Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos 327

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Transcrição:

Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos 327 LETRAMENTO LITERÁRIO: UMA PRÁTICA POSSÍVEL NO ENSINO MÉDIO Isaquia dos Santos Barros Franco (UFT) isaquiasbf@gmail.com 1. Considerações iniciais O ensino da literatura é um dos tantos temas acerca do quais estudiosos e pesquisadores vêm discutindo, na perspectiva de propor estratégias que aprimorem tal ensino, de modo a despertar nos alunos o gosto pela leitura, uma vez que estatísticas e exames indicam que este não atingiu ainda uma condição satisfatória, posto que, não raramente, é possível encontrar pessoas de nível superior lendo pouco ou quase nada. Em análises a resultados desses estudos e pesquisas verificamos que embora com abordagens diversificadas a questão a respeito do ensino de literatura de modo geral deixa evidente a necessidade de uma nova metodologia do ensino dessa disciplina, sobretudo no ensino médio onde ele é abstrato, fragmentado e desvinculado da realidade do aluno. Como forma de refletir sobre essas questões, e propondo caminhos para se chegar ao letramento literário no ensino médio, apresentamos, nesse artigo, uma proposta didática tomando como referência o modelo de sequência expandida de Cosson (2006). Utilizaremos como corpus literário o conto Missa do Galo de Machado de Assis. 2. Letramento literário O conceito de letramento apresentado por Soares (2006) como estado ou condição de quem não apenas sabe ler e escrever, mas cultiva e exerce as práticas sociais que usam a escrita e a leitura (SOARES, 2006, p. 18), já é consenso no nosso país. O letramento literário seria, então, definido como estado ou condição de quem não apenas é capaz de ler texto em verso e prosa, mas dele se apodera deixando a condição de simples expectador para a condição de leitor literário ou mais precisamente [...] o processo de apropriação da literatura enquanto construção literária de sentidos (PAULINO & COSSON, 2009, p. 67). Nessa definição, é relevante entender que o letramento literário não é apenas uma habilidade pronta e acabada de ler

328 Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos textos literários, visto que exige uma atualização permanente do leitor em relação ao universo literário. E é ai que reside o problema nas instituições de ensino, uma vez que em sua maioria elas não têm conseguido instigar a capacidade reveladora que a literatura tem de incentivar o aluno a ler sempre mais. A leitura literária quando empregada corretamente poderá se transformar no início de uma longa e prazerosa caminhada com outras leituras. É no ensino médio que essa caminhada deve tomar um rumo que reforce o letramento para que os alunos possam se tornar aptos a absorver o conteúdo colocado no ensino fundamental e transformá-lo em competência linguística. O letramento literário no ensino médio deve ser feito a partir da construção do gosto do aluno pela literatura. O aluno deve se sentir próximo da literatura para que essa faça parte dele e o ajude a desenvolver suas capacidades de escrita. O letramento literário existe a partir do incentivo da cultura da leitura literária. E isso pode ser feito de várias maneiras diferentes. Uma dessas formas é apresentada por Cosson (2006) em Letramento Literário: Teoria e Prática, no qual propõe uma sequência de atividades que poderá orientar o professor no processo de abordagem do texto escolhido. A utilização dessa sequência permite que se vá além da leitura, tornando a atividade uma fonte de conhecimento e de prazer. Tal sequência constitui o objetivo central de nossa proposta didática elaborada para o gênero conto. 3. O letramento literário no ensino médio: proposta didática Com base nos elementos teóricos aludidos, apresentamos como sugestão uma proposta didática de leitura para o ensino médio baseada nos contos de Machado de Assis. Essa escolha se justifica porque entendemos que o gênero textual conto apresenta uma facilidade técnica para o seu entendimento, pelo fato de se constituir numa narrativa breve, possibilitando aos alunos que não possuem maiores informações literárias adentrarem prazerosamente no mundo encantado da leitura. Neste sentido, Silva (2005) explica que: A leitura de contos pode estimular o aluno-leitor a encontrar, na leitura literária, uma forma lúdica de entender melhor sua própria realidade. Ao ler

Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos 329 narrativas curtas, que exijam uma resposta mais rápida e dinâmica do receptor, o aluno pode se sentir mais atraído pelo texto. (SILVA, 2005, p. 93). Para a escolha do escritor Machado de Assis, considerou-se que este foi e ainda continua sendo, um dos mais excepcionais contistas da nossa literatura, isso se deve ao fato de seus contos apresentarem uma riqueza de significados que prendem a atenção do leitor, uma vez que podem ser estabelecidas relações com o contexto dos leitores da atualidade, pois, a análise da alma humana feita por ele nestes, pode referir-se a qualquer época e povo. Assim, mediante essas escolhas, interessa explicar o método da proposta didática, nesse sentido, apropriamo-nos das proposições de Rildo Cosson (2006), proferidas no livro Letramento Literário, as quais, partindo do ato de leitura, sugerem sequências metodológicas, sendo uma sequência básica e uma sequência expandida. No que concerne a nossa proposta, relatamos uma experiência realizada com alunos do primeiro ano do ensino médio que aborda a segunda sequência que é baseada em algumas etapas, a saber: motivação, introdução, leitura, primeira interpretação, contextualização, segunda interpretação e expansão. Por vezes essas etapas deixam de ser idealizadas no planejamento das atividades de sala de aula, sobretudo no que se refere ao item motivação. Entretanto, preparar o aluno para recepcionar o que ele vai ler é fundamental. Nesse sentido, a primeira etapa da sequência, consiste exatamente na motivação, que segundo Cosson (2006), deve anteceder todo o processo referente ao trabalho com o texto. Trata-se, portanto, de despertar o interesse do aluno pela leitura do texto. Por isso, antes de mais nada, apresentamos ao aluno o conto Missa do galo em áudio, interpretado no programa "Categorias Literárias: A Descoberta do Conto", produzido pela Biblioteca Virtual do Estudante de Língua Portuguesa (BibVirt). O conto está dividido em quatro partes, cada uma com cinco minutos de duração. A ideia é apresentar somente a primeira parte aos alunos como forma de motivá-los a ler o texto na íntegra. O áudio completo é de domínio público, todas as partes estão disponíveis para download livre. Percebemos que essa atividade se constitui num incentivador da leitura, visto que propôs uma maneira mais diversificada de incentivar a leitura.

330 Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos A segunda etapa é a de introdução. Aqui o objetivo é apresentar o autor do conto aos alunos. Com esse intuito incitamos uma conversa acerca do gênero textual conto e sobre o autor Machado de Assis. Com esta atividade verificamos que os alunos sentiram-se estimulados a expressar opiniões, além de refletirem sobre o que significa a leitura para eles. Também procuramos destacar aos alunos o porquê de Machado de Assis ser um dos mais importantes contistas de todos os tempos, a multiplicidade de sua obra que conta com mais de 200 contos, e que percorrendo do tradicional ao moderno ele adotou uma diversidade temática que lhe possibilitou encontrar condições de representar a arte e o artista na sociedade. Na terceira etapa fizemos a leitura completa do texto. Essa etapa foi interessante porque pelo fato dos alunos já terem tido contado através do áudio com a primeira parte conto e por este abordar o tema da sedução, eles estavam ansiosos para saber o que aconteceria e então concluíram que na verdade, nada acontece, mas toda narrativa se desenrola em torno desse nada. Em seguida os alunos foram levados à sala de informática, local no qual sugerimos que cada um escolhesse um dos contos disponíveis em http://www.dominiopublico.gov.br e fizessem a leitura. O ideal é que os alunos buscassem ler o conto que correspondesse aos seus interesses, às suas expectativas. Destacamos que a diversidade de contos estimulou a curiosidade e desenvolveu o gosto e o interesse pela leitura de outros contos disponíveis no site, suscitando, assim, a prática do ato de ler. Vale assinalar que a atividade de leitura deve receber a orientação do professor de modo a facilitar o processo de interpretação e consolidação da sequência, pois como afirma Cosson (2006) a leitura escolar precisa de acompanhamento porque tem uma direção, um objetivo a cumprir, e esse objetivo não deve ser perdido de vista. (COSSON, 2006, p. 62). Embora o autor trate da leitura literária como um todo, no caso do conto, que é um texto curto, este acompanhamento do professor será no sentido de instigar os alunos para que estes descubram sentidos embutidos no gênero. A quarta etapa é a mais subjetiva entre todas as outras, compreende a atividade de primeira interpretação do texto, que, a priori, deve ser pessoal, à qual apenas posteriormente o professor agrega informações, o momento em que fica explícito o seu papel de mediador, porém, é necessário enfatizar o caráter de atividade prática, de algo que requer a ação

Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos 331 dos alunos e não a simples exposição do professor. (Ibidem, p. 121). Como forma de levar o aluno a apresentar a impressão geral do que leu, solicitamos uma produção textual em forma de depoimento. Feita essa primeira interpretação, é o momento de contextualização, a etapa mais significativa do letramento, já que proporciona ao professor preparar um repertório de conhecimentos para seus alunos. A contextualização é desdobrada em diversos itens, todos responsáveis por adicionar informação à leitura. Como nos apresenta Cosson (2006), o número de contextos a serem explorados na leitura de uma obra é teoricamente ilimitado, mas ele indica sete contextualizações. A primeira contextualização é a teórica, a qual explicita as ideias que sustentam ou estão encenadas na obra. Depois vem a contextualização histórica, que diz respeito à época ou o período da publicação do texto, deve-se, portanto, relacionar com a sociedade que o gerou ou com a qual ele se propõe a abordar internamente. Em seguida temos a contextualização estilística, cujo papel é analisar o diálogo entre obra e o período, mostrando como uma alimenta o outro. Mesmo se tratando de uma narrativa curta, o conto apresenta quase todas as marcas estilísticas machadianas. Temos também a contextualização poética referente à estruturação e composição do texto e como ele se organiza. Já a contextualização crítica analisa outras leituras que tem por objetivo contribuir para a ampliação do horizonte de leitura da turma. A contextualização presentificadora busca a correspondência da obra com a atualidade e a contextualização temática define o tema ou temas expressos na obra. Como sempre é possível acrescentar ou ampliar um contexto já dado, nessa etapa é importante realizar pesquisas participativas que levem os alunos a fazer registros e assim aliá-la à segunda interpretação, que aborda aspectos específicos do texto literário, podendo centrar-se sobre uma personagem, um tema, um traço estilístico, questões contemporâneas, etc. No caso do gênero em estudo, contextualizá-lo com a atualidade e produzir o seu próprio conto a partir de um fato significativo e interessante vivenciado seria uma boa maneira de perceber se os alunos se envolveram com a leitura. Por fim, a expansão busca destacar a possibilidade de diálogo que toda obra articula com os textos que a precederam ou que lhes são contemporâneos ou posteriores. Esta etapa pode utilizar-se de recursos como filmes, documentários, textos, etc. Nesse momento é pertinente apresentar o livro Missa do Galo: Variações Sobre o Mesmo Tema, organizado

332 Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos por Osman Lins. Nessa obra, seis renomados escritores recriam o conto Missa do Galo de Machado de Assis, fazendo uma homenagem ao autor. No decorrer dessa etapa alguns contos foram superficialmente analisados, levando-se em consideração as relações intertextuais 4. Considerações finais Nesse artigo, apresentamos uma proposta didática com encaminhamentos metodológicos que julgamos adequados para a leitura de textos literários. E após sua efetivação, podemos afirmar que a mesma é passível de aplicação em sala de aula e atinge um excelente resultado, haja vista o desfecho junto à turma objeto desta intervenção. Acreditamos tratar-se de uma estratégia interessante com a leitura de contos, as quais podem ser aplicadas em sala de aula, na tentativa de despertar o gosto pela leitura e contribuir para a formação de um leitor com proficiência. Além disso, com essa proposta, desfazemos a concepção de que ler um texto literário é difícil e complexo, sobretudo quando se trata de Machado de Assis. Dessa forma, recomenda-se a utilização deste material, como sugestão de práticas pedagógicas com a leitura no ensino médio. São apenas sugestões que podem ser utilizadas em sala na íntegra ou associá-las a outras propostas, de acordo com a criatividade do professor e interesse da turma. Sem dúvida alguma, sabemos que as aulas de literatura podem ficar mais interessantes se o professor motivar seus alunos, seja na maneira como os convida para a leitura do texto, seja nas estratégias que utiliza para abordar a leitura empreendida. O professor deve promover oportunidades para que haja intenso diálogo entre leitor e texto, especialmente aproximando as questões relativas aos saberes e experiências que se dão no plano ficcional da vivência real de seus alunos. Para conseguir tal intento, seria interessante que ele buscasse conhecer e aplicar novas metodologias que dinamizassem as suas aulas de literatura, como a sugestão que acabamos de apresentar. Acreditamos poder, a partir desses dados e da reflexão sobre a sala de aula, indicar rumos que auxiliem os professores interessados na formação do leitor de literatura a pensar suas práticas: o que delas deve ser mantido, o que ainda precisa ser reformulado e construído.

Círculo Fluminense de Estudos Filológicos e Linguísticos 333 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS BARBOSA, Begma Tavares. Letramento literário: escolha de jovens leitores. Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/32ra/arquivos/trabalhos/gt10-5527-- Int.pdf>. Acesso em: 19-08-2012. BIBLIOTECA Virtual do Estudante de Língua Portuguesa (BibVirt). Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/pesquisaobraform.do?sele ct_action=&co_autor=44138>. COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2006. DOMÍNIO Público. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br>. KATO, Mary. No mundo da escrita: uma perspectiva psicolinguística. São Paulo: Ática, 1986. PAULINO, Graça; COSSON, Rildo. Letramento literário: para viver a literatura dentro e fora da escola. In: RÖSING, Tânia M. K.; ZILBER- NAM, Regina (Orgs.). Escola e leitura: velha crise, novas alternativas. São Paulo: Global, 2009. SILVA, Ivanda Maria Martins. Literatura em sala de aula: da teoria à prática escolar. Recife: Programa de Pós-Graduação da UFPE, 2005. SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. TFOUNI, Leda Verdiani. Alfabetização e letramento. São Paulo: Cortez, 1995. TODOROV, Tzvetan. A literatura em perigo. Rio de Janeiro: DIFEL, 2009.