegar a 7,4 e 7,6 em média, desviando-se, portanto, das condições fisiológicas e tornando-se desfavoráveis ao equilíbrio da homeostase nutro-neuro-metabólica. Diante de tais constatações seria fundamental a participação efetiva do nutrólogo na condução dos casos de DRGE e de RLF, uma vez que a mudança de hábitos de vida e a orientação nutrológica individualizada para cada caso em particular constituem ferramentas indispensáveis para que os pacientes se tornem independentes do uso de fármacos ou façam seu uso pelo menor tempo possível.

CONCLUSÕES A DRGE pode cursar com manifestações bastante distintas. Sua forma laringofaríngea pode estar implicada em cerca de 60% das queixas laríngeas de pacientes que procuram o otorrinolaringologista. As manifestações clínicas diferentes tornam bem evidentes as duas formas de DRGE. Apesar dos estudos incessantes sobre o RLF, ainda não se tem a perfeita compreensão dos mecanismos envolvidos nessa forma peculiar de refluxo. Koufman acredita que um dos fatores responsáveis pela laringite de refluxo é a pepsina que refluiria com o conteúdo gástrico e seria ativada pelo ph ácido. Estudos tem sido desenvolvidos com o fito de dosar a pepsina salivar em pacientes co RLF, mas ainda não dispomos desse teste na prática clínica. Admite-se que além do ácido, do álcali e da pepsina contidos no refluxo, parece haver outros fatores locais que justificam a hipersensibilidade do epitélio respiratório de alguns indivíduos em relação a outros, como por exemplo, a deficiência salivar do fator de crescimento epidérmico ( EGF ), que é uma das muitas proteínas biologicamente ativas produzidas pelas glândulas salivares e pelo epitélio gástrico que atua na rápida regeneração desse epitélios. As pesquisas nessa área ainda são muito incipientes. Os pacientes com DRGE precisam dos cuidados de profissionais de várias áreas da medicina, sendo necessário o engajamento de diferentes especialistas para o diagnóstico precoce, orientação e tratamento adequados. Destarte, a relação entre o gastroenterologista, o pediatra, o otorrinolaringologista e o pneumologista deve se tornar bastante estreita, para que todos possam atuar juntos. Estes especialistas e também os pacientes se beneficiariam muito se soubessem que o nutrólogo tem de fato e de direito todas as condições de atuar de forma bastante positiva em todas as fases do acompanhamento desses pacientes, desde a orientação para o diagnóstico, passando pelo tratamento, e colaborando de forma indiscutivelmente eficaz após o desmame farmacológico. Ninguém melhor do que o nutrólogo para orientar sobre mudança de hábitos de vida e alimentação saudável e nutrologicamente balanceada. O objetivo maior dessa comunhão é compartilhar o conhecimento de cada um tendo sempre como escopo o bem estar do paciente.

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