Partículas: a dança da matéria e dos campos Aula 18 - Núcleos, átomos, moléculas e vida 1 1. Revisão de aspectos da aula passada. 2. Átomo de hidrogênio. 3. Átomos e princípio da incerteza. 4. Correções ao potencial coulombiano.
Revisão: Spin & Relatividade Aprendemos várias coisas sobre o spin: 1. Está associado à rotação. 2. É umbilicalmente ligado à relatividade. 3. É um grau de liberdade adicional aos graus de liberdade 3D a que estamos acostumados. 4. Números quânticos de spin inteiros ou semi-inteiros estão associados a bósons ou férmions, respectivamente. 5. Houve, de fato, um abuso nas analogias feitas; spin e momento angular são vetores e o módulo do momento angular e a projeção em um eixo z de uma partícula que tenha número quântico de spin s é: S=[s(s+1)] 1/2 Ñ S z =sñ Vale ressaltar que esticamos até o limite do possível as metáforas que havíamos utilizado para entender o mundo quântico.
Revisão: Helicidade Helicidade (h): 1. Projeção do spin na direção do momento p: A partícula é de mão direita (h=+1). 2. Projeção do spin na direção oposta a p: A partícula é de mão esquerda (h =-1).
Revisão: Spin e massa zero O spin de partículas de massa zero merece algumas considerações Vamos analisar uma situação em que o spin é perpendicular à direção do momento. Uma argumentação nada rigorosa nos diz que se um observador analisar o movimento da periferia da partícula veria velocidades diferentes de c, o que não é possível pois ela deve se mover inteira com velocidade c. Isso significa que não é permitido ao spin ficar perpendicular à direção do movimento no caso de m = 0 Uma tal partícula só pode ter duas helicidades (i.e., duas direções de polarização): de mão esquerda ou de mão direita. Ademais, não existe rotação capaz de alterar seu estado de polarização sem passar pelo estado de polarização proibido (longitudinal). Isso não é problema para partículas com massa 0. Proibido para partículas com m=0
Revisão: Spin e massa zero Partículas com m 0 A helicidade de partículas de massa zero merece algumas considerações. Antes, porém, vamos analisar o que ocorre com a helicidade de partículas com massa não nula. Sempre é possível efetuar uma transformação de Lorentz que leve a partícula ao repouso e mesmo que inverta a direção do seu movimento. Ou seja: h m 0 = v/c
Revisão: Spin e massa zero Para partículas com massa nula, a situação é distinta: Não existe transformação de Lorentz que as leve ao repouso ou altere sua velocidade. Em outras palavras, sua helicidade não pode ser alterada: h m=0 = 1 Uma tal partícula só pode ter duas helicidades (i.e., duas direções de polarização): de mão esquerda ou de mão direita. Não é permitido ao spin ficar perpendicular à direção do movimento no caso de m = 0 Ademais, não existe rotação capaz de alterar seu estado de polarização sem passar pelo estado de polarização proibido (longitudinal). S fóton =1: A componente longitudinal está associada aos fótons que não estão em harmonia com a relação energia-momento e são associados à interação, Proibido para partículas com m=0
Adendo: Indistinguibilidade Discutimos anteriormente (aulas 9 & 10) diversas conseqüências da identidade dos constituintes do mundo microscópico. Pauli (~1925) foi o primeiro a propor que o caráter intolerante dos férmions e explorar suas conseqüências. A tabela a seguir resume propriedades dos bósons e férmions
Adendo: Indistinguibilidade A tabela ao lado compara as diferentes maneiras como os estados de duas partículas são ocupados conforme a natureza fermiônica, bosônica ou clássica das partículas. Cuidado: o autor do The force of symmetry afirma perigosamente que férmions idênticos não existem. Existem sim e sua existência (férmions ou bósons) é uma conseqüência inarredável da mecânica quântica: a impossibilidade de distinção entre duas partículas impede que possamos saber qual trajetória a partícula percorreu; na verdade, ele quer se referir ao fato de que, se dois férmions pretenderem ocupar o mesmo estado, a amplitude se anulará e assim, eles não estariam autorizados a ficarem iguais, i.e., ter todas as características idênticas. Trata-se apenas de uma inversão de conceitos: é o fato das partículas serem idênticas que leva a esse resultado.
Átomo H: Pano de Fundo Alguns problemas da Física no início do sec. XX: crise na Física dificuldades em entender uma grande variedade de novos dados sobre o comportamento da Natureza. A experiência de Geiger & Marsden apresentou uma surpresa: alguns projéteis eram espalhados para trás indicando uma colisão com algo maciço, levando Rutherford a concluir que o átomo era constituído por um caroço (núcleo) extremamente denso cercado por uma nuvem de elétrons. Mas: No modelo planetário de Rutherford os átomos não seriam estáveis: era um resultado conhecido do eletromagnetismo que cargas aceleradas irradiam. N(θ) 1.4x10 5 1.2x10 5 1.0x10 5 8.0x10 4 6.0x10 4 4.0x10 4 2.0x10 4 0.0... e elas voltavam! Dados de Geiger & Marsden cossec 4 (θ/2) normalizada em θ=15 0 20 40 60 80 100 120 140 160 θ [Graus]
Átomo H: Pano de Fundo A análise dos comprimentos de onda da luz emitida na desexcitação do átomo de hidrogênio conduziu a uma expressão meio cabalística devida a Rydberg. Ela sumarizava os dados existentes mas carecia de uma explicação com os conceitos então disponíveis. Física pré sec. XX: uma onda é uma onda, uma partícula é uma partícula. Mas, como sabemos, a mecânica quântica subverteu essa conceituação simplista. 1 λ f 1 1 = = RH 2 2 c k n n, k inteiros e n>k
Modelo de Bohr Átomo de hidrogênio: formado por um próton e um elétron. q p = q e- átomo neutro. m p >> m e- o próton pode ser considerado parado. Bohr: Física Clássica + ousadia. Hipótese: o elétron está em um estado estacionário apenas valores definidos do momento angular são permitidos.
Nós A análise das oscilações de uma superfície esférica mostra que em certas regiões não há nenhum movimento da superfície: os nós. Cada uma das figuras corresponde a um valor diferente do momento angular associado à onda. Os modos fundamentais de vibração dessa superfície são descritos por uma família de funções denominada harmônicos esféricos; essas funções aparecem em qualquer descrição de sistemas que apresentam simetria esférica. A família dos esféricos harmônicos constitui uma representação do grupo de rotações em três dimensões. Na figura a seguir apresento, apenas por completeza a forma funcional de alguns esféricos harmônicos, bem como sua representação espacial. a) l=6,m=6 b) l=2, m=0 c) l=4, m=3 d) l=20, m=20
Modelo de Bohr Vamos seguir um caminho diferente do de Bohr e apenas estimar a energia de um elétron, em órbita circular, ligado ao átomo de hidrogênio (H). Força de atração entre o próton e o elétron separados por uma distância r: F centrípeta = F elétrica F e =e²/r²=mv²/r=f c : Força centrípeta A energia total do átomo de H é: E = T + V=(p²/2m)-(e²/r). A energia de ligação decresce com a distância: E 1/r (é só lembrar que Fe=F c, i.e., e²/r=mv²= p²/m e portanto: E=- e²/2r) Assim, T=p²/2m 1/r p 2 1/r. O elétron está em uma órbita de raio r se a órbita desse elétron tiver n nós, a incerteza na sua posição será menor. Afinal de contas, sabemos que ele não estará onde houver um nó. Usando o princípio da incerteza: pδx ~ p(r/n) ~ ħ p (n/r)
Modelo de Bohr Juntando os pedaços: p n/r & p 2 1/r r n 2. Portanto: E 1/n 2. A energia do elétron no átomo de H é inversamente proporcional ao quadrado do número quântico n. Já vimos algo parecido com isso antes, no caso da expressão de Rydberg. Fazendo direito: E n =-13,6/n² [ev] e r n =0,53n² [Å]. 13,6 ev é a energia de ligação do átomo de H. 0,53 ev é o raio de Bohr para o átomo de H.
Modelo de Bohr Um átomo de H é uma entidade complexa pois o elétron pode se mover em 3D. Um hipotético e irrealista físico experimental com um "contador de elétrons", movendo-se em torno do próton e registrando um ponto numa folha de papel cada vez que o seu equipamento fizesse um "clique" poderia obter ao fim de inúmeras medidas uma das distribuições mostradas na figura. As relações entre n, l, e m são as seguintes: 1. Para um dado n, l: varia entre 0 e (n-1) 2. Para um dado l, os valores de m variam entre: -l até +l em passos de 1.
Modelo de Bohr Se o átomo estiver isolado (por exemplo, se não estiver submetido a um campo magnético), nenhuma projeção m é privilegiada. Se o físico repetisse as medidas com o mesmo átomo ele obteria uma das outras distribuições apresentadas (com o mesmo n, e l). A figura apresenta a superposição dos estados com todos os m's possíveis para um dado n e l: o resultado é esfericamente simétrico. Assim, o que o físico obteria como resultado das suas medidas é uma distribuição esfericamente simétrica. Pensando bem, teria que ser assim: afinal de contas, o átomo está isolado e ele deve estar em um estado invariante por rotações.
Átomos O físico experimental mencionado acima não é hipotético. As figuras mostram resultados de uma experiência recente onde a distribuição de carga de um átomo de Cu no óxido de cobre foi medida. Notar que como o Cu está ligado ao O, não há simetria rotacional e apenas o estado com um dado m existe (isto é uma dada projeção do momento angular).
Átomos e princípio da incerteza Retomando o mencionado no início da aula, o que impede o elétron de cair no próton? Afinal de contas, segundo a Física Clássica cargas aceleradas irradiam e dessa forma ele iria continuamente perdendo energia e espiralar até chegar no próton. Ocorre que a mecânica quântica nos diz que apenas são possíveis as órbitas eletrônicas tais que caiba um número inteiro de comprimentos de onda. Ademais, o princípio da incerteza nos diz que quanto mais tentarmos colapsar a órbita do elétron, mais incerto será o momento linear; maior incerteza no momento significa que o elétron tenderá a fugir da região menor para a qual ele está se movimentando. A menor "caixa" que podemos construir para colocar um elétron no átomo de hidrogênio tem 0,53 Å.
Átomos e princípio da incerteza Sob certas situações, o elétron "pode entrar no núcleo" (observar as aspas!). Átomos com número atômico grande têm as órbitas dos elétrons mais internos muito próximas do núcleo. Lembram-se da interação fraca? Pois bem, esse elétron está suficientemente próximo do núcleo para que ela entre em ação ocorrendo o chamado processo beta inverso: p + e - n + n e (nesse caso, o núcleo altera seu número atômico Z Z-1, mantendo inalterado o número de massa A=Z+N).
Estados excitados Será então que um elétron está destinado a permanecer sempre num mesmo estado? Se um fóton de energia adequada incidir sobre o átomo, o elétron passa a ocupar um estado excitado. A descrição correta de como isso ocorre é assunto da QED, que descreve a interação entre partículas carregadas e o campo eletromagnético. Excitação do átomo de H, do estado (1, 0, 0) para o estado (3, 1, 0), através da absorção de um fóton cuja energia é igual à diferença de energia desses dois estados eletrônicos.