fls. 327 Registro: 2015.0000905XX ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 1030XXX-17.2014.8.26.0001, da Comarca de, em que é apelante GAFISA S/A, é apelada RUTH M. C. O. ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PERCIVAL NOGUEIRA (Presidente), PAULO ALCIDES E EDUARDO SÁ PINTO SANDEVILLE., 26 de novembro de 2015. PERCIVAL NOGUEIRA RELATOR Assinatura Eletrônica
fls. 328 Apelação nº 1030XXX-17.2014.8.26.0001 Apelante: Gafisa S/A Apelado: RUTH M. C. O. Comarca: Comarca: / Foro Regional de Santana JUÍZA: Carina Bandeira Margarido Paes Leme rescisão contratual Promitente compradora que não tem mais condições financeiras para arcar com o negócio Ação julgada procedente com devolução das quantias pagas e retenção de 10% (dez por cento) Admissibilidade Entendimento dos artigos 51, inciso IV, 1º, inciso III e 53 do Código de Defesa do Consumidor Sentença mantida Recurso desprovido. Trata-se de recurso de apelação (fls. 234/246) interposto pela empresa Gafisa S. A. contra a r. sentença de fls. 224/226, cujo relatório se adota, que julgou procedente a ação de rescisão contratual que lhe foi ajuizada por Ruth M. C. O., para o fim de, operada a rescisão contratual e declarada a abusividade da cláusula contratual 5.4, condenar a ré a restituir 90% dos valores pagos pela autora, com correção monetária desde os respectivos desembolsos e juros moratórios legais a partir da citação. Restou também condenada ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em 15% do valor da condenação. Foram interpostos embargos de declaração (fls. 228/229), sendo o recurso acolhido para suprir a omissão apontada, ficando a unidade liberada desde logo, para que a ré dê a destinação Apelação nº 1030XXX-17.2014.8.26.0001 - /Reg. Santana 2
fls. 329 entendida devida (fls. 232). Busca a apelante a reforma da r. sentença, com a improcedência da ação, alegando, que não houve qualquer tipo de oposição ao pedido de rescisão contratual, sendo que a apelada tomou inequívoco conhecimento dos seus termos e condições, bem como em relação à retenção de valores da cláusula 5.4, não se opondo aos termos e condições. Aduz que há impacto com a rescisão do contrato e essa perda é reposta a partir da retenção imposta nas cláusulas contratuais. Frisa que não houve qualquer inadimplemento contratual perpetrado pela apelante, que vem cumprindo religiosamente o cronograma de obras e parcelas avençado com a apelada, não podendo ser prejudicada pela resolução unilateral, com uma retenção em percentual bem inferior ao pactuado. Se outro for o entendimento, o que admite apenas por amor ao debate é que seja determinada a retenção de 30% do montante pago. Postula a apelante que as normas do CDC sejam aplicadas somente de forma supletiva/subsidiária ao presente caso, levando-se em conta que a matéria é regulada por legislação especifica. Recebido o apelo em ambos os efeitos (fls. 248), foram apresentadas contrarrazões (fls. 249/262). Oportunizada a manifestação Apelação nº 1030XXX-17.2014.8.26.0001 - /Reg. Santana 3
fls. 330 acerca do julgamento virtual, não houve oposição. É o relatório. Primeiramente, é de se anotar que, com a entrada em vigor do Código de Defesa do Consumidor, a estrita aplicação do princípio da pacta sunt servanda foi mitigado. As partes se enquadram nas definições dos artigos 1º e 3º da Lei 8.078/90 e a aplicação de tal legislação tem cunho protetivo. Assim, a lide deve ser analisada à luz da legislação consumerista sendo perfeitamente cabível a resilição de contrato de venda e compra quando da ocorrência de fato superveniente que venha a afetar a situação financeira de um dos contratantes. As partes firmaram Contrato de Compra e Venda e Outras Avenças em 14/09/2012, tendo por objeto o apartamento 92, localizado no 9º andar do Empreendimento denominado Smart Alto de Santana (fls. 19/48). Sob a alegação de falta de recursos a apelada, desde março de 2014, solicitou a apelante o Distrato amigável do Contrato, não sendo atendida. Como ensina Orlando Gomes, o distrato, em síntese, é um contrato para acabar outro contrato (in Contratos, pág. 186, Editora Forense, 2ª edição). Portanto, o distrato rege-se pelas mesmas disposições relativas ao contrato e, por estar caracterizada a relação de consumo, obedece às disposições do Código de Defesa do Consumidor, Apelação nº 1030XXX-17.2014.8.26.0001 - /Reg. Santana 4
fls. 331 inclusive do seu artigo 53. Assim é que a cláusula 5.4, b.4 do documento de fls. 33, que determina a devolução de somente 60% (sessenta por cento) dos valores pagos, coloca a apelada em situação excessivamente desvantajosa, ofendendo não só o artigo 53, como também o art. 51, incisos II e IV, e 1º, incisos I e III, da Lei 8078/90. Nesse particular é de se anotar que, em atenção ao disposto no art. 413, do Código Civil (antigo art. 924 do Código Civil de 1916), a cláusula penal que prevê a perda das quantias pagas pode ser reduzida pelo juiz, proporcionalmente, em patamar justo, a evitar o enriquecimento indevido a qualquer das partes contratantes. E, em consonância com este entendimento, vem decidindo o Egrégio Superior Tribunal de Justiça que: "A cláusula contratual que prevê a perda das importâncias pagas, no caso de inadimplemento dos promissários compradores, tem caráter de cláusula penal compensatória, podendo o juiz, reduzila proporcionalmente, conforme lhe faculta o artigo 924 do Código Civil" (cf. julgamento de 30.3.92, do Recurso Extraordinário n. 16.239, ementa publicada no DJU de 18.5.92, pág. 6.982 e de 23.8.91 do Recurso Extraordinário n. 8.354, ementa publicada no DJU de 7.10.91 do Recurso Extraordinário n. 8.354, ementa publicada no DJU de 7.10.91, pág. 13.963, ambos relatados pelo Ministro Nilson Naves). O Direito não permite cláusulas que impliquem no desequilíbrio das partes em evidente enriquecimento sem causa, ou seja, Apelação nº 1030XXX-17.2014.8.26.0001 - /Reg. Santana 5
fls. 332 retoma-se a coisa, que será alienada a terceiro, e ainda fica-se com um plus de vantagem, traduzido em percentual sobre as prestações pagas. Assim é que a retenção de 10% (dez por cento) dos valores é suficiente para cobrir as despesas apontadas pela apelante, não podendo ser esquecido o fato de que o imóvel será ao seu patrimônio incorporado. Percentual menor resultaria em enriquecimento ilícito. Nesse sentido: CIVIL. Promessa de compra e venda. Desistência. Ação pretendendo o ressarcimento integral das importâncias pagas. Retenção em favor da vendedora, como ressarcimento de despesas. Código de Defesa do Consumidor, arts. 51, II, 53 e 54. Código Civil, art. 924. A C. 2ª Seção do STJ, em posição adotada por maioria, admite a possibilidade de resilição do compromisso de compra e venda por iniciativa do devedor, se este não mais reúne condições econômicas para suportar o pagamento das prestações avençadas com a empresa vendedora do imóvel. O desfazimento do contrato dá ao comprador o direito à restituição das parcelas pagas, porém não em sua integralidade. Fixação de percentual de retenção em favor da construtora. Precedentes do STJ. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (STJ - REsp. nº 78.221-SP - 4ª T - Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior - j. 26.08.2003). Logo, a r. sentença não está, como visto, a merecer qualquer reparo, sendo, assim, de rigor o desacolhimento do pleito recursal. Apelação nº 1030XXX-17.2014.8.26.0001 - /Reg. Santana 6
fls. 333 recurso. Portanto, pelo exposto, meu voto nega provimento ao JOSÉ PERCIVAL ALBANO NOGUEIRA JÚNIOR Relator (assinatura eletrônica) Apelação nº 1030XXX-17.2014.8.26.0001 - /Reg. Santana 7