Comparação multiplicativa: a força que a expressão exerce na escolha das estratégias de resolução dos estudantes

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Transcrição:

Comparação multiplicativa: a força que a expressão exerce na escolha das estratégias de Sandra Magina Professora titular da PUC/SP Brasil sandra@pucsp.br Aparecido dos Santos Doutorando da PUC/SP Brasil cidosan@uninove.br Vera Merlini Doutoranda da PUC/SP Brasil vera.merlini@gmail.com Resumo O objetivo desse artigo é o de investigar o desempenho e as estratégias de resolução dos estudantes, dos anos iniciais do Ensino Fundamental, em duas situações do campo conceitual multiplicativo envolvendo a ideia da comparação multiplicativa. Para tanto, nos apoiamos nas ideias teóricas de Vergnaud (1990, 1991, 1994) concernentes ao Campo Conceitual Multiplicativo. O estudo foi realizado com 175 estudantes (86 e 89 pertencentes ao 3º e 5º anos respectivamente) de uma escola pública estadual da cidade de São Paulo, os quais responderam a um teste contendo treze situações do Campo Multiplicativo. Para efeito desse artigo, versar-nos-emos sobre o desempenho dos estudantes em duas situações contemplando a ideia de comparação multiplicativa. Os resultados apontaram que aspectos linguísticos influenciam fortemente nas estratégias de resolução e, consequentemente, no desempenho dos estudantes quando lhes solicitado a resolução de situações as quais expressões como vezes mais e, principalmente, vezes menos estão presentes. Palavras-chave: campo conceitual multiplicativo, comparação multiplicativa, ensino fundamental, estudo diagnóstico, estudantes. Introdução No Brasil, o ensino das operações de multiplicação e divisão ocorre, basicamente, já no final do 3º ano do Ensino Fundamental, momento que normalmente se explora bastante as continuidades entre o raciocínio aditivo e multiplicativo, nas quais a multiplicação é vista como um modo mais rápido de fazer adições repetidas. De todo modo, para trabalhar com problemas do campo conceitual multiplicativo, a escola, quase sempre, centra-se o ensino das tabelas de multiplicar e no manejo dos algoritmos, convertendo a memorização das multiplicações básicas em um dos objetivos centrais do ensino da matemática no Ensino Fundamental. Em outras palavras, parece haver uma forte crença que para o domínio conceitual das operações de multiplicação e divisão, basta o estudante dominar a tabuada e alguns procedimentos de cálculo para obter sucesso na resolução de diversos problemas do campo conceitual multiplicativo.

2 Em posição diametralmente oposta a essa ideia, os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), por sua vez, apontam que o trabalho integrado dos diferentes blocos estruturados no referido documento, bem como um trabalho com base na resolução de problema, requer uma ação docente que atendam as seguintes características: O ponto de partida da atividade matemática não é a definição, mas o problema; o problema não é um exercício em que o aluno aplica, de forma quase mecânica, uma fórmula ou um processo operatório; aproximações sucessivas ao conceito são construídas para resolver certo tipo de problema; num outro momento, o aluno utiliza o que aprendeu para resolver outros; o aluno não constrói um conceito em resposta a um problema, mas constrói um campo de conceitos que tomam sentido num campo de problemas; a resolução de problemas não é uma atividade para ser desenvolvida paralelo ou como aplicação da aprendizagem, mas uma orientação para a aprendizagem, pois proporciona o contexto em que se pode apreender conceitos, procedimentos e atitudes matemáticas (1997, p. 43). Apontando nessa mesma direção estão as ideias teóricas de Vergnaud (1990, 1991, 1994), concernentes ao conjunto de situações que dão sentido ao campo conceitual multiplicativo e os estudos de Magina et.al (2010) no que diz respeito a competência dos estudantes e a concepção dos professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental em diversas situações desse campo conceitual. Em face dessas considerações iniciais o objetivo desse artigo é o de investigar o desempenho dos estudantes dos anos inicias do Ensino Fundamental, em duas situações do campo conceitual multiplicativo envolvendo a ideia da comparação multiplicativa. O Campo Conceitual Multiplicativo Podemos nos referir a um Campo Conceitual Multiplicativo como sendo um conjunto de problemas ou situações, cuja análise e tratamento requerem vários tipos de conceitos, procedimentos e representações simbólicas, os quais se encontram em estreita conexão uns com os outros. Entre os conceitos podemos destacar: as funções lineares e não-lineares, o espaço vetorial, a análise dimensional, a fração, razão, proporção, número racional, multiplicação e a divisão. A partir das ideias teóricas de Vergnaud (1990, 1991, 1994) sobre o Campo Conceitual Multiplicativo, elaboramos um esquema com o objetivo de sintetizar as ideias centrais desse campo. Assim, o esquema apresentado na figura 1 está dividido em duas partes: relações quaternárias e relações ternárias. A primeira parte, por sua vez, é constituída por dois eixos: proporção simples e proporções múltiplas, que por sua vez são constituídos por duas classes de situações (um para muitos e muito para muitos), sendo que cada classe, ainda podem ser exploradas levando em consideração dois tipos de quantidades (contínua e discreta). Da mesma forma que na primeira, as relações ternárias são constituídas por dois eixos: comparação multiplicativa e produto de medida, sendo que cada um apresenta uma divisão. No primeiro eixo, podemos pensar na formulação de problemas no âmbito de duas classes (a relação desconhecida e o referido desconhecido), levando em consideração dois tipos de quantidades (continua e discreta). Já no segundo eixo das relações ternárias, o produto de medidas, temos mais duas classes de problemas: a configuração retangular e a combinatória, que permitem ainda

3 a formulação de problemas levando em consideração dois tipos de quantidade a contínua e a discreta exceção feita apenas para os problemas envolvendo a ideia de combinatória, para os quais não faz sentido pensar na formulação de problemas envolvendo quantidade contínua. O esquema a seguir, apresenta uma síntese do que acabamos de discutir. Salienta-se que essa síntese é fruto das reflexões teóricas de Magina, Santos e Merlini (2010), que foram sendo consolidadas a partir da ideias teóricas de Vergnaud (1990; 1991, 1994) concernentes à Teoria dos Campos Conceituais, mais especificamente as relacionadas ao Campo Conceitual Multiplicativo. ESTRUTURA MULTIPLICATIVA Relações Quaternárias Ternárias Eixo Proporção Simples Proporção Múltipla Comparação Multiplicativa Produto de Medida Classes Tipos Um para muitos Discreto Muitos para muitos (4ª proporcional) Contínuo Um para muitos Discreto Muitos para muitos (4ª proporcional) Contínuo Relação Desconhecida Referido Configuração Desconhecida Retangular Combinatória Discreto Contínuo Discreto Contínuo Discreto Figura 1: Esquema do Campo Conceitual Multiplicativo Nesse artigo, não temos a pretensão de explorar todas as situações concernentes a esse campo. Limitar-nos-emos a discutir o desempenho dos estudantes no âmbito das relações ternárias, mais especificamente situações relacionadas à comparação multiplicativa. As situações que fazem parte deste eixo envolvem a noção de comparação entre duas quantidades de mesma natureza e exige que pensemos a situação em termos de relação ternária. Já no início da escolarização, é possível explorar situações simples envolvendo a relação de dobro e de metade. Situações como estas podem se configurar como protótipos 1 da comparação multiplicativa, como por exemplo: João tem a metade da quantia de Maria. Se João tem R$ 10,00, qual é a quantia de Maria? Existem situações dentro desse eixo que exigem, para a sua resolução, níveis cognitivos mais elaborados. Os exemplos a seguir ilustram esses tipos de situações: Exemplo 1: Na loja um carrinho custa R$ 5,00 e o jogo de memória custa 4 vezes mais que o carrinho. Quanto custa o jogo de memória? Esquematicamente tal situação poderia ser representada da seguinte maneira: 1 O termo protótipo está sendo empregado aqui com sentido de uma situação elementar. O primeiro representante de uma determinada classe de situação.

4 Referido? Relação 5 Referente X 4 Nessa situação, conhece-se o referente (o preço do carrinho), a relação (quatro vezes mais) e é solicitado para calcular o preço do jogo de memória comparativamente ao preço do carrinho, ou seja, o referido. A operação requerida para a resolução da situação é a multiplicação, isto é: referente x relação = referido (5 x 4 = 20). Exemplo 2: Comprei uma boneca por R$ 21,00 e uma bola por R$ 3,00. Quantas vezes a boneca foi mais cara que a bola? Referido 3 Relação 21 Referente? Diferentemente da situação anterior, nesta é dado o referente (preço da boneca), o referido (preço da bola) e é solicitado para calcular a relação que existe entre esses dois valores. Este tipo de situação requer, para a sua resolução, uma operação de divisão, isto é: referente referido = relação (21 3 = 7). Situações do campo conceitual multiplicativo envolvendo a idéia de comparação multiplicativa, como as dos exemplos anteriores, podem gerar dificuldades de compreensão até para estudantes mais experientes. Assim, é razoável inferir que esta dificuldade não reside na habilidade de se efetuar a operação de multiplicação ou divisão, mas sim na complexidade de compreender o enunciado e traduzí-lo na operação matemática adequada para a resolução da situação. Tal inferência sustenta-se no fato de que problemas que envolvem a ideia de comparação multiplicativa com expressões do tipo dobro, metade, tal como Maria tem 4 bolachas e Carlos tem o dobro dessa quantidade. Quanto tem Carlos? são apresentadas aos estudantes desde muito cedo e que, em geral, não apresentam dificuldade em resolver. Porém, nos exemplos 1 e 2, apresentados anteriormente, em que há uma falta de congruência entre as palavras utilizadas no enunciado do problema e a operação requerida para a sua resolução, o grau de dificuldade do problema atinge patamares bem mais altos. Em outras palavras, não é tão simples compreender que a expressão vezes mais ou vezes menos associa a ideia de uma operação de multiplicação e divisão, respectivamente. Desse modo, situações pertencentes ao campo conceitual multiplicativo com a ideia de multiplicação comparativa, do ponto de vista do ensino, requerem do professor um trabalho cuidadoso, pois na maioria das vezes, na etapa anterior do ensino, ainda no trabalho com o

5 campo conceitual aditivo, é comum associar a expressão ganhar ou perder com a operação de adição e subtração, respectivamente. Damm (1992) apud Santana (2010), após analisar diversas situações do campo conceitual aditivo, a partir das expressões linguísticas empregadas, as classificou em dois grupos: (a) estritamente congruentes quando não há inversão nem a presença de verbos antônimos (nesse caso, os verbos ganhar e perder correspondem, respectivamente, às operações de adição e subtração); (b) fortemente não congruentes - quando há inversão e os verbos são antônimos (nesse caso os verbos ganhar e perder correspondem, respectivamente, às operações de subtração e a adição). Nessa mesma linha de investigação e, ainda, no campo aditivo, Santana (2010), ao investigar estudantes da 3ª série (atual 4º ano) do Ensino Fundamental, identificou que o sucesso desses estudantes ao resolverem problemas aditivos, estava diretamente relacionado não só à complexidade das extensões, mas também a congruência entre as palavras do enunciado e a operação necessária para resolver o problema. Assim, é provável que a congruência e a não-congruência, entre as expressões utilizadas no enunciado das situações aditivas, se manifestem também na resolução das situações multiplicativas, especialmente relacionadas àquelas com a idéia de comparação multiplicativa, em que estão presentes as expressões vezes mais ou vezes menos sejam traduzidas por duas operações consecutivas em cada caso. A expressão vezes mais pode significar para o estudante uma operação de multiplicação seguida de uma adição e a expressão vezes menos interpretada como uma operação de multiplicação seguida de uma operação de subtração entre os dados do problema. No caso da expressão vezes mais nos parece menos sofisticada, do ponto de vista cognitivo, do que a expressão vezes menos. Na primeira há congruência entre a expressão utilizada e a operação a ser empregada (vezes mais pode ganhar o significado de multiplicar). Já na segunda expressão não há uma congruência entre a expressão linguística empregada e a operação requerida para a resolução do problema (vezes menos está longe de ganhar o significado de dividir). Em síntese, parece-nos que esses aspectos linguísticos interferem, sobremaneira, no desempenho dos estudantes quando lhes é solicitado a resolução de problemas multiplicativos em que tais expressões estão presentes. Metodologia Para realização do presente estudo nos apoiamos nos princípios da pesquisa descritiva, o qual o pesquisador tem por objetivo conhecer e interpretar determinados fenômenos ligados à realidade sem nela interferir para modificá-la (RUDIO, 2001). Sendo assim, nesse artigo analisaremos o desempenho dos estudantes em duas situações do campo conceitual multiplicativo. Salientamos que os dados a serem analisados nesse estudo, referem-se a duas situações extraídas de um instrumento diagnóstico aplicado a 349 estudantes, de 2º a 5ª anos, do Ensino Fundamental, de uma mesma Escola Pública Estadual, localizada em um bairro classe média da cidade de São Paulo. Esse instrumento era constituído por treze situações do campo conceitual multiplicativo. Quanto ao ano, os estudantes estavam assim distribuídos: 80 estudantes do 2º ano, 86 do 3º, 94 do 4º e 89 estudantes do 5º ano.

6 O instrumento foi aplicado coletivamente pela professora de cada turma com a supervisão de três pesquisadores. Para garantir a compreensão, foi feita pela professora, a leitura em voz alta de todas as situações. Após esse procedimento, foi dado um tempo para que todos os estudantes pudessem responder individualmente cada situação. E assim, se procedeu a aplicação de todo o instrumento. Para efeito desse artigo, consideramos duas situações do instrumento diagnóstico, referentes à comparação multiplicativa e analisamos o desempenho dos estudantes do 3º e 5º anos do Ensino Fundamental, sendo 86 e 89 estudantes, respectivamente. A Figura 2 a seguir apresenta as duas situações analisadas, e logo em seguida a sua respectiva classificação. Situação 1: Na loja um carrinho custa R$ 5,00 e o jogo de memória custa 4 vezes mais que o carrinho. Quanto custa o jogo de memória? Figura 2: As duas situações a serem analisadas. Situação 2: Seu Pedro vende um quilo de uva por R$ 12,00 e um quilo de laranja por 3 vezes menos. Quanto custa o quilo da laranja? A situação 1 trata-se de uma situação envolvendo a ideia de comparação multiplicativa que se conhece o referente (preço do carrinho) e a relação (quatro vezes mais) e é solicitado o referido (o preço do jogo de memória). Na situação 2, também é dado o referente (preço do quilo da uva) e a relação (três vezes menos) e procura-se o valor do referido (preço do quilo da laranja). As operações requeridas na primeira e na segunda situação são, respectivamente, a multiplicação e a divisão. Resultados Nessa seção apresentamos os resultados do desempenho dos estudantes do 3º e 5º anos discutindo os dados sob dois enfoques: (a) análise quantitativa do desempenho dos estudantes, (b) análise quantitativa e qualitativa das estratégias utilizadas. Iniciamos nossa análise quantitativa observando o Gráfico 1 que apresenta o desempenho dos estudantes do 3º e 5º anos nas duas situações que dizem respeito ao eixo da comparação multiplicativa. Desempenho dos estudantes do 3º e 5º anos nas situações 1 e 2 100 3º ano 5º ano Percentual 80 66,3 60 47,6 40 21,3 20 5,8 0 Situação 1 Situação 2 Figura 3: Gráfico do desempenho dos estudantes do 3º e 5º anos nas situações 1 e 2.

7 Os dados apontam que, como esperado, os estudantes da 5º ano tiveram maior sucesso, na resolução das duas situações, do que os do 3º ano. Isto, porém, não significa que o desempenho da 5º ano tenha sido satisfatório, visto que se observa que mesmo na situação na qual os estudantes deste ano apresentaram melhor desempenho (situação 1) ainda restaram mais de 30% de estudantes sem obter sucesso. O gráfico 1 ainda nos leva antever que há uma enorme queda no percentual de acertos dos estudantes dos dois anos quando comparados o resultado da primeira situação com a segunda. Fato esse que evidencia que a segunda situação, em que não há congruência entre as palavras do enunciado e a operação a ser realizada, foi bem mais difícil para esses estudantes. Passamos para a análise comparativa quali e quantitativa das estratégias, utilizadas pelos estudantes do 3º e do 5º ano, que levaram tanto ao sucesso como ao fracasso em cada uma das situações. Para tanto, apresentamos duas tabelas as quais esquematizam as estratégias. A primeira faz referência à situação 1 e a segunda à situação 2. Tabela 1: Estratégias que levaram ao sucesso e ao fracasso os estudantes dos 3º e 5º anos na situação 1. Anos 3º 5º Estratégias Corretas (41) Incorretas (45) Corretas (59) Incorretas (30) Multiplicação Adição Adição/Mult Subtração Só Resposta Outras 17 (41,4%) 5 (12,2%) 2 (5%) - 17 (41,4%) - 3 (6,6%) 26 (71%) - - - 16 (35,5%) 54 (91,5%) 1 (1,7%) 1 (1,7%) - 3 (5%) - 6 (20%) 17 (56,7%) - 1 (3,3%) - 6 (20%) A partir dos dados da Tabela 1, destacamos as estratégias que julgamos relevantes, iniciando com as que levaram ao resultado correto (sucesso) e em seguida ao incorreto (fracasso). Das estratégias que levaram ao sucesso no 3º ano, em 17 das 41 possíveis, os estudantes utilizaram a Multiplicação; no 5º ano esse número foi mais expressivo, 54 das 59 possíveis se apropriaram dessa estratégia. Diante do exposto, podemos inferir que, principalmente para os estudantes do 5º ano, na expressão vezes mais há congruência entre a expressão utilizada e a operação a ser empregada (vezes mais pode sim ganhar o significado de multiplicar). Para ilustrar, escolhemos dois protocolos que exemplificam as estratégias elencadas em nosso esquema da Tabela 1 que mais levaram ao sucesso.

8 Figura 4: Estratégia da Adição/Multiplicação do estudante do 5º ano S4295 Figura 5: Estratégia da Multiplicação do estudante do 3º ano S2153 Destacamos o protocolo do estudante do 5º ano (Figura 4) porque ele apresenta a estratégia que utiliza as duas operações, a da Adição e da Multiplicação, destacando que poderia obter a mesma resposta utilizando uma ou outra operação. É provável que isso se deva a congruência da expressão vezes mais manifestada no enunciado, traduzida pelo estudante por essas duas operações na resolução da situação 1. Quanto ao protocolo da Figura 5, a estratégia de resolução utilizada por um estudante do 3º ano foi a Multiplicação. Podemos perceber que, mesmo no algoritmo da operação de multiplicação, existe a preocupação em destacar a unidade e a dezena, que nos dá indícios que a formalidade do algoritmo da estrutura aditiva ainda é muito forte nos estudantes do 3º ano. É importante salientar que, a estratégia que também levou ao sucesso e foi por nós denominada como sendo Só resposta, corresponde aquela na qual o estudante, sem apresentar qualquer esboço de raciocínio no espaço reservado, coloca o resultado correto na linha designada para resposta. Posto isto, na sequência destacaremos as estratégias que os estudantes utilizaram e que levaram ao fracasso. Observando os dados da Tabela 1, a estratégia que mais se sobressai, tanto no 3º como no 5º anos, é aquela a qual denominamos Adição. A título de ilustração, segue dois protocolos que refletem essa estratégia. Figura 3: Estratégia da Adição do estudante do 3º ano S2103 Figura 4: Estratégia da Adição do estudante do 5º ano S4274 Ao analisarmos as estratégias que levaram ao fracasso, há fortes indícios que, tanto para o 3º como para o 5º ano, a palavra a mais, da expressão linguística empregada vezes mais, pode ser sido o fator que induziu a operação de adição na resolução. Observamos que no protocolo da Figura 4, o estudante monta o algoritmo da operação de multiplicação, coloca o sinal (X) de multiplicação e faz a operação de adição. Outro aspecto que vale a pena destacar, é que, de forma geral, nas estratégias que foram categorizadas por Adição, tanto os estudantes do

9 3º como do 5º anos utilizaram a adição dos dados da situação 1, sem se preocupar com suas naturezas distintas (preço e relação entre os preços). Cabe salientar, que a estratégia, por nós denominada como sendo Outras e que também levou ao fracasso, é aquela na qual o estudante deixa em branco o espaço reservado para o cálculo, colocando apenas um valor na linha da resposta. Nesse tipo de estratégia podemos observar duas repostas: (i) aquela em que o estudante coloca um valor e não explicita como obteve, (exemplo: o estudante não faz o cálculo e dá como resposta 6 ); (ii) aquela em que o estudante simplesmente transcreve um dos valores do enunciado (exemplo: o estudante não faz cálculo e dá como resposta 5, talvez fazendo alusão ao valor do carrinho que consta no enunciado da situação). Feitas essas análises em relação à situação 1, passaremos nesse momento à situação 2, descrita nos dados da seguinte tabela: Tabela 2: Estratégias que levaram ao sucesso e ao fracasso os estudantes dos 3º e 5º anos na situação 2 Estratégias Anos Corretas (5) 3º Incorretas (81) Corretas (19) 5º Incorretas (70) Adição/ Só Outras Divisão Multiplicação Subtração Subtr/Mult Adição Subtração Resposta 3 2 - - - - - - (60%) (40%) 2 33 11 35 - - - - (2,5%) (40,7%) (13,5%) (43,3%) 17 2 - - - - - - (89,5%) (10,5%) 1 9 41 1 2 2 14 - (1,4%) (12,9%) (58,5%) (1,4%) (2,9%) (2,9%) (20%) De posse dos dados da Tabela 2, analisaremos as estratégias mais relevantes, ou seja, aquelas que foram mais utilizadas pelos estudantes ou ainda, aquelas que por algum motivo nos chamou a atenção. Iniciaremos com as que levaram ao resultado correto e em seguida ao incorreto. Observando as respostas corretas do 3º ano, em três das cinco possíveis, os estudantes utilizaram a divisão. Entretanto, é importante evidenciar que no 3º ano não apareceu, entre as corretas, o algoritmo da divisão e sim a divisão a partir do desenho, no qual os estudantes fizeram agrupamentos como podemos constatar nas Figuras 5 e 6. Figura 5: Estratégia da Divisão por agrupamento do estudante do 3º ano S2124 Figura 6: Estratégia da Divisão por agrupamento do estudante do 3º ano S2111

10 Como podemos observar, os agrupamentos são distintos, o estudante S2124 (Figura 5) fez três grupos de quatro ao passo que o S2111 (Figura 6) fez quatro grupos de três, sendo que os dois colocaram a resposta de forma correta. A estratégia por nós designada como sendo Só Resposta, assim como já explicamos anteriormente, refere-se àquela estratégia em que o estudante não explicitou seu raciocínio, escrevendo somente a resposta correta. Fato que nos fornece fortes indícios de que os estudantes do 3º ano já sabem fazer a operação de divisão (mesmo não sendo de maneira formal), ou seja, a operação em si não foi empecilho para que respondessem corretamente, mas dos 86 apenas cinco dos estudantes do 3º ano compreenderam a expressão vezes menos associada à operação de divisão. Ao analisarmos as respostas dos estudantes do 5º ano temos que entre as 19 corretas, 17 delas foram obtidas a partir do algoritmo da divisão e em duas delas a estratégia utilizada foi a da multiplicação. Para ilustrar essas duas estratégias de resposta temos as Figuras 7 e 8. Figura 7: Estratégia do algoritmo da Divisão do estudante do 5º ano S4261 Figura 8: Estratégia do algoritmo da Multiplicação do estudante do 5º ano S4307 Observando o protocolo do estudante S4261 (Figura 7) podemos inferir que o 5º ano conhece formalmente o algoritmo da divisão, porém dentre 89 estudantes, somente 17 puderam perceber que a expressão vezes menos significa dividir. Quanto ao protocolo do estudante S4307, podemos intuir que ele tenha procurado e encontrado um número que multiplicado por 3 desse como resultado o 12. Nesse caso, o estudante se apropria da operação inversa, a multiplicação, para resolver essa situação, a qual a operação mais indicada seria a divisão. Ao nos depararmos com as estratégias que os levaram ao fracasso na situação 2 destacaremos as duas mais utilizadas por nós denominadas Outras e Subtração. Desse modo, escolhemos dois protocolos que personificam essas duas estratégias. Figura 9: Estratégia Outras do estudante do 3º ano S2118 Figura 10: Estratégia Subtração do estudante do 5º ano S4284

11 A resolução do estudante S2118 (Figura 9) demonstra que o vezes menos está de fato longe de ganhar o significado de dividir, por conta da não congruência entre a expressão linguística empregada e a operação requerida. Podemos perceber que ele até coloca o sinal da multiplicação (X) e o da subtração ( ), porém não faz nenhuma dessas duas operações. Há evidências que demonstram que esse estudante tem a noção que não se trata nem de uma multiplicação, nem tão pouco de uma subtração, contudo, nos parece que a expressão linguística vezes menos que requer uma interpretação mais sofisticada, do ponto de vista cognitivo, contribuiu, sobremaneira, para o insucesso dos estudantes. Ainda de acordo com os dados da Tabela 2, podemos observar, que tanto para os estudantes tanto do 3º como do 5º anos, a estratégia que majoritariamente conduziu ao fracasso foi a utilização da operação de Subtração. Fato que nos chama a atenção e nos leva a inferir que a expressão linguística vezes menos é mais sofisticada, do ponto de vista cognitivo, para os estudantes do que a expressão linguística vezes mais. É importante ainda, ressaltar que a estratégia que recebe o rótulo de Outras, se dá pelo fato do estudante repetir o valor de um dos dados da situação, ou ainda por colocar um valor o qual ele não explicita como obteve. Considerações Finais O objetivo do presente artigo é o de investigar o desempenho dos estudantes, do 3º e 5º anos do Ensino Fundamental, em duas situações do campo conceitual multiplicativo envolvendo a ideia da comparação multiplicativa. A análise dos resultados nos permite fazer algumas considerações relevantes. Os resultados obtidos neste estudo nos permitem afirmar que situações do campo conceitual multiplicativo envolvendo a ideia de comparação multiplicativa podem gerar dificuldades que residem não no fato de efetuar a operação de multiplicação ou de divisão, mas sim na complexidade de compreender o enunciado e traduzí-lo em uma operação matemática adequada para a resolução da situação. Para esses estudantes, os aspectos linguísticos das expressões vezes mais e, principalmente, vezes menos presentes nas situações interferiram, sobremaneira, nas estratégias de resolução e, conseqüentemente, nos seus desempenhos. Na situação 1 os estudantes do 3º ano atingiram pouco mais que 47% de acerto, enquanto que os do 5º ano atingiram percentual de acerto de 66,3%. O baixo desempenho dos estudantes do 3º ano é de certa forma esperado, pois ainda não tiveram experiência formal com as operações de multiplicação e divisão e tampouco com situações envolvendo a ideia de comparação multiplicativa. No que tange, ao desempenho dos estudantes do 5º ano, apesar de apresentar um percentual de desempenho superior ao do 3º ano, ainda observamos que há um número significativo de estudantes que ainda não apresentam um desempenho satisfatório. Quanto à situação 2, tanto o 3º como o 5º anos tiveram índices baixo de sucesso (5,8% e 21,3% respectivamente). Se somarmos as estratégias utilizadas pelos estudantes dos dois anos, observamos que a maioria delas, que levaram ao fracasso, foram as que eles utilizaram a operação de subtração, o que nos leva a inferir que a palavra menos da expressão vezes menos pode ter induzido o estudante a escolher tal operação. Isso nos remete aos resultados obtidos por Dann (1992) em sua classificação das expressões linguísticas fortemente não congruentes - quando há inversão e os verbos são antônimos.

12 Em suma, essas considerações nos remetem à teoria vergnaudiana que postula que os conceitos matemáticos traçam seus sentidos com base em uma variedade de situações e, normalmente, cada situação, não pode ser analisada com a ajuda de apenas um conceito. Isso significa que uma situação, por mais simples que seja, envolve mais que um conceito e, por outro lado, um conceito não pode ser apropriado a partir da vivência de uma única situação. Dessa forma, para que o estudante possa se apropriar do campo conceitual multiplicativo, este necessita ser trabalhado tanto nas relações quaternárias assim como nas ternárias. Dentro dessa última que sejam exploradas situações que contemplem o eixo da comparação multiplicativa, entretanto indo além daquelas que envolvem a relação de dobro e de metade, configuradas como sendo protótipos. Bibliografia BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria da Educação Fundamental (1997). Parâmetros Curriculares Nacionais Matemática, v.3. Brasília: MEC/SEF. MAGINA, S.M.P.; MERLINI, V.L.; SANTOS, A. (2010). O Desempenho dos estudantes de 4ª Série do Ensino Fundamental frente a Problemas de Estrutura Multiplicativa. In: X encontro Nacional de Educação Matemática, 2010, Salvador. Educação Matemática, Cultura e Diversidade. Ilheus : Via Literarum,. v. 1. p. 1-11. RUDIO, F. V. ( 2001). Introdução ao Projeto de Pesquisa CientíficaPetrópolis: Vozes, 32ª ed. SANTANA, E. (2010). Estrutura Aditiva: o suporte didático influencia a aprendizagem do estudante? São Paulo. Tese (Doutorado) Pontifícia Universidade Católica de São Paulo VERGNAUD, G. A. (1983). Multiplicative structures.iem R. Lesh 8 M. Landau (Eds.). Acquisitions of mathematics concepts and procedures. New York: Academic Press, p.127-174.. (1988).Multiplicative structures. In. HIEBERT, H. and BEHR, M. (Ed.). Research Agenda in Mathematics Education. Number Concepts and Operations in the Middle Grades. Hillsdale, N.J.: Lawrence Erlbaum. p. 141-161.. (1990). La théorie des champs conceptuels. Recherches en Didactique des Mathématiques. Grenoble, v. 10, n. 23, p. 133-170.. (1991). El niño, las matemáticas y la realidad : problemas de las matemáticas em la escuela primária. México: Trilhas.. ( 1994). Multiplicative conceptual field: what and why? In. Guershon, H. e Confrey, J. (Eds.). The development of multiplicative reasoning in the learning of mathematics. Albany, N.Y.: State University of New York Press.. p. 41-59.