A IMAGINAÇÃO PRODUTORA NA CRÍTICA DA RAZÃO PURA 1

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Transcrição:

A IMAGINAÇÃO PRODUTORA NA CRÍTICA DA RAZÃO PURA 1 Hálwaro Carvalho Freire PPG Filosofia Universidade Federal do Ceará (CAPES) halwarocf@yahoo.com.br Resumo O seguinte artigo tem como principal objetivo analisar o papel da faculdade de imaginação na teoria kantiana do conhecimento desenvolvida por Immanuel Kant. Tal faculdade irá propiciar a ligação entre intuições e conceitos, mediação esta que não seria possível sem as suas duas funções: síntese e esquema. Neste sentido, através do estudo acerca da faculdade de imaginação podemos estabelecer as bases fundamentais da teoria kantiana do conhecimento, visto que só por meio de suas funções será possível o conhecimento. Introdução A filosofia transcendental de Kant tem como principal intuito tratar dos conceitos que estabelecem as condições de possibilidade do conhecimento a priori. No capítulo primeiro da "analítica dos conceitos" Kant define os elementos a priori para o conhecimento dos objetos. O primeiro será o múltiplo da intuição, mediante a receptividade da sensibilidade; o segundo consistirá na síntese deste múltiplo, por meio da capacidade de imaginação; e o terceiro, que repousa no entendimento, serão os conceitos, que darão unidade a esta síntese da imaginação. Segundo Kant, sensibilidade e entendimento não podem permutar suas funções, ou seja, o entendimento não pode intuir nenhum objeto e os sentidos não podem pensá-los, pois a sensibilidade produzirá apenas intuições e o entendimento deduzirá apenas conceitos. Essa relação não é possível apenas mediante estas duas faculdades, porque se trata de um material indeterminado (captado pelas intuições puras de espaço e tempo) e de formas possíveis para esse material da intuição (pensados pelas categorias do entendimento). Desta forma, só poderemos falar de conhecimento mediante a reunião destes dois tipos distintos de conhecer a realidade. Será, pois a faculdade de imaginação e suas funções fundamentais, síntese e esquema, o elemento mediador do conhecimento. O papel da síntese 1 O presente trabalho foi realizado com o apoio da CAPES, entidade do Governo Brasileiro voltada para a formação de recursos humanos.

Por síntese Kant entende o ato de ligar, unificar as diversas representações em um múltiplo 2. Esta síntese se divide em três partes, a saber, síntese de apreensão, síntese da reprodução e síntese de recognição. O primeiro tipo de síntese diz respeito às representações na intuição, a segunda síntese reproduz tais representações na imaginação e a última síntese reconduz tais representações em conceitos. A consideração destes três tipos de síntese é de fundamental importância para este artigo, pois, uma vez compreendido as funções destas será possível edificar em que sentido a imaginação torna-se uma faculdade fundamental na construção do conhecimento puro a priori. Kant inicia a abordagem de tal síntese avaliando que, independentemente da origem de nossas representações, se nos chegam empiricamente ou possam formar-se a priori, estas, enquanto fenômenos estão subordinadas ao tempo, correspondente ao nosso sentido interno. Isto significa que toda intuição contém em si um diverso que, porém, não seria representado como tal, se o espírito não distinguisse o tempo na série das impressões sucessivas (KANT, 2001, A 99). Será, pois, a síntese de apreensão que irá conceber as unidades no tempo e as perceber diante de um todo. Assim sendo, as representações do espaço e do tempo são produzidas pela síntese do diverso apreendido em uma unidade sensível. Ou seja, tal síntese produz o diverso da intuição e o transforma em uma unidade. Desta maneira, só através do tempo, que tem sua representação possibilitada pela apreensão do múltiplo, que podemos distinguir um momento diferente de outro momento. Ao estabelecer essa diferença Kant pode agora afirmar que cada intervalo de tempo o espírito apreende como contendo uma unidade. E, neste sentido, há uma série de unidades no tempo, contudo, estas ainda não estabelecem ligações entre si. Podemos afirma, portanto, que este processo sintético de perceber unidades se dá de maneira a priori, pois, caso contrário, não poderíamos ter a priori nem as representações do espaço, nem as do tempo (KANT, 2001, A 100). Esta síntese é, pois, gerada pela espontaneidade do pensamento mediante a receptividade da sensibilidade. Desta forma, a apreensão do diverso por meio da sensibilidade possibilita a formação das representações das formas puras da intuição, espaço e tempo. Kant afirma que as representações apreendidas na intuição são passiveis de ligação devida uma lei empírica segundo uma regra constante. Ou seja, é imprescindível que logo depois de estabelecer as unidades do múltiplo, estas possam ser ligadas, visto que o conhecimento é um todo de representações ligadas entre si (KANT, 2001, A 105). Isto significa dizer que para reproduzirmos algo devemos pressupor uma certa regularidade nos 2 Cf. KANT, A 77.

próprios fenômenos, caso contrário, não haveria posição para qualquer síntese empírica da imaginação reprodutora. Ou seja, por meio destas regras, as quais Kant declara que são meramente empíricas, é possível preservar a imagem do objeto, mesmo sem a sua presença na experiência, pois: se o cinábrio fosse ora vermelho, ora preto, ora leve, ora pesado, se o homem se transformasse ora nesta ora naquela forma animal, se num muito longo dia a terra estivesse coberta ora de frutos, ora de gelo e neve, a minha imaginação empírica nuca teria ocasião de receber no pensamento [...] se precisamente a mesma coisa fosse designada ora de uma maneira, ora de outra, sem que nisso houvesse uma certa regra, a que os fenômenos estivessem por si mesmos submetidos ( KANT, 2001, A 100-101). Declarar que os fenômenos só podem ser compreendidos devido a uma regularidade dos mesmos, nos leva a considera um empirismo. Contudo, tal regularidade dos fenômenos esta fundada em um princípio a priori, em uma unidade sintética e necessária dos fenômenos é, pois, [...] preciso admitir uma síntese transcendental pura da imaginação, servindo de fundamento à possiblidade de toda a experiência. (KANT, 2001, A 101-102). A síntese pura da imaginação torna possível a reprodução dos fenômenos e os converte a uma unidade sintética e necessária. No entanto, as representações resultam, em última análise, das determinações transcendentais do tempo. Contudo, o tempo ainda não origina por ele mesmo o conhecimento, necessita, pois, de uma ligação do diverso, uma síntese que torne possível a possibilidade de toda a experiência, pois: se quero traçar uma linha em pensamento, ou pensar o tempo de um meio dia a outro, ou apenas representar-me um certo número, devo em primeiro lugar conceber necessariamente, uma a uma, no meu pensamento, estas diversas representações ( KANT, 2001, A 102). Se há na síntese de apreensão uma receptividade da sensibilidade em relação ao objeto dado e uma unificação deste em uma representação na intuição, a síntese de reprodução requer que o objeto dado na apreensão já possua uma certa regularidade para que possa haver uma reprodução por meio da imaginação empírica. Ou seja, no ato de apreensão há uma distinção entre os momentos do tempo, enquanto na reprodução, faz-se necessário a ligação de tais momentos, tornando possível, por exemplo, traçar uma linha no pensamento. Neste sentido, enquanto a síntese da apreensão apresenta o princípio transcendental da possibilidade do conhecimento de forma geral, a síntese da reprodução da imaginação tornará possível à própria experiência.

Mesmo que o fenômeno seja primeiro, sensivelmente intuído e depois reproduzido, segundo Kant, devemos pressupor ainda uma consciência que permita que aquilo que tínhamos pensado no passado seja a mesma coisa do presente. Ou seja, o filósofo afirma que tem de haver uma unidade da consciência que garanta que o apreendido e o reproduzido das sínteses anteriores pertençam a um e mesmo sujeito, pois, como afirma Kant: Se esquecesse, ao contar, que as unidades, que tenho presentemente diante dos sentidos, foram pouco a pouco acrescentadas por mim umas às outras, não reconheceria a produção do número por esta adição sucessiva de unidade a unidade nem, por conseguinte o número, pois este conceito consiste unicamente na consciência desta unidade sintética. (KANT, 2001, A103). Neste sentido, o diverso apreendido e reproduzido é reunido numa consciência una, sem qual seria impossível os conceitos e, por conseguinte, o conhecimento dos objetos. Esquema e esquematismo Devemos ressaltar a distinção feita por Kant entre esquema e esquematismo. O primeiro se refere à condição formal e pura da sensibilidade às quais as categorias do entendimento estão submetidas no seu uso, enquanto o segundo trata do processo pelo qual o entendimento opera com esses esquemas. O esquematismo transcendental se estabelece, portanto, como a aplicação, a operação do entendimento com os esquemas. Um dos elementos fundamentais para uma melhor compreensão do esquematismo transcendental é, sem dúvida, entender a sua relação com a analítica transcendental, mas especificamente, com a dedução transcendental das categorias. Kant estabelece alguns pontos centrais para a constituição do conhecimento objetivo na dedução transcendental das categorias. Em tal dedução, o filósofo procura fundamentar como os conceitos puros do entendimento se referem a priori a objetos. No decorrer de tal exposição, Kant estabelece que sem as categorias não seria possível o conhecimento de objetos e que além da experiência não há conhecimento algum. Deste modo, a dedução transcendental, apesar de pensar pressupostos (categorias) necessários para o estabelecimento do conhecimento, não fornece ainda o modo correto de aplicá-lo. Neste sentido, o capítulo do esquematismo transcendental serve de complemento para a exposição transcendental das categorias, pois um juiz e um médico podem ter excelentes regras na cabeça e, todavia, errarem facilmente na aplicação destas na realidade concreta 3. 3 Cf. KANT, 2001, A 134.

Devemos compreender que o esquema não pode ser confundido com uma mera imagem, antes, esta pressupõe o primeiro. Desta maneira, Kant classifica o esquema como a representação de um procedimento universal da capacidade de imaginação, o de proporcionar a um conceito sua imagem, o esquema destes conceitos (KANT, 2001, A140). Neste sentido, o esquema, que é um produto da capacidade de imaginação produtiva, proporciona a um conceito uma imagem que funciona como uma representação intuitiva. A imagem, por sua vez, está ligada a imaginação reprodutiva, ou seja, é um produto sensível relacionada a representações empíricas, não puras e a priori. Ou seja, os esquemas são representações universais, enquanto as imagens fornecem apenas o aspecto de uma figura singular. Kant classifica três 4 tipos de esquemas: os empíricos (relacionados aos conceitos empíricos), os sensíveis puros (relacionados à matemática) e os transcendentais (relacionados à relação entre sensibilidade e entendimento). Os esquemas transcendentais (terceiro tipo) são formados pelos conceitos puros do entendimento. Eles devem possibilitar a aplicação das categorias aos fenômenos intuitivos. Como foi aludido acima, o esquema possui uma condição formal da sensibilidade (nomeadamente o sentido interno). Ora, a forma do sentido interno é o tempo. Desta maneira, o esquema é a determinação transcendental do tempo que medeia a subsunção dos fenômenos às categorias. Isto significa que a determinação transcendental do tempo, é homogênea tanto a categoria quanto ao fenômeno, pois o tempo é universal (homogêneo a categoria), neste sentido, repousa sobre uma regra a priori, e está presente em toda representação empírica do múltiplo dos objetos (homogêneo a intuição). Portanto, para cada categoria há um esquema correspondente. De acordo com as divisões das categorias, o tempo se apresenta de quatro modos distintos: a série do tempo em relação à quantidade (adição sucessiva de unidade a unidade); o conteúdo do tempo em relação com a qualidade (indica um ser no tempo); a ordem do tempo com a relação (sucessão do diverso no tempo) e, por fim, o conjunto do tempo com relação à modalidade (existência de um objeto em todo o tempo). 4 Enfatizaremos aqui apenas o terceiro tipo de esquema (transcendental), visto que este está intimamente ligado ao nosso objetivo principal neste trabalho, a saber, a esquematização transcendental da imaginação produtora.

Conclusão A faculdade de imaginação constitui, portanto, um fator fundamental para entender a teoria do conhecimento kantiana, visto que tanto a síntese quanto o esquema (seus produtos) irão perpassar dois pontos de suma importância na constituição do sujeito transcendental, a saber: a sensibilidade, abordada no capítulo da Estética transcendental, e o entendimento, inserido no capitulo da Analítica transcendental. Na primeira, a faculdade de imaginação age de forma a produzir a síntese como meio de unificação do múltiplo dado pelas intuições. Na segunda, a faculdade de imaginação trabalha através dos esquemas, que possibilitarão a aplicação dos seus conceitos puros (categorias) às intuições. Referências ALLISON, Henry E (1983). Kant s transcendental idealism: an interpretation and defense. New Haven: Yale University Press. HÖFFE, Otfried. Immanuel Kant (2005). Tradução de Christian Viktor Hamm e Valério Rohden. São Paulo: Ed. Martins Fontes. Kant, I. (2001) Crítica da razão pura. (1ª e 2ª ed.) Tradução de Manuela Pinto dos Santos e Alexandre Fradique Morujão. 5ª ed. - Lisboa-Portugal: Fundação Calouste Gulbenkian. (2008) Prolegómenos a toda a metafísica futura que queira apresentar-se como ciência. Tradução de Artur Morão. Lisboa-Portugal: Edições 70. LONGUENESSE, Béatrice (2000). Kant and the Capacity to Judge: Sensibility and Discursivity in the Transcendental Analytic of the Critique of Pure Reason. Tradução de C. T. Wolfe. Princeton: Princeton University Press.