ANÁLISE TEÓRICA-COMPUTACIONAL DE LAJES LISAS DE CONCRETO ARMADO COM PILARES RETANGULARES Liana de Lucca Jardim Borges,1,2 1 Pesquisadora 2 Curso de Engenharia Civil, Unidade Universitária de Ciências Exatas e Tecnológicas, UEG RESUMO Com a análise de diversas lajes lisas da literatura, que abordam o estudo da influência da relação entre os lados do pilar de apoio (c máx /c mín ) na resistência última das lajes, foi possível propor um coeficiente para a norma brasileira NBR6118 (2003), de forma que se considere o esta relação na expressão empírica. Foram observados resultados satisfatórios para lajes apoiadas em pilares com c máx /c mín superior a 2. O método dos elementos finitos foi usado em simulações computacionais e os resultados de força cortante mostraram que os maiores valores são observados mais próximos das extremidades do pilar retangular, sendo que os esforços no trecho central da maior dimensão do pilar são menores. Isto configura uma polarização da força cortante para as extremidades, e sugere que o combate ao puncionamento pode ser mais efetivo em regiões próximas das extremidades dos pilares. Palavras-chave: laje lisa, puncionamento, pilar retangular Introdução O uso de lajes lisas tem se tornado freqüente, não apenas devido a diversas pesquisas desenvolvidas, mas também pelo fato de apresentarem vantagens em relação às lajes convencionais, tais como, economia de mão-de-obra e materiais, rapidez na execução e facilidade de relocação de paredes, devido à ausência de vigas para auxiliar na transmissão das cargas, como mostra a Figura 1. No caso de pilares retangulares, estes são utilizados, na maioria dos casos, por razões arquitetônicas e estruturais, especialmente em garagens de estacionamentos, onde atuam como pilar-parede projetado para resistir a esforços horizontais. Laje Pilar Figura 1 Modelo de laje lisa 366
A norma brasileira de projeto de estruturas de concreto armado NBR 6118 (2003), assim como códigos internacionais de projeto, apresentam recomendações de projeto baseadas em trabalhos empíricos, e, em seu caso especial, não fornece prescrições relacionadas à geometria da área carregada da laje, que é um aspecto determinante na resistência da estrutura. Desta forma, pesquisas teóricas, experimentais e numéricas sobre esse tema podem conduzir a uma possível contribuição no projeto de lajes lisas de concreto armado com pilares retangulares. A pesquisa tem como objetivos: baseando-se em resultados experimentais, propor um coeficiente que relacione as dimensões do pilar ou área carregada, na expressão empírica da norma brasileira NBR 6118 (2003), para estimar a resistência ultima à punção de lajes lisas de concreto armado. Adicionalmente, utilizando um programa computacional, baseado no método dos elementos finitos, comparar deslocamentos verticais experimentais com teóricos, e analisar a distribuição de forças cortantes em torno do pilar e no perímetro de controle situado a 2.d, conforme recomenda a norma, das lajes ensaiadas por pesquisadores. Materiais e Métodos Estudo teórico foram analisadas, neste estudo, apenas as lajes lisas solicitadas nas duas direções, dentre as disponíveis na literatura. O estudo consistiu na análise da resistência ultima ao puncionamento das lajes, enfocando a influência da relação entre os lados do pilar (c máx /c mín ). Os principais códigos de projeto que tratam do assunto (ACI (2002), CEB-FIP MC90 (1991), NBR6118 (2003)) foram utilizados para a determinação da carga última, de forma a observar a influência das dimensões do pilar na resistência ultima. A NBR 6118 (2003) considera que a superfície de ruptura está localizada a 2.d (d é a altura efetiva da laje) da face do pilar, como mostra a Figura 2. É apresentada na equação 1, a expressão empírica da norma brasileira para estimar a carga última de lajes lisas sob punção. Com os resultados experimentais de carga última das lajes da literatura, características mecânicas e geométricas e as parcelas componentes da expressão de cálculo da NBR 6118 (2003), estabeleceu-se uma relação com o parâmetro c máx /c mín e, assim, definir um coeficiente a ser inserido na expressão citada (equação 1). 1 ( 100. ρ. f ).u. d 200 V 0,17. 1. 3 ck = + c d eq. (1) onde V ck é a força nominal resistente, d é a altura efetiva da laje, ρ é a taxa de armadura flexão, f c é a resistência à compressão do concreto e u é o perímetro de controle. 367
2.d Fissuração antes da ruptura Inclinação entre 25 e 30 Cisalhamento resistido pela força de compressão radial inclinada Fissuração na ruptura 2.d Figura 2 Modo de ruptura de uma laje lisa, de acordo com CEB (1991), e posicionamento do perímetro de controle, de acordo com NBR 6118 (2003) Análise computacional através de um programa computacional baseado no método dos Elementos Finitos, foi feita uma modelagem das lajes da literatura. Nesta modelagem foram atribuídas às lajes, as reais características geométricas (dimensões da laje e do pilar, espessura da laje, distância entre as forças aplicadas) e propriedades mecânicas (resistência ao escoamento do aço f ys, resistência à compressão f c, módulo de elasticidade E, coeficiente de Poisson do concreto ν), e também, as condições de carregamento e apoio adotados nos ensaios. A discretização da estrutura foi feita através da determinação de uma malha de elementos finitos (refinamento da malha) que atendesse a necessidade de modelagem dos pilares, o que variou de acordo com as lajes testadas. Após o fornecimento de todas as informações necessárias à modelagem da estrutura, foi possível processá-las e obter resultados de deslocamentos verticais e distribuição de força cortante, dentre outros esforços. Resultados e Discussão Estudo teórico a consideração do coeficiente 1,09. 0, 045 ( ) c máx c mín, incorporado na expressão empírica da NBR6118 (2003), forneceu estimativas teóricas V Teór superiores às da própria norma, consequentemente, relações V Exp/ V Teor menores. O coeficiente proposto conduziu a resultados contra a segurança para algumas lajes da literatura (Gomes, 1991; Hawkins et al., 1971; Oliveira, 2003), assim como faz a NBR6118 (2003). Para outras lajes (Borges, 2004; Teng et al.,1999; Silva, 2003 e Al-Yousif & Regan, 2003), a expressão empírica com o coeficiente proposto forneceu resultados mais próximos dos experimentais, quando comparada com a expressão original da norma brasileira, como mostra a Tabela 1. Observa-se que os valores de média, desvio padrão e coeficiente de variação obtidos, respectivamente, para a norma e para a proposta, foram, 1,06, 0,12, 11,2% e 1,01, 0,11, 11,0% A Figura 3 apresenta um gráfico com os resultados obtidos pela expressão da norma e pela inclusão do coeficiente proposto, e também, as linhas de tendência definidas pelos resultados. 368
Tabela 1 Relação V Exp/ V Teor para lajes da literatura solicitadas nas duas direções AUTOR LAJE c máx /c mín V Exp/ V Teor NBR6118/03 NBR6118/03_PROPOSTA GOMES L1 1 0,96 0,88 L1A 1 1,00 0,92 L42 2 1,16 1,09 L42A 2 1,10 1,04 L45 3 1,12 1,08 BORGES L46 4 1,09 1,07 L41 1,67 1,13 1,06 L41A 1,67 1,07 1,00 L43A 3 1,12 1,08 L44 4 1,06 1,04 7 3 0,93 0,89 HAWKINS 8 4,3 0,91 0,89 9 2 1,02 0,96 AL- 2 5 0,93 0,92 YOUSIF 4 1 1,10 1,01 OC11 1 1,17 1,07 TENG OC13 3 1,14 1,10 OC15 5 1,01 1,00 L1 1 1,07 0,98 SILVA L2 2 1,33 1,26 L3 3 1,36 1,31 L1C 1 1,01 0,93 L2C 2 0,94 0,89 OLIVEIRA L3C 3 0,94 0,90 L4C 4 0,94 0,91 L5C 5 0,90 0,88 Média 1,06 1,01 Desvio padrão 0,12 0,11 Coeficiente de variação (%) 11,2 11,0 1,15 NBR6118/03 1,10 VExp/VTeor 1,05 1,00 0,95 NBR6118/03_PROPOSTA Potência (NBR6118/03) 0,90 0 1 2 3 4 5 6 c máx /c mín Potência (NBR6118/03_PROPOSTA) Figura 3 - Tendência das estimativas das expressões empíricas para lajes carregadas nos quatro bordos e apoiadas em pilares com c mín /c mín variando entre 1 e 5 369
Análise computacional nas lajes apoiadas em pilares quadrados, a distribuição de forças cortantes foi praticamente uniforme. Nas lajes apoiadas em pilares retangulares, com o aumento da relação c máx /c mín, as forças cortantes foram maiores nas extremidades dos pilares, ou seja, as regiões situadas ao longo dos maiores lados dos pilares foram menos solicitadas. Observa-se a polarização das forças cortantes, e isso ocorre tanto no perímetro do pilar quanto no perímetro de controle situado a 2.d do pilar. Nas extremidades do pilar ocorre uma inversão do diagrama de esforço cortante devido a carga aplicada da reação do pilar. A Figura 4 apresenta a distribuição de força cortante sob carga de 300 kn, nas direções x e y, na face do pilar da laje L46 de Borges (2004) com pilar retangular (c máx /c mín = 4). 8-41-68-147 1866 0 1437 147 68 41-8 7-4 -39 35-49 -11 0 11 49 39 4-35 -7-1437 -1866 L46_300 kn (direção y - face pilar) L46_300 kn (direção y - 2d do pilar) 1534 1854 165 13 35 50 12 7-7 -12-50 -35-13 -165-6 31 38 62 0-62 -38-31 6-1854 -1534 L46_300 kn (direção x - face pilar) L46_300 kn (direção x - 2d do pilar) Figura 4 Diagrama de esforço cortante da laje L46 de Borges (2004), nas direções x e y) em kn/m Em todas as lajes analisadas, os deslocamentos teóricos foram praticamente iguais aos observados experimentalmente, no inicio do carregamento. Com o acréscimo de carga, os deslocamentos experimentais superaram os valores teóricos, principalmente para cargas superiores à carga correspondente ao momento da fissuração. Isto ocorre porque o programa efetua cálculos considerando o material com comportamento sempre no regime elásticolinear, ou seja, sempre com o concreto não fissurado. Para as lajes de Borges (2004), para um carregamento equivalente a 300 kn, por exemplo, a diferença entre os deslocamentos teórico e experimental se apresentou entre 55% e 130%. 370
Conclusão A proposta de incluir a relação c máx /c min na expressão da NBR6118 (2003) forneceu resultados teóricos próximos dos experimentais para lajes com pilares retangulares. A distribuição de forças cortantes, ao longo do perímetro critico da NBR6118 (2003) difere daquela apresentada para regiões mais próximas dos pilares. As forças cortantes tendem a ser mais intensas nas extremidades que ao longo dos maiores lados, para seção da face do pilar e a 2.d do mesmo. Pelo fato da ruptura por puncionamento ser um fenômeno que ocorre sem aviso prévio e abruptamente, os maiores esforços que atuam nas imediações do pilar podem ser combatidos com a utilização de mecanismos que aumentem a resistência da laje nas regiões próximas à extremidade do pilar. Referências Bibliográficas? ACI Committee 318. 2002. Building Code Requirements for Reinforced Concrete and Commentary. American Concrete Institute. Farmington Hills, Michigan, 2002. 391 p.? Al-Yousif, A.T., Regan, P.E. 2003. Punching resistances of rc slabs supported by large an/or elongated columns. The Structural Engineer. March, 2003. pp. 130-134.? Associação Brasileira de Normas Técnicas NBR 6118. 2003. Projeto de Obras de Concreto Armado Procedimento. Rio de Janeiro, 2003.? Borges, L. L. J. 2004. Comportamento ao Puncionamento de Lajes Cogumelo de Concreto Armado com Pilares Retangulares e Furos de Grandes Dimensões. Tese de Doutorado em Estruturas e Construção Civil. Universidade de Brasilia. Brasilia, 2003.367 p.? Committe Euro-International du Beton. 1991.CEB-FIP Model Code 1990: Final Draft. Bulletin D'Information 204. Lousanne, July 1991.? Hawkins, N.M.; Fallsen, H.B.; Hinojosa, R.C. 1971. Influence of Column Rectangularity on the Behavior of Flat Plate Structures. ACI Publication SP-30: Cracking, Deflection, and Ultimate Load of Concrete Slab Systems. Detroit, 1971. pp.126-146? Oliveira, D.R.C. 2003. Análise experimental de lajes cogumelo de concreto de alta resistência com pilares retangulares.tese de Doutorado em Estruturas e Construção Civil. Universidade de Brasília. Brasília, Agosto 2003. 183 p.? Silva, J.A. Punção em Lajes Cogumelo: Pilares Retangulares, Furos e Armadura de Cisalhamento. Dissertação de Mestrado em Engenharia Civil. Universidade Federal de Goiás, Goiânia, Julho 2003. 171 p.? Teng, S., Kuang, K. L., Cheong, H. K. 1999. Concrete Flat Plate Design Findings of Joint BCA-NTU. R&D Project, Singapure, 1999. 15 p. 371