A CULTURA ESCOLAR NA ACADEMIA DA POLÍCIA CIVIL DE SANTA CATARINA ( ) 1

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Transcrição:

1 A CULTURA ESCOLAR NA ACADEMIA DA POLÍCIA CIVIL DE SANTA CATARINA (1967-1977) 1 Educação, Linguagem e Memória Maria Aparecida Casagrande 2 Introdução O presente trabalho problematiza a cultura escolar na Academia da Polícia Civil de Santa Catarina - ACADEPOL/SC 3, na primeira década de sua existência (1967-1977). Neste texto, privilegiou-se, especialmente, as discussões em torno da ACADEPOL/SC como uma instituição de ensino construtora de conhecimentos, como produto histórico, como um lugar de cultura, de formação e reprodução de valores da sociedade que, por sua vez, interage com sua arquitetura física, com as regras, normas, saberes e práticas, os quais não estão desconectados da cultura que a rodeia e, muitas vezes, são fundamentais para explicar este espaço escolar. No âmbito educacional, a ACADEPOL/SC, enquanto espaço de ensino e aprendizagem, é parte do conjunto das instituições responsáveis pela produção, sistematização e transmissão de saberes e práticas, com uma cultura própria, carregada de historicidade. Assim, Compreendo-a como uma instituição de ensino que se aproxima do ambiente escolar sem deixar de considerar suas especificidades. Trata-se de um espaço de construção de conhecimentos. É na escola que normas e práticas definidoras dos conhecimentos são historicamente construídas, gerando uma cultura própria. Com este entendimento é que a categoria Cultura Escolar está sendo adotada neste trabalho, que tem como propósito possibilitar um alargamento das reflexões 1 O presente texto é parte da dissertação de Mestrado em Educação, na linha de pesquisa Educação, Linguagem e Memória, intitulada: Mulheres Policiais: formação e atuação profissional das primeiras alunas da Academia da Polícia Civil de Santa Catarina (1967-1977), em que o processo de formação das primeiras mulheres que frequentaram a ACADEPOL/SC nesse período, bem como suas trajetórias profissionais ao longo da carreira policial, foram problematizadas sob a perspectiva das relações de gênero e da cultura escolar. 2 Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação da Universidade do Extremo Sul Catarinense, UNESC/SC; Agente de Polícia Civil e professora da Academia de Polícia Civil de Santa Catarina. 3 Situada na cidade de Florianópolis/SC.

2 sobre as práticas internas da ACADEPOL/SC, na sua relação com o meio social. O surgimento da ACADEPOL e a cultura escolar Criada pela Lei 3.247 de 9 de maio de 1964, a então chamada Escola de Polícia só inicia suas atividades, de fato, em 1967. Em 1974 passou a ser denominada ACADEPOL/SC, e, desde então, é o órgão da Polícia Civil catarinense responsável pelos cursos de formação das carreiras de Delegado de Polícia, Psicólogo Policial, Escrivão e Agente de Polícia, quando do ingresso nos quadros da instituição. Também é atribuição da ACADEPOL a capacitação e aperfeiçoamento de todos/as os/as policiais civis do Estado de Santa Catarina. Os espaços escolares foram sendo historicamente construídos e desenvolvidos os hábitos, ritos, modos de pensar e agir, tanto dentro da escola como fora dela, não sendo diferente na ACADEPOL/SC. Assim, a cultura escolar pode ser vista de variadas maneiras e com olhares diversos e articulados. Para o autor, este conjunto inclui toda a vida escolar, ou seja: Práticas e condutas, modos de vida, hábitos e ritos a história cotidiana de fazer escola -, objetos materiais função, uso, distribuição de espaço, materialidade física, simbologia, introdução, transformação, desaparição...-, e modos de pensar, assim como significados e idéias compartilhadas. (VINÃO FRAGO, 1995 apud GONÇALVES; FARIA FILHO 2005, p. 41). Em outra perspectiva, Julia (2001, p. 10) descreve a cultura escolar como um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses comportamentos. Para o autor, essas normas e práticas são determinadas pelas finalidades que são postas à escola, as quais variam de acordo com o momento histórico a que pertencem. Com os entendimentos referenciados pelos autores, passa-se a olhar para dentro da escola, buscando seu funcionamento interno, ou seja, as relações entre professores/as e alunos/as, normas e práticas, ritos, disciplinas, etc. Nesse contexto, as instituições carregam consigo a memória coletiva,

3 cumprindo a mesma função que a memória pessoal tem para o indivíduo, ou seja, dar-lhe sentido e identidade. A materialidade da cultura escolar O prédio onde funcionou a primeira Escola de Polícia, possivelmente projetada a partir de uma racionalidade com objetivo de apresentar ou expressar uma neutralidade esperada de uma instituição policial. Figura1 - Prédio onde funcionou a primeira Escola de Polícia Bairro Estreito, Florianópolis (1967) Fonte: Acervo da ACADEPOL/SC Para o funcionamento da ACADEPOL/SC, houve uma adaptação das salas de aula, as quais foram improvisadas mas, nem por isso, deixou de ser um ambiente escolar específico para fins educacionais e propício para dar sentido aos saberes a serem ensinados aos alunos/as em processo de formação. Para Boto (2005, p. 63), a escola moderna apresenta-se ao mundo como a única instituição cujo propósito era exclusivamente o de educar. Para isso era necessário que possuísse métodos, técnicas, um espaço físico dividido mediante critérios específicos, uma nova organização do tempo em horários.

4 Na ACADEPOL/SC, como não poderia ser diferente de uma escola regular, a figura do Diretor aparece e, no Relatório de 1967, estão registradas fotografias do mobiliário do gabinete do diretor. Figura 2 - Mobiliário da sala do diretor (1967) Fonte: Acervo da ACADEPOL/SC Os objetos e produtos do escrever ocupam um lugar significativo no conjunto das práticas escolares e administrativas da escola. A presença reiterada, na mesa, de livros, lápis e caneta, indica a íntima e estreita relação entre o universo da escrita e a invenção da escola moderna. Na sala do diretor, a formalidade e o ar disciplinar são perceptíveis, demonstra por meio de elementos simbólicos incorporados à decoração, que o ambiente é essencialmente regulador. A bandeira do Estado de Santa Catarina, disposta ao lado da mesa, denota esse intento. Na tentativa de instituir a permanência dos valores nacionais, os símbolos pátrios cumprem o papel de representar e fortalecer uma instituição hierárquica e disciplinadora a ser respeitada pela sociedade catarinense, pois ela representa oficialmente o Estado, e, mais amplamente, o governo militar instalado no país, desde 1964. É importante mencionar que os objetos escolares, como carteiras, quadros, globos, entre outros, são importantes para a compreensão de pistas das diversas maneiras como os professores/as e alunos/as constituíram suas práticas escolares.

5 Em sua trajetória histórica, a escola explicitou desejos e necessidades que se tornaram homogêneos e obtiveram amparo nas políticas educacionais implementadas no país ao longo dos anos. Assim, as normas, leis, práticas e dispositivos disciplinares foram sendo incorporadas por todas as instituições escolares, inclusive pela ACADEPOL/SC. Considerações Finais A cultura escolar não é algo isolado da sociedade e reflexões nesse sentido têm sido evidenciadas para compreender a educação moderna e contemporânea, com o objetivo de aprofundar em determinados períodos e espaços os significados da cultura produzida nesse tipo de instituição, configurando-se em um novo modo de olhar para o ambiente escolar. A cultura escolar foi percebida e instituída nos dez primeiros anos de existência da academia, pois está concretizada a partir das práticas, dos dispositivos escolares, da materialidade física e das relações que, certamente, interferiram no processo de formação das policiais que por lá passaram entre os anos de 1967 e 1977. Nesse ambiente educacional outros aspectos importantes foram analisados na cultura escolar, como os saberes e as práticas instituídas na formação das primeiras alunas. Por fim, foi possível perceber que a cultura escolar perpassou as práticas pedagógicas e os dispositivos implementados na ACADEPOL/SC, aparecendo materializada na arquitetura, no espaço físico, nas disciplinas e nas normas. Referências BOTO, Carlota. Histórias, idéias e trajetórias da Cultura Escolar: um desafio metodológico. In: SOUZA, Rosa Fátima de; VALDEMARIN, Vera Teresa (Orgs.). A Cultura Escolar em Debate: questões conceituais, metodológicos e desafios para a pesquisa. Campinas: Autores Associados, 2005. p. 59-80. FARIA FILHO et al. A cultura escolar como categoria de análise e como campo de investigação na história da educação brasileira. Revista Educação e pesquisa, São Paulo, v. 30, n. 1, p. 139-159, jan.-abr. 2004. JULIA, Dominique. A cultura escolar como objeto histórico. Revista Brasileira de História da Educação. Campinas, n. 1, p. 9-45, 2001. Disponível em

6 <http://www.rbhe.sbhe.org.br/index.php/rbhe/ article/view/273/281>. Acesso em: 12 out. 2012. SANTA CATARINA. Secretaria de Estado da Segurança Pública. Polícia Civil de Santa Catarina. Legislação. Disponível em <http://www.acadepol.sc.gov.br/ index.php/download/cat_view/1-legislacao/2- policia-civil>. Acessado em 28 out. 2012. SANTA CATARINA. Escola de Polícia. Relatório do Curso de Formação 1967. Florianópolis, [1967]. Relatório. Mimeografado. VIÑAO FRAGO, Antonio. História de La educación e história cultural: possibilidades, problemas, cuestiones. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n. 0, p.63-82, 1995